Bolsonaro decreta que patrão pode demitir e recontratar por salário menor

Constituição impede redução salarial. Nem a reforma Trabalhista permitiu a demissão e recontratação em seguida por representar fraude

Foto: Adonis Guerra

Ontem Bolsonaro assinou uma portaria em que autoriza o patrão a demitir o trabalhador e recontratá-lo em seguida com salário menor, durante a pandemia do novo coronavírus, desde que o sindicato a que ele pertença faça um acordo coletivo aceitando a redução salarial e de benefícios. Hoje a recontratação é considerada fraudulenta quando ocorrida dentro dos 90 dias subsequentes à data da rescisão do contrato.

O diretor administrativo do Sindicato, Moisés Selerges, critica a medida e afirma que se o governo Bolsonaro estivesse preocupado com a classe trabalhadora, teria, desde o início da pandemia, assinado decreto que proibisse as empresas de demitirem.

“Ele deveria proibir as demissões e liberar o auxílio para as empresas, principalmente às pequenas que estão quebrando e não tiveram acesso à linha de crédito. É sempre bom lembrar o montante de mais de um trilhão de reais liberados para os bancos. Isso mostra, mais uma vez, que eles não estão nem um pouco preocupados com a classe trabalhadora do Brasil”.

O dirigente afirma ainda que os Sindicatos mais fortes conseguirão fazer enfrentamento a essa medida, mas as categorias com sindicatos mais frágeis enfrentarão muita redução de salário e precarização. “E quem assegura que o trabalhador será recontratado? E nessa situação de desespero que muitos se encontram, se forem recontratados aceitarão ganhar menos e serem precarizados. Isso que o governo está fazendo é remediar, mas sabemos bem que o remédio defendido do governo não é eficaz e traz muitos efeitos colaterais”, pontuou se referindo a defesa incansável do presidente sobre o uso da cloroquina no combate ao coronavírus.

Para o secretário de Assuntos Jurídicos da CUT, Valeir Ertle, esta é a decisão mais absurda que um governo pode tomar, já que a Constituição impede a redução salarial. O dirigente ressalta que nem a reforma Trabalhista permitiu a demissão e recontratação em seguida por representar fraude, e que a reforma sindical impede que uma pessoa demitida possa retornar a trabalhar na mesma empresa como PJ (pessoa jurídica), antes de um período de ausência de 18 meses.

Foto: divulgação

“A legislação é clara. Não se pode demitir para ganhar menos. Usar a pandemia, um momento de desemprego e o desespero do trabalhador para favorecer patrão não tem fundamento jurídico e é um contrassenso do governo que deveria proteger o trabalhador neste grave momento de crise econômica”, afirmou.

“Nenhum sindicato cutista vai aceitar reduzir salários. Não tem lógica num mundo das relações de trabalho esta decisão. Nenhuma portaria presidencial pode ferir a Constituição. Vamos tomar as medidas jurídicas cabíveis contra este governo que só sabe governar por portaria e decretos inconstitucionais”, ressaltou.

O que diz a portaria de Bolsonaro

• A portaria que flexibiliza a norma de 1992, presume que durante o período de calamidade pública, que termina em 31 de dezembro deste ano, não haverá fraude trabalhista se a recontratação ocorrer antes do prazo de três meses após da data de demissão, desde que haja negociação coletiva com o sindicato. A medida é retroativa e vale para trabalhador demitido sem justa causa a partir do dia 20 de março.

• Na recontratação poderá ocorrer redução de salários e outros benefícios, ou ainda a manutenção do mesmo salário e a diminuição dos benefícios, desde que haja uma negociação coletiva com a participação dos sindicatos.

• Poderá ser considerada fraude trabalhista se os casos de demissão e readmissão por contrato temporário ou de experiência. Neste caso, a empresa é obrigada a pagar salários e demais verbas trabalhistas também do período de demissão.

 Com informações da CUT