Abolição não foi presente. Ela veio com muita luta
A abolição dos escravos,
em 13 de maio de 1888, insiste
em permanecer no imaginário
popular como o ato
de uma princesa, a Isabel,
boazinha e humana. Essa é a
versão que há décadas a história
oficial reproduz.
A história oficial, no entanto,
não mostra o contexto
histórico que se deu a abolição.
Brasil e Cuba foram os
dois últimos países do mundo
a eliminar a escravatura
como base de um modo de
produção. Bem antes deles,
escravos dos países latinos
americanos conquistaram a
liberdade com guerras e insurreições.
A Guerra da Secessão
(1861-65), nos Estados
Unidos, por exemplo,
cobrou o preço de mais de
um milhão de mortos para
que se encerrasse a escravidão.
No Haiti, uma insurreição
dos escravos negros, expulsou
a bala e a facão os
colonialistas franceses em
1803.
Segundo José Carlos
Miranda, do Movimento
Negro Socialista, no meio do
século 19 já não havia mais
como manter a escravidão no
Brasil. As lutas dos negros tomavam
conta do País, inspiradas
no Quilombo de Palmares.
Nas décadas de 1830 e
1840, o Brasil havia vivido
algumas de suas maiores rebeliões
ou guerras internas. O
norte conheceu as revoltas da
Cabanagem, nome dos negros,
índios e mestiços que
viviam nas cabanas. Eles chegaram
a tomar Belém e a instituir
um governo próprio.
A Balaiada, no Maranhão,
que durou de 1838 a
1841, teve à frente o negro
Cosme, líder de um quilombo,
que comandou cerca de
três mil homens armados em
combates contra as tropas da
monarquia.
Mesmo na Guerra dos
Farrapos, que se estendeu de
1835 a 1845, no Rio Grande
do Sul, quando a elite local
chegou a proclamar a
República do Piratini, os negros
jogaram um papel importante
e conquistaram a
reivindicação de libertação
de todos os negros que lutaram
ao lado de Bento Gonçalves
contra a monarquia.
A luta abolicionista juntou
negros, brancos, mestiços
e mulatos. Teve apoio ainda
dos trabalhadores das ferrovias
e operários gráficos, núcleos
de uma classe operária
ainda em formação. Eles participaram
ativamente do
movimento, escondendo os
negros fugidos e imprimindo
os panfletos anti-escravistas.
Essa história permanece oculta
da maioria dos brasileiros.
Em 1888, quando assinou
a Lei Áurea, a princesa
Isabel estava firmando um
documento de derrota do
Império. O fim da escravidão
também significou o abandono
dos negros. Expulsos das
fazendas não tiveram acesso
ao modo de produção que se
instalava no Brasil. A economia
passou a se desenvolver a
partir de uma abundante
mão-de-obra livre, basicamente
estrangeira, imigrada com
amplo financiamento do Estado.
Aos negros recém libertos
restou a marginalidade.
Para Ana Nice Carvalho,
da Comissão de Combate ao
Racismo dos Metalúrgicos
do ABC, o culto ao 13 de
maio esconde a luta de classes
no Brasil. “É por isto que
nada temos a comemorar
nessa data, porque ela não
celebra uma conquista popular
ou uma transformação
social verdadeira”, afirma.