Arte sem limites

Eliana Zagui, tetraplégica, tem 32 anos e há 30 vive no Hospital das Clínicas de São Paulo. Os limites do corpo, porém, parecem ser proporcionalmente inversos à sua imaginação e perseverança que, como a arte que produz, são vigorosas e sem barreiras.

A Associação dos Pintores com a Boca e os Pés, entidade criada há 50 anos, reúne hoje no Brasil cerca de 30 artistas que não podem fazer uso das mãos para produzir suas obras. Entre eles está Eliana Zagui, 32 anos, vitimada pela poliomelite, que a tornou tetraplégica. A doença, que a acometeu quando tinha apenas dois anos, levou-a a ser protagonista de uma história singular: desde essa idade, e portanto há 30 anos, Eliana vive no Hospital das Clínicas de São Paulo, entre aqueles que considera sua verdadeira família. “Desde o eletricista até o superintendente, cada um deles são meus pais, mães, irmãos, tios, tias, professores…”, avalia. Apesar de todas as limitações impostas pela doença e pelo fato de residir num hospital, a imaginação de Eliana parece ignorar barreiras. Nas telas, nos textos que escreve para o site que mantém, tudo está registrado com o encantamento do ineditismo, desde a primeira visita ao mar até a saída para o cinema. “A cada passeio feito tenho aproveitado viver ao máximo as pessoas, a situação e o que eu mesma me permito dentro das minhas limitações”, explica a artista, que afirma detestar o marasmo, almeja o aprimoramento profissional e aposta no amor como antídoto à discriminação.

Eliana, você conta que foi vitima de poliomielite aos 2 anos de idade e há 26 reside no H.C. Você tem hoje 32 anos, não é? Como ocorreu essa mudança para o hospital e por que foi necessário deixar sua casa? Como você e seus familiares reagiram?

Em janeiro de 2006, completou 30 anos que moro no H.C. e, em março desse ano, completei 32 anos. Por morar no interior, na época nenhuma cidade poderia me dar os cuidados que eu necessitava, inclusive os aparelhos, principalmente uma máquina chamada Pulmão de Aço, que hoje não existe mais no H.C. Enquanto se é criança, tudo é muito diferente, pois tem o mundo da fantasia, das imitações, das descobertas, brincadeiras que hoje em dia não se vê mais, enfim.  Tudo fica no ar enquanto se vive a idade dos 4 aos 10 anos que foi o meu caso, pois nessa época estava na fase das descobertas do por que fazer as coisas com a boca e o quê podia fazer com a boca. Minha maior revolta com a situação de ficar no hospital era ver muitas crianças indo embora e eu ficando; isso me doía muito, se eu era apegada a tal criança chorava desesperadamente ao vê-la indo embora.Quanto aos meus pais, eles sofreram e ainda sofrem muito até hoje, mas mesmo assim não deixaram de viver a vida e por mais que não fosse proposital, acabamos nos tornando estranhos um ao outro por falta de convivência.

Você foi vitima da pólio por falta de vacina?

Não foi por falta de vacina e sim falta de comunicação, conhecimento de quem estava vacinando. Todas as vezes em que meus pais me levavam para ser vacinada diziam a eles que não podiam me vacinar, porque eu estava com febre e garganta inflamada.

Você ainda guarda memórias de sua vida, antes de passar a viver no hospital?

Não tenho memória nenhuma, pois tudo que sei hoje…. foi depois de um bom tempo que criei coragem de perguntar aos meus pais como tudo aconteceu até eu chegar no Hospital das Clínicas-SP.

Como começou a sua história com a pintura e como foi se aperfeiçoando?

Tudo começou com papel e canetinhas coloridas, pois eu adorava passar o meu tempo com o meu caderno de desenho, fazendo meninas e meninos, colocando nomes dos médicos, auxiliares de enfermagem e atendentes em cada menina e menino. Depois pintei um pouco de cerâmica e  fiquei um bom tempo pintando em madeira pirografada, a qual eu preenchia os espaços com tinta e pintava com palito de bambu ou de churrasco