Acordo de livre-comércio com o México coloca a indústria em risco no Brasil
Importação e exportação sem barreiras entre os dois países pode ser o fim da indústria automotiva nacional. Mesmo com o acordo, Brasil já tinha déficit de US$ 9 bilhões desde 2008
Fotos: Adonis Guerra
Começou a valer ontem o acordo de livre-comércio entre o Brasil e o México para importação e exportação de veículos e autopeças. Até então vigorava o sistema de cotas para o comércio entre os dois países. O Sindicato tem alertado que acordos como este podem representar o fim da indústria automotiva do país.
“O livre-comércio com o México é o início do fim da indústria automotiva brasileira. Junto com as outras discussões de acordos com a Argentina e a União Europeia, podem ajudar a enterrar as indústrias e os empregos no Brasil”, alertou o diretor executivo dos Metalúrgicos do ABC, responsável por Políticas Industriais, Wellington Messias Damasceno.
No período de 2008 a 2018, a diferença entre o que o Brasil exportou e importou do México é de cerca de US$ 9 bilhões negativos para a indústria brasileira. O levantamento é da subseção Dieese do Sindicato, com dados do Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (MDIC).
“O governo deveria renegociar o acordo. Com as cotas, o Brasil já era deficitário. Agora com o livre-comércio, haverá uma enxurrada de veículos mexicanos no Brasil, com impactos na produção do Brasil, no emprego e renda”, afirmou.
A Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), o sindicato das montadoras, também defendia a prorrogação do acordo de cotas por mais três anos.
“O problema do livre-comércio são as condições desiguais entre os países. É importante lembrar que o México tem uma das maiores plataformas exportadoras do mundo, com muito investimento em maquinário para ter competitividade porque exporta para os Estados Unidos, uma série de benefícios internos do governo em impostos e custo logístico baixo. O trabalhador mexicano tem praticamente um subemprego, em condições degradantes e não tem organização sindical para defender os direitos”, contou.
O dirigente ressaltou que as montadoras que estão no Brasil também estão no México, assim como as autopeças instaladas aqui têm plantas lá. Inclusive os carros importados do México já são de maior valor agregado, como o Volkswagen Tiguan, Nissan Frontier e Sentra e o Chevrolet Tracker, enquanto o Brasil exporta carros com menos tecnologia e menor valor agregado.
“Com esse acordo, o risco é fechar as empresas no Brasil enquanto o México continua a exportar a sua produção. O Brasil vai ser cliente do México e não haverá o intercâmbio de produtos”, explicou.
Além disso, o acordo prevê a certificação de origem das peças, que passa de 35% para 40% de índice de nacionalização do produto.
“O México importa muito produto e, como não tem fiscalização do governo, pode embutir peças da China, Tailândia e Vietnã, por exemplo, e colocar no certificado de origem que é mexicano. Também pode usar desses subterfúgios para baratear ainda mais o produto final com peças que não são feitas lá”, disse.
“Se restar alguma indústria no Brasil, será com subemprego, com a carteira verde e amarela, sem direitos”, concluiu.
Chile não tem montadora
O exemplo negativo do Chile, que o governo brasileiro está copiando, é uma mostra do que a medida representa. “O setor automotivo chileno chegou a ser grande, mas privilegiou o livre-comércio. Hoje o país não tem mais montadoras. É tudo importado”, contou.
O governo Bolsonaro quer copiar também o sistema de capitalização da Previdência no Chile, que deixou a maioria dos idosos na miséria e altas taxas de suicídio.
O acordo
O acordo de livre-comércio de automóveis, comerciais leves e autopeças entre os dois países passou a valer ontem. As montadoras poderão exportar e importar produtos sem qualquer tipo de barreira.
Para o ano que vem, a medida passará a valer também para caminhões pesados e ônibus.
Até então, vigorava o sistema de cotas, com valores aumentando 3% ao ano. A cota estava em US$ 1,7 bilhão para cada país.
O acordo automotivo existia desde 2002. Em 2015, quando estava previsto o início o livre-comércio, o acordo foi renovado por mais cinco anos de cotas.
Zonas maquiladoras
No México, existem zonas maquiladoras, ou de maquilas, onde o governo praticamente não tem atuação, empresas pagam menos impostos, a legislação trabalhista é mais flexível, com intensa exploração dos trabalhadores, além de sindicatos que protegem as empresas ao invés de protegerem os direitos dos trabalhadores. Essas empresas importam produtos sem o pagamento de taxas, com produtos que não serão comercializadas no país.
Da redação