Brasil passou por branqueamento e perpetuou racismo

O livro O Branqueamento do Trabalho é resultado da dissertação de mestrado em história de Ramatis Jacino, diretor da CUT São Paulo. Ele sustenta que a exclusão a que os negros brasileiros foram relegados é resultado de um conjunto de ações desencadeadas pelos cafeicultores paulistas, no final do século 19 e início do século 20, para tornar a população mais branca Foram eles que incentivaram a imigração de europeus para ocupar os postos de trabalho antes destinados aos escravos.

A que se deve à quase perpetuação das diferenças (renda e oportunidades de trabalho) entre brancos e negros, conforme mostrou o estudo do Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas.

Veja a pesquisa completa (colocar link para a outra matéria)

Apesar dos extraordinários avanços do governo Lula no que diz respeito a ações de resgate da cidadania da população em geral e dos negros em particular, as mudanças acontecem lentamente. Afinal são 350 anos de escravidão e 120 de discriminação, com impedimento do acesso ao trabalho, a terra e a educação. Além disso, o racismo está incrustado culturalmente no nosso país. Dados recentes do Dieese demonstram que mesmo com curso superior e com a mesma qualificação profissional, os negros e negras recebem salários inferiores aos dos brancos e brancas.

Tribuna Metalúrgica – Em sua dissertação de mestrado você afirma que o branqueamento foi feito de caso pensado pela elite. O que levou uma sociedade a condenar parcela dela própria à marginalidade?

Ramatis – Considero que a condenação do negro à marginalidade é resultado de uma construção ideológica baseada no darwinismo social e na eugenia, materializadas na “ideologia do branqueamento” que tinha por objetivo tornar a maioria da população brasileira branca. As elites consideravam que os brancos eram superiores, física, mental, moral e eticamente aos negros, índios e mestiços. Acreditava, que para conquistar um país moderno e civilizado seria necessário a introdução de milhares de imigrantes europeus. Essa concepção foi absorvida pelo sendo comum, disseminando o racismo por todas as classes sociais.

TM – Pelo mesmo estudo, 72% dos negros sentiram menos os efeitos das desigualdades de raça por conta a queda da desigualdade em geral no País e apenas 28% conseguiram ascender socialmente. É por isto que podemos afirmar que a pobreza brasileira é predominantemente negra?

A pobreza brasileira continua sendo predominantemente negra mas chegarmos a 28% de ascensão social entre os negros é significativo. Este avanço é resultado das ações do governo federal e da luta dos negros organizados nos movimentos, em sindicatos, associações, etc.

TM – Qual sua opinião sobre as políticas afirmativas e cotas? E quais outros caminhos para a superação do racismo no Brasil?

O Estado brasileiro e suas elites são responsáveis por três séculos e meio de escravidão e pela atual marginalização do povo negro brasileiro, conseqüência direta da maneira como se deu a transição do trabalho escravo para o assalariado. A maioria da riqueza construída nosso país é resultado da escravidão e da super exploração da mão-de-obra negra pessimamente remunerada. O Estado brasileiro deve reparações aos descendentes de escravos. As políticas afirmativas, nas quais as cotas em universidades são apenas uma parte, são propostas que têm por objetivo fazer com que a sociedade brasileira pague essa dívida com os afro-descendentes. São absolutamente oportunas. Por outro lado, não defendemos cotas para todo o sempre. As cotas e as políticas afirmativas são ações episódicas que devem ser colocadas em prática pelo Estado e pelos empresários de maneira a tratar os desiguais de forma desigual para que possamos, no futuro, conquistar a igualdade. Então não precisaremos mais de ações afirmativas.

Saiba mais sobre o livro

Focado na segunda metade do século XIX, O Branqueamento do Trabalho aborda a transição do trabalho escravo para o trabalho livre na cidade de São Paulo, as ocupações exercidas por negros libertos, sua incipiente ascensão social e como posteriormente foram excluídos do mercado de trabalho assalariado.
O texto, desenvolvido sob orientação da professora doutora Vera Lucia Amaral Ferlini, se baseia em documentação dos arquivos do Estado, do Município, da Cúria Metropolitana, do Tribunal de Justiça e de vasta bibliografia onde se destacam Florestan Fernandes, Clovis Moura, Maria Odila Leite da Silva Dias e Lilia Schwarcz. É resultado de dissertação de mestrado defendida em 2007 na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo.
O autor sustenta que a exclusão econômica, matriz da exclusão social, à que os negros brasileiros foram relegados, é resultado de um conjunto de ações protagonizadas pelo setor mais dinâmico e poderoso da classe dominante de então – os cafeicultores paulistas – materializadas no incentivo a imigração de italianos, espanhóis, portugueses, alemães e diversos outros povos, para ocuparem os postos de trabalho antes destinados aos escravos.
A opção por marginalizar os ex-escravos e seus descendentes seria resultado de uma concepção racista desenvolvida pelas elites intelectuais brasileiras a partir de elaborações teóricas como o darwinismo social e a eugenía que teriam dado origem a “Ideologia do Branqueamento”.
Esta “ideologia” pregava que o Brasil era um país “atrasado e selvagem” porque a maioria da sua população, composta de índios, negros e mestiços, era inferior e incivilizável, sendo necessário “branqueá-la”. Para tanto deveria se promover a entrada de milhares de imigrantes europeus, “civilizados, trabalhadores, superiores do ponto de vista moral, espiritual, cultural, mental e físico”.
Assim, parte dos negros, uma vez libertos, teriam sido condenados aos trabalhos menos importante para a economia do País, com alto grau de informalidade, pior remunerados, insalubres e em muitos casos em situações análogas à escravidão. A outra parte teria se deparado com o desemprego estrutural e hereditário com todas as conseqüências advindas daí.
O resultado, conclui o historiador, é que a República e o capitalismo no Brasil se constroem sob a égide do racismo, com profundo desprezo pelo trabalhador nacional e baseados em desigualdades entre negros e brancos que se mantém até os dias de hoje.
O Branqueamento do Trabalho, Ramatis Jacino. Nefertiti Editora Ltda., 2008, 168 páginas, 18 x 11cm. História econômica do Brasil (1872/1890). Áreas de interesse: História, Geografia, Sociologia, Antropologia, Economia
O livro encontra-se a venda, por R$ 15,00, nas livrarias da EDUSP (nos campos da USP) na rede da livraria Cultura (inclusive com venda on line) e na livraria Clóvis, Rua Silveira Martins, 147, Sé São Paulo, Capital.

Sobre o autor
Ramatis Jacino, nasceu em Porto Alegre, Rio Grande do Sul. Militante político desde 1974, participou de diversas organizações de luta contra o racismo.
Professor efetivo de História na rede pública, leciona na Escola Estadual República da Guatemala, em Itaim Paulista, extremo leste da cidade de São Paulo. Assessora a Direção Executiva Nacional do PT e é membro da direção paulista da CUT.
Doutorando em História Econômica pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas – FFLCH da Universidade de São Paulo, é mestre em História Econômica pela mesma Universidade.