Cinema Nacional|Só falta a massa

O cinema brasileiro é bem servido de recheio. É rico em diversidade,
criatividade e tem personalidade. Mas ainda enfrenta os obstáculos da
distribuição e busca novos atalhos para se exibir ao grande público

Por Guilherme Bryan

Falta tela
Nesse multiplex em São Paulo, apenas uma das
12 salas exibia filme nacional no início
do ano

O cinema nacional ainda sofre para entrar em cartaz e
está esperançoso de que algumas novidades aprovadas no final do ano
possam ajudar a mudar essa cena. Mais que melhorar o potencial de
produção, é preciso aumentar a chance de chegar ao espectador, para que
ele mesmo confira nossa crescente qualidade. Uma das mudanças está no
Fundo Setorial do Audiovisual, que oferece novos mecanismos de fomento
à atividade, em conjunto com a antiga Lei de Incentivo à Cultura
(Rouanet, de 1991), que continuará sendo utilizada por empresas ou
pessoas físicas interessadas em apoiar curtas-metragens, documentários
e séries para TV com até três episódios. O estímulo vai da dedução
fiscal à possibilidade de o investidor tornar-se cotista do direito de
comercialização da obra.

“O
Fundo Setorial do Audiovisual receberá o imposto cobrado de todas as
produções audiovisuais brasileiras e importadas. O recurso, que antes
era recolhido para o caixa do governo, agora retorna diretamente para a
atividade, com a inovação de ser utilizado não só na produção, mas
também na distribuição e exibição”, explica Leopoldo Nunes, diretor da
Agência Nacional do Cinema (Ancine).

Para
Carlos Gerbase, um dos sócios da Casa de Cinema de Porto Alegre, o
fundo é uma iniciativa boa para aqueles que não têm trânsito tão livre
com as empresas, seja por realizarem algum tipo de trabalho mais
alternativo, seja por ainda não serem conhecidos. “Dificilmente fazemos
um filme financiado de um jeito só. Muitas vezes você ganha um concurso
do BNDES, outro da Petrobras, aí consegue uma grana pela Lei do
Audiovisual e mais um pouco pela Lei Rouanet. É uma espécie de
quebra-cabeça até completar o orçamento. A lei pode ser mais uma
possível entrada de recursos. O modelo de financiamento da produção até
que tem funcionado razoavelmente, apesar de já ter sido melhor. Mas o
de distribuição e exibição está falido”, alerta Gerbase. Cerca de 80
produções são finalizadas por ano sem que as bilheterias acompanhem
esse ritmo.

“Em 1982, a produção
nacional ocupou a taxa recorde de 32% do mercado interno. O governo
Collor (1990-1992) desmantelou a estrutura do cinema, extinguiu a
Embrafilme e assistiu ao número de salas despencar de 3.500 para cerca
de 600”, observa o crítico Sérgio Rizzo. Em 2005 e 2006, pouco mais de
12% dos ingressos vendidos foram de um filme nacional. “Ainda é pouco
em relação à virada dos anos 70 para os 80”, avalia Rizzo. “O grande
público do cinema brasileiro sempre foi o povo, as classes C, D e E.
Essa faixa não vai mais ao cinema, porque não há salas para ela.” O
recorde da retomada do cinema nacional pós-Collor foi em 2003, 21%,
quando Carandiru foi visto por 4,6 milhões de espectadores, bilheteria
só superada pelos 12 milhões de Dona Flor e Seus Dois Maridos (1976).

Cota de exibição

Diante disso, parece um contra-senso a nova Cota de Tela definida pelo
governo federal para este ano. Cinemas de apenas uma sala estão
obrigados a passar filmes brasileiros por 28 dias, contra 35 do ano
passado. Os de duas salas devem exibir produções nacionais por 70 dias,
contra 84. Os de três salas devem fazê-lo por 126 dias, eram 147 em
2006. E os de quatro, 196 dias, contra 224. Já para os cinemas com
cinco a oito