Economia da América Latina resiste à crise financeira mundial
A América Latina crescerá no próximo ano cerca de 4%, apesar da atual volatilidade financeira mundial que vem da zona do euro e de suas dificuldades para resolver os problemas da dívida soberana de alguns de seus membros. Pelo menos foi esse o prognóstico apresentado na última sexta-feira (28) pela OCDE (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico) e pela CEPAL (Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe), na Cúpula Ibero-Americana de Assunção.
“Embora se espere que o crescimento nas economias mais desenvolvidas continue sendo lento, estima-se que a América Latina crescerá cerca de 4,4% em 2011”, prevê o documento Perspectivas Econômicas da América Latina 2012 da CEPAL e da OCDE, organizações dirigidas pelos mexicanos Alicia Bárcena e Ángel Gurría, respectivamente.
Apesar das previsões otimistas sobre a América Latina, o informe adverte que “os problemas fiscais na zona do euro poderiam causar sérios problemas ao sistema financeiro internacional, inclusive nos mercados emergentes, e uma reversão dos fluxos de capital poderia gerar grandes flutuações nos tipos de câmbio com efeitos perturbadores sobre a economia real”.
O atual crescimento latino-americano se explica porque agora a região depende mais da China do que dez anos atrás, quando o comércio bilateral envolvia um terço do que é hoje. Para o Brasil e o Chile, o gigante asiático é o primeiro parceiro comercial. Para a Argentina e o Peru, é o segundo. Em compensação, o México, a América Central e o Caribe ainda dependem mais do futuro da desacelerada economia dos Estados Unidos.
“O comércio da região com a China foi um dos fatores que contribuiu para sua rápida recuperação” depois da crise mundial de 2008-2009, destacam a CEPAL e a OCDE. “Porém, também implica uma maior sensibilidade a uma potencial desaceleração do crescimento chinês, transmitida tanto por uma menor demanda de produtos latino-americanos quanto por seu efeito sobre os preços das matérias-primas. Ambos os fenômenos teriam um forte impacto sobre o balanço fiscal de muitas economias da região”.
Presença do Estado
Mas por trás do entusiasmo da CEPAL e da OCDE pela conjuntura latino-americana existe uma preocupação a longo prazo. “Os países latino-americanos devem aproveitar as oportunidades para eliminar restrições ao desenvolvimento e dar um salto quantitativo e qualitativo no fornecimento de serviços públicos. Apesar dos avanços conquistados na região em matéria de redução da pobreza – 44% da população em 2002 para 33% em 2008 – e da desigualdade, ainda perseveram grandes disparidades a serem diminuídas. Um em cada três latino-americanos vive abaixo da linha de pobreza”.
Por isso os organismos estão propondo reformas tributárias na América Latina. “Com exceção de alguns países do Cone Sul, como a Argentina, o Brasil e o Uruguai, que têm uma arrecadação em torno de 30% do PIB, similar à média dos países da OCDE, a carga tributária como um todo na região é baixa. Por outro lado, observam-se menores níveis no imposto sobre a renda de pessoas físicas, mais deduções e exonerações tributárias do que em outros países, e estruturas concentradas em impostos indiretos”, diz o documento, em referência ao IVA [imposto sobre valor agregado], por exemplo.
Também é baixo o gasto social em alguns países. Representa 7% do PIB na Guatemala, ao passo que chega a 25% no Brasil. “O Estado também deve se transformar para atender melhor às necessidades dos cidadãos e gerir os recursos de maneira mais eficiente, transparente e eficaz”, pedem a CEPAL e OCDE, que possui dois membros latino-americanos: o México e o Chile. Os organismos propõem três áreas-chave para um crescimento sustentável e inclusivo: educação, infraestrutura e desenvolvimento produtivo e inovação.
“A cobertura e o gasto com educação melhoraram de maneira contínua nas últimas décadas na América Latina. No entanto, sua qualidade continua sendo baixa e o acesso desigual”, lamentam a OCDE e a CEPAL. Por exemplo, em leitura, mais de 48% dos estudantes não alcançam os níveis mínimos aceitáveis, ao passo que na média da OCDE essa proporção é inferior a 19%. Na Argentina, no México e no Panamá, os estudantes rurais têm um atraso de um ano em relação aos das zonas urbanas.
Na primeira metade da década de 2000, a América Latina mostrava um déficit em infraestrutura de transporte (quilômetros de rodovia por quilômetro quadrado) de 85% em relação às economias do Sudeste Asiático, e uma lacuna no setor de energia (megawatts por mil habitantes) de 60%. A disparidade entre a América Latina e os países da OCDE no acesso à banda larga fixa passou de 1% em 2000 para 17% em 2009. O informe propõe “melhorar o marco normativo para fortalecer os processos de planejamento e de gestão dos investimentos em infraestrutura”.
Os setores intensivos em recursos naturais continuam representando 60% do valor agregado manufatureiro na América Latina, enquanto que nos Estados Unidos são os setores intensivos em conhecimento os que representam 60% do valor agregado do setor de manufatura. “A região investe poucos recursos em pesquisa e desenvolvimento”, criticam a OCDE e a CEPAL.
Tradução: Lana Lim
Do El País, via Portal Vermelho