A indenização de 40% do FGTS decorrente dos expurgos dos Planos Verão e Collor I

Célia Rocha de Lima* e Davi Furtado Meirelles**

I – Introdução

O presente estudo visa analisar e tecer alguns comentários sobre a Lei Complementar nº 110, de 29.06.01, que reconheceu o direito às diferenças de FGTS, em virtude da não correção dos depósitos, por ocasião dos chamados planos Verão (janeiro/89) e Collor I (março/90), após o reconhecimento desse direito pelo Supremo Tribunal Federal.

Antes de mais nada, é importante ressaltar que seria impossível fazer qualquer estudo prévio, seja quanto a competência, quanto a legitimidade (ativa e passiva), ou mesmo quanto a prescrição, sem abordar um dos outros tópicos, na medida em que a definição de um, consequentemente, implicará na escolha das demais alternativas.

Nesse sentido, a nossa conclusão final passará, necessariamente, pela abordagem dos pontos acima. Estamos cientes, no entanto, que o tema é polêmico e, certamente, suscita outras posições e entendimentos, o que é próprio da interpretação jurídica. Nossa finalidade é contribuir para o debate.

Assim, com essas considerações iniciais, passemos à abordagem do que realmente nos interessa.

II – Competência

A primeira indagação que se faz é sobre qual a Justiça competente para apreciar e julgar o pedido de diferença da indenização de 40% do FGTS, nos casos de dispensa sem justa causa.

Para responder a essa e outras indagações que virão a seguir, torna-se imperioso definir a natureza jurídica do próprio FGTS e da indenização de 40%, devida quando da dispensa imotivada.

Muito embora o valor da segunda depender diretamente do montante encontrado na conta vinculada da primeira, suas naturezas são diversas. Enquanto o FGTS tem caráter fiscal e compensatório, porque visa a compensação do tempo de serviço do empregado, a indenização de 40% possui característica de ressarcimento de dano sofrido pela perda do emprego, nos termos do art.10, inciso I, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, devida como verba rescisória.

Assim, o não recolhimento (ou recolhimento a menor) do FGTS, pelo empregador, ou o não pagamento (ou pagamento insuficiente) da indenização de 40%, permitem ao empregado reclamá-los na Justiça do Trabalho. Todavia, a incorreta correção do FGTS, pelo órgão gestor (Caixa Econômica Federal), deverá ser questionada perante a Justiça Federal (art.109 da CF).

Com o reconhecimento legal da correção a ser aplicada nos saldos das contas vinculadas nos meses referidos acima, tem-se que a indenização compensatória quitada por ocasião das rescisões contratuais operadas até aqui se baseou em valores inferiores àqueles de fato devidos pelo empregador.

Pois bem. Inegável é a natureza de verba rescisória da indenização de 40%, já que devida quando das dispensas sem justo motivo. Ou seja, trata-se de parcela decorrente da relação empregatícia, o que, pela interpretação do art.114 da Magna Carta, define como competência para conciliar e julgar litígios que envolvam essa discussão a Justiça Obreira.

III – Legitimidade

Pelos mesmos motivos acima expostos, partindo da premissa de que a competência se encontra definida, o interesse de agir (art. 3º do CPC), de buscar a reparação da lesão de direito individual ora verificada, é de cada empregado que tenha mantido contrato de trabalho nos meses em que ocorreram os expurgos inflacionários, e que tenha sido dispensado sem justa causa.

A legitimidade ativa, portanto, é de cada ex-empregado, individualmente, mas nada impede que sejam promovidas reclamações trabalhistas plúrimas contra o mesmo empregador.

Por consequência, a legitimidade passiva nas ações a serem propostas é de cada empregador que se tornou inadimplente com o nascimento do direito, através da LC nº 110. Aliás, o Decreto nº 3.914, de 11.09.01, que veio regulamentar as contribuições sociais instituídas pela LC nº 110, já define a legitimidade passiva das empresas, no caput do seu art.4º.