Decisão suspende reintegração em São Bernardo

Marcada por desapropriações violentas, São Bernardo viu ontem
uma ação inédita, quando um juíz foi conhecer as condições de
vida das 400 famílias que moram no Jardim Scaf. “Não imaginava
que em São Bernardo houvesse tanta falta de dignidade à pessoa
humana”, comentou o juiz Gersino Donisete, ao anunciar a
suspensão de reintegração de posse da área.

Juiz suspende reintegração de posse no Jardim Scaf

Depois de percorrer as
vielas e barracos do Jardim
Scaf para conhecer as condições
de vida dos moradores,
o juiz Gersino Donisete, da
7ª Vara de São Bernardo,
anunciou ontem a suspensão
da reintegração de posse do
bairro, para alívio das 402
famílias que lá moram.

O anúncio fez com que
a apreensão do pessoal, que
acompanhava de perto a visita,
se transformasse em festa,
comemorada com muitos
vivas e muitas palmas.

“Foi uma grande vitória
da comunidade e acredito
que seja o primeiro passo
para encontrarmos uma solução”,
disse o pastor Cícero
Ferreira dos Santos, líder comunitário
do Jardim Scaf,
que fica entre o Batistini e o
Jardim Represa.

Depois de conversar
com moradores em seus próprios
barracos durante mais
de uma hora, o juiz Donisete
se disse impressionado.

“Não imaginava que em
São Bernardo houvesse tanta
falta de dignidade à pessoa
humana”, comentou o
juiz ao se deparar com tamanha
miséria, com lixo e esgoto
a céu aberto.

Reintegração – O drama dos moradores começou quando a família
Scaf, antiga proprietária,
entrou com ação há dez anos
alegando ocupação irregular
do bairro, que fica em área
de manancial.

Parte dos moradores
afirma que têm documentação
dos terrenos.

O juiz disse que, nesse
caso, a solução não é jurídica
e que sua ida ao bairro foi no
sentido de lançar uma semente
de diálogo e de negociação.

“Vamos chamar todas
partes, o dono, os moradores,
os três níveis de governo,
além dos órgãos de proteção
ao meio ambiente, e
tentar encontrar uma solução”.

Gesto do juiz é considerado inédito

Para as entidades em
defesa da moradia, a inspeção
judicial é um grande
avanço, pois se trata da
humanização do direito.

“O juiz escreveu uma
página ao vir aqui no Jardim
Scaf “, disse Humberto Costa,
da Central de Atendimento
aos Moradores e Mutuários,
entidade que defende o
pessoal do bairro.

Ele acredita que a saída
dos juízes de dentro do gabinete
para conhecer a realidade
deve se transformar num primeiro mecanismo de
cumprimento dos direitos
sociais.

Para o pastor Cícero
Ferreira dos Santos, a ida de
um juiz à periferia é um fato
inédito. “Não é todo dia que
um juiz sai do Fórum”, disse.

Eles esperam que outros
juízes façam o mesmo
quando em questão estão direitos
como o da população
ter uma vida digna.

“No Brasil, o direito de
moradia existe só no papel”,
comentou Humberto Costa.

Governo federal investe
R$ 115 milhões

O secretário de Habitação,
Admir Ferro, disse que
é muito difícil fiscalizar São
Bernardo por causa de seu
imenso tamanho.

Esta foi a desculpa que
ele deu para a falta de iniciativa
da Prefeitura no encaminhamento
de soluções para
os graves problemas da periferia.

Ele colocou a culpa nos
governos estadual e federal,
não revelando que só neste ano a verba federal para habitação
e saneamento é de
R$ 115 milhões.

“São R$ 15 milhões para
urbanização de favelas e mais
R$ 100 milhões em saneamento,
sem contar as verbas
para as obras do PAC – Plano
de Aceleração do Crescimento”,
disse Renato Baldin,
do Ministério da Cidade, que
também esteve acompanhando
a visita do juiz no Jardim
Scaf.