2020: um ano para ser lembrado

Estamos todos de acordo: 2020 foi um ano atípico. Vivemos o inimaginável, o medo de um vírus desconhecido que adoeceu muita gente e ceifou mais de 180 mil vidas até hoje, só no Brasil, e mais de 1,5 milhão em todo o mundo. Vivemos também as consequências dessa pandemia, que gerou a maior crise sanitária e econômica da história recente.

Um ano que para muitos “deve ser esquecido”, o que é compreensível, já que é comum querermos apagar lembranças que nos fazem sofrer. No entanto, acredito que, ao contrário, 2020 precisa ser lembrado, e para sempre. 2020 precisa – e vai – ficar registrado na história do país como o ano em que o Estado brasileiro escreveu um dos seus piores capítulos. Como se diz, é preciso não esquecer para não repetir. Para que num futuro próximo, possamos fazer um balanço do que efetivamente aconteceu, as escolhas que foram feitas, e avaliar que caminhos queremos para o futuro do Brasil.

Nunca ficou tão evidente a falta que faz a uma nação e a seu povo um governo responsável, de fato comprometido com sua população. O que se viu neste 2020 inesquecível foi um verdadeiro desastre em termos de ação governamental. O governo federal minimizou a gravidade do problema e mostrou-se completamente despreparado para o enfrentamento da pandemia. Quando não ausente, teve suas poucas e tímidas ações marcadas pela desorganização, falta de planejamento, por recuos de última hora.   

Assistimos atônitos a um verdadeiro desacerto político no combate ao Coronavírus, que deixou evidente a falta de vontade, de competência e, especialmente, a falta de empatia do presidente da República em relação ao flagelo que assolou a população. Não foram poucas as manifestações de desrespeito às vítimas e seus familiares, muitas em tom de deboche registradas em vídeo e fartamente divulgadas pela imprensa.

A politização da pandemia, hoje evidente até na discussão sobre as vacinas, foi iniciada pelo governo federal, que resolveu aproveitar-se da pandemia para travar uma disputa política com seus desafetos nos estados e municípios, só ampliando a gravidade da situação.

A negação da ciência e a briga irracional do presidente até mesmo com as áreas técnicas de seu próprio governo, levou o País a ficar mais de um mês sem um ministro titular da Saúde, cargo que foi ocupado por três pessoas diferentes em meio à uma pandemia, algo até então impensável. Cargo que, ao final, foi entregue a um ministro sem formação técnica na área, após a demissão de dois médicos.

É certo que a pandemia não é um problema exclusivo do Brasil e suas consequências estão impactando as vidas e as economias de todo o mundo. A grande maioria dos países, no entanto, compreendeu o papel imprescindível do Estado nesse enfrentamento, mesmo as economias mais liberais. Ao garantir auxílio emergencial à população e crédito às empresas, atrelado à preservação de empregos, várias dessas economias investiram e preservaram seu mercado consumidor, fundamental tanto durante a pandemia como para o momento da retomada.

No Brasil não houve nada semelhante. O valor de R$ 600 para o auxílio-emergencial foi garantido pelo movimento realizado no Congresso Nacional contrariando o governo, que defendia uma ajuda de apenas R$ 200. Cortado pela metade, ele acaba no final deste ano, sem que se aponte nada que venha a substituí-lo. Dificuldades para o seu recebimento também foram inúmeras – filas imensas, negativas injustificáveis, demora para depositar. Sem contar aqueles que, mesmo com auxílio aprovado, esperam até hoje pelo benefício. Até mesmo o FMI (Fundo Monetário Internacional), órgão que orienta as economias capitalistas, criticou o governo, alertando para o risco de o país entrar em recessão caso a população necessitada deixe de receber o auxílio no ano que vem.

Sem um programa forte também para a preservação de empregos e de crédito para as micro e pequenas empresas, vimos crescer o desemprego para níveis extremamente altos, deteriorando ainda mais o mercado de trabalho, já impactado pela reforma Trabalhista. Muitos foram para empregos precários ou mesmo para a economia informal, e até mesmo esta foi fortemente impactada pela queda na renda.

Este cenário aponta para um 2021 ainda sob os efeitos da pandemia, tanto do ponto de vista social como econômico, e para uma retomada lenta. Há boas perspectivas no que diz respeito à sonhada vacina, mas a efetiva imunização de uma população do tamanho da brasileira, em meio às nossas condições políticas, não acontecerá em pouco tempo. Basta lembrar que o Brasil ainda não tem um plano nacional de imunização e que, após meses de pandemia, o governo só agora se deu conta de que faltam seringas e algodão para aplicação das vacinas e iniciou o processo de compra.

Se por um lado, faltou governo, não faltaram iniciativas da sociedade civil organizada, dos movimentos sociais e populares e da população em geral.  Como sempre acontece em meio a crises e tragédias, o povo brasileiro mostrou aquilo que tem de melhor, sua capacidade de ser solidário e criativo. A categoria metalúrgica foi extremamente ativa, se organizou nas fábricas, na comunidade, e merece nossos agradecimentos por ter atendido aos diversos chamados do Sindicato para ações de solidariedade.

As páginas desta retrospectiva mostram que, mesmo em meio à pandemia, nosso trabalho não parou. Seguindo as orientações da Organização Mundial de Saúde e de nossa assessoria técnica, em especial do departamento de Saúde, continuamos lutando por tudo que sempre nos mobilizou. No entanto, o trabalho foi redobrado. Frente ao cenário da pandemia, agravado pela inação do governo, a luta pela manutenção dos empregos foi ainda mais dura. Também tivemos um enorme desafio em relação às condições de trabalho nas fábricas, uma vez que era preciso – e continua sendo – garantir condições sanitárias adequadas para evitar a contaminação, nossa preocupação maior.

Mesmo com mais perguntas do que respostas para 2021, sabemos qual será nosso papel, tanto do ponto de vista individual como coletivo. Vamos continuar cobrando dos governos ações concretas de enfrentamento da pandemia e fazendo nossa parte, seguindo as orientações de quem de fato entende do assunto – a ciência e a medicina.

Estamos cansados, é verdade, mas os cuidados básicos devem continuar até que haja uma vacina disponível à toda população. Enquanto isso, vidas podem continuar sendo salvas por aquelas medidas já tão conhecidas – lavar as mãos com água e sabão, usar máscara da forma correta, respeitar o distanciamento, evitar aglomeração e locais fechados, ficar em casa sempre que possível.

Com estes mesmos cuidados teremos nosso Natal e fim de ano, hora do descanso mais que merecido e de fortalecer nossa relação de afeto com familiares e amigos, mesmo que, em alguns casos, isso seja feito à distância. O ano que termina exigiu de nós um enorme esforço pessoal, por isso é ainda mais importante este momento de parada para repor as energias e renovar as esperanças.

Não poderia deixar de manifestar aqui o respeito de toda a direção do Sindicato àqueles que sofreram de forma mais grave os efeitos da pandemia, em especial aos que perderam amigos e entes queridos. Só no Grande ABC, mais de 3 mil vidas se foram até agora, às quais prestamos nossa sincera homenagem.

Temos sim, como já mencionei, muitas dúvidas em relação a 2021, mas também é certo que estaremos juntos, como sempre, numa luta que hoje se amplia para além da nossa realidade sindical. É com esta certeza que desejo a todos os companheiros um Natal de paz, saúde e esperança e um 2021 também inesquecível, mas que fique marcado pela superação da pandemia, por muitas alegrias e novas conquistas.

Um abraço a todos,

Wagner Santana – Wagnão

Presidente