Entrevista|Mão na massa

Para Paulo Betti, o Brasil deu saltos em políticas públicas de
cultura, mas ainda tem muito a fazer para equilibrar o controle
dos meios de comunicação, para o bem da democracia.

Por Viviane Barbosa

Nos últimos 35 anos, Paulo Betti já atuou em mais de 15 novelas, dezenas de peças e filmes. No teatro, dirigiu no início dos anos 80 a primeira montagem do best-seller de Marcelo Rubens Paiva, Feliz Ano Velho. Agora, estréia na direção de cinema, com Cafundó, rodado em cidades históricas do Paraná – Lapa, Ponta Grossa, Vila Velha, Paranaguá e Antonina –, além de Curitiba e São Paulo. O filme mostra o temperamento e a alma do povo brasileiro e mistura universos, como o africano, o católico e o mundano, e vê a religiosidade como expressão do mistério e do inexplicável.
Cafundó recebeu prêmios em Gramado, Trieste (Itália), Espanha, África do Sul e Los Angeles. No último dia 15 de setembro, Betti conversou com a reportagem da Revista do Brasil em Sorocaba (SP), sua cidade natal. Logo mostrou um de seus grandes orgulhos, o Instituto Vila Leão, sua casa de infância que hoje atende crianças da periferia que aprendem música, teatro e cidadania. Paulo Betti se define autêntico e impulsivo e diz o que pensa. Nesta entrevista, fala de cultura, políticas afirmativas, cinema nacional, comunicação de massa, linchamento moral e dos novos desafios do Brasil.

Cafundó é sua estréia na direção, ao lado de Clovis Bueno. Como foi a experiência?
Foi um longo parto, a filmagem se iniciou em 2003, mas hoje estou muito feliz com o resultado. A história se passa na igreja de Bom Jesus da Água Vermelha, ou melhor, de João de Camargo, que era um escravo liberto, milagreiro, que viveu no final do século 19 e início do século 20 em Sorocaba, minha cidade natal. Meu avô trabalhava nas terras de um fazendeiro negro, o Aquiles Camporim. Eu tinha 6 anos, mas sempre o acompanhava e o admirava muito. A família Camporim era bem de vida e nós éramos pobres, mas eles sempre nos trataram muito bem. Já lançamos Cafundó em Sorocaba, Jundiaí, Itu e em São Paulo e em breve será exibido em todo o país.

Como foi sua infância?
Foi muito boa. Morei na roça, minha família era de imigrantes italianos, em um bairro onde 95% das pessoas eram negras. Tocavam-se samba e música gospel. Andava descalço; jogava futebol o dia inteiro. Minha mãe era empregada doméstica, analfabeta, e meu pai, servente de pedreiro, depois ele virou vendedor de sorvete. Como minha mãe era empregada doméstica de uma família bem esclarecida, então ajudaram a minha e me puseram em boas escolas. Tive uma formação muito vasta e eclética.

As histórias de João de Camargo, o famoso Preto Velho, marcaram muito sua infância?
Essa é uma história presente na minha vida, reverenciei a memória dos meus antepassados. Sempre fui muito apaixonado pela história de João de Camargo. Fiquei encantado quando fizemos a pesquisa e descobrimos que, em 1934, a revista O Malho, de grande circulação na época, havia feito longa reportagem sobre ele. Depois, quem escreveu uma tese e o citou foi Flores