“As Diretas-Já despertaram a minha geração”, diz Wagnão
Desde o golpe militar de 1964, os brasileiros estavam impedidos de exercer o direito legítimo de votar para presidente da República.
Por 20 longos anos, a população havia se calado diante do medo e do terror instaurado pelo regime ditatorial e seus atos que proibiam as manifestações públicas, prendiam e matavam quem ousasse se opor.
Tudo mudou no dia 25 de janeiro de 1984, quando o silêncio foi rompido por mais de 300 mil vozes que entoavam o Hino Nacional, na Praça da Sé, em São Paulo.
Entre as vozes que ecoaram pela Sé, um jovem às vésperas de completar 22 anos, participava do ato que começaria a mudar a história do País.
Filho de família metalúrgica Wagner Santana, o Wagnão, secretário-geral do Sindicato.
Ele participava da campanha pelas eleições diretas, conhecida por Diretas-Já, que mobilizou todo o Brasil com o objetivo de reestabelecer a democracia.
Wagnão contou para a Tribuna como foi o comício pelas Diretas-Já depois de 30 anos.
Tribuna Metalúrgica– Por que você decidiu ir ao comício?
Wagnão – Antes, precisamos recordar como era ser jovem naquela época.
TM – Como era?
Wagnão – Ao contrário da geração antes da minha, nós nunca tínhamos vivido em um regime democrático.
Nem sabíamos o que era isso. Eu nasci e cresci durante a ditadura militar. Ficávamos perfilados no pátio da escola e cantávamos o Hino Nacional, o da Bandeira, sei lá, uns cinco hinos, pelo menos, todos os dias.
Então, para a gente era normal que o País fosse governado pelos militares. Achava queera assim mesmo.
TM – Mas o comício era contra o regime militar? O que mudou para você participar deste movimento?
Wagnão – Tive a sorte de debater com professores no colégio assuntos como liberdade, desigualdade e direitos sociais. Além disso, meu pai era metalúrgico e acompanhávamos as greves, apesar de não nos identificarmos com elas até aquele momento.
O movimento sindical não era a minha realidade, ainda. Só muito tempo depois fui entender o que era direito de greve. Já tinha visto o Lula, em um comício em Santo André. Então eu disse: ‘eu também quero ter o direito de escolher’.
TM – Como soube do comício?
Wagnão – Eu via convocatória de rua e naquela época a imprensa noticiava. Então resolvi ir com dois amigos.
TM – Como estava a Praça da Sé naquele dia?
Wagnão – A praça estava tomada. Cheguei por volta das três da tarde e já não tinha mais lugar. Para conseguir ver alguma coisa tive que subir em uma grade de um prédio no entorno da Sé. Fiquei com uma vista privilegiada. (risos)
TM – Como eram os discursos?
Wagnão – Falavam muito de unidade, apesar das muitas diferenças. Naquele momento a pauta agregava todos em torno desta luta por democracia. Políticos como Montoro, Lula e Brizola, os artistas, militantes…
TM – Que momento você destacaria do ato pelas Diretas?
Wagnão – O momento de maior emoção foi a multidão cantando o Hino Nacional. Os militares diziam, em sua propaganda, que eles eram os defensores da Nação. Quando cantamos o Hino, sentimos que todos nós éramos os verdadeiros defensores da pátria. Aquele amor pelo Brasil, essa coragem de querer construir um País melhor.
TM – Como você definiria aquele momento?
Wagnão – As Diretas- Já despertaram minha geração. O Brasil ideal era aquele que nós iríamos construir.
TM – Você vê alguma semelhança daquele ato com o que aconteceu em junho passado, com a juventude indo às ruas?
Wagnão – Me identifico com a juventude de hoje. Toda geração precisa fazer a sua luta. Queríamos democracia, escolher o presidente da República e hoje a juventude quer saúde, educação e transporte de qualidade. Os motivos não são mais ou menos nobres. Espero que eles consigam, como nós, fazer um País melhor.
TM – Existe alguma diferença daquela época para os dias atuais? O que você destacaria?
Wagnão – O comportamento da mídia. Em 84, a imprensa, os jornais também eram censurados, vigiados, então havia um comprometimento dentro das redações de apoio a nossa causa. Hoje, os interesses políticos dos grupos donos dos jornais, da informação, estão acima dos interesses do Brasil.
Da Redação