Carta ao Leitor|As saúvas do mercado

José Chiese, 82 anos, aposentado rural da região de Embu-Guaçu (SP)

 
Parece incrível para um país com tantas carências e
injustiças ainda por corrigir, mas a existência da Previdência pública
por aqui faz do Brasil uma raridade mundial entre os chamados
emergentes no quesito proteção social. De acordo com a Pesquisa
Nacional por Amostra de Domicílios do IBGE, metade das crianças de até
10 anos vive abaixo da linha de pobreza. O mesmo acontece com 30% das
pessoas de 20 a 45 anos. Já entre a população idosa, os maiores de 65
anos, cerca de 10% estão numa situação familiar com renda média abaixo
de meio salário mínimo por morador do domicílio. Sem as aposentadorias
e pensões, a fatia dessa população idosa que estaria abaixo da linha de
pobreza saltaria para 70%. Ou seja, a Previdência Social é garantia de
condições básicas de vida para milhões de famílias brasileiras.

O
Brasil tem muito com que se preocupar. Com aquelas crianças do
parágrafo acima. Com uma reforma política que fortaleça os partidos, a
democracia participativa e elimine os cânceres que corroem confiança do
povo na política – e quem sabe tire dos congressistas o direito de se
autoconcederem aumentos salariais à revelia dos sacrifícios do restante
da sociedade. Com a aceleração do crescimento econômico movido a
redução de desigualdades.

A
Previdência Social não pode ser vista como mera fonte de gastos
públicos, como têm feito alguns setores empresariais e da mídia, que
azucrinam por uma “reforma”. Antigamente, brincava-se que as saúvas
atrapalhavam o Brasil; para os burocratas de planilha, agora é a
Previdência.

O Brasil precisa de
fato pensar hoje nos desafios a superar para garantir, no futuro, a
manutenção e a ampliação dos direitos relacionados a sua seguridade
social e para que mais brasileiros tenham acesso a uma rede de proteção
maior e melhor. Mas toda a sociedade tem de se apropriar desse debate,
para que os ideólogos do deus-mercado – nada aventureiros – não o
façam.