As liberdades seletivas
Por Luciano Martins Costa
A crise política em Honduras começa a deixar claras algumas diferenças entre os jornais brasileiros. O uso de expressões como “governo golpista” ou “governo de facto” esclarece o que cada veículo considera como a normalidade democrática ou o desvio institucional. Mas o noticiário deixa muito a desejar no que se refere à necessária orientação do leitor no meio da enxurrada de acontecimentos e declarações.
Uma questão que foge às discussões gerais: se Manuel Zelaya é o presidente de direito, deposto por um ato de força, sua presença na embaixada brasileira em Tegucigalpa não seria um fato favorável à volta da normalidade?
Observando-se os três jornais brasileiros de circulação nacional, que tratam de assuntos gerais, nota-se maior predisposição do Globo em apoiar a posição do governo golpista – ou interino, conforme a tendência de quem vê.
Os títulos das reportagens, o vocabulário empregado e as escolhas dos declarantes mais destacados revelam que o jornal carioca só não aderiu explicitamente ao golpe por causa da crescente truculência do governo comandado nominalmente pelo deputado Roberto Micheletti. Além do mais, os fatos que se sucedem deixam claro, a cada dia, que quem tomou o poder em Honduras foram os militares, cumprindo ordens das mesmas forças políticas que historicamente dominam os países da região.
Os jornais já se referiram eventualmente a uma elite de empresários e famílias influentes que estariam por trás da deposição de Manuel Zelaya, mas ainda não deram nomes aos bois. Talvez porque alguns deles sejam os proprietários da imprensa local, e conhecidos de décadas dos donos da imprensa brasileira.
Na muda
A outra questão que deve estar causando estranheza no leitor atento é a ausência das costumeiras manifestações de indignação por parte da imprensa nacional e latino-americana contra a invasão e depredação da rádio Globo – que não tem nada a ver com a rede brasileira – e do canal 36 de Tegucigalpa.
As emissoras foram ocupadas e destruídas por militares uniformizados, em missão oficial, e tiradas do ar à força.
Passou-se o dia e tanto a Associação Nacional de Jornais como a Sociedade Interamericana de Imprensa, sempre alertas para denunciar os atentados contra a liberdade de informação, se mantinham estranhamente na muda.
Do Observatório da Imprensa