“Precisamos de um acordo de longo prazo”, garante Sérgio Nobre

Em entrevista à Folha, Sergio Nobre critica empresas que estão pressionando o governo e os sindicatos para fazer negociações nesse sentido. Alega que a crise não atingiu o setor automobilístico e promete resistir às ameaças das empresas

Dino Santos

O presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC afirma que não é momento de discutir redução de salários, muito menos demissões

O presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, Sérgio Nobre, afirma que não é momento de discutir redução de salários, muito menos demissões.
“As empresas estão vindo de cinco anos consecutivos de recorde de produção e vendas. Será que não têm fôlego para manter o pessoal em casa dois, três meses?”, disse, defendendo medidas como uso de banco de horas e férias coletivas.

Na quarta-feira, Nobre tem marcada uma audiência com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva -que presidiu o sindicato dos metalúrgicos entre 1975 e 1980. “Vou sugerir a ele [Lula] que reative a câmara setorial, experiência importante que tivemos em 1992”, disse.

FOLHA – Então ainda não há motivos para redução de salários nem demissões?
SÉRGIO NOBRE – Ainda não sabemos como vai ser 2009. Antes de saber o que vai acontecer com o setor, já começam a falar de demissões, redução de salários… É um absurdo.

FOLHA – As empresas estão se preparando para o pior. NOBRE – Mais do que a crise internacional, o que está provocando demissão é a falta de responsabilidade social das empresas. Só vai saber o que vai ocorrer no setor no início de abril. Por que a empresa não espera até lá para saber o que vai acontecer e segura os trabalhadores? Porque é mais fácil demitir. Ela demite agora. Se em abril melhorar, ela contrata outro por metade do salário.

FOLHA – Ainda não houve demissões no ABC?
NOBRE – Acho que as empresas demitem onde têm facilidade. As empresas estão vindo de cinco anos consecutivos de recorde de produção e vendas. Será que as empresas não têm fôlego para manter o pessoal em casa dois, três meses? Não é que vai ter resultado negativo. Vai ter uma quedinha no faturamento das empresas. Elas querem compensar essa queda reduzindo salários ou transferindo custo para o Estado.

FOLHA – No futuro, poderá haver redução salarial no setor?
NOBRE – A crise ainda não se instalou no setor. Ninguém sabe o impacto. Como é barato demitir, demitem agora. Acho que tudo vale para proteger o emprego. Não sou contra discutir absolutamente nada. O que eu acho é que existem mecanismos agora que podem ser utilizados.

FOLHA – Os empresários estão fazendo uma pressão sobre o governo para que haja mais negociações para reduções salariais?
NOBRE – Eu acho que os empresários estão transferindo a responsabilidade da crise para o Estado e para as costas dos trabalhadores. E não querem entrar com nada. Espero que o governo reflita sobre isso.

FOLHA – Então neste momento não se fala nem em redução de salário?
NOBRE – De jeito nenhum. As empresas podem deixar o pessoal em casa com recurso próprio.

FOLHA – Mas e daqui três meses?
NOBRE – Eu não tenho nenhum problema ideológico de discutir absolutamente nada. Eu acho que esse debate de redução de salários e demissões agora é fora de hora.

FOLHA – No ABC, o senhor já tem um compromisso com as empresas de que não vai haver demissão até abril?
NOBRE – Eu tenho conversado com todas as empresas sobre isso.

FOLHA – Até abril não vai ter demissão?
NOBRE – Espero que não.

FOLHA – O senhor vai ter uma audiência com o presidente Lula?
NOBRE – Vai ser amanhã. Vou sugerir a ele [Lula] que reative a câmara setorial, experiência importante que tivemos em 1992. Afinal de contas, a crise não atingiu todos os setores. Com a mediação do governo, precisamos construir um acordo de longo prazo. Temos de discutir meta de emprego, produção.

Da Folha de São Paulo