A vitória de Dilma é a minha vitória, diz Lula. Confira também áudios e vídeo da entrevista exclusiva

 

“A vitória de Dilma é a minha vitória”
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva concedeu na última terça-feira uma entrevista coletiva aos veículos da rede de comunicação dos trabalhadores, Tribuna Metalúrgica, TVT, Jornal ABCDMaior, Rede Brasil Atual, Rádio Brasil Atual e Revista do Brasil. 
Pela primeira vez após ter deixado a Presidência da República, Lula falou sobre os desafios da classe trabalhadora e do sindicalismo, as manifestações de junho, eleições presidenciais e estaduais em 2014, reforma política, democratização dos meios de comunicação e Copa no Mundo. Leia os principais trechos da entrevista e confira a íntegra no site www.smabc.org.br
A classe trabalhadora é a mesma de seu tempo de sindicalista? Eu devo tudo que sou ao alto grau de consciência política que os trabalhadores brasileiros adquiriram. Sei qual era o grau de consciência quando fui eleito presidente do Sindicato, em 1975, ou como delegado de base, em 1969, e sei qual é hoje. A classe trabalhadora mudou. Essa é a verdade. Eu ia à Volks nos anos 1980 e encontrava 44 mil trabalhadores. Hoje tem 13 mil. É um terço daquela época. A empresa mudou. Está mais sofisticada. A gente chamava de peãozada e hoje não pode nem chamar mais de peãozada porque todo o mundo tem um curso técnico ou está fazendo universidade. Mudou o perfil a classe trabalhadora. Hoje existe um crescimento grande nas áreas de serviços, telecomunicações e outros setores que não são mais só industrial, mas, de qualquer forma, sejam trabalhadores do setor primário ou terciário, a classe trabalhadora continua sendo a coisa mais importante na existência de um país. 
Qual é o desafio dessa classe trabalhadora daqui pra frente?
O desafio colocado para classe trabalhadora é pensar se o papel dela agora é o mesmo de antes ou é inovar. Eu posso usar o exemplo mais vivo que conheço que é dos Metalúrgicos do ABC, que conquistou um espaço que não tínhamos nos anos 80. A gente era mais emoção, mobilização e garra. Hoje é muito mais consciência política. Hoje, o presidente do Sindicato, o Rafael Marques, não precisa ir 800 vezes à porta da empresa para parar, fazer uma greve. O Comitê Sindical vai lá e para. Isso é uma evolução, mas aumentou o desafio. Não é só salário, transporte, melhor qualidade de refeição. São outras coisas agora. Precisamos representar os trabalhadores fora do chão de fábrica. Quando ele sai da fábrica, ele continua sendo trabalhador. Eu vou me interessar em levar cultura e transporte para o bairro onde ele mora? Eu vou ficar brigando com o empresário local ou eu vou para o Congresso Nacional aprovar a redução da jornada de trabalho e dar mais tempo de lazer ao trabalhador? Ou lutar pela reforma tributária para que o trabalhador possa pagar menos impostos? 
Isso não seria responsabilidade de todo o movimento sindical?
O movimento sindical precisa fazer um processo de reciclagem para definir quais bandeiras serão necessárias no século 21. Não pode ser a mesma bandeira do passado. Hoje o trabalhador quer ter um computador em casa, ter acesso à banda larga, ter acesso a coisas que não estão na pauta de reivindicações. Vamos ter de evoluir. Só dentro da fábrica não resolve mais. Temos que discutir novas profissões, funções e jornadas de trabalho. E acho que esse desafio é mais grave e difícil que o da minha época. O papel de um dirigente sindical hoje é muito mais complicado do que o meu papel da década de 80. Antes eu ia para a porta da fabrica, na época era ditadura, e ficava meia hora xingando o governo, mais meia hora xingando o patrão e chamava o trabalhador para a briga. Hoje você tem quase pleno emprego no País, dez anos seguidos de aumento real no salário, participação nos lucros, que não tinha na minha época. Se não são essas as prioridades, quais são agora? O sindicato tem de sair do chão da fábrica e fazer outro papel? Estamos em um momento de descobertas de novos desafios do movimento sindical brasileiro. É uma revolução que o movimento sindical tem de encarar. Já fiz algumas discussões com os movimentos sindicais e não é uma tarefa fácil. 
É possível dar exemplos desses novos desafios?
Nos Estados Unidos, na Nissan, os trabalhadores não se sindicalizam e quem não deixa eles se sindicalizarem é o governador do Estado. Senão a empresa vai para outro Estado. É um retrocesso ao século 19. Aqui, para onde foram os metalúrgicos que estavam nas montadoras? Estão terceirizados? A terceirização não vai acabar, temos que regulamentá-la. Dizer o que pode e o que não pode ser terceirizado. Tem de discutir com as centrais sindicais uma mudança na representação para melhorar o atendimento aos trabalhadores. Na França, houve um tempo que não havia representação sindical, quem fazia o movimento de rua eram as ONGs. O movimento sindical vai deixar acontecer isso aqui no Brasil?  
Qual o impacto das manifestações de junho na vida do País e o que elas mudam para os governantes?
Tudo que aconteceu em junho de 2013 deve servir como uma grande lição para a sociedade brasileira e, sobretudo, para os governantes brasileiros. Habitualmente, costumávamos afirmar que o povo precisava reivindicar sempre, estar sempre no calcanhar dos governantes cobrando as coisas para que não esquecessem os compromissos de campanha. Não aconteceu nada no Brasil nos últimos 40 anos que a gente não estivesse à frente. Fosse o movimento sindical, os partidos de esquerda, a UNE, os Sem Terra… De repente aconteceu uma manifestação que esses setores organizados não estavam à frente. Ela aconteceu quase em uma voz única dizendo ‘nós queremos mais’. Não foi um movimento contra o governo, não foi um movimento em que as pessoas queriam derrubar o governo, mas foi um movimento em que as pessoas diziam ‘queremos mais’, ‘nós queremos mais educação’, ‘nós queremos mais saúde’, ‘nós queremos mais transporte’, ‘nós queremos mais qualidade de vida’. Então, o que eu tenho dito? Que esse movimento fez com que a nossa presidenta, e eu acho que ela teve a sabedoria de dar uma resposta muito imediata, colocando a reforma política como algo fundamental para que a gente possa mudar a situação do Brasil; depois veio a questão da saúde com o Mais Médicos; depois a aprovação de 75% dos royalties para a educação. Ou seja, foram medidas tomadas pela nossa presidenta que mostraram que o governo está num processo de evolução para tentar encontrar soluções para os problemas. Eu acho que foi uma coisa de Deus fazer com que a sociedade se manifestasse e dissesse olha, nós estamos vivos, nós reconhecemos que muita coisa foi feita e nós queremos que seja feito mais. Ao invés de ficarmos lamentando, nós temos que agradecer e começar a trabalhar para que façamos acontecer as melhorias que a sociedade brasileira deseja. Que bom que o povo resolveu dizer ‘estou aqui’. 
Por que, então, apesar das manifestações, a reforma política não avança no Congresso Nacional?
Não é fácil. As pessoas que foram para a rua não votam nas sessões do Congresso Nacional. É importante lembrar que fizemos a campanha das Diretas, que foi um dos maiores movimentos cívicos desse país, em que fomos às ruas por meses com todos os partidos políticos, com o movimento sindical, realizamos centenas e centenas de manifestações pelo Brasil inteiro, toda a sociedade apoiando, e quando a emenda das Diretas chegou ao Congresso não tínhamos número para aprovar e não aprovamos.
Qual a saída, então?
Só teremos uma reforma política plena no dia em que tivermos uma Constituinte própria para fazer uma reforma política. A sociedade comete um equívoco quando acha que o financiamento público tirar dinheiro da União. A forma mais eficaz, honesta e barata de se fazer uma campanha política é você saber que cada voto vale 1 centavo, 1 real, 10 reais e que cada partido vai ter tanto, e que cada partido vai fazer aquilo e que pegar dinheiro privado será um crime inafiançável, para que as pessoas não fiquem subordinadas aos empresários. É muito interessante que algumas pessoas, que se acham as mais honestas do planeta, acham que o financiamento público é corrupção e vai gastar dinheiro público, e não se tocam por que o empresariado brasileiro não está na rua fazendo campanha para que seja pública e parar de dar dinheiro! Oras, é porque interessa a eles cada um construir a sua bancada. Os bancos têm bancada no Congresso Nacional, tem influência, porque cada um tem a lista de quem financia. Quem tiver dúvida disso, saia candidato para ver o que acontece para ver como você se elege no Brasil.
O senhor pode comentar o cenário nacional para as eleições de 2014? 
O problema de fazer uma avaliação de 2014 era que eu precisaria de uma bola de cristal na minha frente. O que eu falar aqui pode ser desmentido em uma semana com o posicionamento de um partido político. Primeiro: eu trabalho com a ideia de que a presidenta Dilma deve fazer um esforço para manter sua base de sustentação. Que essa gente vota no Congresso e que pra Dilma ter alguma coisa aprovada ela precisa de 41 senadores e 257 deputados na Câmara. Se não, não ganha. Não esqueçam que eu fui presidente da República e que meu partido tinha 13 senadores e 80 deputados, de 513. Não tem milagre. Se quiser aprovar as coisas tem que fazer coalizão. Por isso, acho que a Dilma deve manter a base. Quer facilidade, elege a maioria! Temos uma presidenta e eu falo dela com muito orgulho. Vejo as pessoas colocarem defeitos na Dilma, essa história que ela não gosta de conversar. Cada um tem um estilo! O que eu tenho consciência é que poucas vezes no mundo tivemos um presidente tão decente como a Dilma. De caráter, competente e séria. Isso é condição fundamental para o Brasil seguir em sua trajetória de crescimento.
Qual será o seu papel nas eleições?
O meu papel será o papel que a Dilma e o PT desejarem. Farei a campanha como se fosse a minha, isso é o que eu sei fazer e espero estar em condições até lá. Me considero razoavelmente bom de palanque [risos]. Me sinto bem. Por isso agradeço a Deus todos os dias pela relação de confiança que a população construiu comigo. A vitória da Dilma é a minha vitória. O sucesso da presidenta é o sucesso do povo brasileiro. Da ascensão dos mais pobres. É que tem gente que fica incomodado com o sucesso dos mais pobres, que hoje tem acesso às universidades, restaurantes, shoppings, praças e exposições nas bienais. Isso tudo é um gesto ruim, pois acredito que, quanto mais o pobre ascender, melhor será para todos, já que a classe média sobe junto e todo mundo ganha. Quando não tivermos mais miseráveis teremos menos violência, menos assaltos. Afinal, não é isso que nós queremos? Por isso tenho certeza que ela fará um segundo mandato infinitamente melhor que o primeiro. 
E a regulamentação da mídia?
Em 2007, no meu segundo mandato, fizemos a conferência de comunicação. Não andou e eu acho que não foi legal ela não ter andado. Mas não temos que ficar chorando o que já foi. Temos agora a regulamentação da internet no Congresso. Então é importante mantermos a neutralidade nesse tema e eu posso garantir que o debate da mídia vai voltar. Esse é um debate difícil. Basta vermos no Congresso quantos políticos tem concessão de rádio e TV. Tem governador, senador… Geralmente, os meios de comunicação nos Estados, que transmitem a Globo, o SBT, a Bandeirantes, são de políticos.
O senhor já falou da sua preocupação com a Copa do Mundo…
Eu já conversei com muita gente sobre este assunto. E por que estou preocupado com isso? Precisamos ver se a Copa será um evento onde o Brasil fortaleça sua imagem para o mundo ou a gente vai fazer uma Copa fracassada pelos nossos problemas internos. Temos de fazer da Copa Mundo um motivo de orgulho para o País. Eu vi agora, na conquista do Japão com as Olimpíadas e que a conquista era para melhorar a imagem do país. No Brasil é o contrário. É o puro complexo do vira-lata. Por isto estou voltando, com muita vontade, com muita disposição – para felicidade de alguns, para desgraça de outros. É o seguinte: eu estou no jogo.
Da Redação

Confira também áudios e vídeos da entrevista exclusiva.

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva concedeu na última terça-feira uma entrevista coletiva aos veículos da rede de comunicação dos trabalhadores, Tribuna Metalúrgica, TVT, Jornal ABCDMaior, Rede Brasil Atual, Rádio Brasil Atual e Revista do Brasil

Pela primeira vez após ter deixado a Presidência da República, Lula falou sobre os desafios da classe trabalhadora e do sindicalismo, as manifestações de junho, eleições presidenciais e estaduais em 2014, reforma política, democratização dos meios de comunicação e Copa no Mundo.

A classe trabalhadora é a mesma de seu tempo de sindicalista? Eu devo tudo que sou ao alto grau de consciência política que os trabalhadores brasileiros adquiriram. Sei qual era o grau de consciência quando fui eleito presidente do Sindicato, em 1975, ou como delegado de base, em 1969, e sei qual é hoje. A classe trabalhadora mudou. Essa é a verdade. Eu ia à Volks nos anos 1980 e encontrava 44 mil trabalhadores. Hoje tem 13 mil. É um terço daquela época. A empresa mudou. Está mais sofisticada. A gente chamava de peãozada e hoje não pode nem chamar mais de peãozada porque todo o mundo tem um curso técnico ou está fazendo universidade. Mudou o perfil a classe trabalhadora. Hoje existe um crescimento grande nas áreas de serviços, telecomunicações e outros setores que não são mais só industrial, mas, de qualquer forma, sejam trabalhadores do setor primário ou terciário, a classe trabalhadora continua sendo a coisa mais importante na existência de um país. 

Qual é o desafio dessa classe trabalhadora daqui pra frente?

O desafio colocado para classe trabalhadora é pensar se o papel dela agora é o mesmo de antes ou é inovar. Eu posso usar o exemplo mais vivo que conheço que é dos Metalúrgicos do ABC, que conquistou um espaço que não tínhamos nos anos 80. A gente era mais emoção, mobilização e garra. Hoje é muito mais consciência política. Hoje, o presidente do Sindicato, o Rafael Marques, não precisa ir 800 vezes à porta da empresa para parar, fazer uma greve. O Comitê Sindical vai lá e para. Isso é uma evolução, mas aumentou o desafio. Não é só salário, transporte, melhor qualidade de refeição. São outras coisas agora. Precisamos representar os trabalhadores fora do chão de fábrica. Quando ele sai da fábrica, ele continua sendo trabalhador. Eu vou me interessar em levar cultura e transporte para o bairro onde ele mora? Eu vou ficar brigando com o empresário local ou eu vou para o Congresso Nacional aprovar a redução da jornada de trabalho e dar mais tempo de lazer ao trabalhador? Ou lutar pela reforma tributária para que o trabalhador possa pagar menos impostos? 

Isso não seria responsabilidade de todo o movimento sindical?

O movimento sindical precisa fazer um processo de reciclagem para definir quais bandeiras serão necessárias no século 21. Não pode ser a mesma bandeira do passado. Hoje o trabalhador quer ter um computador em casa, ter acesso à banda larga, ter acesso a coisas que não estão na pauta de reivindicações. Vamos ter de evoluir. Só dentro da fábrica não resolve mais. Temos que discutir novas profissões, funções e jornadas de trabalho. E acho que esse desafio é mais grave e difícil que o da minha época. O papel de um dirigente sindical hoje é muito mais complicado do que o meu papel da década de 80. Antes eu ia para a porta da fabrica, na época era ditadura, e ficava meia hora xingando o governo, mais meia hora xingando o patrão e chamava o trabalhador para a briga. Hoje você tem quase pleno emprego no País, dez anos seguidos de aumento real no salário, participação nos lucros, que não tinha na minha época. Se não são essas as prioridades, quais são agora? O sindicato tem de sair do chão da fábrica e fazer outro papel? Estamos em um momento de descobertas de novos desafios do movimento sindical brasileiro. É uma revolução que o movimento sindical tem de encarar. Já fiz algumas discussões com os movimentos sindicais e não é uma tarefa fácil. 

É possível dar exemplos desses novos desafios?

Nos Estados Unidos, na Nissan, os trabalhadores não se sindicalizam e quem não deixa eles se sindicalizarem é o governador do Estado. Senão a empresa vai para outro Estado. É um retrocesso ao século 19. Aqui, para onde foram os metalúrgicos que estavam nas montadoras? Estão terceirizados? A terceirização não vai acabar, temos que regulamentá-la. Dizer o que pode e o que não pode ser terceirizado. Tem de discutir com as centrais sindicais uma mudança na representação para melhorar o atendimento aos trabalhadores. Na França, houve um tempo que não havia representação sindical, quem fazia o movimento de rua eram as ONGs. O movimento sindical vai deixar acontecer isso aqui no Brasil?  

Qual o impacto das manifestações de junho na vida do País e o que elas mudam para os governantes?

Tudo que aconteceu em junho de 2013 deve servir como uma grande lição para a sociedade brasileira e, sobretudo, para os governantes brasileiros. Habitualmente, costumávamos afirmar que o povo precisava reivindicar sempre, estar sempre no calcanhar dos governantes cobrando as coisas para que não esquecessem os compromissos de campanha. Não aconteceu nada no Brasil nos últimos 40 anos que a gente não estivesse à frente. Fosse o movimento sindical, os partidos de esquerda, a UNE, os Sem Terra… De repente aconteceu uma manifestação que esses setores organizados não estavam à frente. Ela aconteceu quase em uma voz única dizendo ‘nós queremos mais’. Não foi um movimento contra o governo, não foi um movimento em que as pessoas queriam derrubar o governo, mas foi um movimento em que as pessoas diziam ‘queremos mais’, ‘nós queremos mais educação’, ‘nós queremos mais saúde’, ‘nós queremos mais transporte’, ‘nós queremos mais qualidade de vida’. Então, o que eu tenho dito? Que esse movimento fez com que a nossa presidenta, e eu acho que ela teve a sabedoria de dar uma resposta muito imediata, colocando a reforma política como algo fundamental para que a gente possa mudar a situação do Brasil; depois veio a questão da saúde com o Mais Médicos; depois a aprovação de 75% dos royalties para a educação. Ou seja, foram medidas tomadas pela nossa presidenta que mostraram que o governo está num processo de evolução para tentar encontrar soluções para os problemas. Eu acho que foi uma coisa de Deus fazer com que a sociedade se manifestasse e dissesse olha, nós estamos vivos, nós reconhecemos que muita coisa foi feita e nós queremos que seja feito mais. Ao invés de ficarmos lamentando, nós temos que agradecer e começar a trabalhar para que façamos acontecer as melhorias que a sociedade brasileira deseja. Que bom que o povo resolveu dizer ‘estou aqui’. 

Por que, então, apesar das manifestações, a reforma política não avança no Congresso Nacional?

Não é fácil. As pessoas que foram para a rua não votam nas sessões do Congresso Nacional. É importante lembrar que fizemos a campanha das Diretas, que foi um dos maiores movimentos cívicos desse país, em que fomos às ruas por meses com todos os partidos políticos, com o movimento sindical, realizamos centenas e centenas de manifestações pelo Brasil inteiro, toda a sociedade apoiando, e quando a emenda das Diretas chegou ao Congresso não tínhamos número para aprovar e não aprovamos.

Qual a saída, então?

Só teremos uma reforma política plena no dia em que tivermos uma Constituinte própria para fazer uma reforma política. A sociedade comete um equívoco quando acha que o financiamento público tirar dinheiro da União. A forma mais eficaz, honesta e barata de se fazer uma campanha política é você saber que cada voto vale 1 centavo, 1 real, 10 reais e que cada partido vai ter tanto, e que cada partido vai fazer aquilo e que pegar dinheiro privado será um crime inafiançável, para que as pessoas não fiquem subordinadas aos empresários. É muito interessante que algumas pessoas, que se acham as mais honestas do planeta, acham que o financiamento público é corrupção e vai gastar dinheiro público, e não se tocam por que o empresariado brasileiro não está na rua fazendo campanha para que seja pública e parar de dar dinheiro! Oras, é porque interessa a eles cada um construir a sua bancada. Os bancos têm bancada no Congresso Nacional, tem influência, porque cada um tem a lista de quem financia. Quem tiver dúvida disso, saia candidato para ver o que acontece para ver como você se elege no Brasil.

O senhor pode comentar o cenário nacional para as eleições de 2014? 

O problema de fazer uma avaliação de 2014 era que eu precisaria de uma bola de cristal na minha frente. O que eu falar aqui pode ser desmentido em uma semana com o posicionamento de um partido político. Primeiro: eu trabalho com a ideia de que a presidenta Dilma deve fazer um esforço para manter sua base de sustentação. Que essa gente vota no Congresso e que pra Dilma ter alguma coisa aprovada ela precisa de 41 senadores e 257 deputados na Câmara. Se não, não ganha. Não esqueçam que eu fui presidente da República e que meu partido tinha 13 senadores e 80 deputados, de 513. Não tem milagre. Se quiser aprovar as coisas tem que fazer coalizão. Por isso, acho que a Dilma deve manter a base. Quer facilidade, elege a maioria! Temos uma presidenta e eu falo dela com muito orgulho. Vejo as pessoas colocarem defeitos na Dilma, essa história que ela não gosta de conversar. Cada um tem um estilo! O que eu tenho consciência é que poucas vezes no mundo tivemos um presidente tão decente como a Dilma. De caráter, competente e séria. Isso é condição fundamental para o Brasil seguir em sua trajetória de crescimento.

Qual será o seu papel nas eleições?

O meu papel será o papel que a Dilma e o PT desejarem. Farei a campanha como se fosse a minha, isso é o que eu sei fazer e espero estar em condições até lá. Me considero razoavelmente bom de palanque [risos]. Me sinto bem. Por isso agradeço a Deus todos os dias pela relação de confiança que a população construiu comigo. A vitória da Dilma é a minha vitória. O sucesso da presidenta é o sucesso do povo brasileiro. Da ascensão dos mais pobres. É que tem gente que fica incomodado com o sucesso dos mais pobres, que hoje tem acesso às universidades, restaurantes, shoppings, praças e exposições nas bienais. Isso tudo é um gesto ruim, pois acredito que, quanto mais o pobre ascender, melhor será para todos, já que a classe média sobe junto e todo mundo ganha. Quando não tivermos mais miseráveis teremos menos violência, menos assaltos. Afinal, não é isso que nós queremos? Por isso tenho certeza que ela fará um segundo mandato infinitamente melhor que o primeiro. 

E a regulamentação da mídia?

Em 2007, no meu segundo mandato, fizemos a conferência de comunicação. Não andou e eu acho que não foi legal ela não ter andado. Mas não temos que ficar chorando o que já foi. Temos agora a regulamentação da internet no Congresso. Então é importante mantermos a neutralidade nesse tema e eu posso garantir que o debate da mídia vai voltar. Esse é um debate difícil. Basta vermos no Congresso quantos políticos tem concessão de rádio e TV. Tem governador, senador… Geralmente, os meios de comunicação nos Estados, que transmitem a Globo, o SBT, a Bandeirantes, são de políticos.

O senhor já falou da sua preocupação com a Copa do Mundo…

Eu já conversei com muita gente sobre este assunto. E por que estou preocupado com isso? Precisamos ver se a Copa será um evento onde o Brasil fortaleça sua imagem para o mundo ou a gente vai fazer uma Copa fracassada pelos nossos problemas internos. Temos de fazer da Copa Mundo um motivo de orgulho para o País. Eu vi agora, na conquista do Japão com as Olimpíadas e que a conquista era para melhorar a imagem do país. No Brasil é o contrário. É o puro complexo do vira-lata. Por isto estou voltando, com muita vontade, com muita disposição – para felicidade de alguns, para desgraça de outros. É o seguinte: eu estou no jogo.

Da Redação