Altamiro Borges: Dra. Cureau, investigue as contas da Veja

Por Altamiro Borges, no Blog do Miro

Na semana passada, a vice-procuradora-geral eleitoral, a controvertida Sandra Cureau, enviou ofício ao jornalista Mino Carta, exigindo informações sobre a revista CartaCapital. Entre outros dados, ela cobra “relação da publicidade do governo federal dos anos 2009/2010, os respectivos contratos, bem como os valores recebidos a esse título”.

Cureau dá um prazo de cinco dias para que as informações sejam remetidas, “sob pena de responsabilização nos termos do artigo 8º, parágrafo 3º, da Lei complementar nº75/93, cumulada com o artigo 330 do Código Penal”.

A iniciativa causou estranheza e revolta. Conhecendo a figura, que ganhou notoriedade por sua perseguição implacável ao presidente Lula, ficou a sensação de que ela quer intimidar a única revista de circulação nacional que adota uma linha independente e crítica na imprensa brasileira. Ela alegou que apenas atendeu ao “pedido de um cidadão”, que denunciou que a revista “apoia o governo Lula e a candidatura Dilma e que, para tanto, receberia verbas do governo federal”.

Vamos exigir outras apurações
Mino Carta, um dos jornalistas mais respeitados do país, reagiu com ironia ao pedido de Cureau. “Se ela se dedicasse, porém, à mesma investigação junto às demais editoras de jornais, revistas e outros órgãos da mídia, verificaria, talvez com alguma surpresa, que todos eles têm publicidade de instituições do governo em quantidade muito maior e com valor maior do que CartaCapital”.

Ele lembrou ainda do boicote promovido pelo governo FHC. “Fomos literalmente perseguidos pela absoluta ausência de publicidade. Alguém, inclusive na mídia, se incomodou com isso?

A atitude da Dra Cureau é realmente muito estranha. Já que está tão interessada em averiguar a situação da mídia brasileira, bem que ela poderia pedir para abrir as contas da Editora Abril, do Grupo Folha, do Estadão ou das Organizações Globo. Já que basta o “pedido de um cidadão”, os participantes do “ato contra o golpismo midiático e em defesa da democracia”, organizado pelo Centro de Estudos Barão de Itararé, deverão ingressar com pedidos para que vice-procuradora eleitoral investigue a publicidade e outras fontes financeiras dos grupos monopolistas da mídia.

Uma mãozinha para a vice-procuradora
Para agilizar seu trabalho, apresento alguns dados sobre a Editora Abril, que também edita uma revista, a Veja, e que “apoia o candidato José Serra e que, para tanto, recebe verbas do governo estadual”. O levantamento foi feito pelo blog NaMariaNews, uma excelente fonte de informação sobre os negócios do atual governo paulista na área de educação. Numa minuciosa pesquisa aos editais publicados no Diário Oficial, o blog descobriu o que parece ser um autêntico “mensalão” pago pelo tucanato ao Grupo Abril e a outras editoras. Veja algumas das mamatas:

– DO [Diário Oficial] de 23 de outubro de 2007. Fundação Victor Civita. Assinatura da revista Nova Escola, destinada às escolas da rede estadual. Prazo: 300 dias. Valor: R$ 408.600,00. Data da assinatura: 27/09/2007. No seu despacho, a diretora de projetos especial da secretaria declara ‘inexigível licitação, pois se trata de renovação de 18.160 assinaturas da revista Nova Escola’.

– DO de 29 de março de 2008. Editora Abril. Aquisição de 6.000 assinaturas da revista Recreio. Prazo: 365 dias. Valor: R$ 2.142.000,00. Data da assinatura: 14/03/2008.

– DO de 23 de abril de 2008. Editora Abril. Aquisição de 415.000 exemplares do Guia do Estudante. Prazo: 30 dias. Valor: R$ 2.437.918,00. Data da assinatura: 15/04/2008.

– DO de 12 de agosto de 2008. Editora Abril. Aquisição de 5.155 assinaturas da revista Recreio. Prazo: 365 dias. Valor: R$ 1.840.335,00. Data da assinatura: 23/07/2008.

– DO de 22 de outubro de 2008. Editora Abril. Impressão, manuseio e acabamento de 2 edições do Guia do Estudante. Prazo: 45 dias. Valor: R$ 4.363.425,00. Data da assinatura: 08/09/2008.

– DO de 25 de outubro de 2008. Fundação Victor Civita. Aquisição de 220.000 assinaturas da revista Nova Escola. Prazo: 300 dias. Valor: R$ 3.740.000,00. Data da assinatura: 01/10/2008.

– DO de 11 de fevereiro de 2009. Editora Abril. Aquisição de 430.000 exemplares do Guia do Estudante. Prazo: 45 dias. Valor: R$ 2.498.838,00. Data da assinatura: 05/02/2009.

– DO de 17 de abril de 2009. Editora Abril. Aquisição de 25.702 assinaturas da revista Recreio. Prazo: 608 dias. Valor: R$ 12.963.060,72. Data da assinatura: 09/04/2009.

– DO de 20 de maio de 2009. Editora Abril. Aquisição de 5.449 assinaturas da revista Veja. Prazo: 364 dias. Valor: R$ 1.167.175,80. Data da assinatura: 18/05/2009.

– DO de 16 de junho de 2009. Editora Abril. Aquisição de 540.000 exemplares do Guia do Estudante e de 25.000 exemplares da publicação Atualidades – Revista do Professor. Prazo: 45 dias. Valor: R$ 3.143.120,00. Data da assinatura: 10/06/2009.
 

Negócios de R$ 34,7 milhões
Somente com as aquisições de quatro publicações “pedagógicas” e mais as assinaturas da Veja, o governo tucano de José Serra transferiu, dos cofres públicos para as contas do Grupo Civita, R$ 34.704.472,52 (34 milhões, 704 mil, 472 reais e 52 centavos).

A maracutaia é tão descarada que o Ministério Público Estadual já acolheu representação do deputado federal Ivan Valente (PSOL-SP) e abriu o inquérito civil número 249 para apurar irregularidades no contrato firmado entre o governo paulista e a Editora Abril na compra de 220 mil assinaturas da revista Nova Escola.

Esta “comprinha” representa quase 25% da tiragem total da revista Nova Escola e injetou R$ 3,7 milhões aos cofres do ‘barão da mídia’ Victor Civita. Mas este não é o único caso de privilégio ao Grupo Abril. O tucano Serra também apresentou proposta curricular que obriga a inclusão no ensino médio de aulas baseadas nas edições encalhadas do ‘Guia do Estudante’, outra publicação do grupo. Como observou o deputado Ivan Valente, “cada vez mais, a Editora ocupa espaço nas escolas de São Paulo. Isso totaliza, hoje, cerca de R$ 10 milhões de recursos públicos destinados a esta instituição privada, considerando apenas o segundo semestre de 2008”.

Outros grupos monopolistas beneficiados
Para que a Dra. Cureau não ache que é mania de perseguição contra a asquerosa Veja, também cito alguns dados do blog NaMariaNews sobre a compra de outras publicações. O DO de 12 de maio de 2009, por exemplo, informa que o governo Serra comprou 5.449 assinaturas do jornal Folha de S.Paulo, que desde a “ditabranda” viu desabar a sua credibilidade e perdeu assinantes. Valor da generosidade tucana: R$ 2.704.883,60.

Já o DO de 15 de maio publica a compra de 5.449 assinaturas do jornalão oligárquico O Estado de S.Paulo por R$ 2.691.806,00. E o de 21 de maio informa a aquisição de 5.449 assinaturas da revista Época, da Globo, por R$ 1.190.061,60.

Ao invés de perseguir e tentar calar a CartaCapital, a Dra. Sandra Cureau poderia aproveitar seu tempo investigando os poderosos grupos midiáticos do Brasil. Nem daria tanto trabalho assim!