Escolas de São Paulo administram menos de 2% dos recursos da educação, diz pesquisa

Estudo de pesquisadores da Unicamp mapeou fluxo dos recursos públicos no ensino médio paulista

Escolas estaduais de ensino médio de São Paulo administram menos de 2% dos gastos estimados por aluno/ano. Esse foi um dos dados revelados pelo estudo “Caracterização dos recursos públicos destinados ao Ensino Médio: investigação em escolas estaduais paulistas”, coordenado pela pesquisadora Theresa Adrião, da Faculdade de Educação da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas). A apresentação ocorreu no primeiro debate do ano da série “Desafios da Conjuntura”, realizado pelo Observatório da Educação na última quinta-feira (17).

O estudo, feito com base em duas escolas estaduais do interior de São Paulo,  investigou os fluxos dos recursos públicos voltados para o ensino médio, desde os repasses da União, por meio de impostos e do Fundeb, até chegar a duas unidades escolares do interior paulista, uma exclusivamente de ensino médio e, outra, que oferta também fundamental.

A pesquisa mostrou que não há variação no padrão de gastos das duas escolas. Na primeira, de ensino fundamental e médio, 1,98% do gasto estimado por aluno é administrado diretamente pela instituição. Na escola de ensino médio, o percentual é menor, de 1,33%. A verba, gerida pelas diretorias ou pelas APMs (Associação de Pais e Mestres), é usada integralmente em consertos, manutenção, compra de materiais e reparos.

Para Theresa Adrião, o problema está no fato de que as APMs não atuam como instâncias democráticas de discussão sobre esse dinheiro. De maneira geral, a direção centraliza as decisões, e a comunidade escolar, além de não decidir sobre a aplicação dos recursos, não tem informação que possibilite monitorar a gestão financeira.”O problema é menos da centralização, mas sim do consenso, na comunidade escolar, de que esses recursos devem ser usados para consertos e da falta de estímulos de projetos novos, que envolvam a comunidade escolar e que poderiam ser custeados com recursos financeiros da Diretoria Regional de Ensino”, diz.

Marcelo Morais, estudante do ensino médio da rede estadual paulista e alguns professores/as presentes no debate afirmaram sua dificuldade em acessar relatórios de gastos. “Uma vez, fui atrás do livro que mostra o controle dos recursos financeiros de minha escola, mas a diretoria me vetou. Fui até a Associação de Pais e Mestres e três deles resolveram me ajudar. Mesmo com o apoio desses pais, foi-me vetado de novo o acesso a esses números”, contou Marcelo.

Cássia Domiciano, que recentemente assumiu o cargo de professora em escola pública de Americana – interior de São Paulo – explica o que encontrou na escola onde trabalha. “Vejo esse desconhecimento sobre recursos investidos na própria escola. Onde trabalho, não se fala nesse assunto”, polemiza.

Rinaldo Aparecido Meroni, diretor de escola, afirmou que a gestão financeira depende do projeto político-pedagógico da escola. Relatou que na escola em que trabalha a gestão dos recursos está submetida à concretização dos projetos formulados que, além dos recursos estatais, contam também com o apoio da iniciativa privada.  A administração financeira está também vinculada ao trabalho pedagógico, o que significa que a responsabilidade é partilhada entre professores/as.

Subfinanciamento
Com dados da Secretaria do Estado da Fazenda de São Paulo de 2008, a pesquisa também constatou que, enquanto os alunos do ensino fundamental custam, em média, R$3.000 por ano, o governo gasta R$ 1.845 por estudante do nível médio. “O ensino médio é subfinanciado”, diz Cássia Domiciano, professora que também participou da pesquisa. Ela aponta como uma das razões o grande número de alunos por sala de aula. Uma resolução da Secretaria Estadual de 2008 determina que o número máximo de alunos é de 40 por sala de ensino médio.

A dificuldade de se conseguir dados sobre o fluxo dos recursos públicos também foi tema da apresentação. A pesquisadora Cássia Domiciano relatou que o orçamento geral destinado à educação está disponível no site da Secretaria da Fazenda. No entanto, o fluxo de informações não abrange a destinação e execução nas diretorias regionais de ensino e nas escolas.
 
“As pessoas envolvidas [na Diretoria Regional de Ensino] não entendem sobre orçamento. A impressão é que elas não precisam saber sobre o que envolve o seu trabalho. Elas foram solícitas, mas não puderam nos ajudar”, disse a professora Theresa Adrião. Nas escolas, a situação não é diferente, segundo os pesquisadores. “Supervisores qualificados desconheciam os procedimento de uso dos recursos. Há uma dissociação entre o projeto pedagógico e os recursos angariados para realizá-las”.

Ana Aranha, repórter da revista Época, também apontou a dificuldade em acessar informações sobre o fluxo do orçamento da educação, mas afirmou notar melhora neste campo. Na sua opinião, a solução é o fortalecimento dos conselhos existentes para monitorar a execução do orçamento – do Fundeb e da merenda escolar, notadamente.

A participação dos estudantes no acompanhamento da utilização dos recursos na unidade escolar foi valorizada por todos os participantes, mas, Ana Paula Corti, assessora da Ação Educativa, ressaltou que esta responsabilidade é da sociedade em geral, não sendo possível imaginar que sozinhos, os jovens conseguirão mudar a cultura de centralização existente nas escolas.

Falta recursos
Salomão Ximenes, assessor da Ação Educativa alertou para o risco que se corre em, ao discutir os limites da gestão financeira nas escolas, se desconsiderar a insuficiência dos recursos para a área, reduzindo os problemas da educação à dimensão da gestão. Lembrou que a falta de qualidade da educação pública não pode ser atribuída a possíveis equívocos na administração nas escolas.

“Contratação de profissionais habilitados, respeito ao piso salarial nacional do magistério e adequação das instalações físicas são elementos essenciais à garantia da qualidade do ensino e nenhum deles é de responsabilidade da escola” e dependem de ampliação dos investimentos em educação, afirmou o advogado.

Com Observatório da Educação