Educação|Mestres: espécie em extinção

Salvem nossos professores de Matemática, Química, Física, Geografia, História... O desencanto afeta o ensino público, ameaça a preservação da carreira e compromete a educação das gerações futuras

Por Cida de Oliveira
 

Vai mal

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área do serviço público

Alguns alunos do ensino médio em escolas estaduais da
Grande São Paulo tiveram seu final de ano letivo marcado por
depoimentos ao Ministério Público. Em outubro, a promotora de Justiça
Fernanda Leão de Almeida pediu abertura de inquérito para apurar as
causas da falta de professores de diversas disciplinas ao longo de
vários meses. A denúncia foi feita pela organização não-governamental
Educação e Cidadania de Afrodescendentes e Carentes (Educafro),
mantenedora de cursos pré-vestibulares. “Constatamos que faltam
professores em mais de 200 escolas da Grande São Paulo”, diz o frei
Davi Raimundo dos Santos, coordenador da entidade, que fez uma pesquisa
para entender por que chegam alunos cada vez menos preparados ao
cursinho. A falta de aulas chegou ao ponto de, em agosto passado, a
Secretaria de Educação instituir por meio de portaria uma espécie de
força-tarefa. Escolas sujeitas a não cumprir a carga horária mínima
exigida pela lei poderiam funcionar em até três turnos diurnos e seis
dias semanais a fim de recuperar o atraso.

Segundo
egressos do ensino médio da Escola Estadual Engenheiro Francisco
Prestes Maia, em São Bernardo do Campo, ABC Paulista, desde a 8ª série
faltam muitos professores. Os alunos ficavam parte do tempo no pátio ou
iam para casa mais cedo quase todos os dias. A situação chegou a
melhorar mas, no ano passado, voltou a piorar. Turmas do 3º colegial
ficaram três meses sem aulas de História, Matemática e Geografia. Mesmo
assim, fizeram provas e alguns chegaram a tirar 10. Segundo uma fonte
que não quis se identificar, a Escola Estadual Professora Marie Nader
Calfat, em Diadema, ficou sem professor de Física durante praticamente
todo o ano de 2006.

A carência
de professores não se restringe ao estado de São Paulo e, se já afeta o
desempenho do ensino hoje, é prenúncio de crise mais grave no futuro se
o quadro não for revertido. Uma pesquisa da Confederação Nacional dos
Trabalhadores em Educação (CNTE), feita em 2003, ouviu 737.170
profissionais, em dez estados – Alagoas, Espírito Santo, Goiás, Mato
Grosso, Minas Gerais, Paraná, Piauí, Rio Grande do Norte, Rio Grande do
Sul e Tocantins. Mais da metade da base pesquisada (53%) tem entre 40 a
59 anos de idade e tempo de serviço entre 12 e 18 anos. Ou seja, em
pouco mais de uma década – levando-se em conta que a esmagadora maioria
é formada por professoras, que podem se aposentar aos 25 anos de
serviço -, quase metade do atual contingente de profissionais da
educação poderá estar fora da sala de aula. Apenas 3% dos educadores
são jovens entre 18 e 24 anos – muito pouco, portanto, para cobrir o
desfalque anunciado.

Baseado no
censo escolar, um técnico do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas
Educacionais Anísio Teixeira, do Ministério da Educação, estimava,
também em 2003, que o déficit de mestres de 5ª a 8ª séries e de ensino
médio pode chegar a 700 mil. As projeções são grosseiras porque o censo
refere-se aos cargos, e não ao número de profissionais – isso faz
diferença porque é comum um mesmo professor ocupar mais de um cargo,
como dar aulas em duas escolas. Mas não deixam de ser um alerta. O
mesmo levantamento mostra que a demanda é maior por licenciados em
Matemática, Física, Química e Biologia.

Carlos
Ramiro de Castro, presidente da Apeoesp, o sindicato dos professores da
rede estadual de São Paulo, confirma que as disciplinas científicas são
mais carentes de pessoal, mas observa que já começam a faltar
professores de Geografia. “Preocupa também que a busca por cursos de
licenciatura é cada vez menor”, salienta.

Êxodo