Mais uma vítima no ABC

Durante muito tempo acusou-se o forte movimento sindical da região de responsável pela fuga de empresas para outros pontos do País. O leitor, certamente, acompanhou este processo. Mas as razões eram bem outras. Foi mais ou menos como atribuir a São Pedro a responsabilidade pelas enchentes que todo começo de ano atingem os grandes centros urbanos.

Com o tempo, com a poeira abaixando, o País começou a tomar consciência da verdadeira guerra fiscal que estava instalada entre estados e municípios brasileiros e que era responsável pela atração de empresas, em especial, das instaladas na Grande São Paulo. É verdade que nesta disputa se mobilizou outras armas, além dos incentivos fiscais. Mas, só em meados do ano passado, com o debate em torno da instalação da nova fábrica da Ford na Bahia, a opinião pública tomou consciência deste processo.

É esta mesma guerra fiscal que ameaça atualmente uma importante fábrica da região: a Elevadores Otis, de São Bernardo. Pensando na receita tributária, o Governo do Estado e a Prefeitura de São Bernardo já estão mobilizados tentando impedir a mudança da empresa para o Paraná. Para o comércio do ABC e para os trabalhadores da Otis, a história é ainda mais dolorosa. Trata-se de mais de 600 empregos formais e de um faturamento que, no ano passado, alcançou R$ 228 milhões e que simplesmente pode deixar de circular na região.

Um terreno de 22 mil m2 com galpão, a ser alugado pelo valor de R$ 1.000, dá apenas uma idéia do tamanho dos incentivos que estão sendo oferecidos pelo Estado do Paraná à Otis, segundo revelou o Secretário de Desenvolvimento Econômico e Turismo de São Bernardo, Fernando Longo, conforme relato da reporter Ana Paula Dutra, neste Diário. Já o secretário de Ciência e Tecnologia e Desenvolvimento Econômico de São Paulo, José Aníbal, em outro jornal paulista, acrescenta que a proposta é de um contrato de 30 anos, renováveis pelo mesmo prazo, com reajustes semestrais pelo IGP, além da prorrogação do pagamento de 80% do ICMS com carência de quatro anos.

Há muitos anos temos denunciado este tipo de concorrência predatória. A partir do episódio da Ford na Bahia, levantamos a bandeira do Contrato Coletivo Nacional para o setor automotivo, como contribuição dos metalúrgicos para tentar colocar, ainda que setorial e de forma limitada – por tratar-se de salários e outras questões trabalhistas – algum tipo de freio neste processo. Não somos, por princípio, contra acordos que envolvam redução tributárias, setoriais ou por empresa. Eles podem contribuir para incentivar e gerar empregos neste ou naquele setor estratégico da economia, a exemplo da construção civil, da indústria alimentícia, de saneamento básico e assim por diante. Mas é indispensável que sejam acompanhados de contrapartidas como a geração de emprego e renda, preservação de arrecadação e redução de preços e sejam negociados de modo tripartite, sempre tentando preservar objetivos e interesses maiores que os corporativos ou regionais.

O governador Mário Covas decidiu agora penalizar os estados que pratiquem algum tipo de “pirataria” contra São Paulo. Através de decreto, estabeleceu que o Estado pode, a qualquer momento adotar medidas de salvaguarda, entre elas cobrar a diferença do incentivo fiscal ofertado pelo vizinho ou impedir a entrada de produção de outro estado no mercado paulista. O secretário da prefeitura de São Bernardo, por sua vez, fala da necessidade de flexibilizar a lei de incentivos seletivos, criada pela Câmara Regional do ABC, para tentar enfrentar a guerra fiscal.

São justas estas reações? Em sã consciência o leitor deve convir comigo que não podemos deixar de apoiar toda e qualquer tentantiva de defender o parque industrial instalado na nossa região. Mas, para isto, vale tudo? É um paradoxo para o qual só há uma saída real: o Governo Federal precisa fazer aprovar de vez uma reforma tributária capaz de por fim a guerra fiscal. Uma refor