Metalúrgicos denunciam a desindustrialização nacional

No começo de julho, cerca de 30 mil metalúrgicos das cinco principais montadoras de São Paulo e da região do ABC paulista – Ford, Scania, Mercedes-Benz, Volkswagen e Toyota – saíram em passeata pela Rodovia Anchieta para protestar contra a desindustrialização nacional. Organizados nos sindicatos filiados à Central Única dos Trabalhadores (CUT) e Força Sindical, os trabalhadores também fizeram uma crítica ao aumento das importações no país. Em entrevista, o presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, Sérgio Nobre comentou sobre os problemas do enfraquecimento da indústria nacional e os resultados do Seminário Competitividade e o Futuro da Indústria Automobilística, realizado em julho deste ano no intuito de discutir a produção do setor. 

Caros Amigos – Quais os motivos que desencadearam as mobilizações do setor automobilístico?

Sérgio Nobre – Fomos às ruas para defender que o governo federal convoque um fórum tripartite envolvendo as centrais sindicais, que representam os trabalhadores, os empresários e o Planalto para criar uma política de fortalecimento da produção nacional. O problema é o crescimento das importações, que coloca na pauta nacional o risco da desindustrialização no Brasil. Em 2010, o setor deixou de criar 103 mil postos de trabalho em toda a cadeia automotiva no país – mais de 20 mil só nas montadoras – em consequência das importações de veículos, que somaram 660 mil unidades. A projeção de um milhão de carros importados neste ano equivale à produção em 2010 da líder na produção no Brasil. Como esse um milhão representa 38% mais que em 2010, a quantidade de empregos que deixará de ser criada também será maior.

É contra isso que os metalúrgicos do ABC estão se mobilizando e exigindo atenção da sociedade e do Poder Público.  Estamos preocupados com a produção  nacional e a indústria brasileira. É preciso que haja transferência e desenvolvimento de engenharia e tecnologia em território brasileiro para que o veículo seja produzido aqui e gere empregos e salários de qualidade.

Nosso medo é que as matrizes das montadoras deixem de produzir no Brasil e desloquem suas operações para a China. Não temos nada contra a vinda de novas montadoras para o Brasil, não temos nada contra a China ou a Coréia. Novos investimentos são sempre bem vindos. Mas queremos que as montadoras asiáticas que vierem para cá tenham compromisso de transferência de tecnologia com geração de empregos de qualidade. Não queremos ser meros apertadores de parafusos que montam automóveis vindos dentro de caixas enviadas por países asiáticos, onde há ditadura e o trabalhador tem salários aviltantes, quase uma cesta básica, como ocorre na China.

Caros Amigos – Quais os fatores prejudiciais com o aumento das importações?

Risco de desemprego, empregos de baixa qualidade e baixa remuneração e o não desenvolvimento de tecnologia e produtos em solo nacional. Exportar sempre foi parte importante dos empregos no Brasil. Nosso mercado interno não absorve toda a capacidade de produção. Mas hoje estamos abrindo mão de empregos de qualidade porque o País está virando um exportador de commodities e importador de alta tecnologia. A gente não produz televisão, por exemplo, elas vêm em caixas para a zona franca de Manaus e são montadas. O mesmo ocorre com computadores e celulares. Os automóveis têm cada vez mais tecnologia embarcada, ou seja, que vem de fora, dos países centrais. A produção brasileira está correndo serio risco.

Caros Amigos – Quais foram os avanços obtidos no Seminário Competitividade e o Futuro da Indústria Automobilística?

O seminário é consequência do primeiro evento que realizamos em maio deste ano em conjunto com a Fiesp, Força Sindical, Metalúrgicos de São Paulo e no qual debatemos os problemas e propostas contra o risco da desindustrialização e do crescimento das importações. Daquele fórum realizado em São Paulo saiu um documento com propostas que está sendo encaminhado ao governo federal.

O Seminário com as montadoras debateu um estudo que mostrou como será a indústria automobilística no País nos próximos anos e que futuro nós, trabalhadores, e também as empresas queremos para este setor.  Projeções da Fundação Vanzolini apresentadas no seminário mostraram que até 2025, se persistir o atual cenário macroeconômico brasileiro, as montadoras instaladas aqui vão perder 17% do mercado para os produtos importados e que não geram um emprego sequer no Brasil.

Caros Amigos – O que a categoria fará para combater a desindustrialização?

Desde o início do ano realizamos fóruns, seminários e protestos. A nossa principal proposta é a criação de uma Câmara tripartite. Acredito que, juntos, trabalhadores, governo e empresas podem encontrar formas de estimular e fortalecer essa produção. Esse modelo já foi adotado com sucesso nos anos de 1990, com a criação da Câmara Setorial, que resultou em acordos entre montadoras e sindicatos, que  aumentaram a produtividade e evitaram a perda de postos de trabalho. Naquela época, por exemplo, foi criado o carro com motor 1.000.

Vamos realizar outros eventos e manifestações para chamar a atenção da sociedade e do governo federal para o problema e exigir soluções. Estamos debatendo o cenário com empresários, autoridades, sindicatos de diferentes centrais sindicais. Temos de definir se queremos ser produtores de automóveis ou importadores.

Da Caros Amigos (Paula Salati)