Clipping 12 de agosto de 2021

Manchetes

Câmara rejeita distritão e aprova volta das coligações (Folha de SP)

Verba para campanha eleitoral em 2022 pode chegar a R$ 7 bi (Estadão)

Câmara aprova coligações em 1º turno e derruba distritão (O Globo)

Gestão de fortunas por bancos cresce 8,8% e chega a R$ 1,8 tri (Valor)


Automotive Business

Por falta de peças, Toyota suspende produção em Sorocaba

Fábrica que produz Corolla Cross e Yaris ficará parada por 10 dias. Unidade de Porto Feliz (SP) também será afetada

Até então imune à crise dos semicondutores que já provocou a paralisação de 14 fábricas de oito montadoras no Brasil, a Toyota deu sinais de que sua cadeia de suprimentos sentiu os primeiros sinais da escassez de insumos. A montadora anunciou nesta quarta-feira, 11, que vai suspender a produção na fábrica de Sorocaba, no interior paulista.

Responsável pela montagem dos modelos Corolla Cross, Yaris (hatch e sedã) e Etios (somente para exportação), a planta de Sorocaba ficará parada entre os 18 e 27 de agosto, o que também vai afetar parcialmente a produção de motores na unidade de Porto Feliz (SP), que monta os motores 1.3, 1.5 (Yaris e Etios) e 2.0 (Corolla e Corolla Cross).

Enquanto durar a pausa na linha de montagem, os funcionários que tiverem as atividades afetadas serão colocados em férias coletivas, devendo todos voltar ao trabalho no dia 30 de agosto. A produção das fábricas de São Bernardo do Campo (que faz peças para motor) e de Indaiatuba (que fabrica o sedã Corolla), ambas no interior paulista, não será atingida pela medida.

Até o momento, a Toyota foi uma das montadoras menos afetadas no Brasil pela crise dos semicondutores, pois conseguiu manter a previsão de produção para este ano, enquanto as demais foram encolhendo nas vendas, o que explica seu crescimento no ranking nos últimos meses. Em julho, por exemplo, a marca japonesa chegou à vice-liderança do mercado nacional, atrás apenas da Fiat. Veja a seguir o comunicado oficial divulgado pela Toyota do Brasil.

“A Toyota do Brasil informa que realizará a suspensão temporária da produção em sua fábrica de Sorocaba, onde são produzidos os modelos Yaris (hatch e sedã), Corolla Cross e Etios (somente para exportação) entre os dias 18 e 27 de agosto de 2021. A unidade de Porto Feliz, responsável pela produção dos motores 1.3L e 1.5L do Yaris e Etios e do propulsor 2.0L TNGA do Corolla e Corolla Cross, também será parcialmente afetada.

“Apesar de todos os esforços que temos realizado ao longo do tempo para gerenciar a falta de insumos que afeta a cadeia de suprimentos global, provocada pela pandemia de Covid-19, nesse momento uma parada é inevitável.

“Os colaboradores afetados pela paralisação entrarão em férias coletivas neste período, com o retorno às atividades programado para o dia 30 de agosto. As demais unidades da Toyota no Brasil, localizadas em São Bernardo do Campo e Indaiatuba, permanecem com suas atividades normais.”

Estadão

Anfavea defende ‘avalanche de investimentos’ à indústria de transporte

A Anfavea, entidade que representa as montadoras instaladas no Brasil, defendeu nesta terça-feira, 10, que a indústria de transportes pode receber uma “avalanche de investimentos”, como não se vê desde a década de 1960, se o governo brasileiro implementar políticas de incentivo à introdução de tecnologias automotivas de baixa emissão de poluentes, como os carros elétricos ou movidos a biocombustível.

Entre indústria, tanto de automóveis, incluindo fornecedores, quanto de combustíveis, infraestrutura e nacionalização de equipamentos como baterias e, talvez, semicondutores hoje escassos e cuja demanda vai aumentar com os carros elétricos, serão necessários investimentos superiores a R$ 150 bilhões nos próximos 15 anos, conforme estimativa divulgada pela associação.

Se o objetivo for, de fato, evoluir a uma economia de baixo carbono, o governo, defendeu a Anfavea, terá que participar desse investimento não apenas entrando em programas de instalação de postos de recarga onde os investimentos previstos são da ordem de R$ 14 bilhões, e garantindo a geração de energia, mas também aprimorando a coordenação das políticas em curso que visam reduzir a poluição atmosférica.

A mensagem foi transmitida durante apresentação de um estudo encomendado pela entidade à consultoria Boston Consulting Group (BCG) onde são traçados cenários em que a participação de carros com algum grau de eletrificação hoje apenas 1% do mercado varia de 32% a 62% das vendas totais até 2035.

Isso significa entre 1,3 milhão e 2,5 milhões de veículos, sendo que o volume mais baixo considera a possibilidade de a eletrificação acontecer apenas em categorias específicas, e o mais alto leva em conta um quadro no qual a evolução tecnológica se aproxima do ritmo dos mercados desenvolvidos que lideram a transição de motores.

“Não consigo imaginar que esse volume será atendido por importações. É impossível considerar essa hipótese, até porque destruiria a balança comercial. Nem o setor agrícola conseguiria pagar essa conta”, comentou Luiz Carlos Moraes, presidente da Anfavea. “A indústria automotiva precisará entrar num novo ciclo de investimentos em toda a cadeia”, acrescentou o executivo.

A Anfavea convidou os ministérios da Economia, Meio Ambiente, Minas e Energia, Infraestrutura e Agricultura a acompanhar a apresentação, transmitida pelo Youtube, do estudo.

Durante o evento, dirigentes da entidade consideraram importantes, mas criticaram a falta de objetivos específicos e de interligação entre regulação das emissões veiculares com programas de incentivo ao desenvolvimento tecnológico e fontes de energia limpa, como os biocombustíveis.

O presidente da Anfavea defendeu ainda a discussão no Brasil sobre incentivos – como abatimento de preços garantido pelo governo e crédito tributário – dados em mercados que avançam mais rápido na eletrificação: Europa, Estados Unidos e China. “Temos que discutir isso aqui. Os consumidores, transportadores de cargas e passageiros precisam estar estimulados a investir nessas novas tecnologias.”

Descontos em pedágios e no IPVA, liberação do rodízio de placas na circulação em grandes centros urbanos, e taxas mais baratas de financiamento foram outros caminhos apontados para que as novas tecnologias não sejam acessíveis apenas a consumidores da elite social.

“Com certeza, o custo é pequeno perto do benefício que a sociedade vai absorver, inclusive na questão ambiental”, argumentou o presidente da Anfavea. Ele cobrou também um programa de renovação de frota, de modo que os veículos antigos sejam retirados de circulação, e uma reforma tributária que dê apoio à economia verde, sem visar apenas ganhos de arrecadação. “Podemos ter um novo boom de investimento no setor e uma transformação tecnológica no Brasil”, disse Moraes.

Valor

BMW reforça aposta no país para manter sua liderança

Na contramão de outras montadoras, alemã investe em Santa Catarina

Quando, atraídas por incentivos fiscais, as três marcas alemãs de carros de luxo decidiram investir em fábricas no Brasil, cinco a sete anos atrás, muitos desconfiaram que a empreitada poderia não dar certo. Passada a fase dos incentivos e com algumas queixas de que o governo não cumpriu o prometido, recentemente Audi e Mercedes-Benz desistiram de produzir no país. Mas a BMW, líder do segmento, segue um rumo diferente.

A empresa está prestes a anunciar um novo investimento na fábrica de Araquari (SC), inaugurada em setembro de 2014. Alexander Wehr, alemão que mora no México e há cinco anos ocupa a presidência da BMW na América Latina, afirma não poder, ainda, revelar o montante do novo investimento na fábrica que, desde a inauguração, já recebeu R$ 1,3 bilhão.

Afirma, porém, que, junto com a linha de motos, em Manaus, e a fábrica de carros em San Luis Potosi, no México, Araquari faz parte de “um enfoque muito estratégico” que o grupo BMW definiu para a América Latina. “Temos planos de longo prazo que levam em conta o potencial dos mercados e não apenas incentivos ou fatores externos”, destaca.

Embora se complementem no planejamento estratégico da marca alemã para a América Latina, as fábricas de Araquari e de San Luis Potosi têm perfis diferentes. A unidade catarinense é menor e voltada para o abastecimento do mercado brasileiro. Com previsão de produzir em torno de 10 mil unidades este ano, a linha catarinense responde por 80% dos modelos BMW vendidos no mercado brasileiro. Já a mexicana, inaugurada em 2019, tem capacidade para 175 mil veículos por ano e 90% da sua produção são voltados à exportação.

Segundo o executivo, a companhia também tem planos para, futuramente, produzir carros híbridos e elétricos em Araquari. “O futuro é elétrico e se o governo tiver uma agenda verde não permitirá incentivos para tecnologias obsoletas, que não contribuem”, diz. A ideia é inserir a operação brasileira no plano da companhia de, gradativamente, mudar a fonte de energia de seus modelos em todo o mundo.

A montadora que lançou seu primeiro elétrico em 2013 fixou a meta de até 2030 ter metade das vendas mundiais formada por modelos híbridos e elétricos. Para Wehr, cabe aos governantes promover políticas de estímulo à eletrificação do transporte.

“Isso não significa apenas incentivos financeiros, mas oferecer atrativos como a permissão para estacionar carros elétricos e híbridos nas áreas centrais das cidades, criar vias mais exclusivas para esse tipo de veículo ou mesmo oferecer estações de carregamento sem custo. A infraestrutura é a chave”, destaca. A BMW é uma das marcas que mais têm investido em pontos de recarga de baterias, com mais de 300 espalhados no Brasil.

Apaixonado pela América Latina desde os dez anos de idade, quando acompanhava os pais em viagens de turismo, pela região, Wehr, hoje aos 49 anos, fala espanhol fluentemente. Ajudou-o no aprendizado do idioma um período de intercâmbio acadêmico na UADE, universidade argentina dedicada à especialização empresarial.

O executivo conta que tem se dedicado também às aulas de português, embora ainda resista à ideia de conversar no idioma. “O bate-papo ainda é difícil”, diz. Com formação em administração e pós-graduação e doutorado na área de negócios, Wehr começou a trabalhar na BMW, com sede em Munique, em 1997. Ocupou cargos em diversas áreas, como planejamento de produto e vendas internacionais, até se radicar no México de onde comanda as três filiais da montadora alemã – México, Brasil e Argentina -, além de 24 outros mercados regionais, onde os veículos da marca são vendidos por importadores.

Para o executivo, o grupo BMW aprendeu a lidar com a volatilidade e a complexidade econômica da América Latina. “A região é um panorama de diversos países com potencial, mas que sofrem impactos políticos, sociais e econômicos de forma distinta. As taxas de vacinação (contra a covid-19) ainda estão muito baixas em alguns países e sentimos os impactos sociais. Mas no longo prazo a América Latina é relevante”, destaca.

Para ele, um sistema fiscal “menos complexo” ajudaria a economia no Brasil. Ele vê com bons olhos a chance de o país fechar acordos comerciais com outras regiões, como a Europa. “O México, por exemplo, tem acordos comerciais com mais de 40 países”, diz. Embora a BMW seja uma marca de alto luxo, voltada a um nicho de mercado, Wehr mostra-se satisfeito com os resultados na região e no Brasil. No acumulado do ano, até julho, as vendas da marca na América Latina cresceram 26,6% na comparação com igual período de 2020 enquanto o chamado mercado premium avançou 16,6%.

No Brasil, o crescimento da marca chegou a 33,9%, o que lhe garantiu 40,5% do mercado premium. As novas tecnologias, com renovação de produtos, voltados, sobretudo, ao incremento da eletrificação, tem atraído o público com renda para carros com preços a partir de R$ 250 mil.

Valor (análise)

Troller, o fim de um sonho de incentivos fiscais no Nordeste

Empresa fundada por brasileiros no Ceará serviu de trampolim para a Ford obter redução de impostos

Por Marli Olmos

Quando decidiu comprar a Troller, em 2007, não era exatamente nos jipes produzidos pela empresa brasileira que a Ford estava interessada. O que a atraiu à cidade de Horizonte, no Ceará, foi a chance de participar de um programa de incentivos fiscais especialmente criado para empresas do setor automotivo no Nordeste. O prazo para a inscrição ao programa havia se encerrado havia vários anos. Mas existia uma brecha: a compra de alguma empresa do setor na região permitiria aderir ao programa.

O Ceará serviu, assim, de ponte para a Ford obter incentivos fiscais e aproveitá-los na fábrica que erguera em Camaçari, na Bahia – uma então moderna linha de modelos compactos e do Ecosport, primeiro utilitário esportivo produzido no Brasil. Ao adquirir a Troller, nesse pacote, a Ford decidiu manter a linha de produção dos jipes em Horizonte, na empresa que nascera brasileira, em 1995.

Em janeiro de 2021, a Ford anunciou o encerramento das atividades industriais no país. A empresa já havia fechado a fábrica de São Bernardo do Campo (SP) no ano anterior. Restavam Camaçari, Taubaté (SP), onde eram produzidos motores, e a do Ceará. Ao decidir por esticar a produção do modelo Troller T4 até o fim do ano, surgiram rumores sobre interessados na compra da unidade.

Ao ser consultada por jornalistas sobre novas informações, que surgiram nos últimos dias, indicando a iminência da venda da unidade cearense, a Ford buscou eliminar especulações. Disse que o que está à venda são os ativos da fábrica e não a marca Troller. “Como anunciado em janeiro, a produção da Troller será encerrada no último trimestre do ano”, afirmou a empresa por meio de nota.

A produção dos jipes termina no fim de setembro e a de peças para reposição, em novembro, destacou. O processo segue, destaca a empresa, o que “está sendo feito em Camaçari e Taubaté”. Isso significa a venda dos ativos (propriedade, equipamentos, maquinário); “Mas não iremos nos desfazer da marca”. Segundo a nota, negociações com potenciais interessados nos equipamentos e propriedade continuam, mas não há nada conclusivo.

Desde que a Ford decidiu parar de produzir no Brasil surgiram vários rumores a respeito de prováveis candidatos à compra de suas fábricas. O mais longo e polêmico envolveu a antiga fábrica em São Bernardo, o governador de São Paulo, João Doria (PSDB) e o empresário Carlos Alberto Oliveira Andrade, do grupo CAOA. Doria chegou a convocar a imprensa para anunciar, ao lado dos dirigentes da Ford e de Andrade, a assinatura de um contrato de intenção de compra. Mas o negócio não foi adiante.

Voltou-se a falar em CAOA de olho em Camaçari, tempos depois. Mas não há, até agora, qualquer informação de negociações nesse sentido. Em junho, a Ford pagou R$ 2,5 bilhões ao governo da Bahia a título de devolução de incentivos fiscais.

Mas a Troller não foi o único caso de montadora que adquiriu empresa local para “pegar carona” no programa de incentivos do Nordeste. O grupo Fiat Chrysler, hoje parte de uma nova montadora, a Stellantis, seguiu caminho semelhante. Para se enquadrar na lei dos incentivos, a Fiat Chrysler comprou a TCA, fabricante de componentes elétricos (chicotes), de origem argentina, instalada em Jaboatão (PE).

Com a aquisição, a montadora não só passou a usufruir dos benefícios como obteve o direito de mudar o produto fabricado. Foi assim que em 2015 foi inaugurada a fábrica de veículos em Goiana, a poucos quilômetros dali.

Em ambos os casos, o governo federal abriu uma brecha, por meio de medida provisória, para estender a novos participantes os incentivos previstos na lei 9.440, criada em 1997 com o objetivo de descentralizar a indústria automotiva no Brasil. Um dos principais benefícios do chamado Regime Automotivo do Nordeste era o crédito presumido sobre desconto de 32% no Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI).

Nos anos seguintes à criação da lei, o regime sofreu atualizações e várias prorrogações. A mais recente estendeu o fim dos benefícios de dezembro de 2018 para 2025. Foi uma decisão tomada às pressas, na véspera de mudança de governo, e assinada junto com a lei que criou o programa Rota 2030. Sob o argumento de que os benefícios são necessários para compensar custos com a logística em fábricas distantes dos maiores mercados consumidores e de fornecedores, representantes das montadoras participaram ativamente de todas as mobilizações para prorrogar os incentivos.

Não apenas da Ford e da FCA como também de outras que tiraram proveito do regime – estendido ao Centro-Oeste, como o grupo CAOA e a Mitsubishi. Ao longo dos anos, os governos têm se mostrado generosos ao atender o apelo das empresas e perceberam que o regime do Nordeste e Centro-Oeste de fato ajudou a levar riqueza a regiões pelas quais, no passado, nenhum fabricante de veículos havia se interessado. Mas o caso da Ford mostra como as negociações entre empresas e políticos nem sempre são duradouras.

Valor

Indústria recua e ritmo ainda é inferior ao pré-pandemia

Resultado foi influenciado pelo desempenho do setor automobilístico e por máquinas, aparelhos e materiais elétricos

Os dados regionais da indústria brasileira em junho, divulgados ontem pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), apontaram mais uma vez um comportamento negativo da atividade, a despeito da variação nula da média da produção do país. Na passagem entre maio e junho, houve queda em 10 dos 15 locais pesquisados.

Quando se compara com o período pré-pandemia, também são 10 dos 15 locais pesquisados que ainda têm patamar de produção inferior. “Esses dados mostram que há certa instabilidade em relação à compensação [das perdas da pandemia] e se observa um ambiente ainda muito cauteloso na indústria nacional”, diz Bernardo Almeida, gerente da Pesquisa Industrial Mensal Regional (PIM Regional).

Dos dez locais em patamar de produção inferior ao de fevereiro de 2020, destacamse a Bahia (-28,5%) e o Nordeste (-17,5%). Nos dois casos, há influência do fechamento da fábrica da Ford em Camaçari, região metropolitana de Salvador. A terceira região com pior desempenho é o Pará (-13%). Também aparecem no campo negativo Espírito Santo (-7,6%), Mato Grosso (-4,9%), Ceará (-4,1%), Pernambuco (-4%), Paraná (-2,7%), Rio Grande do Sul (-1,5%) e Goiás (-1,4%).

No outro lado, as cinco que já conseguiram ultrapassar o patamar pré-pandemia são Minas Gerais (+15,5%), Amazonas (+9,4%), Santa Catarina (+6,1%), Rio de Janeiro (+4,2%) e São Paulo (+3,4%). Na avaliação do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), os parques industriais do centro-sul do país colocaram um freio à expansão da indústria nacional, anulando o dinamismo positivo de outras regiões.

O Iedi destaca o desempenho negativo de três dos quatro Estados do Sudeste – com exceção do Rio de Janeiro, que teve alta de 2,8% em junho, frente a maio – e nos três Estados do Sul. “É no Norte e no Nordeste onde se concentraram as variações positivas de junho de 2021, e em alguns casos com taxas de crescimento substanciais.

O destaque vai para a região Nordeste como um todo, que saiu de uma sequência de seis meses de queda consecutivos para registrar 6,4% na passagem de maio para junho”, aponta o relatório do Iedi. “Ainda assim, o Nordeste tem um longo caminho a trilhar para retornar a níveis pré-pandemia.”

Principal parque industrial do país, com cerca de 34% de peso na atividade industrial nacional, o Estado de São Paulo voltou a registrar recuo em um contexto de desempenho instável ao longo de 2021. A produção avançou 1% em janeiro, recuou 1,5% em fevereiro e teve variação de 0,1% em março. Em abril, mês de amplas restrições de atividades no Estado, houve perda de 4,6%, em parte compensada pelo aumento de 3,3% em maio.

“Com a flexibilização das medidas de restrição de funcionamento em maio, a indústria paulista avançou e compensou parte do que tinha perdido em abril. Mas em junho se observa mais uma vez o impacto da conjuntura econômica, com ambiente de incertezas, baixo número de contratações e poder de consumo das famílias em queda”, explica o gerente da pesquisa, Bernardo Almeida.

No recuo de 0,9% da produção entre maio e junho, diz ele, a maior influência veio do setor automobilístico, que é o mais importante da indústria paulista, com peso de 16,1%. “O setor de veículos foi a principal influência negativa neste resultado. Mas também contou a produção de máquinas, aparelhos e materiais elétricos, que inclui eletrodomésticos e eletroportáteis”, afirma.

Valor

Novo regime de trabalho gera polêmica e pode ser questionado no Judiciário

Previsto na MP 1.045, o Requip divide opiniões por não promover vínculo de emprego

Apelidada de minirreforma trabalhista, a Medida Provisória (MP) nº 1.045, cujo texto-base foi aprovado na Câmara dos Deputados, traz um regime especial de trabalho e qualificação que poderá gerar um novo contencioso na Justiça de Trabalho. A polêmica está no fato de não prever vínculo de emprego e direitos trabalhistas – apenas vale-transporte.

Para advogados que assessoram empresas, o Regime Especial de Trabalho Incentivado, Qualificação e Inclusão Produtiva (Requip), porém, é uma boa saída em tempos de crise para reincluir pessoas no mercado de trabalho. É destinado a quem está sem registro em carteira de trabalho há mais de dois anos, jovens de 18 a 29 anos e beneficiários do Bolsa Família.

A MP prevê ainda um outro regime – o Programa Primeira Oportunidade e Reinserção no Emprego (Priore), destinado a pessoas entre 18 e 29 anos e acima de 55 anos sem registro por mais de 12 meses. Nesse caso, os trabalhadores terão todos os direitos assegurados pela Constituição, CLT e convenções coletivas. Mas receberão um valor menor de FGTS em caso de demissão.

As alterações, segundo Alberto Nemer, do escritório Da Luz, Rizk & Nemer, vieram em boa hora. “Esses programas dão uma oportunidade de reinserir essas pessoas no mercado de trabalho e qualificá-las”, diz ele, acrescentando que o Priore seria uma versão aprimorada do Contrato de Trabalho Verde e Amarelo, previsto na MP nº 905, de 2019. “Temos que enxergar a questão financeira das empresas e o programa é a porta de entrada para um emprego.”

No entendimento de outros advogados trabalhistas e juízes do trabalho, no entanto, por não prever direitos, o Requip cria subcategorias e abre a possibilidade de fraudes na relação trabalhista. “O projeto não é ruim. Mas podem [empresas] contratar pessoas sem dar qualificação e cobrar como se fossem empregadas”, diz Juliana Bracks, do Bracks Advogados. Ela lembra que a Justiça pode reconhecer vínculo, se presentes os requisitos previstos na CLT e se houver fraude na relação.

Pelo texto básico da MP, pessoas poderão ser contratadas por meio desse regime pelos próximos três anos, após a publicação da lei. E os contratos poderão durar até dois anos. Nesse caso, a pessoa não recebe salário. Está estabelecido o pagamento de bônus pelo trabalho (o BIP, Bônus de Inclusão Produtiva) e de uma bolsa por participação em cursos de qualificação de 180 horas ao ano (a BIQ, Bolsa de Incentivo à Qualificação).

O trabalhador poderá ter jornadas de até 22 horas por semana, com pagamento proporcional ao mínimo. Ou seja, pode receber no máximo R$ 550. Não será, pela MP, considerado funcionário. Só terá direito ao vale-transporte e não receberá qualquer indenização no fim do contrato de trabalho, como aviso prévio, férias e 13º proporcionais, conforme previsto no artigo 73 da MP.

As empresas que aderirem ainda poderão descontar o valor do BIP dos pagamentos ao Sistema S – como ocorrerá com o Priore. Por não ser considerada uma relação trabalhista, a MP ainda permite descontar o montante da BIQ da base de cálculo do IRPJ e da CSLL.

Apesar da confusão, o artigo 46 da MP já esclarece que o Requip não se confunde com estágio, previsto na Lei nº 11.788, de 2008. Nem mesmo com contrato de aprendizagem, disponível nos artigos 428 e 433 da CLT – as empresas continuam obrigadas a cumprir as cotas de aprendizes. Empregadores de qualquer setor podem contratar pelo Requip, desde que obedeçam os limites da MP, que vão de 10% do total de empregados no primeiro ano de vigência da lei até 20% no terceiro ano. Empresas com mais de 20 empregados podem ter no máximo quatro beneficiários.

Fabíola Marques, sócia do Abud Marques Sociedade de Advogadas, critica o texto. Para ela, mais uma vez o Legislativo quer repassar a conta pelas dificuldades econômicas enfrentadas para a parte mais fraca. “O Requip traz uma figura nova e complicada. É como se ficasse à margem da sociedade, não é trabalhador, não recebe salários, não tem direitos como os outros”, diz.

A advogada acrescenta que essa nova modalidade poderá ser questionada judicialmente, caso seja aprovada. “Com a alegação fundamentada em violações de princípios constitucionais, como o princípio da dignidade humana.”

José Eymard Loguercio, do LBS Advogados, que assessora trabalhadores, afirma que todos os estudos e indicadores no Brasil e no mundo, que analisam dados de reformas trabalhistas que trocam trabalho seguro por inseguro ou trabalho com direitos por trabalho com menos direitos, comprovam que aumenta a concentração de renda e riqueza e não se gera mais inclusão social. “Nós estamos na contramão do que estão fazendo Estados Unidos e a União Europeia, que começam a enxergar no trabalho, na negociação coletiva e no papel de fomento do Estado a saída para a crise”, diz.

Presidente nacional da CUT, Sérgio Nobre afirma que com a MP 1.045 atacam, mais uma vez, os direitos da classe trabalhadora e trazem de volta à cena a “famigerada” carteira verde amarela, sem nenhum direito. A entidade, segundo ele, vai pressionar o Congresso e demonstrar que o texto, assim, como a reforma trabalhista, não vai gerar os empregos anunciados. “A reforma não criou os seis milhões de empregos prometidos à época”, diz.

Luiz Antonio Colussi, presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça (Anamatra) afirma que “é evidente o viés precarizante dos programas propostos, notadamente do Requip e do Programa Nacional de Prestação de Serviço Social Voluntário”. Para ele, não houve o debate necessário para a aprovação da MP que, depois de analisados os destaques, segue para o Senado. A Confederação Nacional da Indústria (CNI) foi procurada, mas não deu retorno.

Folha de SP

Oposição tenta desidratar minirreforma trabalhista, mas centrão mantém programas de Guedes

Proposta cria três novos programas trabalhistas; governo diz que objetivo é estimular o mercado de trabalho, mas oposição na Câmara fala em precarização

Partidos da base do governo conseguiram barrar a tentativa da oposição na Câmara, nesta quarta-feira (11), de desidratar o projeto que tem sido chamado de minirreforma trabalhista, por criar novas modalidades de contratações e mudar normas da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho).

A votação do texto principal foi nesta terça (10), e o placar foi 304 votos a favor, e 133 contrários. Nesta quarta, o plenário analisou sugestões apresentadas pela oposição e partidos independentes para tentar retirar parte das medidas. As votações não foram concluídas, e devem seguir nesta quinta (12). Depois, o texto seguirá para o Senado.

Com isso, está mantido o trecho que cria três novos programas trabalhistas, defendidos pela equipe do ministro Paulo Guedes (Economia) e Onyx Lorenzoni (Trabalho e Previdência), que preveem contratos com regras mais flexíveis e, em alguns casos, sem vínculo de emprego.

O custo desses programas à União deve ser de pelo menos R$ 41,1 bilhões de 2022 a 2026.Além disso, pelo projeto, o programa emergencial de corte de jornada e de salários de trabalhadores da iniciativa privada, que foi criado por causa da crise da Covid-19, se torna permanente, podendo ser acionado em novas situações de calamidade pública.

O pacote trabalhista foi inserido no meio de uma MP (medida provisória) que prorrogou esse programa de corte de jornada na pandemia. O governo aproveitou a rápida tramitação dessa proposta e incluiu medidas defendidas pelos ministros.

A minirreforma também prevê mudanças nas regras da CLT que tratam de fiscalização trabalhista, restringe acesso à justiça gratuita em questões trabalhistas e também altera a jornada complementar de atividades e profissões com carga horária diferenciadas, como professores.

O relator da MP, deputado Christino Áureo (PP-RJ), nega que a proposta seja uma minirreforma trabalhista. Integrantes do governo dizem que o objetivo é estimular a geração de empregos e a entrada de jovens no mercado de trabalho.

“É um projeto que procura lidar com o desemprego mediante a precarização, a redução de direitos. É uma fórmula antiga, testada em outros países e no Brasil, na reforma de 2017, mas não obteve sucesso e afeta o nível de qualidade dos empregos”, disse Gustavo Ramos, advogado especialista em Direito do Trabalho e sócio do escritório Mauro Menezes & Advogados.

O primeiro programa trabalhista previsto no projeto é o Requip (regime de qualificação profissional). A medida é voltada para jovens, desempregados há mais de dois anos, ou beneficiários de programas sociais. O contrato poderá ser de até dois anos, não poderá exceder 22 horas semanais, e precisa estar vinculado a um curso de qualificação. O curso pode ser ofertado pelo Sistema S ou pelo patrão.

O plano prevê a criação do BIP (Bônus de Inclusão Produtiva) e do BIQ (Bônus de Incentivo à Qualificação), ambos pagos ao trabalhador em treinamento. Com isso, o valor recebido seria de R$ 550 por mês. O BIP, pelo desenho, será pago pelo governo. Já o BIQ seria a parcela da empresa.

Pelo texto, a parcela da União (BIP) pode ser paga pela empresa e descontada na hora em que for pagar contribuições sociais ao Sistema S. A segunda modalidade trabalhista a ser criadas pelo projeto é o Priore (Programa Primeira Oportunidade e Reinserção no Emprego). Ele é destinado a jovens com primeiro registro na carteira de trabalho e pessoas com 55 anos ou mais desempregadas há mais de um ano.

Nesse tipo de programa, haverá uma redução do recolhimento para o FGTS dos empregados. A remuneração não pode passar de dois salários mínimos (R$ 2.200). Essa modalidade deve ser feita exclusivamente para novas vagas e o contrato pode durar até dois anos. Direitos como o 13º salário e férias estão mantidos nesse programa. Os contratados via Priore terão prioridade para participar de ações de qualificação profissional e, assim, receberiam o BIP.

O terceiro novo tipo de contratação foi pedido por Onyx. É o Programa Nacional Prestação de Serviço Social Voluntário, também com foco em jovens de 18 anos a 29 anos, além de pessoas acima de 50 anos. O programa permite que prefeituras possam contratar temporariamente pessoas para serviços e, em troca, pagar uma remuneração que não pode ser inferior ao salário-mínimo hora (cerca de R$ 5). A União poderá ajudar nesse pagamento, em até R$ 125 por mês.

Em nota, entidades do Ministério Público, como a ANPT (Associação Nacional dos Procuradores e das Procuradoras do Trabalho), se posicionaram contra modificações feitas pelo Congresso. O líder da oposição na Câmara, Alessandro Molon (PSB-RJ), também criticou. “A base do governo Bolsonaro quer se aproveitar dessa crise, com elevado desemprego e fragilidade dos trabalhadores, para fazer uma nova reforma trabalhista, que retira mais direitos e flexibiliza a fiscalização do trabalho”, disse.

Segundo o relator, o objetivo é “reduzir os impactos sociais e no mercado de trabalho causados pela emergência em saúde pública, e garantir o ingresso no mercado de trabalho de jovens”. A MP foi enviada para o Congresso com 25 artigos. Na versão em votação pelos deputados, há quase 100 artigos na proposta. A inclusão de medidas que não estavam no texto original é conhecida como jabuti.

Valor

Relator muda parecer, mas resistências à reforma permanecem

Novo relatório prevê queda da alíquota básica do IRPJ dos atuais 15% para 6,5% em 2022

O deputado Celso Sabino (PSDB-PA) apresentou novo relatório da reforma do imposto de renda com importantes alterações, principalmente para tentar atender governadores e prefeitos. As mudanças, porém, não removeram as resistências de Estados e municípios e aumentaram a animosidade de empresários, fortemente contrários ao projeto.

O presidente da Câmara, deputado Arthur Lira (PP-AL), estava sendo pressionado a adiar a votação. De acordo com o novo relatório, a alíquota básica do IRPJ vai cair dos atuais 15% para 6,5% em 2022. Uma redução adicional de 1 ponto porcentual está prevista para o ano seguinte, levando-a a 5,5% em 2023. Antes, Sabino previa uma queda maior: eram 10 pontos no primeiro ano e mais 2,5 em 2023.

O relator concordou ainda em trocar parte da queda do IRPJ, que é dividida com Estados e municípios, por um corte na Contribuição Social sobre Lucro Líquido (CSLL), cuja arrecadação é só da União, em “até 1,5 ponto porcentual” (de 9% para 7,5%), vinculado ao fim de algumas renúncias tributárias. Assim, o projeto ficou menos agressivo em termos de redução de carga tributária.

A alíquota da tributação sobre o lucro das empresas, que iria a 21,5%, agora cairá a 23% no segundo ano. As estimativas de custos fiscais das medidas não foram oficialmente divulgadas. Mas o Valor apurou que as novas sugestões de alíquota para IRPJ reduzem o impacto em 2022 de R$ 74,1 bilhões para R$ 63 bilhões e de R$ 98,1 bilhões para R$ 86 bilhões em 2023, segundo cálculos preliminares. Já a redução da CSLL tinha custo estimado de R$ 15 bilhões em 2022 e R$ 16 bilhões em 2023.

Parte do custo dessas desonerações na tributação do lucro das empresas será compensada com a taxação de dividendos em 20%, principal medida que o governo quer implantar com o projeto enviado em junho, e o fim dos Juros sobre Capital Próprio (JCP). Essa compensação, contudo, ficou menor porque agora Sabino prevê isenção total de dividendos para empresas do Simples, além de manter o limite de isenção de R$ 20 mil para as demais empresas de menor porte. Antes dessas alterações, o ganho de arrecadação era calculado em R$ 18,7 bilhões em 2022 e R$ 56,6 bilhões em 2023.

Com a possibilidade de votação ontem e a apresentação do novo relatório, o dia no Congresso foi marcado por reuniões. Sabino defendeu sua proposta em almoço com empresários e parlamentares e disse que o Brasil sairá de uma taxação sobre o lucro das empresas de 34%, equivalente apenas a de Malta (35%), para um modelo igual a dos Estados Unidos, com 23% cobrado na pessoa jurídica e 20% na pessoa física. “Estamos chegando a consenso na Câmara para taxar o lucro das empresas em 23%. Essa redução vai beneficiar todas as empresas do lucro presumido, do lucro arbitrado e do lucro real”, disse.

Mas os empresários não se mostraram satisfeitos após o encontro. Em outra reunião, os Estados e municípios informaram ao relator que, embora tenha havido melhora, ainda há prejuízo significativo para eles, da ordem de R$ 16,5 bilhões – na primeira versão as estimativas chegavam a R$ 27 bilhões de perdas. Sabino, porém, indicou que não iria mais mexer e que novas alterações deveriam ser tentadas por destaques (emendas). Os Estados estão sugerindo mudar a queda do IRPJ da alíquota básica para a alíquota adicional.

A proposta levada a Sabino era reduzir de 10% para 0,5% (o que reduziria o custo da desoneração em cerca de R$ 11 bilhões), voltando a base para o original de 15%. Uma versão mais recente para tentar acordo propunha extinguir o IRPJ adicional e ainda reduzir a CSLL em 2 pontos. Os governos também querem a incidência de IR sobre dividendos em rendimentos superiores a R$ 240 mil por ano nas empresas de menor porte, inclusive do Simples.

Secretário de Fazenda de Pernambuco e coordenador do grupo de reforma tributária do Comsefaz, Décio Padilha destacou ao Valor que, além das perdas geradas do IRPJ, é preciso levar em conta que os Estados perderão receitas importantes com a correção da tabela do Imposto de Renda da Pessoa Física, não só pela redução que essa e a queda do IRPJ provocam, mas também porque o IR retido dos servidores ficam diretamente com os Estados. “Essa perda é ainda maior nos Estados grandes”.

Enquanto a Câmara estava discutindo a reforma do IR, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), defendia uma reforma tributária “ampla”. “Nós temos esse compromisso de uma avaliação e da evolução da PEC 110 no Senado”, afirmou, após receber um grupo heterogêneo de entidades que inclui CNI, Comsefaz, CCIF e entidades de auditores fiscais, como Sindifisco e Febrafite, entre outros. Eles entregaram ao presidente da Casa um manifesto em defesa de uma reforma tributária ampla, nos termos da PEC 110 do Senado.

Valor

Proposta não resolve problema da falta de progressividade

Para Bernard Appy, haverá redução de arrecadação do IR sobre empresas

A proposta apresentada pelo deputado Celso Sabino (PSDB-PA), relator da reforma do imposto de renda (IR), deve reduzir a carga tributária sobre renda no agregado e não melhora o problema da falta de progressividade do sistema atual, dizem analistas ouvidos pelo Valor. Isso, avaliam, distancia a proposta de um sistema que deveria ter carga maior sobre renda e menor sobre consumo e trabalho. Uma alteração no IR teria que, estruturalmente, elevar ou no mínimo não diminuir a carga sobre renda, diz o economista Bernard Appy, diretor do Centro de Cidadania Fiscal (CCiF).

Ele aponta que haverá redução de arrecadação do IR sobre empresas. Na proposta do relator, a alíquota básica de 15% do IR das pessoas jurídicas deve cair para 6,5% em 2022 e para 5,5% em 2023. O relator manteve a tributação sobre dividendos em 20%. “Há uma certeza de redução na tributação do IR das pessoas jurídicas, mas não se sabe em quanto a distribuição de dividendos cairá a partir do momento em que houver a tributação de 20%.”

Como mantém a isenção do IR de dividendos para até R$ 20 mil mensais, na regra geral, diz Appy, a proposta grava distorções existentes hoje e continua estimulando a pejotização. Com as novas alíquotas do relator, a carga para o sócio de empresa do lucro presumido com faturamento de R$ 25 mil mensais cai dos atuais 9,6% para 5,2%, calcula ele.

A conta considera a alíquota básica de 5,5% de IR de e 7,5% de Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), conforme proposta por Sabino. Atualmente a alíquota de CSLL é de 9%. A conta de Appy é feita com base presumida de 32% já aplicada ao setor de serviços e um lucro de 80% do faturamento.

Eduardo Fleury, tributarista sócio do FCR Law, diz que o debate hoje em torno da tributação sobre dividendos mostra que a chamada “classe média” também deve ser atingida por ela e não somente os “ricos”, como é comum dizer. Uma solução para esse efeito da pejotização, diz ele, seria tributar dividendos de forma progressiva, talvez numa tabela específica para essa renda.

Um ponto positivo, diz Fleury, é que no texto do relator a carga de IR envolvendo tributação sobre empresa e dividendos soma 38,4%, bem mais razoável que os 43% da proposta inicial do governo federal. A cobrança do imposto na distribuição de dividendos entre empresas praticamente acaba, o que é outra boa notícia, mas a tributação mantida sobre lucros distribuídos ao exterior joga contra a atração de investimentos, avalia.

A redução de alíquota do IR sobre empresas, diz Appy, também tem impacto no equilíbrio federativo, o que explica a resistência de Estados e municípios em relação ao texto do relator. “Mesmo com parte da redução agora na CSLL, mais da metade do custo de redução de carga da tributação sobre lucro das empresas será arcada por Estados e municípios.”

Para Sergio Gobetti, especialista em contas públicas, alguns pleitos dos Estados, como uma redução na alíquota adicional de IR das empresas em vez da diminuição na alíquota básica da pessoa jurídica faz sentido. Isso porque a alíquota adicional é cobrada apenas sobre rendimentos acima de R$ 240 mil anuais. Manter a alíquota de 15% para empresas com lucros até esse valor evitaria perda maior de arrecadação e também não concederia uma redução de carga de IR para uma faixa de empresas que estará também com isenção de dividendos.

Appy destaca ainda que há pelos menos duas medidas que permitem pedalada fiscal na reforma do IR, uma que já estava na proposta do governo e outra incluída pelo relator. Appy se refere à possibilidade de atualizar valores dos imóveis e pagar 4% de IR sobre ganho de capital. “O que se permite é que a pessoa que ia pagar um imposto maior no futuro antecipe essa receita e pague um IR menor. Isso é claramente uma pedalada fiscal porque antecipa para esse governo receita que seria cobrada em alíquota mais alta nos governos seguintes.”

Outra medida com mesmo efeito, diz Appy, foi adicionada ao texto pelo relator. O economista fala da possibilidade de atualização a valor de mercado de ativos do exterior com pagamento de IR de 6%. A alíquota sobre ganho de capital seria de 15% a 22%, dependendo do valor, destaca.

PANDEMIA

Valor

Reabertura é precipitada, afirma Vecina

Sanitarista diz que aumento de casos no exterior provocado pela delta deve servir de alerta ao Brasil

A reabertura quase que total das atividades programadas por alguns Estados nos próximos dias é precipitada e leva em conta apenas um cenário de “retrovisor”, em que mortes e internações têm caído, mas não considera os possíveis efeitos da disseminação da variante delta, afirma o médico sanitarista Gonzalo Vecina Neto.

Professor da Faculdade de Saúde Pública da USP e ex-presidente da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), ele diz que não há elementos que permitam inferir que o comportamento da delta no país será diferente de outras nações como EUA, Israel, Indonésia, Reino Unido, onde se tornou dominante e elevou de forma significativa o número de casos de covid-19. “Pode ser que tenhamos uma notícia nova e positiva [com relação à delta]? Pode. Mas estamos pagando para ver. Estamos correndo um risco grande e desnecessário”, diz Vecina, para quem, em se tratando de pandemia, o país vai respirar aliviado apenas daqui a uns três anos.

Os governos dos Estados de São Paulo e Rio de Janeiro anunciaram maior liberação de atividades a partir dos dias 17 e 23 deste mês, respectivamente. Estarão proibidos apenas eventos que causem aglomeração maior, como shows. No Rio, a expectativa é que a delta se torne predominante nas próximas semanas, segundo a Secretaria de Saúde.

Na Grande São Paulo, capital paulista ela já responde por 23,5% das infecções, segundo o Instituto Adolfo Lutz. “Tudo depende do horizonte. Se você enxerga dez metros à frente, você espera continuar vendo o que está no retrovisor, neste caso uma queda consistente de mortes e internações, e pensa que está na hora de liberar a sociedade. Se enxergar mais longe, vê a probabilidade de ocorrer o que está acontecendo nos outros países”, diz Vecina.

E o Brasil ainda tem um agravante em relação aos EUA e Reino Unido, que é a baixa testagem e sequenciamento genético dos vírus encontrados pelo país. “Sabemos pouco sobre o que está circulando”, diz ele, referindo-se às variantes.

De acordo com balanço do Ministério da Saúde, até ontem haviam sido identificados e notificados no Brasil 706 casos da variante delta e 36 mortes em 14 Estados e o Distrito Federal. Rio de Janeiro (com 211) e São Paulo (193) são os Estados com mais casos. O médico ressalta que embora casos e internações tenham caído no país, a marca em torno de 900 mortes diárias, em média, é muito alta, equivalente ao pior momento da primeira onda. E lembra que apenas duas doses de vacina podem conter a delta. Pouco mais de 22% da população do país está completamente imunizada.

O sanitarista estima que em novembro o Brasil possa ter entre 70% e 80% das pessoas totalmente vacinadas. Até lá, é possível um novo recrudescimento da pandemia provocado pela variante que veio da Índia, que não é mais letal, mas tem um potencial maior de transmissão, diz Vecina. E pode-se esperar no Brasil um comportamento como o que tem sido visto lá fora, com hospitalizações principalmente de pessoas não vacinadas. “Não estou olhando em bolsa cristal, estou olhando as informações que vêm da Europa e do Sudeste Asiático, dos Estados Unidos.”

Embora a vacinação tenha avançado nas últimas semanas, o médico aponta que o número de doses disponíveis ainda segue muito abaixo da capacidade de imunização do SUS. Instado a fazer uma previsão de quanto o brasileiro poderá respirar um pouco mais aliviado, Vecina se diz pessimista.

A pandemia, avalia ele, vai demorar para ser controlada. “Talvez isso ocorra em três anos”. Para isso concorrem dois pontos: a desigualdade de vacinação no mundo deve fazer com que o vírus continue circulando e criando novas variantes. Sem estratégia de combate à pandemia pelo menos até o fim de 2022, o Brasil deve continuar suscetível a novas ondas. “Não tenho nenhum tipo de otimismo em relação ao controle da pandemia no país.”

Mas o médico vê com mais esperança o desenvolvimento de novas vacinas no país. Além da Butanvac, do Butantan, a Anvisa já recebeu três pedidos de autorização de estudos, a da vacina UFRJac, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ); a Spintec, da Federal de Minas (UFMG) e a Versamune, da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto – USP com a empresa Farmacore e a PDS Biotechnology, dos Estados Unidos. “As três são muito promissoras”, diz Vecina.

O fato de esses projetos existirem, diz, são um ponto de atenção em meio à tragédia da pandemia. “As universidades, o Butantan, a Fiocruz, a Anvisa são exceções fantásticas nesse clima de terra arrasada em que vive a área de ciência e tecnologia no Brasil. São exemplos fantásticos de superação, a despeito da situação do país”.

Apesar das vacinas em desenvolvimento, Vecina diz que ficaria mais tranquilo se o país tivesse comprado mais imunizantes porque a terceira dose é, para ele, um fato. “A terceira dose não é mais uma pergunta, é uma certeza. E não só para idosos”, diz. “Não tenho muita dúvida que teremos que fazer isso depois de vacinada a população de 12 a 18 anos”. No Brasil, a Unifesp estuda a terceira dose em vacinados com Coronavac, Pfizer, AstraZeneca e Janssen.

Valor

Terceira dose de Coronavac eleva proteção, dizem estudos

Trabalho elaborado na China ainda não foi revisado por outros cientistas mas indica proteção entre três e cinco vezes maior para adultos e de até sete vezes para maiores de 60 anos

Uma terceira dose de Coronavac para quem já completou o esquema vacinal contra a covid-19 é eficaz para aumentar a imunidade contra o coronavírus. A conclusão está em dois estudos divulgados na terça-feira pelo fabricante, o laboratório chinês Sinovac, e comentados pelo Instituto Butantan, parceiro na produção do imunizante.

As pesquisas foram feitas na China com dois grupos de voluntários, adultos e idosos, e com dois diferentes intervalos de aplicação da terceira dose. Os artigos estão publicados na plataforma medRxiv, ainda sem a revisão de outros cientistas.

Em um estudo, pessoas de 18 a 59 anos tomaram a dose adicional após seis meses da conclusão do esquema normal de vacinação (com duas doses). “E mostrou o que nós já sabemos: que com duas doses existe uma imunização e, após seis meses, se recebe uma dose adicional, a resposta é multiplicada de três a cinco vezes”, disse Dimas Covas, diretor do Instituto Butantan.

No outro estudo, foi avaliada a resposta em pessoas com mais de 60 anos. Nesse grupo, a aplicação da terceira dose foi feita oito meses depois do esquema de duas doses estar completo. “A resposta foi até mais substancial: de cinco a sete vezes superior à resposta após as duas doses”, disse Covas.

Segundo o diretor do Butantan, a segurança de tomar uma terceira dose também foi acompanhada nos trabalhos, e os resultados não demonstraram que haja risco em nenhum dos grupos. “Não houve mudança do perfil de segurança da vacina, que é a vacina, neste momento, mais segura entre todas que estão sendo utilizadas”, afirmou.

Para Dimas Covas, as conclusões dos estudos não determinam que uma dose adicional seja necessária neste momento para quem tomou a Coronavac. São úteis, porém, para “preparar uma revacinação”. “São resultados que confirmam a efetividade de uma dose adicional. Isso não quer dizer que está sendo proposta uma dose adicional”, afirmou. “Isso depende de outros fatores, inclusive com relação ao problema da circulação de variantes. São dois estudos importantes, dois primeiros estudos a serem divulgados.”

Existem outras vacinas que estão realizando o mesmo tipo de estudo, mas ainda não houve divulgação. De acordo com Jean Gorinchteyn, secretário de Saúde do Estado, a aplicação de doses adicionais já está sendo planejada para o ano que vem, como “prerrogativa” para todos os moradores de São Paulo, “independentemente do imunizante” que tenham tomado na campanha deste ano.

A secretaria tem acompanhado estudos nesse sentido. Em julho, o Ministério da Saúde encomendou um estudo, em parceria com a Universidade de Oxford, para avaliar uma dose adicional de vacina da Coronavac. O trabalho deve ficar pronto em novembro.

Valor

Chile começa a aplicar terceira dose

O Chile começou ontem a aplicar uma terceira dose de vacina contra a covid-19 em pessoas com mais de 86 anos que receberam duas doses da Coronavac. A dose de reforço é da vacina da AstraZeneca /Oxford. O Chile planeja reforçar a imunização dessa faixa etária até o fim do mês. A partir de setembro o reforço será estendido a outros grupos.

A medida contraria orientação da Organização Mundial de Saúde (OMS), que teme que isso complique a oferta de vacinas para os países mais pobres. Mas o país optou por aplicar o reforço após um estudo indicar queda de 5% na eficácia da Coronavac em prevenir casos sintomáticos após seis meses da imunização inicial. Israel também já está aplicando a terceira dose em sua população adulta, e EUA, França e Reino Unido também se preparam para oferecer doses de reforço.

POLÍTICA

Folha de SP

Câmara rejeita distritão e aprova volta das coligações após Lira pautar reforma eleitoral a jato

Após meses de debates, o plenário da Câmara dos Deputados decidiu na noite desta quarta-feira (11) rejeitar a criação do chamado distritão, mas aprovou a retomada da possibilidade de coligações nas eleições para deputados e vereadores.

A medida foi fruto de um acordo entre os defensores do distritão, que não tinham os 308 votos necessários para mudar o sistema eleitoral, e a oposição, que afirmou entender a volta das coligações como um “mal menor”. Por se tratar de mudança na Constituição, era preciso haver ao menos 308 dos 513 votos.

Essa é a terceira vez que o plenário da Câmara rejeita o distritão, desta vez por 423 votos a 35 —as duas vezes anteriores ocorreram em 2015 e 2017. A volta das coligações foi aprovada por 333 a 149. A análise de alguns destaques (emendas que tentam alterar parte do texto) e a votação do segundo turno estão previstas para serem finalizadas nesta quinta-feira (12). Após isso, a PEC segue para o Senado e tem que ser aprovada e promulgada até o início de outubro para valer nas eleições de 2022.

A reforma eleitoral foi colocada para votação às pressas pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), na noite desta quarta, motivando protesto de líderes de diversos partidos, já que a previsão era tratar do tema só nesta quinta.

O presidente da casa vizinha, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), já afirmou não ver apoio substancial entre os senadores para alterações no sistema eleitoral. Deputados reconhecem que haverá dificuldade para aprovar de fato, por lá, a volta das coligações.

O fim das coligações para a eleição ao Legislativo foi uma das medidas mais elogiadas dos últimos anos, já que tende a sufocar agremiações de aluguel e reduzir a sopa de letras partidária do país, que tem hoje 33 legendas.

Partidos nanicos tendem a obter vagas no Legislativo apenas em coligações com siglas maiores. A proibição dessas alianças começou a valer na eleição municipal de 2020. Juntamente com a cláusula de desempenho —que tira recursos das siglas com baixo desempenho nas urnas—, essa medida visava reduzir o número de partidos no Brasil.

Apesar de a medida ser considerada uma ação de racionalização do sistema político nacional, houve uma expressiva mobilização na Câmara ou para a volta das coligações ou para a criação do distritão. Ambas as propostas são criticadas pela ciência política.

No distritão são eleitos para a Câmara, Assembleias e Câmaras Municipais os candidatos mais bem posicionados. Os votos dados aos derrotados e os votos dados em excesso aos eleitos são desprezados. O distritão fragiliza os partidos e tende a beneficiar políticos já bem posicionados ou celebridades. Caso ele fosse instituído, não haveria razão para a volta das coligações, já que a votação dada no conjunto de candidatos do partido ou dos partidos não tem efeito para a distribuição de cadeiras.

Isso ocorre no atual sistema, chamado proporcional, em que os eleitos são definidos por meio de um cálculo que leva em conta todos os votos dados ao partido (voto na legenda) e aos seus candidatos, mesmo os derrotados. Ou seja, nesse modelo, uma coligação robusta e de vários partidos tende a ampliar as chances de nanicos e siglas menores elegerem candidatos.

O projeto, que já havia sido aprovado em uma comissão especial, também alterava a forma de escolha de presidentes da República, governadores e prefeitos, isso a partir de 2024. Pelo texto, o eleitor poderia votar em até cinco candidatos a presidente, governador ou prefeito, em ordem decrescente de preferência, acabando com o segundo turno. O acordo fechado entre os partidos, entretanto, estabelecia que essa mudança seria rejeitada na votação dos destaques.

Um outro ponto da PEC estabelece que o voto dado a mulheres e negros terá peso duplo na definição da distribuição das verbas públicas —hoje o dinheiro é repartido de acordo com a votação que cada legenda tem na eleição para a Câmara dos Deputados.

O PSL apresentou um destaque para tentar derrubar essa medida. Em defesa do destaque, a deputada Carla Zambelli (PSL-SP) afirmou considerar que a medida representa uma “discriminação” contra brancos e homens e “outras minorias”, embora a política seja dominada, amplamente, por homens e brancos.

“No momento em que a gente coloca isso na Constituição e principalmente no momento em que a gente dá um peso diferente ao voto da mulher e ao voto do negro, a gente está discriminando quem não é negro, quem não é mulher. Estamos discriminando os brancos, as outras minorias, eventualmente, outras pessoas, e estamos discriminando os homens”, disse Zambelli. “Por que nós mulheres temos que ter um peso diferente em relação ao dinheiro distribuído do que os homens? Por que essa diferença com as mulheres?”, prosseguiu a deputada. O destaque do PSL foi derrotado por 352 votos contra 97.

A PEC também tenta impor uma amarra ao Supremo Tribunal Federal e ao Tribunal Superior Eleitoral, colocando na Constituição a determinação que decisões suas que alterem regras eleitorais só podem valer na disputa se forem tomadas até um ano antes. Esse trecho, se passar pelo Senado, tende a ser judicializado.

Os deputados também aprovaram outras medidas, como a alteração da data de posse de presidentes, governadores e prefeitos, hoje no dia 1º de janeiro, para 5 (presidente) e 6 de janeiro. O projeto ainda flexibiliza punições a partidos e dá mais liberdade para aplicação do dinheiro destinados por eles às suas fundações.

Além dessa proposta, a Câmara dos Deputados pretende votar projetos que visam alterar praticamente toda a legislação eleitoral e política do país, em uma reforma que, se entrar em vigor, será a maior da história desde a Constituição de 1988.

Projeto que pode ir a voto nas próximas semanas, relatado pela deputada Margarete Coelho (PP-PI), tem 372 páginas e 902 artigos. Além de censurar a divulgação de pesquisas eleitorais até a antevéspera do pleito, a proposta enfraquece as cotas para estímulo de participação de mulheres e negros na política, esvazia regras de fiscalização e punição a candidatos e partidos que façam mau uso das verbas públicas e também tenta colocar amarras ao poder da Justiça de editar resoluções para as eleições.

O projeto, relatado pela deputada Margarete Coelho (PP-PI), aliada de Arthur Lira (PP-AL), presidente da Câmara, pretende revogar toda a legislação eleitoral e estabelecer um único código eleitoral. Uma primeira tentativa de alteração nas regras eleitorais já foi rejeitada pela Câmara.

Na terça-feira (10) o plenário da Câmara rejeitou projeto de emenda à Constituição que pretendia exigir a impressão do voto dado pelo eleitor na urna eletrônica. A medida era uma das principais bandeiras do presidente Jair Bolsonaro (sem partido). Desde antes de assumir, ele tem alimentado suspeitas contra as urnas eletrônicas, apesar de jamais ter apresentado qualquer indício concreto de fraude nas eleições. Baseado nessas falsas suposições, e em um cenário de queda de popularidade e de maus resultados em pesquisas de intenção de voto, já ameaçou diversas vezes a realização da disputa do ano que vem.

A VOLTA DAS COLIGAÇÕES

O que são – Desde 2020 os partidos estão proibidos de se coligar para a eleição de deputados e vereadores. A coligação para as eleições majoritárias permanece

Por que as coligações foram proibidas – Objetivo foi sufocar agremiações de aluguel e reduzir o número de partidos hoje no país (33)

Por que podem voltar – Partidos nanicos e médios tendem a obter vagas no Legislativo apenas em coligações com siglas maiores. Com isso, pressionam pela retomada do modelo

Por que teria que se optar entre coligações e distritão – O atual sistema distribui as cadeiras com base em todos os votos dados na legenda e aos candidatos dos partidos. Quanto maior e mais forte a coligação, mais chances há de partidos menores elegerem representantes. No distritão, são eleitos os mais votados, ou seja, coligações são inócuas.

Folha de SP

Horas após derrota do voto impresso, Bolsonaro critica TSE e diz que eleições de 2022 não serão confiáveis

Presidente deu declarações a apoiadores após Câmara dos Deputados barrar PEC do voto impresso

Apesar da derrota da proposta do voto impresso na Câmara dos Deputados, o presidente Jair Bolsonaro manteve nesta quarta-feira (11) ataques à Justiça Eleitoral e insinuações sem provas sobre a segurança das eleições brasileiras.

Em conversa com apoiadores horas após a derrota, Bolsonaro disse que deputados que votaram pela PEC (Proposta de Emenda à Constituição) do voto impresso não acreditam no trabalho do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) e afirmou ainda que o resultado das eleições do ano que vem não será confiável.

“Números redondos: 450 deputados votaram ontem [terça-feira]. Foi dividido, 229 [a favor], 218 [contra], dividido. É sinal que metade não acredita 100% na lisura dos trabalhos do TSE. Não acreditam que o resultado ali no final seja confiável”, disse o presidente. “Hoje em dia sinalizamos uma eleição… não é que está dividida. Uma eleição onde não vai se confiar no resultado das apurações”, declarou aos seus apoiadores.

Nesta terça (10), dia em que Bolsonaro foi protagonista de um desfile de veículos militares em frente ao Palácio do Planalto, visto como uma forma de pressionar os demais Poderes, a PEC do voto impresso foi derrotada pelo plenário da Câmara.

A proposta foi usada como pretexto para seguidas manifestações golpistas do presidente. Foram 229 a favor do texto, 218 contra e uma abstenção. Eram necessários ao menos 308 votos dos 513 deputados —60%— para que a proposta de impressão do voto dado pelo eleitor na urna eletrônica fosse adiante. Ou seja, faltaram 79 votos para que a PEC fosse aprovada. Diante do resultado, ela foi arquivada.

Nesta quarta, Bolsonaro voltou a alimentar teorias da conspiração sobre a fragilidade dos sistemas internos do TSE e sobre a existência de um suposto plano para eleger o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) “na fraude”. As falas do mandatário foram transmitidas por um site bolsonarista.

“O que a gente quer —repito aqui— é uma maneira de a gente comprovar que em quem o João ou a Maria votou, o voto foi para aquela pessoa. Não tem explicação o que estão fazendo.” “Querem na verdade levar, eleger, uma pessoa na fraude. Uma pessoa que há pouco tempo esteve à frente no Executivo e foi uma desgraça o que aconteceu”, disse Bolsonaro.

Em outro trecho, Bolsonaro disse estar “feliz com o Parlamento” após o resultado da votação. Ele também afirmou que alguns deputados que foram contra a PEC o fizeram por terem sido “chantageados”. “Quero agradecer à metade do Parlamento que votou favorável ao voto impresso. Parte da outra metade, que votou contra, que entendo que votou chantageada. Uma outra parte que se absteve, não são todos, alguns ali que não votaram com medo de retaliação”, disse.

Um dia antes, Bolsonaro acusou o ministro Luís Roberto Barroso, presidente do TSE e integrante do STF, de “apavorar” parlamentares contra o voto impresso. “O ministro Barroso apavorou alguns parlamentares, e tem parlamentar que deve alguma coisa na Justiça, deve no Supremo. Então o Barroso apavorou.”

Já o vice-presidente Hamilton Mourão (PRTB) foi na linha contrária da de Bolsonaro. Questionado sobre o voto impresso, ele afirmou que o assunto está “encerrado”. “Para mim está encerrado, o Congresso decidiu está decidido”, disse, ao chegar ao gabinete da Vice-Presidência, anexo ao Palácio do Planalto.

“Nós não conseguimos o número de votos necessários, minha avaliação era que era difícil conseguir os 308 votos. Apesar de termos a maioria de votos, mas não foi o número necessário para uma mudança.” “Acho que o assunto foi colocado, a própria Justiça Eleitoral acho que ela vai se esforçar para, dentro do processo que existe, dar mais publicidade e transparência. Acho que no final das contas saímos bem disso daí”, afirmou.

A análise do mapa da votação que rejeitou a adoção do voto impresso mostra que os dois principais partidos do centrão, PL e PP, foram cruciais para enterrar na Câmara a bandeira de Jair Bolsonaro, também pretexto para seus discursos golpistas.

Apesar de serem aliados do presidente da República, as duas siglas deram apenas 27 votos a favor da medida, um terço de suas bancadas. Outros 36 deputados dessas duas legendas votaram contra e 18 se ausentaram, o que, na prática, contou como voto contrário à PEC.

Ou seja, se PP e PL tivessem se mobilizado totalmente a favor do voto impresso, a medida ficaria bem mais próxima de ser aprovada —em vez dos 79 votos a menos (uma PEC precisa de 308 ou mais votos), faltariam apenas 25.

O PP lidera o centrão e tem a Casa Civil, comandada pelo presidente da sigla, o senador Ciro Nogueira. A Câmara também é presidida pelo partido, com Arthur Lira (PP-AL), que nesta terça afirmou esperar que esse assunto esteja encerrado entre os deputados.

Nos bastidores, o centrão nunca se envolveu de corpo e alma na defesa do voto impresso, considerando essa uma bandeira dos bolsonaristas radicais. Na reta final da discussão, ainda pesou contra o agravante de Bolsonaro intensificar o discurso contra os Poderes.

Em uma atitude diferente das grandes siglas do centrão, partidos que se opõem a Bolsonaro, mas não integram a esquerda, racharam, apesar do discurso público de seus presidentes contrários ao voto impresso.

Em junho, presidentes de 11 legendas se reuniram e fecharam acordo para votar contra a medida. Nesta terça, porém, PSDB, MDB e DEM se dividiram. Os tucanos deram 14 votos a favor da medida, mais do que os que votaram contra (12). Cinco se ausentaram, e Aécio Neves (MG) foi o único a se abster, o que, na prática, contou como voto contra.

MDB e DEM deram 28 votos a favor da medida e 33 contra (entre faltosos e votos não). O PSD de Gilberto Kassab pendeu mais para o lado do voto impresso —20 votos a favor da medida e apenas 15 contra (entre votos não e faltosos).

Ao final da votação, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), agradeceu ao plenário pelo “comportamento democrático de um problema que é tratado por muitos com muita particularidade e com muita segurança”. “A democracia do plenário desta Casa deu uma resposta a esse assunto. E na Câmara eu espero que esse assunto esteja definitivamente enterrado”​, afirmou.

A abstenção registrada foi do deputado Aécio Neves (PSDB), que, em 2014, pediu auditoria no resultado das eleições após perder por estreita margem para a ex-presidente Dilma Rousseff (PT).

A votação desta terça-feira (10) enterra a proposta que mobilizou a escalada de ataques de Bolsonaro a integrantes do STF e do TSE e que agravou uma crise entre os Poderes. A tensão foi apimentada com a apresentação de blindados das Forças Armadas em Brasília, vista como tentativa de intimidação no dia de votação da PEC do voto impresso.

Desde antes de assumir, Bolsonaro tem alimentado suspeitas contra as urnas eletrônicas, apesar de jamais ter apresentado qualquer indício concreto de fraude nas eleições. Baseado nessas falsas suposições, e em um cenário de queda de popularidade e de maus resultados em pesquisas de intenção de voto, já ameaçou diversas vezes a realização da disputa do ano que vem. Arthur Lira disse ter ouvido de Bolsonaro o compromisso de que respeitaria o resultado do plenário da Câmara —apesar da desconfiança inclusive de aliados do presidente.

A votação ocorreu horas após um desfile militar patrocinado por Bolsonaro, que reuniu na manhã desta terça cerca de 40 veículos, todos da Marinha, entre blindados, caminhões e jipes. A parada militar passou ao lado da praça dos Três Poderes, onde estão o Palácio do Planalto (sede do Executivo), o Congresso Nacional (Legislativo) e o Supremo Tribunal Federal (Judiciário).

Interpretado como uma tentativa de demonstração de força do presidente no momento em que aparece acuado e em baixa nas pesquisas, o desfile foi alvo de uma série de críticas do meio político, sendo tratado como mais uma tentativa do Planalto de pressionar outros Poderes e de buscar a politização das Forças Armadas.

Folha de SP (Painel)

PEC do voto impresso mostra terceira via desorganizada e com tendência bolsonarista

MDB, DEM, PSD e PSDB orientaram voto contrário, mas maioria dos deputados apoiou proposta

A votação da PEC do voto impresso na Câmara nesta terça-feira (10) mostrou dificuldade das siglas da chamada terceira via em organizar apoio unificado entre os seus próprios membros e também a existência de afinidades com o bolsonarismo de muitos de seus parlamentares.

Legendas mais destacadas da chamada terceira via, PSDB, DEM, PSD e MDB orientaram voto contrário à PEC. No entanto, na hora da votação a maior parte de seus deputados foram favoráveis à proposta que tem Jair Bolsonaro como principal defensor atualmente.

No PSDB, 14 votaram a favor, 12 foram contra e 6 se abstiveram ou se ausentaram. No DEM, 8 votaram em defesa do voto impresso, 13 foram contra e 7 se ausentaram. No PSD, 20 foram a favor, 11 foram contra e 4 se ausentaram. No MDB, 15 apoiaram a PEC, 10 se opuseram e 8 se ausentaram.

Os presidentes desses quatro partidos encabeçaram o movimento para que a PEC fosse, primeiro, derrubada na comissão especial sobre o tema e, posteriormente, derrotada no plenário. São eles que hoje conversam para tentar apresentar uma alternativa às candidaturas de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Jair Bolsonaro, que atualmente lideram as pesquisas de intenção de votos para 2022.

Pelo PSDB, João Doria (SP) e Eduardo Leite (RS) são os principais nomes. Pelo MDB, a senadora Simone Tebet (MS) é a favorita atualmente. Pelo DEM, Luiz Henrique Mandetta (MS) está à frente. O PSD pretende atrair Rodrigo Pacheco (DEM-MG) para os seus quadros e lançá-lo para o Planalto.

O partido Novo, sigla que também tenta se associar ao discurso da terceira via, liberou a bancada para que cada deputado decidisse como se posicionar. Três foram contrários à PEC e cinco, favoráveis. Marcel van Hattem (RS), por exemplo, fez discurso favorável à PEC com críticas ao Tribunal Superior Eleitoral, que tem sido alvo de ataques e alegações falsas de Jair Bolsonaro.

Folha de SP (Coluna Saída Pela Direita)

A luta continua, dizem bolsonaristas, que veem vitória política sobre voto impresso

Fábio Zanin

“A luta continua”. Um dos mais famosos slogans da esquerda serviria bem para descrever o humor da direita alinhada ao presidente Jair Bolsonaro nas horas seguintes à derrota do voto impresso na Câmara dos Deputados.

O sentimento preponderante, em redes sociais e em grupos bolsonaristas, foi de uma derrota no plenário, mas uma vitória na política. Quem esperava que o assunto fosse enterrado definitivamente, como prometeu o presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), fez a aposta errada.

“A guerra não acabou! Jamais desistiremos! Estamos juntos!”, escreveu a deputada federal Bia Kicis (PSL-DF), principal voz em defesa do voto impresso e autora da proposta de emenda que acabou derrotada (mas apenas porque não conseguiu o quórum qualificado).

O fato de numericamente a mudança ter vencido a votação por 229 a 218, ainda que em razão de muitas ausências de deputados, turbinou os ânimos bolsonaristas. “O voto auditável é seu direito. Continue na cobrança”, afirmou o deputado federal Luiz Philippe de Orléans e Bragança (PSL-SP), pré-candidato a governador de São Paulo.

Entre apoiadores do presidente, houve um chamado por cobrança a deputados que votaram contra o voto impresso, com a defesa de que sejam pressionados sem trégua daqui até a eleição do ano que vem. “Temos pegar os deputados dos nossos estados e bater sem dó e piedade, tomando obviamente cuidado para não cometer injúria, calúnia, difamação”, afirmou um ativista pró-Bolsonaro em um grupo fechado de WhatsApp.

Youtuber e um dos mais conhecidos influenciadores digitais conservadores, Bernardo Kuster foi na mesma linha, de marcação sobre pressão em parlamentares que apertaram “não”. “Batalha perdida, mas a guerra continua. Nenhum deputado que votou contra será esquecido. Nenhum!”, disse.

Mais do que o resultado da votação em si, o que levantou o ânimo dos apoiadores do presidente foi a sinalização política que o tema passou para o futuro. A discussão sobre o impeachment, por exemplo, regrediu várias casas, como fez questão de lembrar o ex-deputado federal Roberto Jefferson, presidente nacional do PTB. “Os números da votação do voto impresso deixaram visível, até para a esquerda, que não há voto para aprovar o impeachment do presidente Bolsonaro”, afirmou Jefferson.

Bolsonaro, afinal, precisa de apenas 172 votos em uma eventual sessão do impeachment na Câmara para sobreviver no cargo, e a implementação do voto impresso teve 57 a mais do que isso.

Embora entre defensores do voto impresso tenha havido, quase que imediatamente, torcida para que andem outros projetos de teor semelhante que existem no Congresso, a chance concreta de isso ocorrer é nula. Mas não é o que importa, e sim a manutenção do discurso, capitaneado pelo presidente e repetido à exaustão por seus seguidores, de que a urna eletrônica não é confiável.

Nas últimas semanas, poucos assuntos mobilizaram tanto a base bolsonarista, tomando o lugar que até recentemente era ocupado pela pandemia, com seus ataques à China e a defesa do tratamento precoce.

O presidente aposta nessa energia como um motor para sua campanha de reeleição no ano que vem, que, para todos os efeitos, já começou. Bolsonaro deixou isso claro ao falar com apoiadores na entrada do Palácio do Alvorada poucas horas após a derrota em plenário, ignorando a expectativa de Lira de colocar uma pedra sobre o assunto.

O voto impresso deve voltar também a ser estrela dos próximos atos de rua, como os que estão marcados para 7 de setembro, feriado de Independência. E seguirá assim por um bom tempo, ao menos até o momento em que outro grito de guerra se imponha.

Valor

Terceira via aderiu à agenda da extrema direita, diz Amorim

Para cientista político da FGV, votos de deputados do DEM, MDB e, sobretudo, PSDB à PEC do voto impresso “comprometeram enormemente” a viabilidade de uma candidatura presidencial

A derrota da PEC do voto impresso na Câmara, na noite de terça-feira, foi um revés para Jair Bolsonaro mas a votação no plenário não deixou o presidente “totalmente esfrangalhado”. Analisado pelo corte partidário, o placar produziu um resultado “espantoso”, aponta o cientista político Octavio Amorim, professor titular da Escola Brasileira de Administração Pública da Fundação Getulio Vargas (Ebap/FGV), no Rio.

As três principais agremiações durante a redemocratização nos anos 1980 – PSDB, DEM (ex-PFL) e MDB – aderiram à agenda que procura deslegitimar as eleições de 2022 e faz ameaças de golpe. “O que me chocou foram as votações dos partidos que sustentaram o começo da Nova República. Neles três, considerando as ausências, houve maiorias relativas a favor da PEC e da agenda da extrema direita, com 44% de votos no PSDB, 45% no MDB e 46% no DEM. Eu diria que isso é a morte simbólica da coalizão da Nova República, que não inclui o PT, por pressuposto. A coalizão que sustentou a primeira década do novo regime democrático iniciado em 1985 morreu ontem [anteontem]”, aponta Amorim, para quem isso colocará um “problema sério”, sobretudo, para o PSDB.

A aproximação dos tucanos com o bolsonarismo – 14 votaram a favor da PEC e 12 contra – cria uma “enorme incoerência” para os principais pré-candidatos do partido ao Planalto, diz o professor, ao citar os governadores do Rio Grande do Sul e de São Paulo. “Como Eduardo Leite e João Doria, na campanha presidencial, vão justificar sua oposição ao bolsonarismo? Como é que vai haver terceira via se os três partidos que fundaram a Nova República contra o regime militar aderiram majoritariamente à grande agenda da extrema direita hoje no Brasil?”, questiona.

Para Amorim, o Poder Executivo tem seus conhecidos instrumentos de persuasão, como distribuição de cargos e recursos do Orçamento, mas para PSDB, DEM e MDB não há como justificar o apoio, pois sabiam o que estava em jogo. “Não tem desculpa. Foi tudo muito claro, a intimidação foi óbvia”, afirma.

Para o especialista, a manobra de Bolsonaro de fazer tanques militares desfilarem por Brasília no dia da votação foi um tiro no pé. “Foi patético, com carros de combate velhos, que soltam fumaça, atrasados, apesar de seus canhões, uma coisa da década de 1970. Não fosse isso, a imagem de Bolsonaro não teria saído tão arranhada da votação. Não é o meu caso, mas muitas pessoas perderam o respeito ontem [anteontem] pelas Forças Armadas, mostrando que são um tigre de papel. Simbolicamente, é um enorme fiasco”, afirma.

Entre os grandes partidos, apenas o PT votou 100% contra a PEC, com um total de 51 deputados, unanimidade seguida por Psol e PCdoB (oito cada), e Rede (um parlamentar). Para o cientista político, a bancada petista demonstrou uma “disciplina prussiana”, fazendo o partido sair como vitorioso da votação, assim como a democracia. No entanto, Bolsonaro “não sai tão mal na foto”, apesar da derrubada da PEC. “Os votos favoráveis lhe garantem quórum mínimo para sobreviver a uma moção de impeachment na Câmara”, lembra.

A proposta de emenda à Constituição do voto impresso precisava de 308 votos (três quintos) para ser aprovada, mas teve 229 votos favoráveis e 218 contrários, além de uma abstenção. Sua entrada no debate público coincidiu com a perda de popularidade de Bolsonaro e faz parte do conjunto de ataques à democracia lançados pelo presidente, que passou a questionar o sistema de voto eletrônico, mesmo sem provas e apesar de ter sido eleito por ele ao Planalto e cinco vezes seguidas a deputado federal.

Para Amorim, o resultado da noite de terça-feira foi “espantoso” para o PSDB pois é o partido com mais chance de disputar a terceira via, “excluindo Bolsonaro de eventual segundo turno”. “Porque a terceira via, para ser vitoriosa, significa necessariamente a exclusão do Bolsonaro, não do Lula, e eles [tucanos] se mostram na esteira [do governo]”, afirma. É

 um movimento que remete à campanha Bolso-Doria em 2018, a qual Amorim caracteriza como tendo sido de extrema direita, e não de direita, como preferem alguns de seus colegas da academia, diz o professor. “O PSDB corre o risco de terminar no ano que vem. Não à toa o Alckmin, o governador mais longevo de São Paulo, está para deixar o partido”, diz.

O cientista político acredita que a votação sobre a PEC afeta negativamente a candidatura presidencial tucana, positivamente a de Lula e não muito a de Ciro Gomes, uma vez que, apesar das traições, a bancada do PDT entregou 72% dos votos contrários à proposta. “Não estou dizendo que destruíram, mas PSDB, DEM e MDB comprometeram enormemente a viabilidade de uma terceira via, apesar de Bolsonaro sair enfraquecido também. Então, quem é que ganha? O PT, que entregou 100% dos votos. Não à toa, goste-se ou não do PT, continua sendo a principal organização partidária não apenas da esquerda, mas do Brasil. Organização partidária é isso: 100% de disciplina em plenário”, afirma.

Octavio Amorim diz que a votação da PEC enfraquece o discurso dos concorrentes do PT. “Vamos dizer que um candidato do PSDB, no ano que vem, critique o PT por conta do apoio que dá a Cuba e à Venezuela. O Lula vai dizer: ‘Mas vem cá, o que importa para a democracia no Brasil é a integridade do nosso sistema de votação. E vocês votaram como em 10 de agosto de 2021?’ Um político hábil pega e puxa o tapete da terceira via facilmente”, diz.

O professor da FGV ressalta que a manobra de Bolsonaro de se aproximar do Centrão mostra-se muito bem-sucedida no intuito de lhe dar proteção no Congresso. “Os 229 votos são 45% da Câmara. É uma minoria substancial. Não basta apenas o Judiciário para conter um presidente como Bolsonaro. Se o Congresso não entrar neste conflito ficará muito difícil para a democracia brasileira – embora no Senado ele seja mais fraco”, pondera.

Folha de SP (Painel)

Órgão vinculado ao Ministério da Saúde critica atuação da pasta e municia CPI da Covid

Conselho Nacional de Saúde tem enviado documentos ao relator Renan Calheiros (MDB-AL)

Órgão vinculado ao Ministério da Saúde, o Conselho Nacional de Saúde (CNS) está auxiliando a CPI da Covid com informações relacionadas à pasta. O CNS tem como função o exercício do controle social do Ministério da Saúde, ou seja, fiscalizar as ações da pasta. Por ser crítico ao modo que o governo federal tem conduzido o ministério, o CNS se posicionou favoravelmente à instalação da CPI e tem municiado Renan Calheiros (MDB-AL) com documentos. O relator tem usado o material para subsidiar oitivas e pedidos de investigação.

Na semana passada, como mostrou o Painel, o ministro Marcelo Queiroga (Saúde) revogou a homologação de resolução do CNS que ele havia oficializado dois dias antes.Ele tomou a decisão após ter sido pressionado por bolsonaristas radicais em redes sociais, que o acusavam de estar facilitando o aborto no Brasil somente porque a resolução mencionava a garantia de direito ao aborto legal como meta da Saúde no Brasil.