Clipping 22 de outubro
Manchetes
Populismo fiscal de Guedes leva a crise e baixas na Economia (Folha de SP)
Guedes fala em ‘licença para gastar’ R$ 30 bi fora do teto (Estadão)
Secretários de Guedes se demitem após manobra para elevar teto de gastos (O Globo)
Drible no teto de gastos leva a debandada na Economia (Valor)
Automotive Business
Montadoras temem prejuízo com nova lei de emissões, que pode ser adiada
Prevista para janeiro, norma inviabilizaria venda de automóveis que estão semiacabados nos estoques das fábricas
A falta de componentes que tem provocado paradas de produção nas montadoras acendeu mais um sinal de alerta na Anfavea, a entidade que representa as fabricantes. Afora a questão do abastecimento, o tema da vez que preocupa está ligado à transição das fases L6 para L7 do Programa de Controle da Poluição do Ar por Veículos Automotores (Proconve), que deverá ocorrer a partir de 1º de janeiro no segmento de automóveis e comerciais leves.
Segundo o texto do programa, após esta data as montadoras devem produzir apenas modelos que já atendam às exigências da fase L7. Acontece que o estoque alto tanto de veículos L6 montados parcialmente nos pátios das montadoras, como o de componentes que atendem a esta especificação prestes a perder vigência, podem configurar prejuízo às fabricantes.
“Ninguém sabe ainda o que fazer com esse estoque, que ganhou proporção nos últimos meses, porque o texto da norma do Proconve não previa um evento como este, de falta de peças e aumento dos estoques”, disse à reportagem uma fonte ligada às montadoras. “Do jeito que está, corre o risco de as fabricantes virarem o ano com veículos e peças que não podem mais comercializar.”
Na transição da fase L5 para a atual, houve um dispositivo no texto da lei chamado estoque de passagem, ou seja, as concessionárias puderam vender veículos L5 por um prazo que ultrapassava a data limite estipulada pelo Proconve. Neste caso, explicou a fonte, o estoque está concentrado apenas nas fábricas, e não há regra que contemple este tipo de cenário.
Preocupação na Anfavea
Dentro da Anfavea a situação preocupa e deve configurar em alguma medida em breve, afirmou a fonte. O que deverá ser feito nas próximas semanas é uma avaliação do volume de estoque L6 nas fabricantes. Caso ele seja alto, o fato será considerado setorial e, portanto, virará um pleito da entidade associativa, que deverá, segundo a fonte ouvida, pedir na esfera federal que seja considerado o inventário e, assim, que sejam feitas alterações no texto da resolução da fase L7 do Proconve.
Em caso de os volumes serem considerados baixos e pontuais em algumas montadoras, a medida deverá se tornar um pleito individual, com as montadoras em situação mais grave buscando alternativas no Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) por meios próprios.
Assunto pode parar em Brasília
Considerando o número de empresas que já sinalizaram problemas com falta de peças em suas linhas, é provável que o tema seja levado à Brasília (DF) como uma pauta do setor. Vale lembrar que no segundo semestre cresceram os casos de montadoras que anunciaram algum tipo de ajuste na produção por falta de componentes, muitas delas em fábricas que produzem modelos em plataformas antigas, como a Volkswagen em Taubaté (SP), onde produz os modelos Gol e Voyage, e a Stellantis em Betim (MG), onde são produzidos os veteranos Fiat Uno, Grand Siena e Dobló.
“Há muitos veículos incompletos que ainda não foram incluídos no estoque”, afirmou Luiz Carlos Moraes, presidente da Anfavea, durante apresentação do balanço da indústria em setembro.
A resolução nº 492 de 2018 estabeleceu patamares de emissões de certos gases por veículo, como o óxido de nitrogênio (NOX), o monóxido de carbono (CO), metano (CH4) , hidrocarbonetos não-metano (NMHC), dióxido de carbono (CO2), amônia (NH3), dentre outros.
A nova fase do Proconve para veículos leves já havia sido tema de discussão na Anfavea no ano passado. Naquela oportunidade, contudo, as fabricantes defendiam a prorrogação dos prazos de vigência alegando atrasos no desenvolvimento de novas tecnologias por causa da pandemia de covid-19 e seus reflexos no fluxo de trabalho dentro das montadoras.
Automotive Business
Anfavea: “Brasil não pode ir à conferência do clima enquanto taxa carros elétricos”
Na visão de Luiz Carlos Moraes, presidente da Anfavea, país precisa começar 2022 com o sistema tributário adequado a novas tecnologias de propulsão
O presidente da Anfavea (Associação dos Fabricantes de Veículos), Luiz Carlos Moraes, voltou a defender a redução no imposto de importação para carros elétricos ou a hidrogênio. A NCM (Nomenclatura Comum do Mercosul) que estabelece em até 7% o imposto para esses veículos vence em dezembro e, caso não seja renovada, as alíquotas subirão para 35%.
“Estamos trabalhando com o governo e a Sindipeças (entidade que representa os fabricantes de autopeças) e esperamos resolver isso o quanto antes para começarmos 2022 com um sistema tributário mais adequado. O Brasil não pode ir para a COP26 taxando novas tecnologias [mais sustentáveis]”, disse Moraes, durante o 10º Simpósio da SAE Brasil, citando a Conferência das Nações Unidas para Mudanças Climáticas, que acontece entre outubro e novembro deste ano.
O executivo afirma que o governo precisa ser ambicioso e dar mais atenção à indústria automobilística para acelerar a descarbonização do transporte. “Precisamos parar de pensar apenas na arrecadação e enxergar o tema com um olhar mais amplo, do ponto de vista da sociedade, da economia e do meio ambiente”, disse o presidente da Anfavea. “Reduzir o imposto de importação, conforme a eficiência energética do veículo, vai estimular os consumidores e atrair esse mercado enquanto não temos condições para produzir localmente.”
Segundo um estudo recente da Anfavea e do BCG (Boston Consulting Group), com o desenvolvimento dos pilares certos para a descarbonização do transporte (regulação e incentivos, investimentos, tecnologias, infraestrutura e análise do custo total de propriedade), em 2035, 62% dos veículos novos vendidos no Brasil terão algum grau de eletrificação. Para isso, seriam necessários investimentos de R$ 14 bilhões no setor nos próximos anos, além da melhoria da eficiência energética do país para atender a demanda de consumo para recarga. Do contrário, no ritmo atual, em 15 anos apenas 32% dos novos veículos seriam eletrificados.
O presidente da associação também voltou a defender a renovação da frota de caminhões e apontou a eletrificação de veículos pesados como um caminho para acelerar a descarbonização. “Estamos bastante esperançosos que nas próximas semanas seja discutido com o governo, finalmente, depois de 20 anos, o projeto piloto para a renovação da frota de caminhões”, afirmou Moraes. “Se não atacarmos a frota velha, não vamos ter uma redução substancial das emissões CO2 no Brasil.”
AutoIndústria
Motor híbrido a etanol é só uma das opções da Toyota para o Brasil
Masahiro Inoue, presidente da empresa, afirma que toda a futura linha nacional será eletrificada
A Toyota foi a primeira montadora a apostar em um motor híbrido flex e que pode utilizar etanol. Lançou a tecnologia no Corolla, em 2019, e a replicou no SUV Corolla Cross, seu mais importante lançamento este ano. O próximo produto a ser fabricado localmente, em 2022, também utilizará a mesma solução, já antecipou a empresa.
Em entrevista exclusiva ao AutoIndústria nesta quinta-feira, 21, Masahiro Inoue, presidente da montadora na América do Sul e Caribe, assegurou que paulatinamente todos os veículos da marca produzidos no Brasil terão algum nível de eletrificação.
A não ser que o mercado mude radicalmente, a Toyota tem como prazo e ritmo para a substituição dos motores exclusivamente a combustão por unidades eletrificadas o próprio ciclo de vida dos atuais modelos, estimado em torno de seis anos por Inoue.
Assim, o substituto ou a próxima geração do Yaris, lançado aqui em 2018 e já portanto com meia-vida percorrida, necessariamente terá algum nível de eletrificação. Mais um modelo híbrido a etanol também? Não obrigatoriamente, afirma o presidente da Toyota.
Embora acredite que hoje essa tecnologia é a melhor opção para automóveis brasileiros mais limpos e com custo produtivo assimilável pelo mercado regional, a montadora pode lançar mão de outra solução já disponível globalmente ou ainda em desenvolvimento.
Dentre elas estão, por exemplo, motores totalmente movidos a bateria, os veículos BEVs, ou os híbridos plug-in, os PHEV. “A Toyota Motor Company tem várias tecnologias na prateleira”, lembra Inoue, reforçando que a escolha cabertá às operações regionais.
Um um carro como o Mirai, modelo elétrico movido a célula de combustível de hidrogênio, hipoteticamente não estaria descartado, caso atendesse a equação demanda e custos produtivos regionais.” Mas veículos a célula de combustível e BEVs são mais viáveis hoje na Europa, China e Estados Unidos. Não uma solução para todo o mundo.”
Os motores híbridos, entende Inoue, seriam assim uma etapa possível e intermediária no processo de eletrificação da frota de países da África, Ásia e América Latina. O Brasil, em especial, inclusive por já ter desenvolvido a cultura e infraestrutura de um combustível renovável mais limpo e renovável, como o etanol derivado da cana-de-açúcar.
“Precisamos utilizar muito ainda todo esse conhecimento e estrutura de distribuição que foram acumulados ao longo de tantos anos”, pondera Inoue, que também comanda as ações para que a operação sul-americana alcance a neutralidade na emissão de carbono até 2035, como determinado mundialmente pela matriz.
No curtíssimo prazo, sua preocupação é outra: assegurar que as cinco plantas da empresa no Brasil e Argentina sejam minimamente impactadas pela crise mundial de componentes eletrônicos e consigam dar conta dos pedidos do mercado interno e exportação. “A demanda existe. O problema é atender”, alerta o executivo, que, entretanto, diz já ter identificado alguma melhora do fornecimento nas últimas semanas.
À frente da operação regional desde abril de 2019, Inoue calcula que, não fosse pela redução da produção motivada pela escassez de componentes, o mercado brasileiro poderia ter chegado em 2021 além dos 2,25 milhões agora esperados. Talvez a até 2,5 milhões, volume que ele agora projeta para 2022, caso os cenários interno e global não se alterem novamente.
Valor
O carro do futuro: ‘smartcar’ é a extensão de onde moramos, trabalhamos e nos divertimos
A bordo, já é possível agendar compromissos, ouvir audiolivros, pedir comida, reservar restaurante – e as transformações só começaram
Quase ninguém, hoje, imagina ter um celular só para fazer ligações. O aparelho passou por um profundo processo de transformação e, agora, também é usado para enviar mensagens instantâneas, navegar na internet, ver filmes, ouvir música, fazer transações bancárias. Serve até de lanterna. Em alguns anos, as pessoas terão a mesma sensação em relação ao carro.
À medida que evolui, o automóvel assume funções que o tornam muito mais que um meio de transporte. A bordo, já é possível agendar compromissos, ouvir audiolivros, pedir comida, reservar restaurante – e as transformações só começaram. É uma rota irreversível: o “smartcar” será uma extensão de onde moramos, trabalhamos e nos divertimos. “O interesse pela conectividade aumenta cada vez mais. As pessoas se acostumaram com a praticidade de o celular fazer tudo por elas. E querem, agora, que o carro também faça”, afirma o diretor-geral da Volvo Car, João Oliveira.
No futuro, diz o executivo, um carro econômico e com bom desempenho não estará fazendo nada “além da sua obrigação”. Para manter o automóvel na posição de objeto de desejo, a indústria terá de se empenhar muito mais para atender às novas demandas do consumidor.
A Porsche planeja investir mais de €1 bilhão em dois alvos considerados essenciais: eletrificação e digitalização. Este último ficará com 80% dos recursos. “Potência e design ainda são apelos fortes num carro, mas a indústria precisa se dedicar às novas gerações, que demonstram habilidade com a conectividade cada vez mais cedo”, afirma o presidente da Porsche Brasil, Andreas Marquardt.
Um episódio ocorrido quatro anos atrás nos Estados Unidos chama a atenção, diz Marquardt. Um garoto de 8 anos de idade, morador de Ohio, dirigiu um automóvel por 2,5 km para levar a irmã, de 4 anos, até o McDonald’s. Ao ser questionado como aprendera a dirigir, o menino respondeu: assistindo a vídeos do YouTube. A história, afirma o executivo, ilustra como a conectividade influencia as novas gerações e torna qualquer aprendizado mais precoce.
Há sinais claros de que a tecnologia está se tornando determinante na hora de o consumidor escolher seu automóvel. Nos Estados Unidos, 55% das pessoas interessadas em trocar o carro afirmam levar esse fator em consideração, segundo levantamento da empresa de pesquisa GfK. Seis em cada dez compradores dão especial atenção à integração do veículo com assistentes digitais que já usam em casa ou no celular, como Alexa, da Amazon, e Google Home.
De maneira geral, para acessar seus aplicativos de dentro do carro, hoje, o consumidor precisa conectar seu smartphone ao automóvel por cabo USB ou espelhamento via Bluetooth. Para isso, usa o pacote de dados do celular. Mas as montadoras já estão incluindo chips em seus veículos para fazer com que a conexão seja feita por intermédio do próprio automóvel.
A Volvo começou a lançar modelos em que o usuário pode acessar todos os seus aplicativos sem precisar do smartphone. O carro sai com um pacote de dados ilimitado, sem custo adicional, durante um período de quatro anos.
A BMW já tem 65 mil carros conectados no Brasil e planeja chegar ao fim do ano com 70 mil. A empresa criou um sistema próprio, com recursos de navegação e concierge, que é atualizado a distância. A companhia arca com o custo do pacote de dados por três anos. A renovação pode ser feita diretamente com montadora. “No passado, a indústria automobilística era basicamente hardware. Hoje, também é software”, diz João Veloso, diretor de comunicação do grupo BMW.
Essa abordagem mostra o quanto o setor automotivo fica cada vez mais parecido com o de tecnologia. Com a nuvem computacional, o consumidor não precisa ir a uma loja para comprar um pacote de software, como ocorria no passado. Ele pode fazer uma assinatura e ter, sempre, a versão mais atualizada. Em alguns casos, a atualização é gratuita. Foi o que a Apple fez com sistema operacional iOS, do iPhone, em setembro, e a Microsoft, com o Windows, no início de outubro.
Para a indústria do carro, o avanço da digitalização abre perspectivas de negócios, principalmente na área de serviços, o que está impulsionando a busca de parcerias com empresas de tecnologia. Há pouco tempo, a General Motors e a Amazon anunciaram uma aliança tecnológica. Pelo acordo, o serviço de emergência OnStar, que a montadora já oferecia em seus veículos, poderá ser acionado por meio de qualquer dispositivo com a assistente Alexa, como celulares, TVs e computadores.
A pessoa que suspeitar que sua casa está sendo invadida, por exemplo, poderá chamar a polícia pelo OnStar, usando comando de voz, mesmo que não tenha um carro. O serviço é pago. A ideia da companhia é ir além de seu negócio tradicional, diversificar as fontes de receita e ampliar o público-alvo, diz Santiago Chamorro, presidente da GM na América do Sul.
Num futuro mais distante, a perspectiva da indústria automobilística é que o consumidor pague apenas pelo que usa, como ocorre atualmente em algumas áreas no mundo da computação em nuvem. Em vez de pagar por um veículo com uma série de recursos que serão subutilizados, ele fará o download das funcionalidades quando precisar delas.
“O usuário poderá comprar potência extra para usar no fim de semana ou alugar o sistema de aquecimento dos bancos em dias mais frios”, afirma Veloso, da BMW. Com o avanço da inteligência artificial e do aprendizado de máquina, o carro será capaz de observar a rotina do condutor e se antecipar às suas necessidades. “Se eu assisto a um jogo de futebol pela TV toda quarta-feira comendo pizza, por que meu carro não poderia pedir a pizza no meu caminho para casa?”, diz Veloso.
E o consumidor? Todas essas transformações começam a mudar a forma como as montadoras abordam o consumidor. “Há uma revolução tecnológica gigantesca, e isso impacta na comunicação das marcas”, afirma Marcello Braga, diretor de marketing do grupo Caoa, que produz e vende as marcas Hyundai, Chery e Subaru.
A propaganda dos automóveis consagrou filmes publicitários de carros possantes percorrendo trilhas selvagens ou de homens charmosos estacionando à porta de lugares elegantes. A tecnologia está fazendo com que as montadoras se dirijam a um público mais diversificado. “Pesquisas mostram que mais de 60% das compras de carro são influenciadas pelas mulheres, que estão muito mais envolvidas com o produto”, diz Braga.
As crianças também passaram a influenciar a decisão de compra e entraram no alvo da comunicação. Uma recente campanha publicitária do Tiggo 8, modelo da chinesa Chery, mostra o deslumbramento infantil dentro do automóvel. Braga foi buscar inspiração em casa, com os próprios filhos. “O grande papel da tecnologia é gerar encantamento”, diz. “Quando você encanta o consumidor, ele se torna fiel.”
Os carros têm cada vez mais sensores, não só para conectividade, mas para melhorar o desempenho e a segurança. Esses dispositivos são essenciais para coletar dados. “Ângulo de direção, marcha, aceleração, tudo isso o veículo mede o tempo todo”, afirma o presidente da Audi do Brasil, Johannes Roscheck. “O carro já é um computador que roda.”
O arsenal de inovações é enorme. A chave, por exemplo, passou a funcionar a distância. Nos modelos mais recentes, basta apertar um botão no painel para ligar o carro. O XC40, elétrico que acaba de ser lançado pela Volvo, dispensa até o botão. Para iniciar a viagem, basta acelerar. Ao chegar ao destino, é só sair do carro. O veículo “entende” que é hora de desligar.
A indústria automobilística quer evitar, no entanto, que as novidades destruam a familiaridade do consumidor com um produto que ele conhece há décadas. Muitos equipamentos foram radicalmente alterados, mas preservam a aparência que tinham. Em modelos esportivos da Audi, câmeras substituem os espelhos retrovisores externos, mas continuam no lugar de sempre. As imagens captadas são projetadas em telas embutidas na porta.
No painel dos veículos, botões de comando que só existem na tela oferecem resistência tátil para o usuário ter a sensação de estar apertando um botão convencional. Até o barulho do motor, que desapareceu nos modelos elétricos, é recriado por um sistema de som para o motorista não perder a sensação de aventura. É uma lição que o setor de software já aprendeu: as mudanças não podem provocar queixas dos usuários.
Em 2015, por exemplo, a Microsoft precisou reincluir o botão “iniciar” no sistema Windows 8 porque sua retirada deixou os consumidores furiosos. O design está ganhando mais liberdade com a chegada dos modelos elétricos, que têm menos componentes. Isso libera espaço para a criatividade dos desenhistas.
Com os carros autônomos, a tendência fica mais forte. Alguns elementos que sempre fizeram parte do carro, como o volante, desaparecem. A disposição dos bancos também pode mudar. Em vez de todos os ocupantes olharem para frente, o interior do carro sem motorista poderá ser uma sala de reunião ou de estar.
Ao gosto do cliente
É improvável, porém, que os veículos se transformem em aeronaves, como nos filmes de ficção científica. “A aparência dos automóveis é fruto de uma evolução gradual”, diz Roscheck, da Audi. A tecnologia abre espaço à personalização. No caso dos importados de luxo, o cliente não se importa em esperar meses para ter o carro do jeito que ele quer.
Além de cores incomuns, frisos e estofamentos especiais, o toque pessoal chega a requintes, como a cor da pinça do freio. Dos 500 modelos esportivos vendidos pela Audi no Brasil neste ano, 380 foram fabricados sob medida. Como ocorre no mundo da alta moda, o comprador quer mostrar que ninguém tem um carro igual ao seu.
A maneira de comprar automóveis também mudou. Antes da disseminação da internet, o consumidor visitava, em média, cinco concessionárias até se decidir pela compra de um veículo. Agora faz pesquisas on-line e fecha negócio com menos de duas visitas, diz Braga, da Caoa. Ir à revenda é mais para ver o veículo escolhido. “Brasileiro ainda gosta de chutar pneu, mas já há casos de venda 100% on-line, uma tendência que a pandemia acelerou”, destaca o executivo.
Com a internet, os fabricantes têm estendido sua estratégia de vendas à fronteira das redes sociais e do comércio eletrônico. A BMW abriu canais comerciais no Instagram, na Amazon e no Mercado Livre. Recentemente, também chegou ao TikTok, em que quase 60% dos usuários têm, no máximo, 24 anos. A Volvo também recorreu ao TikTok numa campanha estrelada pela campeã olímpica Rebeca Andrade, de 22 anos, e pela apresentadora Maisa Silva, 19.
As marcas de carros podem abordar o consumidor diretamente por esses canais, mas, pela legislação brasileira, a venda só pode ser feita por meio de uma concessionária. A próxima fronteira tecnológica é a chegada do 5G, mais recente padrão de comunicação sem fio. A nova rede trará mais velocidade, ampliará a área de cobertura e tornará as conexões mais estáveis. São fatores que abrirão caminho para o “smartcar”.
Hoje, as interações on-line dependem da intervenção humana. Aplicativos como o Waze, por exemplo, permitem dar avisos sobre o que acontece na estrada, mas requerem que o condutor faça isso. No futuro, as máquinas se comunicarão entre si. Quando o pneu perder aderência em uma curva, o próprio automóvel avisará sobre os riscos para os carros que vêm atrás, mesmo que o piloto não tenha percebido o problema, diz Roschek, da Audi.
“Made in Brazil”
O Brasil começa a ganhar relevância no desenvolvimento dos sistemas digitais dos carros. Há quatro anos, a equipe de engenharia da Volkswagen em São Bernardo do Campo (SP) criou uma plataforma de entretenimento e informação que hoje é usada em modelos produzidos pelo grupo em fábricas da Índia, Rússia e do México, entre outros lugares. “O projeto teve um sucesso muito grande; já exportamos [a tecnologia] para quase 70 países”, diz Matheus Arantes, chefe do centro de eletrônica e conectividade da Volkswagen do Brasil.
O sistema de bordo traz uma loja de aplicativos. A versão nacional conta com 13 apps. A maioria já é largamente utilizada em celulares, como Spotify, Waze e iFood. O sistema também oferece um aplicativo de audiolivros e o Playkids, famoso pelos vídeos da “Galinha Pintadinha”.
As novas demandas do consumidor são tão determinantes que estão modificando o perfil de profissionais que trabalham nas fábricas de carros. Na Volkswagen, além do desenvolvimento de softwares e equipamentos, a equipe do centro de conectividade, de 50 pessoas, se dedica a estudar como os proprietários de veículos usam a tecnologia.
Um dos focos é identificar desenvolvedores de aplicativos para fazer parcerias. Nessa busca, o time da Volks encontrou a startup brasileira Get In. O aplicativo tenta resolver uma antiga dor de cabeça de quem procura restaurantes: a fila de espera. Pelo app, a pessoa inclui seu nome na lista por uma mesa assim que entra no carro.
O automóvel vem se transformando num espaço no qual a rotina diária não para: pode-se pedir comida, ouvir podcasts e agendar serviços, entre outras tarefas, sem prejudicar a atenção ao trânsito. “O uso inteligente do tempo é o grande benefício da tecnologia”, diz Arantes, da Volks.
Esse cenário ficará ainda mais evidente com o carro autônomo. Em testes na Europa e nos Estados Unidos, veículos que dispensam motorista ainda têm um grau de automação restrito por causa das leis de trânsito, que também precisam ser adaptadas. Mas a tecnologia avança rapidamente e, segundo especialistas, viajar sem as mãos ao volante será realidade em menos de dez anos nos países desenvolvidos.
Os veículos se conectarão a sistemas públicos e privados das cidades, criando uma enorme rede urbana. Semáforos, faixas de pedestre, placas de trânsito – todos esses equipamentos estarão integrados com os veículos, que também se comunicação entre si, criando um circuito de mobilidade próximo do ideal. “O mundo precisa de zero emissões, zero acidentes e zero congestionamentos”, diz Chamorro, da GM.
A grande questão é saber até onde os mundos do automóvel e da tecnologia podem convergir, com alianças entre empresas desses setores, e a partir de que ponto vão se chocar. Toda vez que as “big techs” chegam a um mercado, as regras de competição são radicalmente reescritas, como ocorreu em setores como fotografia, música, varejo e publicidade.
A transformação tecnológica costuma exigir uma profunda capacidade de adaptação das companhias hegemônicas. As gravadoras, por exemplo, foram duramente afetadas pelo streaming de música, mas o setor está se reorganizando. Já a Kodak, na fotografia, e a Blockbuster, no audiovisual, não conseguiram mudar a tempo e desapareceram.
Os criadores do automóvel sabem que precisam das alianças com as “big techs”, mas não querem perder o domínio da sua criatura. Se depender deles, as parcerias não chegarão ao funcionamento central do automóvel. “O sistema que controla o carro será sempre da montadora”, diz Arantes, da Volks. É a diferença vital entre oportunidade e ameaça.
AutoIndústria
Great Wall define os primeiros executivos para a operação brasileira
Nomeações encaminham o desenvolvimento do negócio a partir da compra da fábrica que foi da Mercedes-Benz em Iracemápolis
AGreat Wall Motors dá andamento à futura operação no Brasil com as nomeações dos primeiros executivos de cargos estratégicos para o desenvolvimento do negócio de vender e fabricar veículos. Como vice-presidente de marketing, vendas e produto, a empresa escalou Koma Li, na direção comercial assume Oswaldo Ramos e, para a posição de diretor de relações externas e governamentais, Pedro Bentancourt.
As definições dos nomes partem da experiência acumulada pelos executivos no setor automotivo. Com isso, a empresa almeja estabelecer base sólida para GWM no Brasil, considerado pela empresa estratégico na condução de seu plano de internacionalização e crescimento na região da América do Sul.
Koma Li, que também acumulará temporariamente a função de gerente geral da operação, virá da Haval Motors Austrália, marca da GWM. O executivo está na companhia chinesa desde 2007 e traz na bagagem conhecimento de mercados do continente africano e da América do Sul, como Chile, Peru e Colômbia, além de Europa e Sudeste Asiático.
Oswaldo Ramos contribuirá com a vasta experiência na área comercial ao desempenhar funções de liderança em vendas, marketing, pós-venda e rede de distribuição. Ramos desenvolveu carreira em empresas como Ford, PSA e, mais recentemente, Stellantis.
Pedro Bentancourt tem longa carreira em empresas multinacionais e no funcionalismo público. Desempenhou funções em quase todos os países da América do Sul, bem como Bélgica, Suíça, Alemanha, México e Estados Unidos. O executivo também participou de projetos estratégicos para a indústria automotiva brasileira, como Inovar-Auto e Rota 2030.
Com a compra da fábrica de Iracemápolis, confirmada em agosto, a maior fabricante de veículo de capital privado da China parte de uma capacidade de produção instalada para 20 mil unidades por ano, mas tem planos de ampliar para 100 mil.
O negócio, cujo valor não foi divulgado, inclui o terreno de 1,2 milhão de m², as instalações produtivas, máquinas e equipamentos. As vendas de veículos devem começar o ano que vem ainda com produtos importados e a produção em 2023, com estimativa de gerar 2 mil empregos.
Valor
Drible no teto de gastos leva a debandada na Economia
Pediram demissão o secretário especial do Tesouro e Orçamento, Bruno Funchal, e o secretário do Tesouro Nacional, Jeferson Bittencourt, além dos adjuntos, Gildenora Dantas e Rafael Araujo
O avanço na manobra do governo e do Congresso para ampliar despesas em ano eleitoral, alterando as regras do teto de gastos, provocou ontem mais uma debandada na área técnica do Ministério da Economia. A intenção da administração Jair Bolsonaro é abrir uma margem para gastar entre R$ 83 bilhões e R$ 95 bilhões a mais em 2022 – além de R$ 15 bilhões neste ano.
Os recursos serão usados para viabilizar o Auxílio Brasil, em substituição ao Bolsa Família, no valor de R$ 400, além da criação de um “auxilio-diesel” de mesmo benefício com a inclusão de 750 mil caminhoneiros autônomos até o fim de 2022, categoria que já apoiou o presidente e ameaça com paralisação. Os parlamentares também devem ser beneficiados com mais emendas ao Orçamento, além de compra antecipada de vacinas.
Pediram demissão o secretário especial do Tesouro e Orçamento, Bruno Funchal, e o secretário do Tesouro Nacional, Jeferson Bittencourt, além dos seus adjuntos, Gildenora Dantas e Rafael Araujo. Como antecipou o Valor, a insatisfação era evidente nos últimos dias. Há três semanas, Funchal declarou que o ministério sofria pressões para concordar com um auxílio acima da capacidade do teto de gastos.
Impulsionadas pela ala política do governo e por líderes do Centrão, as articulações também provocaram reações negativas no mercado e entre especialistas em contas públicas. Os juros futuros dispararam e o Ibovespa caiu 2,75%, fechando a 107.735 pontos, o menor nível do ano. O dólar subiu 1,92%, cotado a R$ 5,6651. Apesar disso, a iniciativa deve ter caminho.
O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), disse que a alternativa criada dentro da PEC dos Precatórios “parece mais justa” e “não põe em risco a responsabilidade fiscal”. O texto-base da proposta de emenda constitucional foi aprovado ontem em comissão especial da Câmara.
A proposta, objeto de críticas por integrantes da equipe econômica, muda o período de aferição do teto de gastos, de julho a junho para janeiro a dezembro. Com isso, o espaço fiscal aberto para gastos, segundo o relator, deputado Hugo Motta, será de R$ 83 bilhões, dos quais R$ 39 bilhões por causa da mudança do teto e R$ 44 bilhões a R$ 45 bilhões pelo não pagamento de precatórios. Contas do governo e de analistas apontam valores maiores
Folha de SP (Mônica Bérgamo)
Fogo amigo cresce e ministro de Bolsonaro diz que ‘ninguém aguenta mais o Paulo Guedes’
Apegado ao cargo, ele só deixaria o Ministério da Economia ‘à força’
O clima no governo é o pior possível para o ministro da Economia, Paulo Guedes. Ministros palacianos já não escondem que querem ver o comandante da pasta pelas costas, e se mostram contrariados com o apego do economista ao cargo. Nas palavras de um deles, “ninguém aguenta mais o Paulo Guedes”, mas ele “só sai dali [da Economia] à força”. Ou seja, mesmo com a debandada de sua equipe, e desautorizado recorrentemente por Jair Bolsonaro, o ministro mostraria disposição de permanecer à frente da pasta.
Guedes, na visão desse colega, seria “muito complicado” e não conseguiria solucionar questões fundamentais para o governo, como a do financiamento do Auxílio Brasil, programa que pretende dar R$ 400 a famílias vulneráveis do país.
O assunto, na análise desse mesmo auxiliar, está sendo discutido há mais de um ano, sem que o Ministério da Economia conseguisse encontrar uma forma de viabilizá-lo dentro das normas então vigentes do teto de gastos.
Além disso, Guedes não conseguiria ter clareza no diálogo com o mercado, falhando em dizer que a política de agora em diante será essa mesma, de maior gasto, uma exigência da conjuntura de crise social que o país atravessa.
Na quinta (21), a decisão de Bolsonaro de turbinar gastos em ano eleitoral e a manobra para driblar a regra constitucional do teto de gastos derrubaram a Bolsa, fizeram disparar o dólar e juros e causaram demissões na equipe de Guedes.
Quatro secretários da equipe econômica pediram demissão nesta quinta-feira por discordarem das decisões. Pediram para deixar o governo dois dos principais nomes do núcleo da pasta, o que comanda as contas públicas.
No fim do dia, Bolsonaro afirmou que o ministro segue no cargo. “Paulo Guedes continua no governo e o governo segue com a política de reformas. Defendemos as reformas, que estão andando no Congresso Nacional, esse é o objetivo”, declarou o presidente à CNN Brasil.
Estadão (Editorial)
Lula e Bolsonaro: tão longe, tão perto
Os apoiadores de Luiz Inácio Lula da Silva não gostam que o seu líder seja comparado ao presidente Jair Bolsonaro. Lula seria inteiramente diferente de Bolsonaro, o que invalidaria eventual cotejo entre as respectivas propostas e práticas políticas. Esse discurso pode até soar atraente para a militância petista, tão afeita a atribuir imaculada superioridade moral e cívica ao ex-presidente Lula. Mas os fatos, no entanto, insistem em aproximar o ex-sindicalista do ex-capitão – os fatos e, deve-se reconhecer, o próprio Lula.
Não é apenas o fato de que o exercício da Presidência da República tenha trazido, tanto a Lula como a Bolsonaro, sérias questões penais. Os dois teimam em ser igualmente desleixados no cuidado das contas públicas quando o assunto tem impacto eleitoral. Quando lhes interessa, esquecem-se de que existe legislação protegendo a responsabilidade fiscal e, principalmente, fazem vista grossa para os efeitos perniciosos do desequilíbrio das contas públicas sobre o desenvolvimento social e econômico do País.
No momento em que o País tem de lidar com a irresponsabilidade populista de Jair Bolsonaro, era de esperar que a oposição pudesse funcionar como contraponto, impedindo o governo de transformar um programa social de transferência de renda em ferramenta eleitoral. No entanto, apesar de os petistas negarem veementemente, Lula, neste caso, está longe de ser oposição a Bolsonaro. O líder petista é igualmente irresponsável.
Um dia depois de o governo federal ter anunciado que o novo Bolsa Família – o Auxílio Brasil – terá um valor médio de R$ 400, sem ter indicado como financiará, dentro das regras fiscais, o aumento, Lula apoiou a tática bolsonarista, sinalizando que faria o mesmo, e até mais. “Estou vendo agora Bolsonaro dizer que vai dar um auxílio emergencial de R$ 400 que vai durar até o final do ano que vem. E tem muita gente dizendo ‘não, a gente não pode aceitar porque é um auxílio emergencial eleitoral’. Não, eu não penso assim”, disse Lula em entrevista à rádio A Tarde, de Salvador.
Para Lula, não apenas deve haver aumento, como o auxílio teria de chegar a um valor médio de R$ 600. O ex-presidente petista não explicou como o Estado financiaria esse valor, tampouco se ele está em conformidade com a legislação. Tal como Bolsonaro, a preocupação de Lula é anunciar aumento do valor do benefício do programa social porque, segundo suas palavras, “o povo merece”.
De fato, o povo sofrido merece muitas coisas, a começar por um governo que não o iluda com milagrosas transferências de renda custeadas por irresponsabilidade fiscal, cujo efeito é a degradação da capacidade de investimento do Estado, uma inflação crescente e juros nas alturas – situação que prejudica, sobretudo, os pobres, que passam a depender cronicamente do populismo descarado de políticos que nunca descem do palanque. É esse círculo vicioso que alimenta o bolsonarismo e o lulopetismo.
Não são os críticos do PT, portanto, que igualam Lula a Bolsonaro. É o próprio Lula que o faz, de maneira acintosa, sem nenhum pudor. Trata-se da banalização do uso da máquina pública para fins eleitorais, como se fosse coisa normal e, pior, como se isso beneficiasse a população.
Já o governo de Jair Bolsonaro faz um esforço adicional, verdadeiramente hercúleo, para emular o pior do lulopetismo. O ministro da Economia, Paulo Guedes, por exemplo, está cada vez mais parecido com Guido Mantega, o mago da contabilidade criativa nos governos petistas.
Ao explicar a manobra fiscal que financiaria o aumento do benefício social, Paulo Guedes disse: “Seria uma antecipação da revisão do teto de gastos, que está (prevista) para 2026, ou mantém, mas por outro lado pede um waiver, uma licença para gastar com essa camada temporária de proteção”.
É assim que os populistas enfrentam suas responsabilidades. O voluntarismo de Bolsonaro e Guedes – segue-se a lei fiscal apenas quando interessa – é o mesmo de Lula, Dilma e Mantega. Com essa turma, a crise econômica nunca é acidental.
Folha de SP (Painel S.A)
Caminhoneiros dizem que auxílio de Bolsonaro é ‘melzinho na chupeta’ e que rejeitam esmola
Representantes de motoristas dizem que promessa do presidente não vai desmobilizar paralisação do dia 1º
A promessa de Jair Bolsonaro de ajudar 750 mil caminhoneiros autônomos para compensar o aumento no preço do diesel foi recebida com desconfiança e ceticismo pela categoria. José Roberto Stringasci, presidente da ANTB (Associação Nacional de Transporte do Brasil), diz que os caminhoneiros não vão recuar das ameaças de fazer uma paralisação no dia 1º de novembro enquanto a política de preços dos combustíveis não for alterada.
“Eles já fizeram até um reajuste no piso mínimo do frete. Mas isso, como se diz no nosso linguajar de motorista, é um ‘melzinho na chupeta’, o famoso ‘tapinha nas costas’ que a categoria já vem levando desde 2018”, diz.
Para Marcelo da Paz, representante dos caminhoneiros de Santos (SP), o presidente está blefando. Ele também afirma que a medida não será suficiente para impedir a próxima manifestação porque os caminhoneiros exigem o cumprimento do frete mínimo. “A gente não aceita auxílio nem quer esmola. Vai precisar mais do que isso para desmobilizar”, afirma Paz.
Bolsonaro prometeu o novo benefício durante um evento nesta quinta-feira (21), mas não detalhou valores nem a origem dos recursos. Segundo ele, os números serão apresentados nos próximos dias. O preço do combustível teve alta nas duas últimas semanas e passou de R$ 4,96 para R$ 4,97.
Folha de SP
Inflação da cesta básica encosta em 16% em 12 meses; veja lista
Preços dos alimentos avançam mais do que o IPCA, diz pesquisa da PUCPR
A inflação dos alimentos que compõem a cesta básica encostou em 16% no acumulado de 12 meses no Brasil. A conclusão é de uma pesquisa lançada por professores do curso de Economia da PUCPR (Pontifícia Universidade Católica do Paraná).
A disparada dos preços dos alimentos afeta principalmente o bolso dos mais pobres na pandemia e reflete uma combinação de fatores. Essa receita indigesta vai desde o dólar alto e a valorização das commodities agrícolas no mercado internacional até os efeitos da seca prolongada e das geadas.
Segundo o estudo da PUCPR, os 13 produtos que formam a cesta básica acumularam inflação de 15,96% em 12 meses até setembro no país. Para calcular o resultado, os pesquisadores utilizaram dados do IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo).
O IPCA, divulgado pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), é o índice oficial de inflação do Brasil. Até setembro, teve alta de 10,25%. Ou seja, mesmo com a variação robusta, o IPCA subiu menos, em termos gerais, do que a inflação da cesta básica.
“Fomos até a base de dados do IBGE e separamos os 13 alimentos que compõem a cesta básica. Rodamos o mesmo modelo estatístico do IPCA para calcular a inflação específica desses produtos”, conta o economista Jackson Bittencourt, coordenador do curso de Economia da PUCPR. “Estamos olhando para aquilo que é considerado o mínimo para as pessoas colocarem na mesa. O problema é que esse mínimo vem subindo muito”, completa.
No acumulado de 12 meses, o açúcar cristal (38,37%), o óleo de soja (32,06%) e o café moído (28,54%) foram os produtos da cesta básica que registraram as maiores altas de preços no país. Em seguida, aparecem o contrafilé (26,88%), a margarina (24,97%), a batata inglesa (24,71%) e o tomate (24,32%).
Bittencourt atribui a disparada dos alimentos a três ingredientes. O primeiro é a valorização das commodities agrícolas no mercado internacional durante a pandemia. O segundo é o dólar alto. A moeda americana acima de R$ 5 favorece exportações, o que pode reduzir a quantidade de mercadorias como carnes direcionadas para o mercado interno. Também encarece parte dos insumos usados na produção de alimentos.
“Por que a taxa de câmbio vem subindo? Porque houve uma insegurança no mercado relacionada à pandemia. No caso do Brasil, também há uma insegurança em relação ao próprio governo. A instabilidade política gera uma instabilidade macroeconômica”, afirma o professor.
O terceiro fator responsável pela elevação dos alimentos, diz o economista, é o impacto do clima adverso. Ao longo de 2021, a agricultura amargou o efeito da seca prolongada e o registro de geadas. Os extremos abalaram a produção de itens como milho, cana-de-açúcar e café.
A pesquisa da PUCPR também calcula a inflação da cesta básica na região metropolitana de Curitiba. Na capital paranaense, a alta foi de 19,54% no acumulado de 12 meses até setembro. Ou seja, foi maior do que a média brasileira (15,96%).
Já o IPCA em Curitiba, no mesmo período, foi de 13,01%. Trata-se da maior inflação entre as capitais e as regiões metropolitanas pesquisadas pelo IBGE. “O Paraná vem sofrendo uma crise hídrica mais prolongada. Esse é um dos principais motivos para a inflação mais alta”, analisa Bittencourt.
Com o aumento dos preços de alimentos e as dificuldades no mercado de trabalho, o Brasil passou a registrar mais cenas de pessoas em busca de doações de comida e até de restos de alimentos durante a pandemia. Um dos episódios recentes ocorreu em Fortaleza (CE). Um vídeo compartilhado nas redes sociais mostra pessoas à procura de comida em um caminhão de lixo na capital cearense.
Outros casos que ficaram conhecidos foram registrados no Rio de Janeiro, onde um caminhão distribuía restos de carne, e em Cuiabá (MT), que teve filas em busca de doações de ossos de boi.
Segundo o professor, a inflação dos alimentos até deve desacelerar, na reta final do ano, no acumulado de 12 meses. Mas a tendência é de os preços permanecerem ainda em patamar elevado, pondera o economista.
Em parte, a possível desaceleração está relacionada a um efeito estatístico. É que, no final de 2020, houve um repique nos preços dos alimentos, afetando a base de comparação. “A inflação ainda será alta, mas em um nível um pouco menor”, afirma Bittencourt.
Em setembro, o custo médio da cesta básica aumentou em 11 das 17 capitais pesquisadas pelo Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos). Houve redução nas outras seis cidades.
Conforme o Dieese, o trabalhador que recebeu um salário mínimo (R$ 1.100) comprometeu 56,53% de sua remuneração líquida (após o desconto da Previdência Social) para a compra de alimentos básicos para uma pessoa adulta no mês passado. O percentual é uma média das 17 capitais pesquisadas. Em agosto, a porcentagem havia sido menor, de 55,93%.
Valor (coluna)
Pressão eleitoral influenciou derrota da PEC 5
Resiliência do combate à corrupção como valor eleitoral surpreende defensores da proposta
MARIA CRISTINA FERNANDES
A derrota da Proposta de Emenda Constitucional 5, que mudava a composição do Conselho Nacional do Ministério Público, foi atribuída ontem, por parlamentares envolvidos na tramitação, à proximidade das eleições de 2022.
O resultado, que, por 11 votos não alcançou quórum constitucional (297 x 182), surpreendeu. Não apenas porque derrotou um dos parlamentares mais experientes na contagem de cabeças que já passou pela Câmara, seu presidente Arthur Lira (PP-AL), como também porque revelou o peso que o tema do combate à corrupção, a despeito de todo o desgaste do MP, continua a ter junto ao eleitorado.
Entre aliados de Lira a percepção é de que as direções partidárias pressionaram seus parlamentares a encerrar o jogo na Câmara para que o tema não chegasse ao Senado, onde pré-candidatos a mandatos majoritários têm assento, inclusive o presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (MG), que deixa o DEM na próxima semana para se filiar ao PSD com vistas à disputa pela Presidência da República.
Apenas quatro partidos não tiveram defecções importantes em relação à orientação de liderança: Novo, Psol e Rede, que votaram por unanimidade contra a PEC, e o PT, só que em sentido contrário. Os petistas deram 51 votos a favor da proposta e registraram uma ausência e uma abstenção.
Os petistas se uniram mais a favor da proposta do que o próprio partido do presidente da Câmara. O PP registrou 36 votos à PEC, cinco contrários e uma ausência. Entre os grandes partidos, a maior divisão foi a do PSL, que deu 26 votos contra a PEC (e 23 a favor). Apesar do encaminhamento da liderança do partido em defesa da PEC, os parlamentares se aferraram à posição original do PSL no tema.
Outros partidos da centro-direita, como o PSD e o DEM, também colheram divisões importantes. O PSD teve 13 votos contra a PEC (e 19 a favor), entre eles o do líder do partido, Antonio Brito (BA). O DEM registrou 16 a favor e 10 contra. O MDB, 22 a 9.
No PSDB, partido com tantas pretensões eleitorais que tem dois pré-candidatos se enfrentando na justiça pelas condições em que se realizarão as prévias da legenda, teve mais votos contra a PEC (21) do que a favor (10). Se o ex-juiz Sergio Moro decidir enfrentar a disputa, encontrará o Podemos, legenda mais provável de sua filiação, dividida rigorosamente em torno do tema: 5 x 5.
A tentativa de Lira de recolocar o tema em votação, desta vez por meio da proposta original do deputado Paulo Teixeira (PT-SP), mais amena no cerco ao MP, não tem acolhida pacífica. São duas teses em disputa. A de que o autor do projeto tem o direito de vê-lo votado e a de que, na presença de um substitutivo, sua votação prevalece sobre a do original.
Ministros do Supremo já consultados sobre embate afirmaram não ver com bons olhos sua judicialização. O tema ainda divide a Corte. Tome-se, por exemplo, o julgamento da reclamação 43007 do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Em voto a que o Valor teve acesso, em processo que corre em segredo de justiça, o relator, ministro Ricardo Lewandowski, se posiciona sobre sindicância aberta na Corregedoria-Geral do Ministério Público Federal sobre procedimentos de integrantes da Lava-Jato em Curitiba.
O ministro reputa de “desconcertante” a afirmação do CNMP que concluiu pelo arquivamento da representação, de que as mensagens trocadas entre procuradores e Moro, reveladas pela Operação Spoofing, foram apagadas “seguindo orientação institucional”.
Em referência ao corporativismo da corregedoria do CNMP, o ministro ainda registra que a instância considerou “normais, rotineiras e legítimas” as tratativas com autoridades estrangeiras para acordos de colaboração que contornaram o Ministério da Justiça. Lewandowski foi acompanhado no seu voto pelo ministro Gilmar Mendes, mas o julgamento, em plenário virtual, teve pedido de vista do ministro Edson Fachin.
Entre os procuradores, a estratégia para blindar novas tentativas de votação da PEC passa pela apresentação de uma proposta de código de ética. Uma minuta será encaminhada na próxima segunda-feira para apreciação do CNMP.
O gesto uniu as entidades mais radicalmente contrárias à proposta, como a Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), a Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (Conamp) e a Associação Nacional dos Procuradores e Procuradoras do Trabalho (ANPT), e aquelas que mantiveram mais interlocução com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), como o Conselho Nacional dos Procuradores Gerais (CNPG) e a Associação do Ministério Público do Distrito Federal e dos Territórios (AMPDTF), além da Associação Nacional dos Procuradores do Ministério Público Militar (ANMPM).
O código de ética foi um dos pontos de confronto entre procuradores e parlamentares. Numa das versões do substitutivo foi incluída a votação de um código pelo Congresso, depois retirada para o estabelecimento de um prazo para que o CNMP o fizesse, a exemplo daquele já elaborado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para a magistratura. A inexistência de um código de ética foi um dos maiores flancos dos procuradores ao longo da tramitação da PEC.