55 anos dos Metalúrgicos do ABC – “Sindicato já nasceu contestador”

“Nunca interessou às elites ver os trabalhadores com poder de decisão”, diz Wagnão

O Sindicato completou ontem 55 anos com o desafio de disputar as consciências dos trabalhadores para a importância da participação política na sociedade. Para o secretário-geral, Wagner Santana, o Wagnão, os Metalúrgicos do ABC já surgiram com o espírito contestador.

Tribuna Metalúrgica – Por que o Sindicato nasceu contestador?

Wagnão – Em 1959, cada sindicato tinha direito a uma vaga na Federação dos Me­talúrgicos, entidade que era oficial, mas não representava a proporcionalidade da ca­tegoria em todo o Estado de São Paulo, principalmente aqui no ABC. E nós contestá­vamos isso. Então, para ampliar nossa participação, os antigos dirigentes dos Meta­lúrgicos de Santo André, que englobavam todas as cidades do ABC, dividiram o Sindi­cato regional em três: Santo André, Mauá, Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra; São Caetano e nós, São Bernar­do e Diadema. Desta forma pudemos indicar três nomes para a Federação e disputar sua representatividade pelo número de trabalhadores da região.

TM – O que mais podemos destacar sobre os primeiros anos do Sindicato?

Wagnão – A ligação ideológica de esquerda, com a diretoria ligada ao Partido Comunista Brasileiro e que sofreu a primeira intervenção em 64, com o golpe militar. Com a diretoria afastada do Sindicato, o movimento se des­locou para dentro das fábricas da base e podemos dizer que esse é o embrião do que temos hoje com os Comitês Sindicais de Empresa, a organização a partir do chão de fábrica. Con­seguimos transformar uma situação caótica, de ilegalidade imposta pela ditadura, em algo muito positivo, que fortaleceu nossa ação.

TM – O que podemos trazer desta época para hoje?

Wagnão – Que nada caiu do céu. Se estamos festejando os 279 dirigentes eleitos pela base para os CSEs é porque aprendemos muito com aqueles que nos antecederam na luta, com as Comissões de Fábricas, e que possibilitaram criar o que chamamos de novo sindicalismo, com os trabalhadores decidindo o futuro do Sindicato.

TM – O que define este ciclo no movimento sindical e para os metalúrgicos do ABC?

Wagnão – Exatamente esta participação dos trabalhadores na construção de uma nova sociedade, mais justa, mais igualitária. Esse novo momento é de ruptura, que acontece no final da década de 70 e, portanto, ainda em plena ditadura, desafiando as elites conservadoras que até hoje querem afastar os trabalhadores da política e das decisões que nos afetam diretamente.

TM – Qual o resultado prático desta fase do sindicalismo brasileiro?

Wagnão – É a constituição de um elemento que parte de dentro do local de trabalho e se exterioriza para a sociedade, com novas questões que são trazidas pelos companheiros, mas estão no seu cotidiano fora do ambiente das empresas. O resultado é a conscientização dos trabalhadores como agentes sociais, como cidadãos capazes de formular propostas para o desenvolvimento do Brasil. Daí nossa participação ativa na criação do Partido dos Trabalhadores, o PT; da Central Única dos Trabalhadores, a CUT; da Confederação Nacional dos Metalúrgicos da CUT, a CNM-CUT; e da participação em diversos fóruns e conselhos na elaboração de políticas para toda a sociedade.

TM – Qual o desafio do Sindicato hoje?

Wagnão – A Direção que está à frente do Sindicato hoje é produto deste projeto. Militamos na base no final da década de 80 e sabemos a importância de preservar este passado histórico como guardiões do legado desta luta. Além disso, precisamos ter essa capacidade evolutiva e acompanhar esse caminho, como elemento de transformação para dialogarmos com um mundo que evolui mais rápido do que há 30 anos. Novas formas de comunicação estão colocadas na disputa destas ideias e esse enfrentamento está cada vez mais sutil e subjetivo.

TM – O que muda com isso?

Wagnão – Antes tínhamos um fuzil ou um tanque do Exército parado em nossa porta e hoje o debate se dá no campo das ideias, muitas vezes usadas de maneira suja para nos combater. Há um debate velado escondendo os objetivos das elites conservadoras, com o intuito de confundir e afastar os trabalhadores do processo político.

TM – Como lutar neste ambiente subjetivo?

Wagnão – Por isso defendemos a democratização dos meios de comunicação, porque hoje existe uma disputa na sociedade neste campo pelo pensamento da própria sociedade. E quem não tem uma compreensão política daquilo que acontece está sujeito a ser convencidos para uma ideologia conservadora que não atende os interesses dos trabalhadores. O Sindicato trabalha de forma intensa para mostrar aos metalúrgicos que temos o direito à informação qualificada, de ouvir as várias posições políticas existentes e formar a nossa opinião. O Sindicato investe para acompanhar a velocidade que a informação tem hoje com as novas tecnologias. Desde o ‘Barão de Tefé’, nosso antigo carro de som, que era muito veloz na comunicação, mas hoje não é tão eficaz quanto um celular em que você acessa informação imediata. O Sindicato está se readequando a isso.

TM – E a disputa da política partidária também mudou ao longo destes 55 anos?

Wagnão – Sim. Antigamente eram dois partidos. Em 64 era clara a divisão entre a Arena, da situação, e o MDB, de oposição e que reunia um grande número de pessoas contrárias à ditadura. Hoje, existem dezenas de partidos políticos com ideias distintas ou um conjunto de ideias e isso confunde a ação política dos trabalhadores. Essa confusão de ideários prejudica a decisão do trabalhador na hora de escolher seus representantes e isso não interessa nossa categoria. As elites promovem essa confusão, nunca interessou a elas ter os trabalhadores envolvidos e se elegendo para tomar as decisões. Afastar os trabalhadores da política só interessa aqueles que querem continuar dominando os meios de produção e os meios de comunicação.

TM – Como o Sindicato pode interferir neste processo?

Wagnão – Se o Sindicato não for visto como o instrumento do trabalhador para intervir na sociedade está condenado à morte. Por isso, defendemos o direito dos trabalhadores se expressarem politicamente e decidir sobre o seu futuro.

Da Redação