Fórum|Um caminho para o futuro

O Fórum Social Mundial inaugurou, de fato, o século 21 ao alertar os tecnocratas da economia que existe vida além das suas cartilhas e que outro mundo é possível. Este ano, estará em primeiro plano a luta contra a miséria e as guerras na África

Por Flávio Aguiar
 

Liberdade?

Palco de debates e encontros, o Fórum também é vitrine para divertidos
protestos

A sétima edição do Fórum Social Mundial – que acontece
neste janeiro em Nairóbi, no Quênia – é de difícil compreensão para
quem dele não tenha participado pelo menos uma vez. A maior parte da
imprensa conservadora sempre o tratou com desdém. Muitos partidos de
esquerda, sindicatos e organizações não governamentais o vêem como
espaço de proselitismo, onde vão levar suas propostas e conquistar
adeptos. Mas o Fórum é muito mais que isso. É um processo. Aberto
oficialmente em 2001, em Porto Alegre (RS), esse processo pode ser
chamado de A Reinvenção do Futuro (título de um documentário da agência
de notícias Carta Maior sobre o conjunto dos fóruns).

Ao
final do século 20 as utopias se encontravam na UTI – para não dizer
sarcófago – da história. Imperava no mundo o pensamento único
consolidado no Consenso de Washington: transformar o Estado num caçador
e desregulamentador de direitos. O conceito de cidadania fora carcomido
pelo de consumidor e os mercados – sobretudo financeiros – foram
alçados a uma suposta condição de panacéia universal para os males do
planeta. A Organização Mundial de Comércio (OMC) passou a ONU para
trás. E o pólo desse consenso era o Fórum Econômico Mundial, realizado
anualmente em janeiro, em Davos, Suíça, reunindo representantes de
governos, atores econômicos e pensadores desse modo de ver o mundo. Mas
os protestos não desapareceram. Dois deles se tornaram célebres – em
Gênova, Itália, e em Seattle, Estados Unidos – durante reuniões da OMC.
No primeiro, um estudante morreu nos confrontos com policiais.

Nesse
clima de desconforto endêmico, algumas ONGs, como a Ação pela
Tributação das Transações Financeiras em Apoio aos Cidadãos (Attac),
com presença forte na Europa e América Latina, e a Associação
Brasileira de Organizações Não Governamentais (Abong), entre outras,
tomaram a iniciativa de chamar um fórum que reunisse correntes de
pensamentos alternativos e controlado por essas organizações.

Como
sede para reunião de tal natureza escolheram a cidade de Porto Alegre.
A cidade era governada por uma administração popular (liderada pelo
Partido dos Trabalhadores) e havia colocado em prática políticas
sociais consideradas exemplares por organismos internacionais. Assim,
em janeiro de 2001, simultaneamente ao fórum de Davos, ocorria a
primeira edição do Fórum Social Mundial (FSM).

A
maior parte da imprensa brasileira o ignorou solenemente. Mas a
surpresa foi enorme. Esperavam-se 5 mil pessoas. Compareceram 20 mil
delegados, além de 700 jornalistas do mundo inteiro. O FSM foi a
“descoberta de que não estávamos sozinhos”. Milhares de sessões de
debates formaram-se e discutiram outras tantas propostas e projetos que
vinham sendo pensados, no mundo inteiro, como alternativas às de Davos
e ao Consenso de Washington. As vozes que discursavam nos Alpes suíços
descobriram que não falavam mais sós no planeta.

Mundo possível

Para
a segunda edição, apareceram mais de 60 mil pessoas. Entre outras
atividades, realizou-se uma tensa discussão via satélite entre Davos e
o fórum de Porto Alegre, que ganhou este nome ao lado do oficial,
transformando a cidade em berço do século 21 e em estuário das
alternativas ao consenso conservador. O lema ganhou visibilidade
planetária: “Um outro mundo é possível”. Na prática, o fórum de Porto
Alegre passaria também a pautar o de Davos, pois este começou a incluir
“agendas sociais” em sua programação.

A
terceira edição do FSM, em janeiro de 2003, atraiu mais de 100 mil
pessoas. Sua abertura foi uma gigantesca marcha pela paz que tomou
conta da cidade e alguns