Áudios mostram envolvimento de Bolsonaro em esquema de rachadinhas
Segundo a ex-cunhada de Bolsonaro, o coronel da reserva do Exército Guilherme Hudson era o responsável por recolher o dinheiro dos salários
Gravações inéditas divulgadas nesta segunda-feira (5) pela jornalista Juliana Dal Piva, do UOL, revelam que o presidente Jair Bolsonaro participava diretamente do esquema ilegal de rachadinha na época em que era deputado federal, de 1991 a 2018. Os áudios integram os autos da investigação do Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ) sobre a mesma prática no gabinete do senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ).
Em um dos áudios, a fisiculturista e ex-cunhada de Bolsonaro, Andrea Siqueira Valle, disse que “Jair” demitiu seu irmão André porque ele não entregava a maior parte do seu salário de assessor ao então deputado federal.
“O André deu muito problema porque ele nunca devolveu o dinheiro certo que tinha que ser devolvido, entendeu? Tinha que devolver R$ 6 mil, ele devolvia R$ 2 mil, R$ 3 mil. Foi um tempão assim até que o Jair pegou e falou: ‘Chega. Pode tirar ele porque ele nunca me devolve o dinheiro certo’. Não sei o que deu pra ele”, diz Andrea Siqueira, que é irmã de Ana Cristina Siqueira Valle, segunda esposa de Bolsonaro.
“Não é pouca coisa que eu sei não, é muita coisa, que eu posso ferrar a vida do Flávio, posso ferrar a vida do Jair, posso ferrar a vida da Cristina, entendeu? É por isso que eles têm medo aí e manda eu ficar quietinha, não sei o que, tal. Entendeu? É esse negócio aí”, afirma Andrea em outra gravação.
No áudio, ela fala também sobre o coronel da reserva do Exército Guilherme Hudson, tio de Andrea e de Ana Cristina. Segundo a ex-cunhada do presidente, Hudson era o responsável por recolher o dinheiro dos salários. “O tio Hudson também já até tirou o corpo fora, porque quem pegava bolada era ele. Quem me levava e buscava no banco era ele”, aponta Andrea.
“Na hora que eu estava aí fornecendo também e ele também estava me ajudando, lógico, e eu também tava, porque eu ficava com mil e pouco e ele ficava com sete mil reais, então assim, certo ou errado, já foi. Não tem jeito de voltar atrás”, confessou a ex-cunhada na gravação.
O UOL também teve acesso a uma conversa de outubro de 2019 em que a mulher e a filha de Fabrício Queiroz, Márcia Aguiar e Nathália Queiroz, se referiam ao presidente Bolsonaro como “01”. “É que ainda não caiu a ficha dele [Queiroz] que agora voltar para a política, voltar para o que ele fazia tão cedo… esquece. Bota anos para ele voltar. Até porque o 01, o Jair, não vai deixar. Tá entendendo? Não pelo Flávio, mas enfim. Ele ainda não caiu essa ficha não. Fazer o quê? Eu tenho que estar do lado dele”, afirma a esposa de Queiroz.
O áudio teria sido em resposta a uma mensagem de Nathália, filha de Queiroz, que o chamou de “burro” por continuar fazendo as articulações. Esses áudios seriam do período em que o ex-assessor de Bolsonaro ficou escondido na casa do advogado da família, Frederick Wassef, em Atibaia, no interior de São Paulo.
Procurado pela reportagem do UOL, o advogado Frederick Wassef, que representa o presidente, negou ilegalidades, afirmou que existe uma antecipação da campanha eleitoral de 2022 e que se trata de uma “gravação. O advogado alegou que os fatos narrados por Andrea “são narrativas de fatos inverídicos, inexistentes”, que “jamais existiu qualquer esquema de rachadinha no gabinete do deputado Jair Bolsonaro ou de qualquer de seus filhos”e que se trata de “gravação clandestina à qual não tenho acesso, não conheço o conteúdo e não foi feita perícia”.
Já os advogados que representam Flávio Bolsonaro no caso da rachadinha emitiram nota afirmando que “gravações clandestinas, feitas sem autorização da Justiça e nas quais é impossível identificar os interlocutores não é um expediente compatível com democracias saudáveis”. A defesa de Queiroz e de sua esposa não teriam respondido aos questionamentos da reportagem, e o advogado que defende Ana Cristina Valle e sua família, além de Guilherme Hudson, informou que seus clientes decidiram não se pronunciar.