Mercosul se consolida no âmbito político sem resolver seus conflitos internos
Da esquerda para a direita: Evo Morales, Cristina Kirchner, Pepe Mujica, Dilma Rousseff e Nicolás Maduro
Representante de exportadores do Uruguai diz que o lento avanço para um acordo com a União Europeia ou com os EUA se deve ao fato de que o bloco está focado em ´juntar países´, mas não em negociar com o exterior
Após uma cúpula marcada pelo tom político e por suas relações externas, o Mercosul inaugurou neste último sábado (13) a presidência temporária da Venezuela com questões internas ainda em aberto, como a situação do Paraguai, seus persistentes problemas comerciais e a falta de avanço nos acordos com outros países.
As declarações críticas aos Estados Unidos e vários países europeus emitidas pelo bloco, formado por Argentina, Brasil, Uruguai e Venezuela, com a Bolívia em processo de adesão, reforçaram a posição política e ideológica do organismo, que nasceu como uma união comercial e que agora aponta mais para a direção de uma integração regional mais profunda e para a construção de uma “Pátria Grande” latino-americana.
O analista e comentarista político uruguaio Adolfo Garcé considerou, em entrevista para a Agência EFE, que as declarações dos presidentes e sua personalidade “anticolonialista” funcionam como “um substituto funcional para os problemas que o Mercosul tem para tratar suas questões internas”.
“É mais fácil questionar os outros do que solucionar seus próprios problemas, que subsistem e não são de fácil solução”, acrescentou.
Entre outros conflitos, ficou sem solução a reincorporação do Paraguai, membro fundador do Mercosul que foi suspenso no ano passado após o impeachment do presidente Fernando Lugo, considerado como um golpe de Estado por seus sócios.
O Mercosul levantou a suspensão do Paraguai, que será efetiva assim que Horacio Cartes assumir como novo presidente do país no dia 15 de agosto, por considerar que a cláusula democrática exigida pelo bloco foi “cumprida”.
No entanto, a entrega da presidência temporária à Venezuela, que entrou no bloco após a suspensão do Paraguai, cujo Parlamento bloqueou durante anos o processo de adesão do país caribenho, não serviu para apaziguar os ânimos.
De fato, o chanceler paraguaio, José Félix Fernández Estigarribia, considerou que com essa decisão, que afeta à “dignidade” de seu país, o bloco “fechou as portas” para o Paraguai e causou prejuízo para “a integração latino-americana”.
O Paraguai continua questionando a entrada da Venezuela, considerada irreversível pelo restante dos países do bloco, e afirmou que não ocorreram “as soluções favoráveis” para que pudesse se reintegrar ao bloco.
Além disso, os persistentes problemas comerciais e econômicos do bloco, que não conseguiu se consolidar como uma zona de livre-comércio, também ficaram sem solução.
A secretária-executiva da União de Exportadores do Uruguai, Teresa Aishemberg, explicou à EFE que, para os comerciantes, “o Mercosul continua sem funcionar como deveria”, particularmente devido aos “impedimentos comerciais entre seus membros, que não geram comércio, mas o impedem”.
Teresa citou os problemas burocráticos, os impedimentos políticos e a lentidão na solução de problemas como algumas das maiores deficiências do Mercosul para o livre-comércio e que prejudicam inclusive a vontade expressada por seus presidentes de avançar nesse sentido.
A crítica maior, no entanto, é para a falta de avanço nas negociações com outros blocos ou países.
“Desde o ano 1990, foram melhoradas as tarifas e efetivamente aumentou o comércio no Mercosul. Mas agora necessitamos que se cumpra a promessa de que o bloco se transforme em uma plataforma para nos vincular a outros blocos, e isso esperamos há muito tempo”, acrescentou.
Em sua opinião, o lento avanço para um acordo com a União Europeia ou com os EUA se deve ao fato de que o bloco está focado em “juntar países”, mas não em negociar com o exterior.
Nos próximos meses, o Mercosul e a UE deverão apresentar propostas comerciais com o fim de reativar suas negociações, mas em qualquer caso não se espera que tenham algum resultado em breve.
Esses dois últimos problemas estão sendo refletidos no Uruguai em duas tendências: uma parte busca uma maior aproximação com o Brasil e outra observa com atenção os avanços da Aliança do Pacífico, o acordo de livre-comércio estabelecido por Chile, Colômbia, México e Peru.
Assim, Uruguai e Brasil estão avançando mais rapidamente de forma bilateral em sua integração, impulsionando sua interconexão energética e de transporte e eliminando impedimentos para que seus cidadãos possam residir livremente em qualquer um dos dois países.
Por outro lado, o Uruguai pediu para ser observador na Aliança e não descartou ser “protagonista” da mesma, um flerte que foi contestado pela presidente argentina Cristina Kirchner durante a cúpula, na qual advertiu contra o “canto das sereias” que só quer fomentar a “desunião” entre os países do Mercosul.
Da Rede Brasil Atual