Cidadania|Esperança amazônica

Como informação, prevenção de doenças, direito ao trabalho, à educação e à alegria transformam a realidade das populações ribeirinhas.

Não olho mais para a Amazônia calculando o tamanho da destruição. Focos de resistência alimentam a esperança. Com informação, prevenção de doenças, direito ao trabalho, à educação, ao riso, populações ribeirinhas transformam a realidade

Por Carline Piva

Jovens ribeirinhos da Amazônia paraense olham atentos
para a impressora a laser: nasce o primeiro jornal “Folha do Aruã”
produzido no computador. As notícias da comunidade localizada na margem
esquerda do Rio Arapiuns, antes datilografadas e ilustradas com
recortes de revistas, ganham agora um toque de modernidade.
Vagarosamente, as manchetes do informativo são digitadas pelas mãos
ainda pouco experientes dos oito jovens repórteres: “Movelaria já está
quase pronta”; “Telecentro capacita jovens e garante mais acessos”;
“Classe Carinho: leia as poesias dos estudantes”.

“Para que serve essa tecla alt?” “Por que tudo sai em letra maiúscula?” “Criei o
e-mail sbichomuitosalegre@hotmail.com, mas não funciona. Ou será que
era obichosmuitoalegre?” As perguntas eram incessantes na oficina de
jornal comunitário patrocinada pelo Projeto Saúde & Alegria (PSA) –
coordenada pela autora desta reportagem. “Eu sou uma jovem muito
esforçada com os trabalhos do meu grupo. Com esse treinamento, vamos
ser muito mais capazes do que já somos”, agradece Daniele dos Santos,
de 18 anos, que também escreve o
e-mail de contato e a sua senha pessoal para acessá-lo. “Não”, explica
a coordenadora, “a senha é sigilosa. Não conte a ninguém.”

Pouco
a pouco, os moradores das 60 famílias de Cachoeira de Aruã vão
aprendendo a conviver com mais essa novidade. A primeira delas foi a
chegada recente da energia elétrica, por meio de uma pequena
hidrelétrica, que permitiu a criação de um centro de internet via
satélite no meio da floresta. Antes, a energia provinha de um
barulhento e malcheiroso motor a diesel. As benfeitorias são fruto da
união de várias entidades parceiras. Há 20 anos, a organização
não-governamental PSA, sediada em Santarém (PA), desenvolve as mais
diversas ações para melhorar a qualidade de vida de 143 populações
tradicionais que beiram os rios Arapiuns, Tapajós e Amazonas. A atuação
envolve prevenção e tratamento de doenças; iniciativas para melhorar a
organização comunitária e a geração de renda; produção e manejo
agroflorestal; educação, cultura e comunicação.

A
oportunidade de conviver com um Brasil mais rústico e contribuir para o
desenvolvimento sustentável dessa região me motivou a deixar o conforto
da vida em São Paulo para atuar como jornalista voluntária da Rede
Mocoronga de Comunicação Popular do Saúde & Alegria. Antes de
prosseguir, um parêntese: a expressão “mocorongo”, na Região Sudeste
empregada com sentido pejorativo contra pessoas de pouca instrução e
jeito rústico, quer dizer simplesmente natural de Santarém, santareno.

Exercício de cidadania

A Rede promove a produção e a circulação de notícias entre as
comunidades por meio de jornais e programas de rádio feitos pela
liderança juvenil. Nas oficinas de capacitação, todos bastante
interessados em ouvir as explicações de como fazer uma entrevista,
enquete, seção cultural, além das clássicas perguntas que compõem uma
reportagem: o que, quando, como, onde, por quê. Após a introdução
teórica, os jovens definem de forma participativa os assuntos a serem
abordados. Vamos entrevistar as cozinheiras! O tema da enquete pode
ser: por que existe tanta gravidez na adolescência? Ou: o que o
presidente pode e deve fazer pela juventude?

A
produção dos informativos visa aguçar o senso crítico dos repórteres
para que eles promovam o debate entre