Aumento da demanda, crise global e falta de investimento nacional agravam crise dos semicondutores no Brasil

Sem produção nacional, país segue dependente, principalmente dos fabricantes asiáticos, que não dão conta da demanda. Fábricas na base estão com produção reduzida e Sindicato busca alternativas para manter empregos

A indústria automotiva no Brasil e em todo o mundo vem sofrendo com a falta de semicondutores (insumos para fabricação de chips) desde o início da pandemia. Mas não só ela, já que os chips estão ainda mais presentes nos aparelhos voltados à comunicação, que tiveram sua demanda aumentada durante esse período.

No fim dos nos 1980, um carro produzido no país tinha em média entre 10 a 15 semicondutores. Hoje modelos médios chegam a ter cerca de 300 chips. O Brasil, que não tem produção nacional, segue dependente dos países asiáticos, principais fabricantes que não conseguem dar conta de abastecer o mercado global.

Produção de veículos prejudicada

De acordo com estimativas da Anfavea (Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores), neste ano 300 mil unidades devem deixar de ser produzidas no Brasil por falta do componente eletrônico. A previsão para o crescimento do setor está entre 6% e 10%.

Porém, a perspectiva anterior era de alta de mais de 20%. Até outubro, foram fabricados 1,82 milhão de veículos, uma evolução de 16,7%. Em outubro, no entanto, a produção de veículos caiu 24,8% em relação ao mesmo período de 2020.

Causas da Crise

De acordo com a subseção do Dieese, a pandemia causou interrupção na demanda de vários produtos e serviços, e ocasionou também uma ruptura no funcionamento de diferentes cadeias produtivas. Com o processo de retomada da atividade econômica, a partir já da virada do ano, houve uma rápida elevação de demanda por eletrodomésticos, computadores e sistemas de monitoramento, que não consegue ser atendida pelos fabricantes de semicondutores.

Outra questão é que os chips mais em falta no mercado são os de tecnologia mais simples, geralmente usados em automóveis. Porém, o setor tem focado na fabricação de chips mais elaborados, necessários para equipamentos com 5G e servidores, por serem mais lucrativos.  Além disso, a crise de oferta aumentou bastante por conta da guerra comercial entre EUA e China, principalmente durante 2020.

As previsões indicam que a escassez deve seguir até o final de 2022, início de 2023.

Falta de política industrial

O diretor executivo do Sindicato, presidente da Agência de Desenvolvimento Econômico do Grande ABC e do Industriall-Brasil, Aroaldo Oliveira da Silva, destacou a preocupação com as fábricas da região e a falta de política industrial do atual governo.

“Temos acompanhando esse debate, cada discussão nas fábricas, e nos preocupamos com o impacto, principalmente em relação aos empregos. Avaliamos que esse é o resultado da falta de política industrial e falta de estratégia do governo”.

Foto: Adonis Guerra/SMABC

O dirigente lembrou que no governo Lula teve início um projeto para desenvolvimento de semicondutores no Brasil, na Ceitec, no sul do país, empresa pública vinculada ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações. Mas que essa única experiência brasileira está sendo fechada pelo governo Bolsonaro.

“Com o que vínhamos acumulando, poderíamos dar passos para o futuro, já que esse campo é muito vasto, mas estamos passando por um retrocesso nesse momento. Bolsonaro, além de não ter nenhuma política para indústria nacional, ainda está matando o que existe”, criticou.

Aroaldo lembrou que o Brasil tem produtores de semicondutores, porém muito pequenos, por isso é necessária uma política de médio e longo prazo.

“Quando elaborado no governo Lula, com continuidade no governo Dilma, foi pensando nessa transformação do processo produtivo, sobre a conectividade quando todo aparelho terá chips. Foi identificado que era preciso desenvolver minimamente uma cadeia no Brasil. Mas Bolsonaro não está atento a isso, ao contrário, ele corta a verba do Ministério da Ciência e Tecnologia”.

Além da crise dos semicondutores, ressaltou Aroaldo, o país sofre com o desabastecimento de outros insumos e peças por conta do incentivo do atual governo ao desmonte de várias cadeias produtivas.

Situação na Base

Montadoras

Volks:  1.900 trabalhadores estão em layoff desde o início desde mês, a situação pode durar até cinco meses. A montadora está operando em um único turno e o Sindicato segue construindo acordos com os trabalhadores terceirizados para atravessar a crise.

Mercedes: houve algumas paradas durante o ano prejudicando o volume de produção. Outras ainda estão previstas até o final de 2021.

Scania: Está sendo utilizado o acordo de jornada flexível com revezamento de grupos de trabalhadores. A fábrica, que operava em dois turnos, hoje mantém apenas um.

São Bernardo

As autopeças tiveram sua produção diminuída por conta da redução da demanda das montadoras. Para evitar demissões, o Sindicato tem utilizado alternativas como banco de horas e férias coletivas.

Diadema

Várias empresas que atendem as montadoras estão com a produção reduzida e o Sindicato tem buscado formas de evitar demissões, como o layoff. A GL de eletroeletrônico, por exemplo, utilizou o banco de horas.

Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra

Todas as fábricas que atendem a cadeia automotiva de carros tiveram sua produção reduzida. Especialmente as que atendem Volks, GM e Fiat. O Sindicato está buscando alternativas como layoff, trocando feriado, banco de horas para não prejudicar o trabalhador. Além da falta semicondutores, há também problema de matéria-prima que chegam com atraso.