Apenas a lei não acaba com a discriminação
Promotor do Trabalho diz que o Brasil tem boas leis, mas elas sozinhas não garantem a promoção da igualdade. "A luta é pelo cumprimento das leis", afirma Raimundo Simão.
“A luta é pelo cumprimento das leis”
Ao participar de debate sobre igualdade racial nas relações de trabalho, o Procurador Raimundo Simão de Mello disse que existem boas leis sobre o assunto, mas que elas em si nada resolvem. O debate aconteceu no dia 29 de março no Centro de Formação Celso Daniel e Raimundo concedeu a seguinte entrevista à Tribuna.
Existem leis e como elas são?
As leis são boas. A Constituição diz que todos são iguais e proíbe a diferença salarial por causa do sexo ou qualquer outro tipo de discriminação. Também a convenção 111 da OIT, assinada pelo Brasil, proíbe qualquer tipo de discriminação.
Então, a lei não é cumprida!
A legislação existe e a luta é pelo cumprimento dela. A lei em si não resolve o problema. É papel da sociedade atuar e cobrar a devida atuação dos órgãos públicos, inclusive do Ministério Público, que é uma espécie de advogado da sociedade. No nosso caso, o Ministério Público do Trabalho iniciou pelo setor bancário de Brasília o combate às discriminações nas relações de trabalho.
Como isso está acontecendo?
Chamamos os bancos e dissemos que havia discriminação dos negros na seleção do pessoal e na ascensão dentro dessas empresas. Mostramos que o número de homens negros e mulheres negras entre os trabalhadores nos bancos era muito menor que os percentuais apontados pelo IBGE na população brasileira. E que quase não havia negro ou mulher nos cargos de chefia.
Qual a reação deles?
Os bancos disseram que não era discriminação, mas uma política interna com critérios. Alegaram que, se havia desigualdade, era uma questão social e não problema dos bancos.
O que o Ministério Público fez?
Entramos com ação coletiva na Justiça do Trabalho para que os bancos contratassem um número de negros e mulheres iguais aos percentuais da população brasileira. As cinco ações já julgadas foram consideradas improcedentes.
Por quê?
A Justiça alegou que esse tipo de discriminação não pode ser considerado um direito coletivo e, por isso mesmo, não era o Ministério Público quem deveria promover a ação. O entendimento é que, se houve discriminação, a ação deveria ser proposta individualmente pela pessoa que a sofreu.
O que fazer agora?
Vamos recorrer ao Tribunal Regional do Trabalho e, se necessário, ao Supremo Tribunal Federal. É um trabalho que vale a pena e os resultados aparecem. Essa denúncia de discriminação nos bancos foi discutida pela Comissão de Direitos Humanos da Câmara Federal. A partir de uma conversa com os deputados, os bancos contrataram uma entidade para fazer levantamento entre os trabalhadores do setor. Além disso, acredito que os bancos devam tomar algumas precauções na seleção dos trabalhadores e nos critérios de promoção.
É um trabalho de longo prazo, não é mesmo?