Democracia Sindical

Não foi apenas mais uma morte, um novo exemplo de violência, ocorrido nesta quarta-feira, entre condutores da nossa região. João Trigueiro, mais que sindicalista, era um trabalhador exemplar, militante, consciente de seu papel de cidadão e de suas responsabilidades políticas e sociais. O leitor sabe dos prejuízos que este tipo de violência causa aos próprios trabalhadores, tornando ainda mais distantes os horizontes de uma sociedade com justiça, democracia e dignidade para os que compõem hoje a maioria dos cidadãos brasileiros.

E não basta pedir punição exemplar ao culpado ou culpados. Também não basta protestar contra o fato de, até hoje, não terem sido encontrados e punidos os responsáveis pelos assassinatos de outros três condutores da região também vítimas da mesma guerra. A morte de João Trigueiro deve ter, para nós, sindicalistas ou não, um significado maior.

É com pesar e, ao mesmo tempo, com intenção de fazer de seu sacrifício um novo marco na nossa luta, que aproveito este espaço para conversar com o leitor sobre este tipo de violência. Também entre nós, metalúrgicos do ABC, apesar das contribuições inestimáveis da nossa categoria à história do nosso País, fatos lastimáveis desta mesma natureza – felizmente sem a mesa fatalidade – tem ocorrido. Vou ater-me apenas a um exemplo.

Até 1993 funcionavam na região três sindicatos metalúrgicos. Dois deles, o Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo e Diadema e o Sindicato de Santo André, Mauá, Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra, filiados à CUT, decidiram unir-se num só sindicato que recebeu o nome de Sindicato dos Metalúrgicos do ABC. Ficavam fora apenas os metalúrgicos de São Caetano.

O objetivo principal desta unificação era fortalecer a estrutura de representação dos trabalhadores para permitir o enfrentamento das dificuldades que então se anunciavam para a categoria. A decisão respeitava deliberações democráticas tiradas a partir de 1987 de amplas reuniões de trabalhadores, plenárias e, inclusive, de congressos dos respectivos sindicatos. Em 1993, antes de assumir a presidência da CUT, Vicentinho encabeçou a primeira diretoria unificada entre os dois sindicatos.

Mas o novo Sindicato dos Metalúrgicos do ABC não estava livre deste tipo de prática criminosa que agora vitimou João Trigueiro. Na primeira renovação de diretoria, em 1996, ela desabrochou. Alguns ex-dirigentes originários da região de Santo André não aceitaram as deliberações da base e racharam com a democracia sindical. Quem guarda na memória informações sobre este processo é testemunha dos métodos que adotaram: gangsterismo na ocupação da sede de Santo André, violência e fisiologismo nas composições políticas e sindicais.

Da nossa parte, o leitor é também testemunha, a reação foi apenas política. Na justiça, em primeira instância, ganhamos. Mas, sustentados em “liminares” de instâncias superiores, na lentidão da justiça e na truculência de um exército de bate-paus o “racha” mantém ocupada a tradicional sede do nosso Sindicato, na Rua Gertrudes de Lima.

Há cerca de um mês, em torno da representação na Cofap-Anéis, esta disputa voltou a acirrar-se. Trabalhadores recusaram-se a aceitar um acordo feito pelo “racha” com a empresa, decretaram uma greve e convocaram o Sindicato dos Metalúrgicos do ABC a assumir sua representação. Apesar de espancamentos e ameaças promovidas pelos capangas do “racha” – infelizmente não registrados pela imprensa local – os trabalhadores não recuaram. Suspenderam a greve com a condição de a empresa assumir o compromisso de organizar o plebiscito que acabou decidindo, na semana passada, quem deveria representá-los.

Votaram 272 trabalhadores – 87% dos metalúrgicos associados a favor do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC para representá-los. O “racha”, que disputava conosco a representação, ficou com 41 votos, ou seja, com apenas 13% da preferência dos