Países europeus redescobrem a pobreza

Em apenas três anos, a taxa de desemprego é recorde, renda da população desaba e número de pobres aumenta no Velho Continente

No momento em que o Lehman Brothers faliu, em setembro de 2008, governos europeus se apressaram em declarar que não havia chance de que o Velho Continente fosse afetado. Três anos depois, não só a crise ainda não foi superada como a Europa redescobre seus pobres. Em apenas três anos, dados oficiais mostram que o desemprego é recorde, a renda principalmente da população na periferia do continente desabou e o número de pobres aumenta.

Segundo pesquisadores, essa é a primeira vez desde o pós-guerra que a Europa registra um aumento real no número de pobres, pelo menos na parte Ocidental do bloco. A classificação de pobre usado na Europa não é a mesma da ONU, que colocou a taxa de miséria em uma renda de US$ 1,25 por dia. Na Europa, a taxa varia dependendo do país e é estabelecida com base num salário que mantenha uma família de forma adequada.

Nas últimas semanas, estudos publicados pela União Europeia (UE), pelos governos nacionais e entidades de pesquisa revelam o que já vem sendo chamado de “nova pobreza”. Centenas de empresas fecharam as portas. Mas foram os cortes drásticos nos investimentos dos governos que aprofundou ainda mais a recessão social.

Portugal
O desemprego oficial em Portugal atinge 12,5%, a maior taxa em 30 anos. Estão inscritos nos centros de empregos do país, para obter ajuda social, 600 mil portugueses. Mas, com os novos cortes de gastos, apenas metade tem direito a algum tipo de seguro social de 528,56 por mês. O desempregado português tinha uma renda mínima garantida por três anos. Com o pacote de austeridade, a ajuda será limitada a 18 meses. A partir do sexto mês, o cidadão terá o benefício cortado em 10%.

Hoje, um quinto dos portugueses vive com menos de 360 por mês – cerca de R$ 800, não muito distante do salário mínimo brasileiro. No total, esse universo abrange quase 2 milhões de pessoas. Uma fatia de 4% não tem condições financeiras para fazer uma refeição a cada dois dias com carne ou peixe. Os dados oficiais da UE apontam que o risco de pobreza em Portugal, que em 2008 atingia 18% da população, hoje já é de 23%.

Espanha
A expansão da pobreza também é uma realidade para os espanhóis. Segundo dados do Instituto Nacional de Estatística da Espanha, 800 mil pessoas a mais passaram à situação de exclusão social severa desde 2007. Hoje, a pobreza relativa chega a 20,8% da população, quase 10 milhões de espanhóis. O desemprego passou de pouco mais de 11% em 2008 para 21% em 2011. Diante das dificuldades em voltar a trabalhar, 500 mil pessoas sequer recebem mais a ajuda social do Estado.

Grécia
A crise na Grécia foi sentida de forma ainda mais forte e fez o país perder dez anos pelo menos em seu progresso social. Em um índice estabelecido pela UE para determinar a disparidade social dentro do bloco, os números desde 2007 mostram uma queda importante na renda grega. Pelo índice, o número 100 é considerado como a média da UE. Em 2008, a Grécia estava com 94 pontos, abaixo já da média do bloco. Apenas três anos depois, a taxa caiu para 89, situação equivalente ao que estava nos anos 90. O índice ainda mostra que a renda de um grego é hoje metade do que ganha um norueguês. Em 2011, um terço dos gregos ganhava menos de 470 por mês.

Irlanda
A queda da renda do irlandês também é evidente. Entre 2008 e 2009, a renda semanal foi reduzida em 12%, para 796. Segundo o Escritório Central de Estatística, 25% das famílias estavam com pelo menos uma de suas contas atrasadas. Em 2008, esse número era de apenas 10%.

Para especialistas, o que mais preocupa é a falta de perspectiva de melhora na situação da periferia da Europa. Para Sha Zukang, vice-secretário-geral da ONU, o desemprego na Europa voltará às taxas de 2007 apenas em 2015. O brasileiro Otaviano Canuto, vice-presidente do Banco Mundial para o combate à pobreza, também aponta um cenário pouco animador para a Europa nos próximos anos. “Veremos um crescimento apenas modesto da economia europeia por algum tempo ainda”, alertou Canuto, em declarações ao Estado.

“O número de pessoas abaixo da linha da pobreza aumentará em 2011 e talvez por alguns anos mais”, alertou o professor de Economia da Universidade de Barcelona, González Calvet.

Do Estadão