A universidade e a classe operária
Há 70 anos, no início do processo de industrialização do Brasil, os sindicalistas e o sindicalismo eram vistos pelas elites como caso de polícia. O Brasil mudou muito. Construiu um parque industrial e uma pujança econômica a partir do trabalho de uma classe operária que, aos poucos, com avanços e recuos, foi conquistando direitos. Há muito ainda por conquistar para que o trabalhador alcance uma condição mínima de cidadania, é verdade. As vezes até mesmo coisas elementares como salário mínimo decente, previdência pública digna, direito à educação pública, ao próprio trabalho e assim por diante.
Mas, perdas e conquistas não podem ser vistas apenas no plano coletivo. Há também as conquistas individuais de trabalhadores, conquistas de segmentos deles, de categorias inteiras e nem por isso deixam de ser tão legítimas e deixam de contribuir para o avanço coletivo. O que nós, lideranças sindicais, não podemos fazer é limitar nossa ação apenas aos objetivos do conjunto da classe operária, esquecendo os anseios e necessidades dos indivíduos trabalhadores que compõem o coletivo. Não podemos, sequer, esquecer nossos próprios anseios e necessidades, também individuais e intransferíveis.
O desenvolvimento tecnológico produziu reflexos profundos na estrutura da classe operária no Brasil. Hoje, na maior parte das fábricas instaladas em setores de ponta da economia, como é a indústria metalúrgica, é frequente encontrarmos o trabalhador universitário. Não apenas em cursos da área de engenharia, química, física ou matemática, mas também atrás de profissões da área de humanas. A questão está colocada pela própria necessidade de sobrevivência num mercado de trabalho marcado pela alta competitividade.
E não é o fato de vivermos em um País onde a educação pública está sendo sucateada que podemos deixar de dar respostas concretas aos anseios individuais dos trabalhadores. Não é a necessidade de continuarmos a luta pelo aumento das oportunidades de estudo na escola pública que devemos tratar o problema individual dos trabalhadores com descaso. É verdade que é preciso colocar a bandeira da recuperação do ensino público em primeiro plano.
Mas, enquanto o Brasil não muda, nós precisamos continuar defendendo, com unhas e dentes, nosso direito à educação. É por esta razão que, depois de completar com muito esforço o meu curso colegial (através do programa de madureza) fiz vestibular e matriculei-me este ano no Curso de Direito da Uniban.
Pela mesma razão nosso Sindicato inaugurou esta semana, em parceria com o Centro Cultural Afro Brasileiro Francisco Solano Trindade, um curso pré-vestibular destinado a atender metalúrgicos associados. Baseado no trabalho voluntário de um grupo de professores, a intenção é preparar trabalhadores para que possam disputar as vagas do ensino público universitário. Outra alternativa que o projeto pretende explorar é oferecer aos alunos bolsas de estudo que, junto com o Centro Solano Trindade, serão solicitadas junto às universidades.
Mas o acesso a bolsas de estudos, ainda que possa resolver problemas individuais, não resolve o problema do acesso à educação superior para os trabalhadores. É preciso rediscutir nosso modelo de ensino superior e implantar soluções efetivas para o problema, se é que o Brasil pretende de fato ingressar na era da robotização industrial prevista pela globalização econômica.
Presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC
e Coordenador do Mova Regional