Acordo Mercosul-União Europeia prejudica o Brasil e os brasileiros

Sindicato e entidades da sociedade civil se manifestam contra o acordo e cobram o parlamento a fazer um amplo debate sobre os impactos da medida

Foto: Divulgação

A Frente Contra o Acordo Mercosul-União Europeia divulgou carta aberta contra a assinatura do acordo de livre comércio entre os dois blocos. Os Metalúrgicos do ABC participam das discussões e assinam o documento junto com entidades da sociedade civil, movimento sindical, social, ambiental, religioso, entre outros.

No documento, a Frente alerta para o aumento da desindustrialização, desemprego, perda de direitos e renda. Também para o agravamento de tragédias sociais ao transformar o direito ao acesso a serviços essenciais como água, energia, saneamento, saúde e educação, em mercadorias, com estímulo às privatizações.

Outro impacto é o ambiental, com mais devastação e queimadas. Na Europa, eurodeputados aprovaram texto em que o acordo não pode ser ratificado como está e citaram preocupação com a política ambiental brasileira.

O acordo foi assinado no meio de 2019 e comemorado pelo governo, mesmo que seja extremamente prejudicial ao país. Para entrar em vigor, precisa ser aprovado pelos parlamentos dos países.

Desde a retomada das negociações, em 2017, o Sindicato se posicionou contra por entender que a União Europeia preserva setores estratégicos da indústria enquanto o Brasil abre mão dessas proteções, isso com base no pouco de informação que existia e da falta de transparência no processo.  

A Tribuna conversou com o economista e assessor da Rebrip (Rede Brasileira pela Integração dos Povos), Adhemar Mineiro. A Rebrip acompanha a política externa brasileira desde 2001 e é formada por entidades sindicais, como a CUT, movimentos sociais, do campo e da cidade, ambientalistas e ONGs.

Foto: Divulgação

Tribuna Metalúrgica –Em resumo, por que ser contra o acordo?

Adhemar Mineiro – O acordo abre poucos mercados nas áreas de produtos agropecuários e mineração aos países da América do Sul, mas por outro lado abre as áreas de indústrias, serviços, compras governamentais para os países da União Europeia. É o que a gente chama de acordo colonial, uma relação de 150 a 200 anos atrás, quando a gente mandava matérias-primas e recebia produtos industrializados. 

TM – Quais os principais impactos?

Adhemar – Mesmo antes do acordo, já vemos que esse tipo de especialização em produção primários tem um enorme custo social do ponto de vista de emprego e renda, por serem tarefas menos remuneradas, que precisam de menos educação.

Por outro lado, gigantescos impactos ambientais avançaram ainda mais em áreas ambientais, quilombolas e indígenas para plantar soja, criar boi. É a história do ministro do meio ambiente de “passar a boiada”.

É um acordo muito perverso ao incentivar os países do Mercosul, o Brasil em especial, a usar suas vantagens competitivas, tem terra barata, água, e produzir produtos de menor valor agregado. O Brasil manda toneladas desses produtos para receber alguns quilos de produtos mais industrializados da Europa.

TM – Como estão as mobilizações entre os países dos dois blocos?

Adhemar – Os europeus, depois de muito tempo, se sensibilizaram e a mobilização começou a crescer, principalmente pelos impactos ambientais, queimadas na Amazônia e no Pantanal. Como o acordo precisa ser aprovado pelos poderes legislativos nos países, a articulação entre as entidades aumentou para que haja discussão com a sociedade, que não teve de fato até agora.

Tem parlamentos nacionais que já vetaram o acordo, como Áustria e Holanda. E tem um nível de resistência que começa a aparecer no Parlamento Europeu. Não negam o acordo, mas dizem que não pode ser aprovado como está formulado. Para a gente mudar alguns pontos não muda a essência do acordo.

TM – Vemos os resultados da falta de políticas e a dependência externa para o combate à pandemia, a alta dos preços no mercado e a falta de insumos para a indústria nacional. O acordo agrava essa situação?

Adhemar – Sim. A pandemia chamou a atenção para bens que tratam como commodities, mas são produtos estratégicos, vimos a guerra por respiradores artificiais, por exemplo. A vacina e os insumos da área da saúde são essenciais e não podem ser tratados pura e simplesmente como mercadoria. Deveria ter autossuficiência ao invés de depender de fora.

É a mesma coisa com os preços nos mercados e a falta de matéria-prima. As empresas vão vender onde o preço está melhor. Já teve esse problema há alguns anos na Argentina, que fez a retenção de carne por lei para garantir o mercado interno. Isso está acontecendo agora, preços subindo de arroz, milho. O Brasil não exporta o que sobra, dá poder ao produtor antes de abastecer aqui. O acordo de livre comércio só reforça esse tipo de comportamento.