Busca de justiça e companheirismo movem luta na Fris
Os companheiros na Fris Moldu Car, de São Bernardo, entraram em greve há 163 dias e estão acampados ao lado da fábrica, confiantes em recuperar seus direitos. A luta também reforça os laços de companheirismo e solidariedade.
163 dias de sonho e esperança
Hoje completam 163 dias que os companheiros na Fris Moldu Car, uma autopeças
em São Bernardo, entraram em greve e montaram um acampamento ao lado da empresa
para receber salários atrasados e direitos não cumpridos por um patrão pra lá de
safado.
Dos 1.700 trabalhadores que a indústria chegou a contar, cerca de 260 ainda
mantém o acampamento, no mais longo movimento na história da categoria e numa
demonstração de que o sonho e a esperança não podem ser abandonados pela classe
trabalhadora na luta por seus direitos. O pintor industrial Francisco Sales da
Silva, o Chicão da Pintura, é um desses exemplos.
Aos 50 anos, dono de um inabalável bom humor, ele afirma que o movimento só
trouxe coisas boas. “Ganhei tempo para conhecer o pessoal e firmar um
companheirismo que não existia antes do acampamento”. revela. Chicão não
se preocupa com as dívidas e tem certeza que um dia vai pagá-las. Seu desejo
maior é justiça para os trabalhadores saírem da luta com a cabeça erguida e
verem o patrão atrás das grades.
Rotina – Entre 50 e 60 pessoas, em média, se revezam todos os dias no
acampamento, onde conversam, jogam dominó, baralho ou fazem palavras cruzadas.
Lá também almoçam, jantam e tomam o café que eles mesmos fazem. O ambiente é de
paz, camaradagem e, principalmente, de sonhos com um futuro melhor e mais justo.
“Dei azar”, conta o plainador ferramenteiro Argemiro Batista da Silva, que há
38 anos veio do Paraná para entrar na Fris. Ele se aposentou e continuou
trabalhando na empresa. No dia que ia fechar a conta e ir para Tuiuti, no
interior paulista, montar uma chacrinha, a indústria quebrou. “Justamente para
fazer a mudança me atolei em dívidas”, recorda Argemiro.
“Pelo menos o terreninho já tenho, agora é esperar receber alguma coisa do
que me devem para eu ir embora”, afirma.
Nunca houve qualquer problema no acampamento. A Polícia contribui e dá uma
passada às noites para saber se tudo está bem. Três trabalhadores ficam na
portaria durante o dia e recebem com toda a cortesia quem precisa de alguma
informação.
À noite, o grupo é reforçado. São dez os companheiros responsáveis pela
ronda, pois o patrão já tentou tirar ilegalmente as máquinas por duas vezes.
E as máquinas são a única garantia dos companheiros na Fris receberem o que
merecem.
Mais de 80 máquinas paradas
Enquanto a situação não se resolve, o pessoal leva uma vida duríssima, como a
operadora de máquinas Antônia Melo Dantas. Há 18 anos ela conseguiu na Fris seu
primeiro emprego. Na época, tinha apenas 17 anos.
Hoje, com dois filhos e marido desempregado, trabalha em um bufê nos finais
de semana para garantir o sustento da família. Começa às noites de sextas noite
e vai até de manhã.
Nos sábados e domingos os turnos vão das 9h às 3h da manhã do dia seguinte.
“Simplesmente não tenho descanso”, conta. “Mas tenho esperança na justiça divina
e que unidos devemos lutar por nossa vitória”, diz Antônia.
É muito triste olhar mais de 80 máquinas paradas no galpão. Há mais de cinco
meses não circula qualquer pessoa por lá.
Os equipamentos são de alta qualidade e forneciam peças a empresas do porte
da GM, Ford, Fiat, Volks e outras montadoras.
Está tudo pronto para voltar a entrar em ação em menos de 30 dias.
“Falta a decisão judicial”, comenta Damião Ferreira Nunes. Ele, Celso Norio
Higo e Edson Ferreira da Costa são os membros da Comissão de Fábrica
responsáveis pela organização do acampamento, acompanhada por Juarez Barros, o
Buda, diretor do Sindicato. Quem resume o sonho de todos é Celso: “Montar
uma cooperativa na Fris e voltar a trabalhar para isso aqui poder ser uma fonte
de renda para muita gente”.