A pressão do agronegócio sobre o Código Florestal
Editorial do Jornal Brasil de Fato
O agronegócio, com a sustentação das empresas transnacionais da agricultura e a força da bancada ruralista no Congresso, tendo como porta-voz um parlamentar com origem na esquerda, puxa a corda e coloca todas as suas forças para passar com o rolo compressor sobre o Código Florestal.
A lei é considerada pelo grande capital um entrave para a expansão desenfreada do agronegócio, uma vez que tem dispositivos fundamentais para a preservação do ambiente, como a Reserva Legal (RL) e as Áreas de Preservação Permanente (APPs). Essa discussão se arrasta faz mais de dois anos e demonstra a disputa entre dois modelos agrícolas: o agronegócio e a agricultura camponesa e familiar.
Setores organizados da sociedade reagiram e se colocaram contra o relatório de Aldo Rebelo (PCdoB). Cientistas e pesquisadores, a Igreja Católica, as organizações não governamentais e setores do empresariado se uniram ao movimento camponês e às entidades ambientalistas para fazer oposição às mudanças no Código Florestal.
Esses setores forçaram um posicionamento mais firme do governo e impuseram um recuo ao agronegócio. Nesta semana, Aldo Rebelo apresentou uma nova versão do relatório, sem os pontos mais problemáticos, mas não atende às necessidades da agricultura camponesa e familiar e beneficia o agronegócio, especialmente o ramo de papel e celulose.
Os setores que se colocam contra o relatório de Aldo conseguiram garantir a manutenção das porcentagens referentes à RL e às APPs, além de derrotar a proposta de anistia geral aos desmatadores. A preservação desses pontos representa uma derrota do projeto estratégico do agronegócio.
No entanto, a maior parte das propostas populares ficou de fora, como a criação de um programa consistente de recuperação ambiental, pagamento de serviços ambientais e de fomento à produção sustentável agroflorestal. O quadro aponta a inexistência de consenso em torno de alterações do Código Florestal. O governo federal vetou o projeto original de Aldo Rebelo e pediu um novo texto com propostas de mudanças. Ele apresentou uma nova proposta, que não foi aceita pelo governo. O projeto entra nesta semana na pauta de votação do plenário da Câmara dos Deputados.
A última versão do relatório de Aldo Rebelo dispensa de Reserva Legal as propriedades com até quatro módulos fiscais (que vai de 20 hectares no Sul e chega a 400 hectares na Amazônia). Isso vai prejudicar os camponeses a longo prazo, pois terão suas propriedades comprometidas pela erosão, escassez de água, perda da fertilidade. Além disso, todas as áreas médias e grandes terão como “bônus” quatro módulos fiscais sem necessidade de RL, porque a porcentagem do cálculo será contada a partir dessa área.
Não podemos aceitar que a RL seja recuperada em até 50% com espécies exóticas nem que o agronegócio tenha a possibilidade de recompor somente metade das APPs com até 10 metros de largura em beira de rios, encostas, topos de morros e bordas de chapadas por eucalipto e pelos. A autorização para recompor a Reserva Legal em qualquer parte do bioma terá impactos negativos para a sociedade, como a expulsão de agricultores, que serão pressionados a vender suas terras, além de latifúndios improdutivos que poderão ser considerados como áreas em recomposição florestal.
Um conjunto de benefícios foi criado para os latifundiários desmatadores que fizerem o cadastro ambiental, que poderão receber crédito com mais facilidade e juros menores. Além disso, terão prioridade em programas governamentais e poderão deduzir do imposto de renda os investimentos em recuperação. O relatório ignora a existência de uma disputa entre dois modelos agrícolas no país. Com isso, trata o grande capital do agronegócio, que produz em escala para exportação, da mesma forma que um assentado da reforma agrária, que planta 70% dos alimentos da cesta básica do povo brasileiro.
De um lado, estão os interesses do agronegócio, que representa a aliança dos latifundiários capitalistas com empresas transnacionais e o capital financeiro. O chamado modelo de produção agroexportador se sustenta no latifúndio, produção de monoculturas valorizadas no mercado internacional, mecanização intensiva e consumo exagerado de agrotóxicos.
Do outro lado, está a agricultura camponesas e familiar e a reforma agrária, que defendem uma proposta para o campo com base em pequenas propriedades, com produção diversificada de alimentos para o povo brasileiro, sem a utilização de agrotóxicos, com geração de empregos para a população do campo, com a construção de cooperativas e de agroindústrias.
O debate em torno do Código Florestal está no marco da discussão sobre o modelo agrícola e o tipo de desenvolvimento que queremos para o nosso país. O povo brasileiro tem que fazer uma grande discussão: se quer um modelo de exploração violenta dos nossos recursos naturais, no ritmo do curto prazo imposto pelo capital, ou um modelo que coloque a utilização das nossas riquezas naturais a serviço de projeto de mudanças estruturais para resolver os problemas do povo brasileiro.
Depois da votação na Câmara, o projeto vai para o Senado Federal. Por isso, precisamos fazer um esforço para que essa discussão ultrapasse as paredes do Congresso Nacional, envolvendo movimentos urbanos, sindicatos, entidades estudantis, para construir força social para fazer com que as mudanças no Código Florestal garantam a preservação do ambiente e fortaleçam a agricultura camponesa e familiar.