Mídia desinforma sobre o ACE, diz Vagner Freitas

Por desinformação ou má-fé, a grande mídia vem publicando matérias equivocadas e distorcidas sobre o ACE – Acordo Coletivo Especial. Afirmar que a CUT, a Central mais combativa do País, defende um projeto de Lei que permite a redução de salários em caso de crise econômica é um desrespeito à inteligência do leitor e, em especial, à nossa trajetória de lutas, conquistas e defesa dos direitos da classe trabalhadora.

Ao contrário do que foi publicado no jornal “O Estado de São Paulo” no dia 23, o ACE não é um projeto de lei que flexibiliza a legislação trabalhista e muito menos que está prestes a ser votado no Congresso Nacional. A proposta que  está em debate interno na CUT e também junto às demais centrais sindicais – ainda não há consenso –, fortalece os Comitês Sindicais de Empresa, que funcionam nos locais de trabalho e contribuem para a solução de conflitos sem necessidade de se recorrer à Justiça do Trabalho ou ao Ministério Público do Trabalho para resolver todas as demandas do dia a dia.
 
A CUT defende o Contrato Coletivo Nacional e Protocolos de Livre Adesão, como o da cana de açúcar e o da construção civil, que ajudamos a construir, e também, a modernização das relações entre o capital e o trabalho. E o ACE trata justamente deste último item, ou seja, da possibilidade legal de uma nova modalidade de negociação com regras claras e rígidas, que protejam os trabalhadores, impeçam que empresários sem escrúpulos e sindicatos fantasmas tentem negociar para baixo os direitos dos trabalhadores.

Entre as travas que constam da proposta, vale destacar as seguintes: o acordo não pode ser negociado em todas as empresas; é de caráter voluntário, e, para adotar o mecanismo de negociação tanto empresas quanto sindicatos têm de cumprir uma série de requisitos, entre elas chamo a atenção para, pelo menos, sete: 1) para aderir ao ACE a empresa tem de ser certificada como cumpridora de suas obrigações; 2) não ter histórico de práticas antissindicais; 3) ter histórico de negociações salariais com o sindicato que representa os trabalhadores; 4) não recorrer à Justiça em todas as negociações coletivas; 5) ter adotado a organização no local de trabalho com trabalhadores eleitos para a função e acompanhamento do sindicato; 6) comprovar que pelo menos 50% mais 1 dos trabalhadores são associados ao sindicato; e, 7) os sindicatos devem comprovar o reconhecimento da comissão sindical de empresa nos seus estatutos.
 
Os direitos fundamentais expressos no artigo 7º da Constituição Federal não são nem serão objeto de negociação. As negociações feitas pelas Comissões Sindicais de Empresa não podem envolver perda ou redução de direitos fundamentais. O objetivo da proposta é justamente ampliar os direitos por meio da modernização e democratização das relações entre trabalhadores e empresários, adaptando as negociações às realidades das empresas, sem redução, flexibilização ou extinção de direitos. Como já disse, a ideia é utilizar a negociação coletiva como instrumento para a solução dos conflitos.  
 
O Estadão fez uma enorme confusão entre o ACE e outra proposta que também estamos debatendo internamente na CUT e com as centrais sindicais. Esta segunda proposta diz respeito à criação do Programa Nacional de Estabilização e Manutenção do Emprego no Setor Privado – PNEME –, que também ainda não é um Projeto de Lei. O PNEME sugere a criação de mecanismos de proteção ao emprego e à renda dos/as trabalhadores/as de empresas que sofrerem mais os efeitos de crises econômicas, como a que vivenciamos nos anos de 2008/09 quando somente no setor metalúrgico foram eliminados mais de 200.000 postos de trabalho. 
 
Para evitar demissões em massa nesses períodos, estamos propondo a manutenção da multa de 10% do FGTS que as empresas pagam em caso de despedida sem justa causa, que deveria ser extinta no final deste ano. A ideia é criar um fundo que possa cobrir os salários dos trabalhadores em caso de redução da jornada de trabalho, parada total da produção ou liberação do trabalho de parte dos empregados por tempo determinado.
 
Detalhe importante: esse fundo somente poderá ser utilizado pelas empresas que comprovarem  dificuldade financeira em razão de grave crise econômica. E, para acessar os recursos do Fundo, a empresa e o sindicato precisam firmar um acordo coletivo assegurando a manutenção dos empregos para todos os trabalhadores por um período de até 3 meses subsequentes ao período em que a empresa se beneficiar do programa. Não é permitido fazer horas extras durante a vigência do acordo e ele deve ser registrado no Ministério do Trabalho e Emprego.

Como se vê, são duas propostas totalmente distintas e que ainda estão em construção e debate dentro da CUT, com as centrais e com o governo. Infelizmente, as matérias citadas misturaram as propostas causando desinformação e confusão. Também não são propostas acabadas. Até mesmo porque pela tradição democrática da CUT preferimos estabelecer e esgotar o debate antes de chegarmos a conclusões definitivas. Nenhuma das duas propostas trata de flexibilização da legislação trabalhista, como afirmou o jornal, mas sim, do aperfeiçoamento e modernização da Lei e,  principalmente, do fortalecimento dos sindicatos representativos, com  organização no local de trabalho. 

Para finalizar, quero dizer que o ACE resgata um princípio histórico da nossa Central que é fazer um sindicato próximo ao trabalhador, resolvendo conflitos no local de trabalho à medida que as demandas vão surgindo. Além disso, contribui para fortalecer a negociação coletiva no Brasil, que praticamente não existe, e também o papel do sindicato como legítimo representante do trabalhador. O resultado é a diminuição da  judicializacao das reações trabalhistas por conta do poder normativo  da Justiça do Trabalho. É isso que a CUT defende desde a sua fundação. Surgimos para lutar contra essa Legislação Trabalhista ultrapassada e defender a livre negociação.

 

Por Vagner Freitas
Presidente da CUT Nacional