Bancada empresarial no Congresso não vai dar sossego
O (ainda) presidente da Câmara, Henrique Alves, pode levar o PL 4.330 a votação em novembro, como quer Mabel, seu autor
Lobby dos que querem escancarar o emprego irregular da terceirização pretende voltar à ofensiva ainda este ano
Fechadas as urnas, o Congresso Nacional pode reabrir a caixa de maldades. O Projeto de Lei 4.330, que se propõe a regular a prática da terceirização em todos os ramos de atividade, pode ser posto em votação já no mês de novembro.
Quem fez o prognóstico foi o próprio deputado federal Sandro Mabel (PMDB-GO), autor do projeto, que tramita na Câmara há dez anos e jamais obteve consenso para ser aprovado na Comissão de Trabalho da Casa. Mas mesmo quando não passa por uma comissão especial, o presidente da Câmara pode levar o projeto a votação diretamente ao plenário. E é o que o presidente HenriqueEduardo Alves (PMDB-RN) vai fazer, garante Mabel. A informação saiu durante seminário promovido pela Confederação Nacional da Indústria no início de setembro.
A reunião foi uma reação a um outro seminário, promovido semanas antes pelas centrais sindicais e pelo Fórum Permanente em Defesa dos Direitos dos Trabalhadores Ameaçados pela Terceirização, com a finalidade de manter as entidades de trabalhadores antenadas com as movimentações das bancadas empresariais no Congresso. No evento dos empresários, ficou explícita a intenção de retomar seu lobby no Legislativo tão logo fossem encerradas as eleições de 5 de outubro. A procuradora Carolina Mercante, do Ministério Público do Trabalho deSão Paulo e integrante do fórum, acompanhou o seminário como ouvinte. E contou à repórterAnelize Moreira, da Rádio Brasil Atual, o que ouviu no encontro.
Carolina manifesta preocupação com a disposição revelada no seminário de que os empresários desencadeiem um corpo a corpo em seus estados e procurem os parlamentares sob sua influência para que encaminhem a votação do PL 4.330. O projeto atenderia aos interesses dos empresários por trazer “segurança jurídica” a práticas irregulares de contratações terceirizadas que acabam sendo contestadas na Justiça do Trabalho. No ano passado, um esforçopara que fosse levado a votação acabou frustrado diante da reação do movimento sindical, especialistas e organizações de magistrados da esfera trabalhista.
“Trata-se de um projeto muito polêmico porque permite a terceirização em qualquer atividade empresarial, em qualquer setor. Ou seja, permitiria a um hospital terceirizar médicos, ou a uma universidade terceirizar professores, ou banco terceirizar atividade bancária. O projeto viabiliza a terceirização sem limites. E, na visão dos empresários ali presentes, seria muito favorável por trazer o que eles chamam de ‘segurança jurídica’”, diz a procuradora.
Segundo ela, a opção por votar após as eleições elimina o “custo político” dos parlamentares ao decidir sobre o assunto. “Se votassem em julho, fatalmente haveria um impacto negativo nas candidaturas. Em novembro não há esse risco.” Carolina observa ainda que, numa hipótese de a oposição se eleger, diminui a chance que o presidente eleito teria mais adiante de exercer seu poder de veto sobre uma decisão do Congresso ruim para os trabalhadores. “É um grande perigo.”
O PL 4.330 está no Congresso desde 2004. Ao começar a transitar pela Casa, foram feitas diversas tentativas de discussão quadripartite – com representantes de Legislativo, Executivo, empresários e trabalhadores –, com objetivo de se chegar a um texto consensual, que assegurasse a dita “segurança jurídica” pretendida pelos empresários, desde que se eliminassem os aspectos mais nocivos aos trabalhadores.
Da forma como está, a prática da terceirização beneficiaria apenas os patrões, ao reduzir custos e aumentar lucros. Segundo pesquisa do Dieese, trabalhadores terceirizados ganham 27,5% menos do que o empregado contratado diretamente.
A procuradora Carolina Mercante alerta que a aprovação do PL 4.330 diminuiria a capacidade de fiscalização por parte de órgãos públicos. A Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra) também integrou o movimento de setores sociais que impediram a votação de ir adiante, no ano passado. Para a entidade, o projeto embute nada menos que uma reforma trabalhista e sindical.
“Alterando a legislação do trabalho no Brasil com 15 artigos que nos iludem e quatro que destroem tudo o que já foi construído em termos de garantias para os trabalhadores”, afirmou na ocasião o diretor legislativo da Anamatra, Fabrício Nogueira.
Da Rede Brasil Atual