Vem aí mais um campeão de bilheteria: Lula

A elite não suporta o pau de arara e malha o filme sobre Lula mesmo antes de assisti-lo porque intui que o recorde de bilheteria que pertence a Dona Flor e seus Dois Maridos vai ser batido pela obra que conta a saga desse nordestino que ganhou o mundo e virou "o cara"

Por: Vanilda Oliveira*

O País dos 180 milhões de ‘técnicos de futebol’ agora também é a nação dos 100 milhões de críticos de cinema. Mesmo sem estrear comercialmente, o filme Lula, o Filho do Brasil já está na boca, blogs, sites e colunas de críticos profissionais e outros tantos charlatões e oportunistas. A grande maioria, até quem ainda não assistiu, tem-se desdobrado em arrasar a produção e a obra que retrata parte da vida de Luiz Inácio Lula da Silva, mais precisamente os 35 anos entre o dia em que ele nasceu, passando por sua infância miserável no Nordeste, até o momento em que se tornou um líder sindical sem precedentes e ainda sem herdeiros; um nome fundamental na construção da democracia brasileira.

Com tantos críticos e palpiteiros de plantão pegando carona na popularidade presidencial, não serei eu, mais uma qualquer, a analisar esteticamente o longa de 128 minutos e 12 milhões de reais produzido por Barretão e dirigido por seu filho Fabio Barreto (de O Quatrilho). O povão ainda não viu, mas, aposto minha coleção das séries House, ER, Heroes e Roma como a malhação despejada sobre o filme – taxado de “maniqueísta”, “superficial”, “eleitoreiro” – em nada vai reduzir as longas filas nos cinemas brasileiros, a partir de 1° de janeiro de 2010.

Gente sem blog nem assinatura em coluna de jornal, mas ávida para ver pela lente da Sétima Arte a saga desse nordestino que desceu do pau de arara, subiu no Rolls- Royce e ganhou o mundo, não sem antes chorar e sofrer muito.

Se, no filme, Lula foi pintado como herói, mitificado em vida, transformado em santo ou homem sem defeitos não mudará a ordem das coisas, o que está para vir. E é isso que irrita a elite refletida nos jornais. Os milhões de brasileiros que elegeram Lula, e os que não votaram nele também, vão querer ver a improvável, mas verdadeira, história do menino que passou fome no Sertão nordestino, liderou os metalúrgicos do ABC e hoje é chamado de “o cara” por Barack Obama. O povão brasileiro não lê crítica de jornal e há muito aprendeu a questionar o que vê e lê.

É por isso que não é preciso ser vidente nem integrar a Academia do Oscar para apostar que o filme de Fabio Barreto levará ao cinema e emocionará gente que nunca pisou num Cinemark antes. Será difícil ficar indiferente a Lula, o Filho do Brasil. Os aliados vão morrer de emoção e a oposição vai morrer de raiva e inveja por não ter um nome que valha um filme de duas horas, e nem sou a autora dessa afirmação gaspariana.

Seja qual for a emoção e opinião que o filme venha a despertar em cinéfilos e pobres mortais como eu, a obra da família Barreto já serviu, no mínimo, para expor que, pela primeira vez, o Brasil poderá ver uma trabalho (não documental) sobre a vida de um homem que se tornou presidente da República.

É isso mesmo. Nunca antes na história desse País um cineasta ousou filmar a vida de um presidente brasileiro (e no filme não é mostrado Lula presidente). Ainda mais vivo, e muito vivo como Lula – o mais popular dos populares, segundo as pesquisas. Já mortos, Getúlio Vargas e JK ganharam lá seus documentários e minisséries globais. E foi só.

Não busquei razões para tal hiato cinematográfico presidencial na história do cinema brasileiro. Pura preguiça de pesquisar o passado. Já a história de Lula é tão incrível e presente que já merecia ter sido filmada antes. Se não o foi é porque não deve ser fácil retratar na telona um mito vivo como ele, um homem que há muito se sustenta no Olimpo de quem ultrapassou os 80% de aprovação popular e que, desculpem o senso comum, acerta até quando erra porque nasceu com o corpo inteiro virado para a Lua, dizem.

E como toda unanimidade é alvo preferencial e fácil da crítica e da mídia e sua iconoclastia de ocasião (lembrei de Pelé, o atleta, não o homem), dá-lhe malhação no filme de Barreto. Tanta crítica não justifica deixar de reconhecer que o Brasil não filmou e não filma seus presidentes, seus ídolos pop, seus atletas, seus jogadores de futebol, a exemplo do que acontece em outros países.

Atire uma pipoca quem já não assistiu um filme contando a história de um presidente norte-americano, uma rainha inglesa, um ditador africano ou um líder na América Central?

Só nos Estados Unidos, de acordo com o Internet Movie Database (IMDb), maior banco de dados sobre cinema disponível no mundo, 654 filmes (devem estar rodando mais um neste momento) têm no personagem principal ou de importância um presidente dos norte-americano (informação retirada do blog Cine Repórter).

Abraham Lincoln é o campeão de bilheteria por lá, com 200 obras sobre ele, das quais em 47 aparece como protagonista. Outro presidente norte-americano que teve a vida levada à telona foi Richard Nixon (‘Todos os Homens do Presidente’, para citar um apenas). E tem alguém com mais cara mais insossa que o Nixon? Não fosse Watergate e ele não mereceria nem um comercial de 30 segundos.

Agora, pelas mãos de Fabio Barreto, Lula entra para a galeria dos presidentes imortalizados pela Sétima Arte. Não que isso vá alterar a sua popularidade.´Pode somar, admito. Mas não gosto muito de nações como os Estados Unidos onde brotam mitos fabricados para idolatrias cegas. Mitos não combinam com a atualidade e suas plataformas tecnológicas em constante avanço. São desnudados por elas. Lula, para o bem ou para o mal, existe, é real. Sua história também.

Por tudo isso, sigo sem entender o estardalhaço negativo que a “grande imprensa” está fazendo para jogar no limbo o filme sobre Lula. Que a oposição seja burra e incompetente e mais ajude o presidente do que o atrapalhe em sua gestão é compreensível. Mas o que os meios de comunicação, principalmente os jornalões a serviço de tucanos e democratas estão fazendo é de rolar de rir. Estão malhando “Jesus” pensando que ele é Judas. Pura perda de tempo.

Fabio Barreto fez, como ele mesmo afirma, um melodrama, uma saga familiar que mais deveria chamar Dona Lindu, a mãe de Lula. Pode ter usado a estética da fome e da miséria (já muito premiada com vários Oscar estrangeiros), mesclado o carisma de um homem impar com a crença cristã de que “quem persiste e não desiste chega lá”. Ele também abriu mão da Lei Rouanet e conquistou dezenas de patrocinadores milionários, mas que cineasta não tenta essa façanha comercial? Deverá bater o recorde de bilheteria nacional, hoje nas mãos do irmão Bruno Barreto, por Dona Flor e seus Dois Maridos (10 milhões de expectadores), com conseqüente faturamento milionário.

E daí? Quem não gostou da história contada por Fabio Barreto que conte de outra forma, da sua forma, com a sua estética. A trajetória de Lula rende não apenas um, mas vários filmes. O povo brasileiro tem direito de escolher se quer ou não assistir e dizer se gostou ou detestou. Melhor ainda se o povo brasileiro tiver dinheiro para ver não só o filme sobre Lula, mas de Pelé (obra que teve somente 268 expectadores), Ronaldo Fenômeno, Marcos, Betinho, Henfil e muitos outros. Dunga não, por favor.

A imprensa é livre, o cidadão também. Todos podem ter e expressar a sua opinião sobre a obra. Antes, porém, é preciso ter acesso a ela. E até isso – ingresso mais acessível, divulgação maciça – está sendo criticado. Carimbar o filme de eleitoreiro é muito raso e previsível. Porque eu ainda não sei a que o presidente Lula concorrerá nas eleições de 2010. Ao Prêmio Nobel. Aí vai render outro filme.

Vanilda Oliveira é coordenadora de Imprensa do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC