ArcelorMittal freia plano bilionário de expansão no Brasil

O maior fabricante de aço no Brasil, o grupo ArcelorMittal, do bilionário indiano Lakshmi Mittal, pôs o pé no freio e decidiu ajustar suas operações locais em linha com a demanda. Ao mesmo tempo, vai manter em espera, por tempo indeterminado, seus dois projetos de expansão no país, duas obras avaliadas em mais de US$ 1,5 bilhão, suspensos alguns meses atrás. O motivo é a estagnação da demanda, com a desaceleração da economia.

“Vamos esperar a situação de mercado ter maior firmeza para reiniciar esses projetos”, disse ao Valor, em entrevista por telefone, Benjamin Baptista, presidente da holding ArcelorMittal Brasil e CEO de aços planos do grupo na América do Sul. Para o executivo, com o cenário internacional difícil – crise nos países da zona do euro, desaceleração na China e excesso de oferta mundial de aço – não há como manter o ritmo de “capex” (investimentos).

Sua avaliação é que o cenário hoje não se mostra nada positivo na economia e para a indústria mundial do aço. “Mas, talvez não chegou ainda ao fundo do poço”, comenta Baptista, referindo-se ao desfecho que poderá ter as decisões da crise da Grécia e outros países da União Europeia.

As expansões previstas do grupo no país estão ligadas ao setor automotivo, na área de aços planos, e ao industrial e para exportação, no caso de aços longos. Como a situação mudou muito, falar em aumento de oferta não faz mais sentido, lembrou ele. Para Baptista, o momento é de administrar a oferta com o potencial de demanda.

O projeto de maior envergadura, orçado em US$ 1,2 bilhão, foi paralisado, pela segunda vez e continua na geladeira, Fica em Monlevade, uma das fábricas mais antigas do grupo no Brasil. Depois de atropelado pela crise de 2008/2009, sua montagem foi reativada em 2010 e já se encontrava com todas as obras civis prontas e os equipamentos comprados.

Dados do setor de distribuição de aços planos mostram abril em queda de 10% nas vendas e aumento dos estoques

A expansão previa dobrar a capacidade de produção de fio-máquina, um produto com aplicações industriais (fabricação de pregos, parafusos, arames…). Dependeria no início de colocação o mercado externo, enquanto a demanda doméstica fosse ganhando corpo para a nova oferta. O projeto foi desenhado para levar a usina a 2,4 milhões de toneladas por ano.

Em outro mercado, o de aços planos, com os aumentos de vendas de automóveis e novos projetos de montadoras, a empresa anunciou há pouco mais de um ano nova linha de aço especial para carros na Vega do Sul, filial de Santa Catarina. O objetivo era ofertar mais 600 mil toneladas por ano, com investimento de quase US$ 400 milhões. Por ora, não existe mais esse mercado.

“Com as medidas do governo, nas taxas de juros, no crédito e outras ações, como a de contenção das importações, diretas e indiretas de aço, minha expectativa é que a economia se sustente e possa ter melhoria no segundo semestre”, afirma o executivo. A seu ver, ainda é incerto se o câmbio, outro fator, se firme no nível de R$ 2. Mesmo assim, ainda será cedo para retomar projetos.

Segundo Baptista, a demanda interna de aço plano fechou o primeiro trimestre com retração de 1%. Isso afetou também as concorrentes, Usiminas e CSN, que vieram com resultados deprimentes. Já no setor de aço longo, onde a briga é com Gerdau e Votorantim, observou-se uma situação um pouco melhor: alta de 4%, puxada pela construção imobiliária e por obras de infraestrutura.

Dados do setor de distribuição de aços planos mostraram abril com queda de 10% nas vendas e aumento dos estoques, para além da marca de 1 milhão de toneladas (três meses de vendas da rede). A entrada de aço no país, até o fim de março, cresceram em torno de 25%, levando a participação de material externo direto no consumo aparente para 16%.

Em sua estrutura atual, a ArcelorMittal Tubarão gera um excedente de 3,5 milhões de toneladas de placas

Para manter o equilíbrio de oferta e demanda no mercado mais afetado, o de aço plano, a ArcelorMittal Tubarão, presidida por Baptista, aproveitou para fazer reformas e serviços de manutenção em suas instalações, operando parcialmente. Na usina de Tubarão, ao lado de Vitória (ES), o maior alto-forno está parado desde 17 de abril e só volta no fim de julho, fazendo a primeira reforma em quase 30 anos de atividades ininterruptas.

Quando essa instalação for religada, vai interromper o forno nº 3, de porte similar (3,5 milhões de toneladas de aço bruto/ano), para manutenções de equipamentos periféricos. Seu retorno está previsto para o fim de novembro. A reação do mercado até lá é que vai definir sua volta, ou se para outra vez o forno menor (o segundo da usina), que, desde a crise de 2008, só foi religado em março para ajustar os estoques durante a reforma.

Assim, explica Baptista, a unidade de Tubarão, a maior usina do grupo na América Latina, vai produzir ao ritmo de 4 milhões de toneladas ao longo de 2012, podendo chegar a 5 milhões em dezembro. “Estamos fazendo o volume necessário para abastecer as linhas de produtos laminados da empresa [chapas de aço, com maior valor agregado]”.

Com isso, a exportação de material semi-acabado (placas) foi reduzida drasticamente. Deverá somar 1 milhão de toneladas no ano, a maior parte neste semestre. Com custos elevados devido aos preços do minério de ferro e carvão e cotação de pouco mais de US$ 500 a tonelada, chegando a US$ 600, entregue no porto, na Ásia, tornaram essa operação não econômica.

Especialistas do setor informam que produzir placa para exportação atualmente traz perda até no resultado operacional de algumas empresas. É o caso da ThyssenKrupp CSA, no Rio, com resultado operacional negativo, Na semana passado, a usina foi colocada à venda pela controladora alemã.

Em sua estrutura atual, a ArcelorMittal Tubarão gera um excedente de 3,5 milhões de toneladas de placas, volume que tem como único destino o mercado externo. No futuro, com melhoria no mercado interno e menos competição de importados, admite o presidente da holding, o caminho é converter esse material em chapas no país.

Do Valor Econômico