Ford muda e dá a volta por cima
Montadora foi a única a obter lucro no terceiro trimestre de 2009. Processo de reestruturação nos EUA foi semelhante ao do Brasil
Uma receita já adotada pelo Brasil no início da década, de cortar custos e desenvolver produtos que caem nas graças dos consumidores, ajudou a Ford Motors a provar que é possível ganhar dinheiro num mercado em crise. A montadora foi a única entre as grandes companhias do ramo a obter lucro no terceiro trimestre de 2009. Ao anunciar ganhos de quase US$ 1 bilhão nas operações globais no período, a Ford também dá um sinal ao mundo de que a tempestade que se abateu sobre o mercado americano pode estar diminuindo de intensidade.
No fim da década de 90, a Ford do Brasil quase fechou suas portas, mas conseguiu uma reviravolta ao adotar um plano de redução drástica de custos. Nos anos seguintes, inaugurou a mais moderna fábrica do grupo, em Camaçari (BA), e criou um veículo que até hoje tira o sono dos concorrentes, o EcoSport. O modelo inaugurou um novo segmento no mercado brasileiro, o de utilitários esportivos de pequeno porte. A empresa também renovou outros produtos e é lucrativa há mais de cinco anos.
A fábrica de Camaçari e o EcoSport foram ´o divisor de águas´ entre a Ford que quase faliu e a Ford que está melhor que a matriz há vários anos, diz o consultor José Roberto Ferro, do Lean Institute. Segundo ele, conceitos adotados no Brasil foram levados para a matriz, ainda que não em sua plenitude, como o processo integrado de produção, com fornecedores dentro da linha de montagem.
“A Ford dos Estados Unidos passou por um processo de reestruturação semelhante ao do Brasil”, confirma o diretor da Ford Brasil, Rogelio Golfarb. Além de mudanças no processo de manufatura, no relacionamento com a rede de distribuição e do lançamento de produtos atraentes, a matriz contou com a astúcia de executivos que se anteciparam à pior crise que o setor automotivo americano assistiu em mais de 30 anos.
Pouco antes de o setor financeiro desabar, provocando efeito dominó no resto da economia, a Ford captou US$ 23,6 bilhões, na época visto como ato de desespero. Mas o dinheiro evitou que a companhia recorresse à ajuda governamental, como fizeram as concorrentes General Motors e Chrysler, que ainda tiveram de passar por processo de concordata.
Para Bernd Gottschalk, ex-presidente da Organização Internacional dos Construtores de Automóveis (Oica) e hoje na empresa alemã de investimentos Macquarie, ao recusar ajuda do governo, o presidente da Ford, Allan Mulally, passou a ser visto como uma liderança forte. E os americanos adoram líderes. A percepção desfavorável em relação à GM e à Chrysler certamente reverteu-se em vendas para a Ford, que teve ajuda do programa do governo para a troca de carros velhos por novos. ´Foi um pequeno milagre o que a Ford conseguiu, diz Gottschalk.
Da Agência Estado