2000: reconstruir a solidariedade

O ano 2000 será certamente muito melhor. É este meu sentimento e, com certeza, também a expectativa dos leitores e leitoras. Mas, não é a toa que este otimismo reflete-se nas pesquisas de opinião. Ouvi de um cidadão a justificativa mais convincente e esclarecedora: “do jeito que está não pode continuar”.

Este sentimento mistura a consciência do “fundo do poço” com a esperança de quem vê a luz no fim do túnel. E tem tudo a ver com o Brasil. Em 1999, o País “caiu na Real”. A maxi-desvalorização cambial de janeiro, revelou um Brasil refém do FMI, das negociatas privatizantes, do sucateamento da educação e da saúde públicas bem como de todos os serviços públicos, em particular energia e telecomunicações.

Resultado: recordes de desemprego, de violência, de miséria, de corrupção, para ficar apenas com os sintomas mais agudos desta degringolada econômica e social que parecia não ter fim. E que também parecia não tem freio. Mas teve. A “Marcha dos 100 Mil” à Brasília, foi o grito mais eloquente desta tomada de consciência nacional, desta afirmação coletiva de que do “jeito que está não dá mais”.

Aqui, na região o processo foi semelhante. Logo no início do ano vieram as ameaças sobre empregos das montadoras, em particular na Ford. A consciência de que, ou se fazia alguma coisa ou não havia como impedir uma onda de desemprego em toda a região, fez com que conseguíssemos remover as resistências da equipe econômica para construir um Acordo Emergencial. Se não resolveu todos nossos problemas, pelo menos impediu o pior.

Em meados do ano a guerra fiscal aguçou-se. A reação de lutar pelo contrato nacional coletivo no setor automotivo significa “cair na real” desta “guerra”. Para a categoria dos metalúrgicos do ABC representa mais consciência da interação entre seus interesses corporativos e os interesses da região. A mobilização nacional inaugurada com “festival de greves” vai refletir-se no Ano 2000 em mais mobilização em torno do contrato nacional coletivo e mais integração às lutas coordenadas pela Câmara Regional do ABC com o objetivo de vencer os desafios regionais. Entre estas lutas vale destacar nosso propósito de fortalecer as iniciativas contra o desemprego, como a central de Trabalho e Renda, e os programas educacionais, como o Mova.

Também no campo social 1999 foi um ano de tomada de consciência. O Brasil assustou-se diante do tamanho do flagelo da fome e do abandono da infância. Na região, vimos a miséria gradualmente tomar conta das esquinas do ABC. No início de novembro, a morte do traficante Euler Vidal da Silva, de 29 anos, chocou-nos diante da evidência de que a Colômbia ronda por perto, e exige de nós decisões capazes de mudar a região e mudar o Brasil.

É a necessidade imperiosa de mudar esta realidade que forja o nosso otimismo diante do ano 2000. É ela que orienta nossa ação para o próximo ano. Mais que garantir emprego e renda, no entanto, o ano 2000 poderá ter significado mais profundo para a região e para o Brasil. Não nos bastará ver implantados um Programa de Renovação da Frota e um centro de reciclagem no ABC, sem os quais vamos atravessar momentos difíceis. Precisamos de muito mais.

O ano 2000 é um ano eleitoral. Mais uma vez a cidadania terá oportunidade de manifestar-se sobre idéias e lideranças que disputam seu voto. Quem sabe o mesmo otimismo que hoje nos contamina, garantirá a todos coragem e determinação para fazer do Brasil um País de dignidade e justiça, com desenvolvimento econômico e, antes de tudo, com a esperança coletiva reconstruída a partir da solidariedade entre os homens.

Luiz Marinho
Presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC
e Coordenador do Mova Regional