Ato no Rio lembra os 50 anos do Comício da Central do Brasil

Presidente da Comissão da Verdade do Rio de Janeiro observa que legado de autoritarismo do regime militar ainda persiste na democracia

Uma manifestação em frente à estação Central do Brasil, no Rio de Janeiro, lembrou nesta quinta-feira (13) os 50 anos do Comício pelas Reformas, convocado pelo então presidente João Goulart e apoiada organizada por movimentos como a União Nacional dos Estudantes (UNE) e o Comando Geral dos Trabalhadores (CGT).

O comício foi uma proposta do próprio Jango como forma de pressionar o Congresso Nacional a aprovar as chamadas Reformas de Base: agrária, eleitoral, educacional, política, entre outras. O ato de ontem, convocado por algumas centrais sindicais e organizações sociais aconteceu nesta quinta-feira (13), foi marcado pelo questionamento: como estaria o Brasil atualmente se, duas semanas depois, em 1º de abril de 1964, Jango não tivesse sido deposto por conta do golpe.

“Eu soltei na Candelária e vim caminhando para a Central e me lembro, até hoje, das tochas que os petroleiros carregavam. Foi uma das mobilizações mais bonitas que eu já vi, mais até que as manifestações de 68 e as do ano passado. Não poderia deixar de vir para este ato, 50 anos depois, porque o saudosismo falou mais alto”, disse Cid Nelson, que tinha apenas 15 anos no comício de 64. No ato de ontem, a reforma mais lembrada como necessária foi a reforma política.

A atividade foi também um contraponto às manifestações pró-golpe que têm circulado, sobretudo em redes sociais, celebrando a ditadura instalada em 1964 e pedindo nova intervenção militar. Uma delas convoca para o próximo dia 22 uma “marcha da família”, nos moldes da que foi promovida pela elite paulista há 50 anos em São Paulo para respaldar a derrubada de Jango pelos militares, com apoio de empresários e do governo dos Estados Unidos.

O presidente da Comissão Estadual da Verdade, Wadih Damous, afirmou em seu discurso que é necessário lidar com o legado que a ditadura deixou na sociedade: “O Brasil, se aquelas reformas acontecessem (as reformas de base preconizadas por João Goulart), seria muito melhor. Os militares deixaram o legado dos desaparecidos, da impunidade aos torturadores. Precisamos resolver isso. E quando perguntamos onde está o Rubens Paiva, onde está o Stuart Angel, temos de também que perguntar onde está o Amarildo”, disse Damous, da Comissão Nacional de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil, referindo-se aos pedreiros desaparecido depois de ter sido detido por policiais militares, descrevendo traços do autoritarismo golpista presentes ainda hoje nos sistemas de segurança pública. “Esse é o legado que continua mesmo em tempo de democracia e que temos de mudar.”

A deputada federal Jandira Feghalli (PCdoB-RJ) reafirmou a necessidade de não permitir espaços para a “direita” que se organiza contra o governo Dilma, articulando manifestações tais como a “marcha da família”.

Conflito de classes

Em 13 de março de 1964, João Goulart discursou para uma multidão que o apoiava na tentativa de promover reformas que tocavam da questão agrária ao controle estatal das refinarias de petróleo, passando por projetos de ensino público e limitação de remessas de lucros por multinacionais aos seus países de origem. Dizia Jango: “O povo quer que se amplie a democracia e que se ponha fim aos privilégios de uma minoria; que a propriedade da terra seja acessível a todos; (…) que se impeça a intervenção do poder econômico nos pleitos eleitorais (…) Chegou-se a proclamar, até, que esta concentração seria um ato atentatório ao regime democrático (…) A democracia que eles desejam impingir-nos é a democracia antipovo, anti-sindicato, anti-reforma, ou seja, aquela que melhor atende aos interesses dos grupos a que eles servem ou representam”.

João Vicente Goulart, filho de Jango, participou do ato desta quinta: “O Brasil ainda está distante das aspirações que o meu pai queria para o país”, disse.

Da Rede Brasil Atual