Clipping 23 de julho de 2021

Manchetes

Apoio da defesa ao voto impresso eleva tensão entre os poderes (Folha de SP)

Autoridades reagem à ameaça de Braga Netto sobre eleições (Estadão)

“Sou do Centrão, nasci lá”, afirma Jair Bolsonaro (O Globo)

Código do Consumidor muda e facilita negociação de dívida (Valor)


Folha de SP

Montadoras devem seguir com paradas por falta de chips até o segundo trimestre de 2022

Falta de insumos reduziu produção em até 120 mil unidades no semestre

O setor automotivo espera que as paradas na produção causadas por escassez de insumos, em especial semicondutores, prossiga até o ano que vem. Luiz Carlos Moraes, presidente da Anfavea (associação das montadoras), disse a jornalistas não ver solução definitiva para o problema da dificuldade para obtenção de semicondutores neste ano e que a expectativa é de normalização apenas no segundo trimestre de 2022.

O problema é global e estrutural, resultante de uma maior competição pela compra de chips em momento de aceleração da busca por eletrônicos. Nesta segunda-feira (19), a Volkswagen iniciou uma paralisação de 20 dias no turno matutino da produção em São Bernardo do Campo, no ABC paulista.

A montadora também mantém parte dos trabalhadores em férias coletivas na cidade de Taubaté (SP), onde produz os modelos Gol e Voyage. A medida, que terminaria na última sexta (16), foi prorrogada por mais dez dias para parte dos funcionários.

Outras empresas enfrentam o problema. Em Gravataí (RS), a fábrica da GM está sem produzir em seu terceiro turno desde março do ano passado, segundo Valcir Ascari, presidente do sindicato dos metalúrgicos da cidade.

Os trabalhadores dos outros dois turnos estão afastados desde abril, segundo o dirigente. O trabalho deveria ser retomado em julho, mas a volta foi adiada para a segunda quinzena de agosto. A montadora não comenta. A unidade da empresa fabrica os modelos Onix e Prisma.

A escassez de suprimentos também vem impactando nos últimos meses a fabricação pela Hyundai dos veículos da família HB20 e Creta na cidade de Piracicaba (SP). Como a GM, a montadora também não comenta.

Segundo o Sindicato dos Metalúrgicos de Piracicaba, os três turnos de trabalho na fábrica da montadora foram interrompidos por dez dias em julho. A atividade foi retomada para todos os períodos de trabalho na última segunda (19).

A Mercedes-Benz disse à Folha que o fornecimento de matérias-primas segue sendo um grande desafio para todas as fabricantes desde 2020. Os maiores desafios são em relação à entrega de componentes eletrônicos, como semicondutores e chips, e também de alguns produtos de origem química, metálica e polimérica.

A companhia afirma que as férias coletivas para grupos alternados, que consideraram questões sanitárias, foram encerradas em maio e não há previsão de repetição da medida. A empresa trabalha em três turnos em São Bernardo do Campo (SP) e dois turnos em Juiz de Fora (MG). A Nissan realizou paralisações em cinco dias durante o mês de junho, em datas não consecutivas. Não há previsão de novas paradas neste mês na fábrica da empresa, em Resende (RJ).

No primeiro semestre, as montadoras brasileiras produziram 1,15 milhão de veículos. A Anfavea estima, a partir de estudo da consultoria BCG, que o mercado brasileiro tenha produzido até 120 mil unidades a menos do que poderia no primeiro semestre, caso não houvesse a escassez de chips. Segundo Moraes, a dificuldade no abastecimento pode levar a uma espera de até três meses para que o cliente obtenha alguns modelos de automóveis.

Para o ano, a projeção de alta na produção ante 2020 foi reduzida de 25% para 22%, atingindo 2,46 milhões de veículos. O setor adaptou sua oferta no ano, diz o dirigente da Anfavea, superando as projeções para produção de caminhões e comerciais leves e ficando abaixo do esperado no caso de carros. A mudança reflete, entre outros fatores, a maior demanda provocada pelo aumento do comércio eletrônico na pandemia e o avanço do agronegócio.

Folha de SP

Tribunal de SP considera legal demissão por justa causa por recusa à vacina da Covid-19

Auxiliar de limpeza de um hospital recusou, por duas vezes, receber a imunização

A 13ª Turma do TRT (Tribunal Regional do Trabalho) de São Paulo confirmou sentença da primeira instância e manteve a demissão por justa causa de uma auxiliar de limpeza que não quis se vacinar contra a Covid-19. A decisão confirma tendência da Justiça trabalhista de assegurar o direito da coletividade à imunização acima da opinião particular do trabalhador.

A auxiliar era funcionária de um hospital em São Caetano do Sul (ABC) e foi demitida em fevereiro após se recusar, por duas vezes, a se vacinar. Ela entrou na Justiça para receber as verbas rescisórias: o aviso-prévio, o 13° salário proporcional e a multa rescisória de 40% do FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço). Com a demissão por justa causa, a trabalhadora também não poderá receber o seguro-desemprego.

Na ação judicial, a trabalhadora alegou que o hospital não fez campanha nem reuniões para informar sobre a necessidade de tomar a vacina, além de não ter instaurado processo administrativo para apurar a suposta falta grave cometida. Para a auxiliar de limpeza, o ato do empregador de forçar a vacinação fere a sua honra e a dignidade humana. O hospital afirmou ter feito campanhas sobre a importância da vacinação e apresentou a advertência assinada pela trabalhadora por recusar a vacina.

Para o TRT, sem se imunizar, a auxiliar colocaria em risco a saúde de colegas de trabalho e dos pacientes do hospital. Por unanimidade, os desembargadores entenderam que o interesse particular da trabalhadora não poderia prevalecer sobre o coletivo.

“Desse modo, considerando que a reclamada traçou estratégias para a prevenção da Covid-19, divulgou informações e elaborou programa de conscientização para assegurar a adoção de medidas protetivas e a vacinação de seus colaboradores, não se mostra razoável aceitar que o interesse particular do empregado prevaleça sobre o interesse coletivo, pois, ao deixar de tomar a vacina, a reclamante realmente colocaria em risco a saúde dos seus colegas da empresa, bem como os demais profissionais que atuam no referido hospital, além de pacientes, e seus acompanhantes”, afirmou o desembargador-relator Roberto Barros da Silva.

A trabalhadora pode recorrer ao TST (Tribunal Superior do Trabalho). Em dezembro de 2020, o STF (Supremo Tribunal Federal) determinou que a vacina contra o coronavírus é obrigatória e que o Estado pode impor restrições àqueles que recusam a imunização.

Em fevereiro deste ano, o Ministério Público do Trabalho, em guia técnico sobre a vacinação de Covid-19, orientou o afastamento do trabalhador que recusa a imunização e considera falta grave a recusa injustificada em não se vacinar.

Para Mourival Boaventura Ribeiro, advogado especializado na área trabalhista, fica claro a tendência a ser seguida pelos tribunais do trabalho de que nenhuma posição particular, convicção religiosa, filosófica ou política ou temor subjetivo do empregado pode prevalecer sobre o direito da coletividade de obter a imunização conferida pela vacina, prevista em programa nacional de vacinação.

“A decisão do tribunal considerou que a vacinação em massa da população contra a COVID-19 se constitui como medida emergencial que vem sendo adotada pelas autoridades de saúde pública de todo o mundo, no claro intuito de proteger a população em geral, evitar a propagação de novas variantes, bem como reduzir o contágio, diminuir as internações e óbitos e possibilitar o retorno da sociedade para as suas atividades”, afirma Ribeiro.

Acompanhe o caso

A auxiliar de limpeza era funcionária, desde dezembro de 2019, de uma prestadora de serviços contratada por um hospital infantil em São Caetano do Sul. A trabalhadora se recusou, por duas vezes, a tomar a vacina contra a Covid-19 e foi dispensada por justa causa por ato de indisciplina e insubordinação. A ex-funcionária processou o hospital e perdeu, em duas instâncias

1ª instância

A trabalhadora entrou na Justiça para reverter a justa causa, alegando que não tomou a vacina por medo. Em maio de 2021, a 2ª Vara do Trabalho de São Caetano do Sul negou o recurso e manteve a demissão.

Na decisão, a juíza Isabela Parelli Haddad Flait afirma que é “de conhecimento geral e notório que a pandemia de Covid-19 já infectou mais de 15 milhões de pessoas e causou a morte de mais de 422 mil em pouco mais de um ano” e que a vacina é a única e perfeita solução de controle da pandemia

A magistrada citou a Lei 13.979, que já prevê a obrigatoriedade da vacinação entre as medidas para o enfrentamento da crise de saúde pública decorrente da pandemia. A juíza citou ainda guia técnico do Ministério Público do Trabalho, que orienta o afastamento do trabalhador que recusa a imunização e considera falta grave a recusa injustificada em não se vacinar. A trabalhadora recorreu da decisão da Vara do Trabalho ao TRT

2ª instância

Ao TRT, a trabalhadora alegou que o hospital não fez campanha nem reuniões para informar sobre a necessidade de tomar a vacina, além de não ter instaurado processo administrativo para apurar a suposta falta grave cometida.

Para a auxiliar de limpeza, o ato do empregador de forçar a vacinação fere a sua honra e a dignidade humana. Em sua defesa, o hospital afirmou ter feito campanhas sobre a importância da vacinação e apresentou a advertência assinada pela trabalhadora por recusar a vacina.

Por unanimidade, os desembargadores entenderam que o interesse particular da trabalhadora não poderia prevalecer sobre o coletivo e mantiveram a demissão por justa causa. Em sua decisão o TRT afirma que, sem se imunizar, a auxiliar colocaria em risco a saúde de colegas de trabalho e dos pacientes do hospital. A trabalhadora pode recorrer ao TST (Tribunal Superior do Trabalho)

Valor

Parlamentares reagem a suposta ameaça de ministro

Braga Netto e Lira negam conversa, mas cresce tensão entre políticos e Forças Armadas

A suposta ameaça do ministro da Defesa, general Walter Braga Netto, de não realização das eleições em 2022 caso não seja aprovada pelo Congresso a proposta de emenda constitucional (PEC) do voto impresso foi negada ontem por ele e pelo presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), mas causou reações e cobranças tanto da oposição como de governistas e criou novo mal-estar dos políticos com as Forças Armadas. O caso foi divulgado ontem pelo jornal “O Estado de S. Paulo”.

Braga Netto teria avisado a um presidente de partido que ele comunicasse, “a quem interessasse”, que não haveria eleições em 2022 se não houvesse voto impresso e “auditável” – a aprovação da PEC defendida pelo presidente Jair Bolsonaro, que há anos acusa terem ocorrido fraudes nas eleições sem ter apresentado nenhuma prova, mesmo quando intimado pela Justiça.

O próprio Bolsonaro falou, a apoiadores, que sem o voto impresso “não haveria eleição em 2022”. A fala teria ocorrido na mesma época em que Braga Netto e os chefes das Forças Armadas divulgaram nota atacando o presidente da CPI da Covid, o senador Omar Aziz (PSD-AM). Esse presidente de partido teria contado a Lira da ameaça sobre as eleições, o que levou o presidente da Câmara a se reunir com Bolsonaro no Palácio da Alvorada, em Brasília, e dizer que seguiria ao lado dele mesmo na derrota eleitoral, mas não apoiaria um golpe.

Braga Netto divulgou uma nota ontem dizendo que “não se comunica com os presidentes dos Poderes por meio de interlocutores” e que as Forças Armadas são instituições “comprometidas com a sociedade” e que atuam dentro dos limites impostos pela Constituição. Mas, na nota, opinou que é “legítima” a discussão defendida pelo governo de comprovante impresso do voto. “Acredito que todo cidadão deseja a maior transparência e legitimidade no processo de escolha de seus representantes no Executivo e no Legislativo”, disse.

Lira negou ao Valor e outros veículos de imprensa a notícia divulgada ontem. “Mentira”, respondeu, sem dar maiores explicações. No Twitter, contudo, numa nota divulgada sobre o caso, ele não negou o teor da reportagem, mas disse que “o fato é” que o povo brasileiro julgará seus representantes em outubro de 2022 por meio do voto e destacou que “as últimas decisões do governo” foram pelo reconhecimento da política – Bolsonaro escolheu o presidente do PP, senador Ciro Nogueira (PI), para chefiar a Casa Civil no lugar do general da reserva e atual ministro, Luiz Eduardo Ramos.

“A despeito do que sai ou não na imprensa, o fato é: o brasileiro quer vacina, quer trabalho e vai julgar seus representantes em outubro do ano que vem através do voto popular, secreto e soberano. As últimas decisões do governo foram pelo reconhecimento da política e da articulação como único meio de fazer o País avançar”, escreveu o presidente da Câmara no twitter.

 A aliados que o procuraram ontem preocupados, Lira reforçou que não houve ameaça e que, se isso tivesse ocorrido, teria adotado uma posição à altura. “Ele disse que, se tivesse acontecido, teria chamado o colégio de líderes [dos partidos] e tomado decisão muito mais dura, cobrado a demissão”, disse o líder do PSC na Câmara, deputado Aluísio Mendes (MA). Mendes lembrou que a Câmara reagiu chamando Braga Netto na Comissão de Fiscalização Financeira e Controle para se explicar após a nota contra a CPI da Covid, que nem envolvia os deputados.

O ministro prometeu comparecer à comissão em 17 de agosto e, caso falte, deve ser convocado. Apesar do desmentido, a oposição tenta convocar o ministro a dar explicações sobre a suposta ameaça nas comissões da Câmara e do Senado. Os deputados Fábio Trad (PSD-MS), Ivan Valente (Psol-SP) e Fernanda Melchionna (Psol-RS) propõem que ele se explique justamente na comissão especial que discute a PEC do voto impresso na Câmara – a votação está marcada para 5 de agosto.

Partidos e parlamentares que costumam votar com o governo também criticaram a suposta fala. “Se ele acredita que vai impor condições para 2022, não conhece a democracia brasileira. Coloque-se no seu lugar, ministro”, escreveu o líder do Cidadania, deputado Alex Manente (SP).

Presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG) afirmou que o sistema político, a forma de financiamento e o voto impresso podem estar em discussão, mas que as eleições serão feitas. “Isso é inegociável. Elas irão acontecer, pois são a expressão mais pura da soberania do povo. Sem elas, não há democracia, e o país não admite retrocessos.” Presidente do PP e provável futuro ministro da Casa Civil, o senador Ciro Nogueira disse ao Valor que soube do episódio pela imprensa e que acredita não ser verdade.

Valor

Reforma expõe disputa nos bastidores

Centrão e Forças Armadas mantêm embate em torno de espaço político e recursos orçamentários

A minirreforma ministerial anunciada pelo presidente Jair Bolsonaro joga luz sobre uma disputa que ocorria, em silêncio, nos bastidores. Uma disputa por espaço político e recursos orçamentários, ou seja, por poder: é este o contexto dos crescentes atritos entre representantes da tradicional classe política, notavelmente o chamado Centrão, e segmentos oriundos das Forças Armadas.

Esse embate coloca o presidente numa situação delicada entre as bases de sustentação do seu governo. E tampouco ajuda sua relação com os chefes dos demais Poderes. O episódio mais recente é a reportagem publicada pelo jornal “O Estado de S. Paulo”. Autoridades das mais variadas áreas de atuação logo lembraram os limites constitucionais para a atuação das Forças Armadas, o que por si só já evidencia o longo caminho que a democracia brasileira precisa percorrer. No entanto, a despeito das negativas e notas de repúdio, as tentativas de se evitar uma escalada não esvaziaram o mal-estar entre os envolvidos.

A incorporação de militares em cargos estratégicos é alvo de críticas no Congresso desde o início do governo. Na reforma da Previdência, por exemplo, os integrantes das Forças receberam um tratamento específico devido às características da profissão.

Bolsonaro também buscou, conforme prometera durante a campanha, dar mais atenção aos orçamentos do Exército, da Marinha e da Aeronáutica. A iniciativa provocou descontentamento em outras áreas da máquina federal. O presidente também colocou oficiais, da reserva e da ativa, em postos tradicionalmente ocupados por civis – muitos dos quais indicações dos partidos políticos. A reforma reduziu os poderes do ministro Luiz Eduardo Ramos, general da reserva, que deixou a Casa Civil rumo à Secretaria-Geral da Presidência.

Depois do ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello, general da ativa, entrou na linha de tiro dos parlamentares o ministro da Defesa, que durante grande parte da pandemia estava na Casa Civil chefiando os esforços de combate à crise sanitária. O mesmo Braga Netto que levou para a Defesa algumas das bandeiras políticas de Bolsonaro. Os atritos tendem a perdurar. O Centrão sabe da força que acumulou e quanto Bolsonaro precisa de seu apoio. Ainda pode aproveitar a oportunidade para tentar conquistar para si a bandeira de grande lastro da democracia.

Folha de SP (análise)

Entenda o que querem militares e se há risco de golpe sob Bolsonaro

Sucessão de crises envolvendo generais do governo gera temor sobre risco de ruptura

IGOR GIELOW

Em um movimento inédito desde a ditadura encerrada em 1985, o governo Jair Bolsonaro foi patrocinado ideologicamente e ocupado por militares da reserva e alguns da ativa, gerando identidade imediata para a população e para o poder civil, que não se dedica a entender os fardados. Isso resultou em diversas crises, culminando na polêmica fala do ministro Walter Braga Netto (Defesa) sobre voto impresso nesta quinta (22).

A Folha traz um resumo deste enredo, que muitos temem poder acabar com uma crise institucional e talvez um movimento golpista por parte do presidente, o que parece ser improvável, apesar de fazer parte da retórica de Bolsonaro.

O PRINCÍPIO

Como os militares se aproximaram de Bolsonaro?

Capitão reformado do Exército, o então deputado sempre foi visto como um militar indisciplinado. No livro-depoimento do ex-comandante do Exército Eduardo Villas Bôas fica claro, contudo, que a cúpula militar viu em sua ascensão nas pesquisas em 2018 uma chance de barrar o petismo de voltar ao poder e de redimir a imagem do golpe de 1964.

Havia clima para isso?

Como o episódio do tuíte de Villas Bôas pressionando o Supremo a não impedir a prisão de Luiz Inácio Lula da Silva mostrou, os militares estavam empoderados no governo em crise de Michel Temer. Um dos ministros mais poderosos era um general, e a Defesa foi entregue a um fardado. Daí o apoio a Bolsonaro, que cercou-se de generais da reserva e os aboletou em diversos ministérios. Não que tenham cabalado votos, mas quiseram ser fiadores.

Os generais achavam que iam governar sozinhos?

Pelo desprezo intelectual que nutrem por Bolsonaro, sim. Mas a prática se mostrou bastante diferente, com a divisão de poder em 2019 com os ditos ideológicos e outras alas do governo federal.

Como o mundo político reagiu a tudo isso?

Fingiu alheamento e buscou tratar os militares como um todo, com fraca interlocução. Historicamente, o poder civil dá pouca atenção aos militares, exceto em golpes. Temas de defesa hoje são tão importantes quanto qualquer outro, mas o Congresso segue ignorando essa realidade.

AS BENESSES E AS CRISES

O que os militares ganharam em troca de tal apoio?

O governo chegou a ter 10 de 23 ministros fardados (hoje são 7), com gente da ativa em alguns momentos, como os generais Luiz Eduardo Ramos (Secretaria-Geral) e Eduardo Pazuello (ex-Saúde). Em toda a Esplanada, são cerca de 6.000 militares emprestados para funções civis, situação na qual os salários são acumulados. Metade desse contingente, em cargos comissionados.

Além disso, o Ministério da Defesa conseguiu ver aprovada no Congresso sua reforma previdenciária, com critérios mais generosos do que para o funcionalismo em geral (defendidos pelos militares por sua condição única de trabalho), e também uma reforma administrativa que era reclamada havia duas décadas.

Programas prioritários foram salvos de cortes de gastos até a conta chegar neste ano. E em 2019 o investimento militar subiu a níveis recordes devido a manobra fiscal.

Então não houve atritos?

Houve. Ao longo de 2019, diversos generais foram sacados de seus postos por choques com a ala ligada à família presidencial, dita ideológica. O caso mais famoso foi o de Carlos Alberto dos Santos Cruz, general da reserva que agora é um crítico do governo.

E como a situação ficou?

Em 2020, sem apoio político e enfrentando a crise sanitária e econômica da pandemia de forma negacionista, Bolsonaro recorreu aos militares. Levou o general Walter Braga Netto para a Casa Civil e deu mais poderes aos fardados, culminando na colocação de Pazuello na Saúde —que resultou calamitosa, arranhando o mito da competência gerencial dos militares.

E os atos antidemocráticos? Os militares os aceitaram?

Em algumas ocasiões, Bolsonaro arrastava um ministro oriundo das Forças. Mas o ex-chefe da Defesa, general Fernando Azevedo, emitiu notas reafirmando o compromisso dos militares com a democracia —o que em si já era esquisito. Por outro lado, o mesmo Azevedo em duas ocasiões emitiu notas elogiando o golpe de 1964, sob a ótica de que no contexto da Guerra Fria seria o correto a fazer contra o esquerdismo do governo de João Goulart.

Pior, houve o episódio do general Augusto Heleno (Gabinete de Segurança Institucional), um dos mentores do governo Bolsonaro desde 2018. Heleno divulgou um texto crítico da possibilidade de o presidente ter seu celular apreendido pela Justiça, e foi apoiado por Azevedo e os comandantes militares.

Depois disso, contudo, acelerou-se o processo de afastamento do serviço ativo, com o então comandante do Exército, Edson Pujol, riscando a linha no chão ao dizer que militares não deveria se meter com a política. Pazuello, contudo, nunca foi para a reserva.

E o que aconteceu na crise militar de março de 2021?

Bolsonaro nunca engoliu Pujol, que promovia o combate ao coronavírus de forma oposta à do presidente, tendo inclusive especulado sua troca por Ramos em 2020. Com o recrudescimento da pandemia no começo deste ano e a queda na popularidade de Bolsonaro, o presidente radicalizou novamente seu discurso. E cobrou de Azevedo apoio às suas ideias, particularmente criticar governadores por restringir circulação de pessoas. O caldo entornou, e Bolsonaro demitiu Azevedo. Num ato inédito, os três comandantes decidiram sair juntos. Braga Netto assumiu a Defesa e os demitiu antes disso, gerando a pior crise desde 1977 no setor.

Os novos comandantes são bolsonaristas, então?

O chefe da Aeronáutica, brigadeiro Carlos Baptista Jr., tem ideias bolsonaristas claras. O mesmo não se pode dizer da Marinha e do Exército, onde acabou ocorrendo nova crise envolvendo o já ex-ministro Pazuello.

General colocado em um cargo esotérico no Planalto, o ex-ministro participou de um ato em favor de Bolsonaro no Rio, em 23 de maio. Isso é proibido pelos regulamentos militares e passível de punição, de advertência verbal até cadeia por 30 dias.

Só que Bolsonaro pressionou o comandante do Exército, Paulo Sérgio Oliveira, a perdoar o general. Isso foi feito, dizem integrantes do Alto-Comando, para evitar uma crise mais prolongada, mas o episódio abriu a brecha para a anarquia: se o general não é punido, por que o sargento seria, afinal?

O PITBULL BRAGA NETTO

Qual o papel hoje do ministro da Defesa, Braga Netto?

Ele é visto como um bolsonarista de quatro costados, sempre disposto a defender as bandeiras levantadas pelo chefe, mesmo que isso incomode a tropa a ele subordinada. Foi assim no episódio Pazuello, na nota em que ameaçou o senador Omar Aziz (PSD-AM) e a CPI da Covid devido às investigações sobre militares envolvidos em corrupção no Ministério da Saúde e na defesa feita por Braga Netto do voto impresso.

Então os militares rejeitam Bolsonaro hoje?

Não exatamente. Uma fatia expressiva do oficialato e, estima-se, dos praças ainda apoia o presidente. Entre os escalões superiores, a tese do voto impresso é majoritária, mas eles creem que não é o caso de o ministro falar sobre isso. O mesmo vale para a CPI.

Mas eles são bolsonaristas então, filosoficamente?

Aqui é um pouco a questão do ovo e da galinha. Militares defendem valores que acabaram sendo sequestrados e ignorados pelo bolsonarismo, como a defesa da família ante o que consideram uma ameaça à esquerda encarnada em pautas identitárias, o conservadorismo político no geral e o ideário de combate à corrupção.

Pior para eles, povo não distingue general ministro da reserva de alguém da ativa, embora a PEC que visa regular isso seja um começo de solução. Para boa parte dos militares que não estão no governo, contudo, o ideal seria uma forma de saída honrosa da enrascada que foi patrocinada pelos chefes militares e generais influentes da reserva em 2018. Como isso pode acontecer é uma incógnita, contudo, enquanto Bolsonaro estiver no poder e usando a carta militar sempre que acuado.

VAI TER GOLPE?

Há clima para algum tipo de golpismo por Bolsonaro?

O presidente usa e abusa de retórica golpista como forma de manter o fantasma vivo, e se apresenta como um corpo único com os militares. A realidade é bem mais complexa. Não há pilares para um golpe clássico, como alinhamento entre as três Forças e parte significativa da sociedade civil, seja para tirar Bolsonaro, seja para transformá-lo num ditador. Há uma compreensão clara de que isso não seria digerido pelas elites, pela população e no exterior.

E versões modernas, como a erosão das instituições?

Bolsonaro claramente sonha com isso, e um roteiro de ruptura foi desenhado por seu ídolo Donald Trump, que viu hordas de apoiadores invadirem o Congresso para tentar melar a validação da eleição de Joe Biden em 6 de janeiro.

Toda a defesa de que eleição sem voto impresso é fraude busca criar um arcabouço para, na visão dos mais pessimistas, forçar uma situação de conflito nas ruas caso Bolsonaro derreta de vez e seja derrotado nas urnas em 2022. Isso levaria a impasses, como a decretação de uso de força federal ou mesmo estado de defesa em alguns locais. Há dúvidas se Bolsonaro iria atender a pedidos de ajuda de governadores opositores, por exemplo, o que levaria a crise para o Judiciário.

E os militares e as PMs?

Comandantes são unânimes em dizer, durante conversas reservadas, que não há espaço para golpismos, mas o fato é que não houve nenhum teste de realidade sobre isso para atestar tal comprometimento. Já o episódio de ação pirata da PM no Recife contra manifestantes anti-Bolsonaro acendeu sinais amarelos sobre a propalada milicianização das forças estaduais. É um tema que merece acompanhamento de perto, embora pareça altamente improvável que uma ruptura de fato possa vir a acontecer.

Folha de SP

Crise em Cuba derruba Lula em popularidade digital, e internação impulsiona Bolsonaro

Presidente se mantém na liderança isolada, e Leite é impulsionado após dizer ser gay, mostra estudo da Quaest

Em termos de popularidade digital, a última semana marcou a alta do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), puxada pela internação hospitalar, e a queda do ex-presidente Lula (PT), motivada por opinião a favor de Cuba. A evolução dos políticos nas redes sociais é medida diariamente pela consultoria Quaest por meio do Índice de Popularidade Digital (IPD).

Em 12 de julho, Bolsonaro e Lula tinham IPD na casa dos 40 pontos, com 48,38 e 43,18 respectivamente. No dia seguinte, fala do petista crítica aos EUA e favorável à ditadura cubana derrubou seu índice para 29,35. Em 14 de julho, chegou ao piso: 27,48.

Nesse mesmo dia, em meio a dores e crise de soluço, Bolsonaro deu entrada no Hospital das Forças Armadas, em Brasília, e foi transferido para São Paulo. Seu IDP subiu a 67,89 e seguiu em alta até 73,91 no último sábado (17).

No período que vai de maio a julho, o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB), chegou a ser o mais popular entre os presidenciáveis por alguns dias, logo após ter dito em entrevista à TV Globo que é gay, no último dia 1º.

Ciro Gomes (PDT) também teve período de alta após lançar, em 21 de junho, vídeo de aceno aos evangélicos, em que afirma que a Bíblia e a Constituição não são conflitantes. De resto, os representantes da chamada terceira via seguem em patamares mais baixos nas redes.

A métrica do IPD isola o máximo possível o efeito do uso de robôs nas redes e avalia o desempenho de personalidades da política nacional nas plataformas Facebook, Instagram, Twitter, YouTube, Wikipedia e Google. A performance é medida em uma escala de 0 a 100, em que o maior valor representa o máximo de popularidade.

São monitoradas seis dimensões nas redes: fama (número de seguidores), engajamento (comentários e curtidas por postagem), mobilização (compartilhamento das postagens), valência (reações positivas e negativas às postagens), presença (número de redes sociais em que a pessoa está ativa) e interesse (volume de buscas no Google, YouTube e Wikipedia).

Segundo as medições mais recentes, Bolsonaro se mantém na casa dos 70 pontos, e Lula, na casa dos 30. Na terça (20), o presidente marcou 72,34, e Lula, 31.52. No segundo escalão, estão Ciro com 25,1; José Luiz Datena (PSL) com 22,18; Leite com 19,49; João Doria (PSDB) com 18,94 e Luiz Henrique Mandetta (DEM) com 18,92.

​Lula recorreu à violência policial contra negros nos Estados Unidos para defender a legitimidade do governo cubano, alvo de protestos no último dia 11. “Você não viu nenhum soldado em Cuba com o joelho em cima do pescoço de um negro, matando ele”, escreveu o ex-presidente, em rede social, em referência ao assassinato de George Floyd, homem negro morto pela polícia americana.

Mas os protestos contra o governo cubano foram alvo de repressão: ao menos cem manifestantes, ativistas e jornalistas foram presos. “O que está acontecendo em Cuba de tão especial para falarem tanto?! Houve uma passeata. Inclusive vi o presidente de Cuba na passeata, conversando com as pessoas. Cuba já sofre 60 anos de bloqueio econômico dos EUA, ainda mais com a pandemia, é desumano. […] Se Cuba não tivesse um bloqueio, poderia ser uma Holanda”, publicou Lula.

“Elogiar Cuba rebaixa a popularidade de Lula ao pior índice desde que ele voltou para a cena eleitoral”, afirma o cientista político Felipe Nunes, diretor da Quaest e professor da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais). ​

O analista explica que o tema Cuba é, ao mesmo tempo, crítico para o bolsonarismo e motivo de desconfiança para eleitores de centro. De modo geral, contudo, Lula vem de um período apagado. A estratégia é de submersão: poucos comentários e pouca exposição nas redes sociais.​ “É quase que por opção, por não ter feito viagens ou eventos públicos. Interessa a Lula que nada aconteça de agora até a eleição de 2022”, afirma Nunes, lembrando que hoje as pesquisas indicam vitória do petista sobre Bolsonaro.

​A ausência de Lula no debate público, negada por petistas, gerou cobranças a respeito de posicionamento do ex-presidente em relação às suspeitas de corrupção no governo Bolsonaro. O movimento cresceu no dia 30 de junho, quando a hashtag “Lula sumiu” alcançou o ranking de assuntos mais comentados no Twitter.

Já a trajetória de Bolsonaro em seu terreno preferido, o das redes sociais, foi de montanha-russa nos últimos dois meses. De acordo com Nunes, o mês de junho marca o efeito da CPI da Covid sobre a popularidade digital do presidente.

O pior momento para Bolsonaro foi a semana em que as suspeitas no contrato com a Precisa Medicamentos para compra da vacina indiana Covaxin vieram à tona e os irmãos Miranda prestaram depoimento à CPI. Mas a recuperação do presidente para a liderança isolada do IPD, posição que em geral costuma ocupar, não tardou e foi motivada por uma combinação de fatores.

Houve uma coincidência temporal entre o encontro de Bolsonaro com o presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Luiz Fux, em uma tentativa de moderação; o recesso da CPI e a internação devido a uma obstrução no intestino —ligada à facada sofrida pelo presidente em 2018.

A questão médica foi explorada por Bolsonaro e seus filhos nas redes ao resgatarem o atentado e o relacionarem ao PSOL e ao PT. “O engajamento e a mobilização dos apoiadores de Bolsonaro cresceram. A valência, que vinha em baixa por conta da CPI, melhorou, já que as notícias ruins diminuíram”, diz Nunes.

O método de recorrer à facada, de acordo com a medição do IPD, deu certo, mas o professor da UFMG pondera que essa tática vai se desgastar até a eleição. “A facada funcionou em 2018 e melhorou a imagem de Bolsonaro neste momento, mas não acho que vai funcionar sempre. Quanto mais você usa uma estratégia, menos eficiente ela fica”, diz. Em relação aos representantes da terceira via, Nunes afirma que cada um deles já teve um período de destaque. “Mas na mesma velocidade em que surgem, desaparecem”, declara. ​

O IPD de maio a julho mostra ainda que os protestos da esquerda pelo impeachment de Bolsonaro geram ganho para Lula, enquanto as motociatas agitam a popularidade de Bolsonaro. Antes de a CPI avançar sobre suspeitas de corrupção na compra de vacinas, o presidente vinha de uma trajetória de alta na popularidade digital impulsionada pelo resultado de crescimento de 1,2% do PIB registrado em junho. ​

Bolsonaro, que lidera o IPD desde que o monitoramento foi criado, em janeiro de 2019, chegou a ficar atrás de Lula por nove dias a partir de 8 de março, data em que o ministro Edson Fachin, do STF, anulou as condenações do petista na Operação Lava Jato. Depois disso, Lula voltou a alcançar Bolsonaro no início de abril e no fim de maio, mas sem tomar a dianteira.​

Ao longo de abril e maio, porém, com a estratégia de conciliar agenda política e repercussão na internet, Bolsonaro passou a ocupar novamente posição de destaque no terreno das redes, área em que atua com maior desenvoltura em relação aos seus concorrentes da eleição de 2022.

Folha de SP

Duas doses da vacina da AstraZeneca têm proteção de 93,6% contra mortes por Covid, diz estudo

Trabalho analisou dados de mais de 61 mil moradores de SP acima de 60 anos

Um estudo recente feito com dados de 61.164 moradores do estado de São Paulo com idades entre 60 e 79 anos e que receberam o imunizante AstraZeneca mostra que a vacina oferece alta proteção contra casos sintomáticos, hospitalizações e mortes de Covid-19. A análise foi feita entre os dias 17 de janeiro e 2 de julho, época de alta circulação da variante gama (P.1).

O estudo usou informações de indivíduos com doença respiratória aguda e submetidos ao teste RT-PCR identificados nos bancos de dados de vigilância (e-SUS e Sivep-Gripe). A estimativa da efetividade da AstraZeneca foi feita comparando quatro grupos: vacinados e não vacinados com PCR positivo para Covid-19 e os vacinados e não vacinados com resultado negativo.

“A principal mensagem desses resultados é o incremento que temos com o esquema vacinal completo. É muito importante porque sai de cerca de 62% para prevenção de óbito e vai para 94%. Reforça a ideia que é necessário o esquema vacinal completo para uma excelente proteção”, afirma o infectologista da Fiocruz, Julio Croda, que também é professor da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul e membro do Centro de Contingência do Coronavírus do estado de São Paulo.

De acordo com a pesquisa, a eficácia da vacina da AstraZeneca 28 dias após a primeira dose é de 33,4% contra casos sintomáticos, 55,1%, hospitalizações e 61,8%, mortes. Os percentuais tornam-se bem mais robustos 14 dias após a segunda dose: 77,9% contra casos sintomáticos, 87,6%, internações e 93,6%, mortes.

Croda lembra, porém, que todas as vacinas aprovadas são boas. “Todas protegem contra casos graves, hospitalizações e óbitos e qualquer variante, mas não existia esse dado para a gama. É o primeiro estudo de efetividade no Brasil para essa variante.”

CORONAVAC

Os pesquisadores também apresentaram novos dados de um estudo que avaliou a eficácia da Coronavac, produzida no Brasil pelo Instituto Butantan, diante da alta circulação da variante gama. O estudo foi feito de 17 de janeiro a 29 de abril com 43.774 moradores no estado de São Paulo acima de 70 anos e que receberam a Coronavac.

De acordo com os resultados, 14 dias após a aplicação de duas doses a efetividade da vacina foi de 41,6% contra casos sintomáticos, de 59% contra hospitalizações e 71,4% contra mortes. Na faixa etária entre 70 a 74 anos, a eficácia da Coronavac contra casos sintomáticos é de 61,8%, de 80,1% contra hospitalizações e de 86% contra mortes.

No entanto, a proteção da Coronavac cai na população com 80 anos ou mais – 28% contra casos assintomáticos, 43,4% contra hospitalizações e 49,9% contra mortes. “Os dados são melhores que os da vacina da gripe, que previne 40% de mortes para acima de 80 anos”, ressalta Croda. Croda ressalta que não se pode comparar a AstraZeneca com a Coronavac. “Apesar da diferença nas estimativas, não há diferença entre as vacinas”, afirma.

Para o pesquisador ainda não há dados suficientes que apontem para a necessidade da revacinação. “Teremos que ficar de olho em duas populações: idosos e imunossuprimidos. E talvez profissionais de saúde. Pode ser que no idoso seja necessário [fazer a revacinação] porque ele responde menos ao longo do tempo. Os dados que temos até o momento apontam oito meses [de proteção] para a população em geral. Em um ano será que ela se manterá? Não temos como afirmar agora.”

Valor

Fiocruz vê retração na covid, mas situação ainda é ‘crítica’

Em duas semanas até 17 de julho mortes caem 2,6% e casos 2,1%, aponta boletim

A Fundação Oswaldo Cruz informou que, nas duas últimas semanas até 17 de julho foi mantida a queda no número de casos, desta vez redução de 2,1%, e de óbitos (-2,6%). Ainda assim, ponderam os pesquisadores, o país permanece em patamar “muito crítico”, com média diária de 39 mil novos casos e 1.196 mortes por covid-19, o que ainda é considerado muito alto. “Diante disso, continuam pertinentes as preocupações quanto à possibilidade de piora no quadro pandêmico, especialmente frente à propagação da variante Delta, que é altamente transmissível”, dizem os pesquisadores da Fiocruz.

Os especialistas afirmam, ainda, que a pandemia pode entrar em uma nova fase marcada pela diminuição geral de casos e óbitos, mas com retorno de uma participação maior dos idosos nas estatísticas. O fato, observam, não indica avanço da doença entre maiores de 60 anos, mas estaria ligado ao avanço da vacinação entre os mais jovens, o que nivela o nível de proteção. É só um efeito estatístico.

De acordo com o Boletim Observatório Covid-19, divulgado na noite de ontem, entre os dias 12 de junho e 10 de julho, ou seja, intervalo de quatro semanas epidemiológicas, o percentual de idosos no total de internados subiu de 27,2% para 31,8%. A participação dos idosos no número de óbitos também subiu de 44,8% – a menor já registrada na pandemia – para 58,2%.

Segundo a Fiocruz, qualquer conclusão sobre a mudança nas estatísticas seria “precoce” e elas devem continuar sendo observadas “criteriosamente” nas próximas semanas para que se possa ratificar um novo ciclo demográfico para a pandemia. Os pesquisadores pedem atenção à população idosa em paralelo a uma expansão da vacinação entre os mais jovens, ainda encarada como a única saída para uma queda sustentada dos casos.

Na análise regional, a Fiocruz não detectou aumento das taxas de incidência ou mortalidade em nenhum Estado. Paraná, Mato Grosso e São Paulo apresentam as maiores taxas de mortalidade pela doença, ou seja, número de mortos ante população geral. As maiores taxas de letalidade, proporção de mortes entre infectados, acontecem no Rio de Janeiro (5,7%), São Paulo (3,4%), Amazonas (3,4%) e Pernambuco (3,1%). Nacionalmente, esse dado fica em torno de 3%.