Câmara aprova novo Código Florestal

A Câmara dos  Deputados aprovou, por 410 votos a 63 – e uma abstenção – o texto-base da última versão apresentada pelo deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP) para o projeto do novo Código Florestal.

Em seu segundo maior teste de força no Congresso desde que tomou posse, o governo Dilma Rousseff viu sua base de apoio na Câmara se dividir em torno de uma das questões mais sensíveis do projeto: a emenda 164, de autoria do deputado Paulo Piau (PMDB-MG), que libera plantações e pastos feitos em áreas de preservação permanente (APPs) até julho de 2008. A emenda, que recebeu 273 votos favoráveis, 182 contrários e duas abstenções, contraria uma promessa de campanha da presidenta ao anistiar desmatamentos ocorridos até a data.

A alteração ao texto-base do projeto contou com o apoio do PMDB, maior aliado do governo petista. A mudança permite que os Estados participem da regularização ambiental nessas áreas – o governo queria que as autorizações fossem concedidas apenas por decreto federal. Pelo projeto aprovado, cabe agora aos governadores de cada unidade da federação decidir, por exemplo, se uma área poderá desenvolver atividades agrícolas, pecuárias e de ecoturismo em regiões já desmatadas.

No plenário, o destaque foi defendido pelo líder do PMDB, Henrique Eduardo Alves (RN). Ele negou que a aprovação da emenda significasse uma derrota ao governo. “Não sou aliado do governo Dilma, eu sou o governo Dilma, eu tenho o vice-presidente da República, que não foi nomeado, foi eleito”, disse.

O líder do governo, deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP) rebateu o argumento ao dizer que a própria presidenta Dilma considerava a emenda “uma vergonha para o Brasil”. “A emenda muda a essência do texto do deputado Aldo Rebelo”, disse Vaccareza.

O novo Código Florestal segue agora para o Senado, onde o governo tentará mudar o texto do relator, inclusive a emenda 164.

Nova lei
O texto do novo código aprovado nesta terça-feira define agora que o licenciamento ambiental para exploração de florestas nativas seja feito com base em um Plano de Manejo Florestal Sustentável (PMFS), do qual devem constar mecanismos de controle dos cortes, da regeneração e do estoque existente.

O código determina que a sociedade tenha acesso público, pela internet, a um sistema que integre dados estaduais sobre o controle da origem da madeira, do carvão e de outros subprodutos florestais.

Os assentamentos em área urbana consolidada que ocupem área de preservação permanente (APP) passam a ser regularizados por meio de um projeto de regularização fundiária, desde que não estejam em áreas de risco.

O projeto definiu também que agora, para identificar a área destinada à reserva legal de uma propriedade, o produtor poderá considerar integralmente a APP no cálculo, desde que isso não provoque novos desmatamentos. Atualmente, o código prevê essa inclusão apenas quando a soma de APPs e reserva legal exceder 80% do imóvel na Amazônia e 50% no restante do país.

As faixas de proteção em rios continuam as mesmas de hoje (30 a 500 metros em torno dos rios), mas passam a ser medidas a partir do leito regular e não do leito maior. A exceção é para os rios de até dez metros de largura, para os quais é permitida a recomposição de metade da faixa (15 metros) se ela já tiver sido desmatada.

Nas APPs de topo de morros, montes e serras com altura mínima de 100 metros e inclinação superior a 25°, o novo código permite a manutenção de culturas de espécies lenhosas (uva, maçã, café) ou de atividades silviculturais.

Embates
Antes da votação, apenas Psol e PV anunciaram que não aceitavam o acordo para votar o texto-base. O Psol chegou a apresentar um requerimento pedindo o adiamento da votação – pedido que foi rejeitado pelo plenário.

O acordo já foi selado pelos demais partidos após intensas negociações ocorridas durante a tarde. Pouco antes, o presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), havia afirmado que havia chances de o projeto ser adiado mais uma vez.

A sessão extraordinária, iniciada nesta terça-feira, acontece quase duas semanas após o próprio governo patrocinar o esvaziamento da última votação por não concordar com mudanças incluídas de última hora – segundo o PT – no texto relatado por Aldo Rebelo.

Desta vez, a análise do projeto, que havia sido adiada três vezes, aconteceu em meio às pressões sofridas pelo governo para que seu principal ministro, Antonio Palocci (Casa Civil), fosse convocado para dar explicações sobre suspeitas de enriquecimento ilícito durante seu mandato como deputado, entre 2006 e 2010. Ele teria ganhado ao menos 20 milhões de reais com sua empresa de consultoria, a Projeto, somente em 2010, pleno ano eleitoral.

A base aliada conseguiu impedir a sua convocação, mas deixou as lideranças governistas vulneráveis nas negociações em torno do projeto do novo Código Florestal – já que as movimentações eram acompanhadas de perto pelo ministro-chefe da Casa Civil.

No início da tarde, o líder do governo, Cândido Vaccarezza, ainda discutia com Aldo Rebelo e os líderes dos partidos da base governista uma proposta comum. Em vez de Palocci, o Planalto escalou o ministro das Relações Institucionais, Luiz Sérgio, para participar do encontro.

Pontos polêmicos
Desgastado pelo caso Palocci, o governo tentava, ainda na véspera da sessão, reunir forças em torno de um dos pontos mais polêmicos do projeto.

Antes da derrota, os governistas já previam que os pontos fora de acordo fossem vetados pela presidenta Dilma Rousseff. Com menos de seis meses no cargo, Dilma gastaria, dessa maneira, capital político em sua relação com o Congresso, já que possui, uma base de apoio maior que a de seus antecessores.

Até então, o governo havia conseguido impor sua vontade nas mais polêmicas propostas no Congresso, como o reajuste do salário mínimo, no começo do ano, e a recente blindagem sobre Palocci.

Impasse
Outro ponto polêmico do novo Código Florestal se refere ao limite do uso da terra em pequenas propriedades – de até quatro módulos fiscais. Para não inviabilizar as atividades de pequenos produtores, o governo aceitou que as áreas de proteção que devem ser mantidas às margens de rios não ultrapassem 20% das terras.

O líder governista, no entanto, ainda tenta impedir que sejam anistiados os desmatamentos promovidos até 2008, ponto defendido pelo relator do projeto que, na segunda-feira 23, enviou uma carta à presidenta Dilma Rousseff na tentativa de ajudar na compreensão de aspectos “aparentemente polêmicos” da matéria – entre os quais a anistia a desmatadores.

Nas contas do deputado, quase 100% dos 5,2 milhões de agricultores do país – 4,3 milhões deles pequenos proprietários – não têm como cumprir a legislação em vigor nem pagar multas estipuladas em “decretos, portarias, instruções normativas e resoluções absurdas do Conama [Conselho Nacional do Meio Ambiente]”.

Na carta, Rebelo afirmou que não existirá anistia para esses agricultores, “mas a interrupção da prescrição das multas até a adequação dos agricultores aos dispositivos da legislação”.

Novo adiamento
A pressão para que a sessão fosse adiada mais uma vez era forte no Congresso. Na véspera, um grupo de ex-ministros do Meio Ambiente, entre eles Marina Silva (PV-AC), Carlos Minc e Rubens Ricupero, se uniu para pedir o adiamento da votação. O apelo foi feito à presidenta Dilma Rousseff e aos presidentes da Câmara, Marco Maia (PT-RS), e do Senado, José Sarney (PMDB-AP). Aldo Rebelo reagiu aos apelos dizendo que eventuais modificações no texto só deveriam ser feitas quando o texto fosse encaminhado ao Senado.

Os ex-ministros argumentavam que faltam, no texto apresentado por Rebelo, mecanismos de proteção aos pequenos proprietários e aos agricultores familiares.

Da Carta Capital, com informações da Agência Câmara e Agência Brasil