Por uma CUT cidadã
Disseram que iríamos mudar nosso perfil depois de eleger para presidente da central um professor da rede pública; bobagem
João Felício e Antonio Carlos Spis
As novas direções executivas nacional e estadual de São Paulo da CUT tomam posse hoje à noite, em ato solene, na semana em que a central comemora 17 anos de vida (dia 28). Segundo o noticiário, estaríamos mudando o perfil e o caráter da CUT com a eleição para presidente nacional de um professor da rede pública de ensino. Queremos discordar. Sinceramente, nem nós nem o conjunto dos trabalhadores – incluindo os 2.306 delegados ao congresso da central- que debateram nas assembléias de base as teses e as propostas, bem como o melhor perfil para a nova executiva, sabemos em que estão baseadas tais afirmações.
Quem afirma isso certamente não vive o dia-a-dia da CUT e, provavelmente, não conhece os mecanismos que a entidade tem para as tomadas de decisão.
Dizer que agora vamos privilegiar o serviço público ou estatal em detrimento do setor privado é bobagem.
Terminado o 7º Congresso Nacional (que foi realizado de 15 a 19 de agosto, em Serra Negra, SP), a sensação é de que nunca a CUT esteve tão disposta, unida e fortalecida para lutar pelos direitos e interesses da classe trabalhadora quanto agora. Motivos não faltam. A conjuntura favorece a retomada das mobilizações. A inflação volta a incomodar, os salários estão aviltantes, o desemprego assola o país e o governo FHC caiu em completo descrédito na população.
Enganaram-se mais uma vez aqueles que apostaram na divisão da central. Continuaremos nos opondo radicalmente ao modelo econômico neoliberal que diminui o papel do Estado nas questões sociais ao cortar investimentos na saúde e na educação, principalmente; que desmancha os serviços públicos; que privatiza as empresas estatais estratégicas para o desenvolvimento do país; que abre indiscriminadamente o mercado às importações, provocando uma reviravolta na indústria, no comércio e no campo; que alija os sindicatos dos processos de negociação, retirando dos trabalhadores direitos adquiridos e garantidos pela Constituição, e que promove a guerra fiscal, entre outros malefícios.
Conclusão: salários aviltantes, desemprego em massa, aumento da violência, exclusão social, pobreza, discriminação de gênero e de raça, aumento da mortalidade infantil, do analfabetismo, do mercado informal e, consequentemente, diminuição da contribuição à Previdência. Mas também continuaremos a propor soluções alternativas para o debate na sociedade, buscando, como sempre fizemos, a negociação com governos e patrões.
Não é à toa que, agindo dessa forma, a CUT transformou-se na maior central sindical da América Latina e a quinta maior do mundo. Representamos hoje 21 milhões de trabalhadores, dos quais 7 milhões estão filiados -1 milhão deles apenas em São Paulo- aos nossos 3.088 sindicatos.
Mas ainda é pouco. Queremos uma central que, além do salário e do emprego, lute por todos os interesses do cidadão: saúde, educação, transporte público, moradia, segurança pública e igualdade de oportunidades entre os gêneros. Uma CUT que combata o trabalho infantil e escravo, que impulsione a agricultura familiar, a reforma agrária, que consolide e faça avançar a ADS (Agência de Desenvolvimento Solidário) e que desenvolva políticas regionais; uma CUT cidadã. Para isso precisamos de sindicatos fortes, de abrangência nacional e que acabe o famigerado imposto sindical.
Enquanto isso, voltaremos às ruas para garantir o sucesso do Plebiscito Nacional da Dívida Externa e do Grito dos Excluídos, em setembro, pela unificação das campanhas salariais, pela redução da jornada sem redução de salário, pelo fim do banco de horas e de horas extras. Sem esquecer, é claro, as eleições municipais.
A CUT é, e sempre será, um dos mais fortes instrumentos de luta da classe trabalhadora.
João Felicio, 49, professor, é presidente nacional da CUT (Central Única dos Trabalhadores).
Antonio Carlos Spis, 50, petroleiro, é presidente regional da CUT-SP.