Prêmio Santo Dias lembra AI-5 e cobra avanços em direitos humanos

 

Prêmio Santo Dias lembra AI-5 e cobra avanços em direitos humanos
O plenário da Assembleia Legislativa de São Paulo transformou-se numa ponte entre as arbitrariedades do passado e do presente na noite de sexta (13), durante a entrega da 17ª edição do Prêmio Santo Dias de Direitos Humanos. A cerimônia lembrou os 45 anos do Ato Institucional Nº 5 (AI-5) e homenageou os jornais Movimento, O São Paulo e O Berro, que resistiram à censura.
Jornalistas feridos durante a cobertura das manifestações de junho de 2013 também receberam a honraria, junto a religiosos torturados pela ditadura e grupos que denunciam a adoção irregular de crianças na cidade de Itaquaquecetuba (SP). Em suas intervenções, além de contar episódios do terror político que imperava na época, os homenageados lembraram que, três décadas após a redemocratização, os direitos humanos ainda precisam avançar no país. Sobretudo no que diz respeito à violência promovida pelo Estado.
“Hoje estamos falando muito de ditadura militar, mas temos que lembrar que o regime esteve a serviço de um projeto do capitalismo liberal, selvagem, que privilegia a concentração de todos os bens nas mãos de poucos, com a exploração de uma multidão”, lembrou dom Angélico Sândalo Bernardino, 80 anos, padre de Ribeirão Preto (SP) que dirigiu O São Paulo, jornal da Arquidiocese de São Paulo. “A grande imprensa ainda continua a serviço do capital, dos interesses das grandes indústrias, do deslavado comércio sem limites e da exploração da classe trabalhadora. Essa ditadura do capitalismo continua.”
Com o discurso mais aplaudido da noite, dom Angélico afirmou que a tortura ainda perdura, dentro e fora das unidades policiais. “Tortura não é somente aquilo que contemplamos no passado, em delegacias. Isso foi uma barbaridade, mas também é uma barbaridade que centenas de milhares não tenham trabalho. É tortura um trabalhador se aposentar com um salário mínimo miserável. É tortura ver tantos trabalhadores em favelas. É tortura ver, como vemos em São Paulo, favelas pegando fogo.
Entregue no dia em que o Ato Institucional Nº 5 (AI-5) completou 45 anos, o 17º Prêmio Santo Dias de Direitos Humanos lembrou a medida de força baixada pelo ditador Artur Costa e Silva, então chefe do governo militar. O AI-5 promoveu o endurecimento da repressão, judicial e extrajudicialmente. Sobrepujou a Constituição da época e centralizou poderes nas mãos do presidente da República, que a partir de então recebeu a prerrogativa de dissolver o Congresso Nacional, as assembleias legislativas e câmaras de vereadores, além de nomear interventores nos estados e municípios.
O AI-5 ainda permitiu ao governo federal cassar mandatos parlamentares e suspendeu as garantias do habeas corpus para acusados de “crimes políticos” e “crimes contra a segurança nacional”. A medida acirrou a censura. Sua vigência perduraria por dez anos, até 1978.
“Uma das coisas mais cruéis que aconteceram em junho foram os jornalistas terem sido agredidos pela tropa de choque. Estavam todos identificados, com a cara limpa, e foram agredidos porque estavam reportando as agressões da polícia contra os manifestantes”, lembrou o deputado estadual Adriano Diogo (PT), presidente da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa, colegiado que anualmente patrocina o Prêmio Santo Dias.
À frente da cerimônia, o parlamentar listou uma série de profissionais da imprensa violentados física e psicologicamente durante a cobertura dos protestos. De acordo com a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), pelo menos 55 jornalistas foram agredidos na cidade entre 11 e 26 de junho, a maioria por membros das forças de segurança. Entre eles está a repórter da RBA Gisele Brito, também homenageada com o Prêmio Santo Dias.
“O Estado se finge de cego, surdo e mudo quando se trata de regulamentar o uso de armas menos letais, mas quem acabou saindo cego das manifestações fui eu”, afirma Sérgio Silva, 32 anos, fotógrafo que perdeu o olho esquerdo enquanto cobria o protesto de 13 de junho, em São Paulo. Sérgio recebeu um tiro de bala de borracha. Foi a pessoa mais prejudicada pela ação da PM durante as jornadas de junho na capital. Por isso, foi chamado a discursar em nome dos colegas feridos. “Hoje estou em campanha para que essas armas deixem de ser comercializadas como armas menos letais, porque elas são letais. Elas cegam. Elas matam. Elas têm que ser banidas das ruas, porque se manifestar é um direito dos cidadãos. Faz parte da democracia.”
Presente à cerimônia, a ministra da Secretaria de Políticas para as Mulheres, Eleonora Menicucci, recebeu de Sérgio Silva uma camiseta com os dizeres “Chega de bala de borracha”. De artistas e cineastas, recebeu um manifesto pela desmilitarização da polícia no país. “Podem ter certeza que o documento de vocês chegará às mãos do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, e da presidenta Dilma Rousseff”, prometeu, antes de reafirmar o compromisso do governo federal contra a tortura.
“Não se passa borracha na história, sobretudo quando existem homens e mulheres, em diferentes frentes, que jamais compactuaremos com nenhuma forma de tortura contra nenhuma pessoa nesse país. Tolerância zero contra a tortura”, reforçou, lembrando que o pacto republicano deve ser levado em consideração para resolver o problema. “Essa não é uma responsabilidade apenas do governo federal: PM é responsabilidade dos governos estaduais. Quem matou Amarildo não foi o governo federal. Quem mata nas periferias de São Paulo não é o governo federal.”
O operário Santo Dias, que empresta seu nome ao prêmio, foi morto pela polícia militar em 1979, na ditadura. Nascido em Terra Roxa (SP), no interior do estado, onde trabalhava com os pais na lavoura e, mais tarde, como boia-fria, Dias resolveu mudar-se para a capital em busca de melhores oportunidades. No início dos anos 1960, começou a trabalhar como metalúrgico na empresa Metal Leve. Na fábrica, deu início à atuação sindical que motivaria seu assassinato: um tiro pelas costas, disparado por um policial durante uma greve.
Via CUT

O plenário da Assembleia Legislativa de São Paulo transformou-se numa ponte entre as arbitrariedades do passado e do presente na noite de sexta (13), durante a entrega da 17ª edição do Prêmio Santo Dias de Direitos Humanos. A cerimônia lembrou os 45 anos do Ato Institucional Nº 5 (AI-5) e homenageou os jornais Movimento, O São Paulo e O Berro, que resistiram à censura.

Jornalistas feridos durante a cobertura das manifestações de junho de 2013 também receberam a honraria, junto a religiosos torturados pela ditadura e grupos que denunciam a adoção irregular de crianças na cidade de Itaquaquecetuba (SP). Em suas intervenções, além de contar episódios do terror político que imperava na época, os homenageados lembraram que, três décadas após a redemocratização, os direitos humanos ainda precisam avançar no país. Sobretudo no que diz respeito à violência promovida pelo Estado.

“Hoje estamos falando muito de ditadura militar, mas temos que lembrar que o regime esteve a serviço de um projeto do capitalismo liberal, selvagem, que privilegia a concentração de todos os bens nas mãos de poucos, com a exploração de uma multidão”, lembrou dom Angélico Sândalo Bernardino, 80 anos, padre de Ribeirão Preto (SP) que dirigiu O São Paulo, jornal da Arquidiocese de São Paulo. “A grande imprensa ainda continua a serviço do capital, dos interesses das grandes indústrias, do deslavado comércio sem limites e da exploração da classe trabalhadora. Essa ditadura do capitalismo continua.”

Com o discurso mais aplaudido da noite, dom Angélico afirmou que a tortura ainda perdura, dentro e fora das unidades policiais. “Tortura não é somente aquilo que contemplamos no passado, em delegacias. Isso foi uma barbaridade, mas também é uma barbaridade que centenas de milhares não tenham trabalho. É tortura um trabalhador se aposentar com um salário mínimo miserável. É tortura ver tantos trabalhadores em favelas. É tortura ver, como vemos em São Paulo, favelas pegando fogo.

Entregue no dia em que o Ato Institucional Nº 5 (AI-5) completou 45 anos, o 17º Prêmio Santo Dias de Direitos Humanos lembrou a medida de força baixada pelo ditador Artur Costa e Silva, então chefe do governo militar. O AI-5 promoveu o endurecimento da repressão, judicial e extrajudicialmente. Sobrepujou a Constituição da época e centralizou poderes nas mãos do presidente da República, que a partir de então recebeu a prerrogativa de dissolver o Congresso Nacional, as assembleias legislativas e câmaras de vereadores, além de nomear interventores nos estados e municípios.

O AI-5 ainda permitiu ao governo federal cassar mandatos parlamentares e suspendeu as garantias do habeas corpus para acusados de “crimes políticos” e “crimes contra a segurança nacional”. A medida acirrou a censura. Sua vigência perduraria por dez anos, até 1978.

“Uma das coisas mais cruéis que aconteceram em junho foram os jornalistas terem sido agredidos pela tropa de choque. Estavam todos identificados, com a cara limpa, e foram agredidos porque estavam reportando as agressões da polícia contra os manifestantes”, lembrou o deputado estadual Adriano Diogo (PT), presidente da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa, colegiado que anualmente patrocina o Prêmio Santo Dias.

À frente da cerimônia, o parlamentar listou uma série de profissionais da imprensa violentados física e psicologicamente durante a cobertura dos protestos. De acordo com a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), pelo menos 55 jornalistas foram agredidos na cidade entre 11 e 26 de junho, a maioria por membros das forças de segurança. Entre eles está a repórter da RBA Gisele Brito, também homenageada com o Prêmio Santo Dias.

“O Estado se finge de cego, surdo e mudo quando se trata de regulamentar o uso de armas menos letais, mas quem acabou saindo cego das manifestações fui eu”, afirma Sérgio Silva, 32 anos, fotógrafo que perdeu o olho esquerdo enquanto cobria o protesto de 13 de junho, em São Paulo. Sérgio recebeu um tiro de bala de borracha. Foi a pessoa mais prejudicada pela ação da PM durante as jornadas de junho na capital. Por isso, foi chamado a discursar em nome dos colegas feridos. “Hoje estou em campanha para que essas armas deixem de ser comercializadas como armas menos letais, porque elas são letais. Elas cegam. Elas matam. Elas têm que ser banidas das ruas, porque se manifestar é um direito dos cidadãos. Faz parte da democracia.”

Presente à cerimônia, a ministra da Secretaria de Políticas para as Mulheres, Eleonora Menicucci, recebeu de Sérgio Silva uma camiseta com os dizeres “Chega de bala de borracha”. De artistas e cineastas, recebeu um manifesto pela desmilitarização da polícia no país. “Podem ter certeza que o documento de vocês chegará às mãos do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, e da presidenta Dilma Rousseff”, prometeu, antes de reafirmar o compromisso do governo federal contra a tortura.

“Não se passa borracha na história, sobretudo quando existem homens e mulheres, em diferentes frentes, que jamais compactuaremos com nenhuma forma de tortura contra nenhuma pessoa nesse país. Tolerância zero contra a tortura”, reforçou, lembrando que o pacto republicano deve ser levado em consideração para resolver o problema. “Essa não é uma responsabilidade apenas do governo federal: PM é responsabilidade dos governos estaduais. Quem matou Amarildo não foi o governo federal. Quem mata nas periferias de São Paulo não é o governo federal.”

O operário Santo Dias, que empresta seu nome ao prêmio, foi morto pela polícia militar em 1979, na ditadura. Nascido em Terra Roxa (SP), no interior do estado, onde trabalhava com os pais na lavoura e, mais tarde, como boia-fria, Dias resolveu mudar-se para a capital em busca de melhores oportunidades. No início dos anos 1960, começou a trabalhar como metalúrgico na empresa Metal Leve. Na fábrica, deu início à atuação sindical que motivaria seu assassinato: um tiro pelas costas, disparado por um policial durante uma greve.

Via CUT