Clipping 29 de novembro de 2021
Manchetes
5 pastas associam suas ações a falsa queda do desmate (Folha de SP)
Falta de verba trava perícias do INSS em ações judiciais (Estadão)
Protecionismo ameaça R$ 50 bi em exportações (O Globo)
Nova variante adiciona risco a cenário econômico já difícil (Valor)
Automotive Business
Com demanda em alta, Toyota inicia 3º turno na segunda-feira em Sorocaba
Empresa também vai trabalhar mais em dezembro nas três unidades que mantém em São Paulo
Começa na segunda-feira (29) as atividades no terceiro turno na fábrica da Toyota em Sorocaba (SP), já com o quadro formado por 450 trabalhadores que tiveram de ser contratados pela montadora para preencher a jornada adicional. A antecipação do turno, previsto para janeiro, foi realizada por causa da alta demanda do mercado por alguns modelos da montadora produzidos ali, como o Corolla Cross.
A montadora corre para recuperar os dias de produção que perdeu este ano com a falta de componentes, que acabou paralisando as linhas por dez dias. Afora o adiantamento do terceiro turno em Sorocaba, a Toyota também reduziu o período de pausa de fim de ano nas suas três fábricas – Sorocaba, Indaiatuba e Porto Feliz – em dezembro. Serão cinco dias de shutdown, de 27 a 31 de dezembro, com retorno em 3 de janeiro.
O mesmo não deverá ocorrer em outras montadoras, que por causa da falta de componentes pretendem, por outro lado, aumentar o período de pausa entre dezembro e janeiro de modo a equilibrar os estoques de componentes que estão em falta no mercado.
Os números do Renavam divulgados pela Fenabrave indicam crescimento nas vendas de veículos Toyota no acumulado até outubro. Foram emplacados no período 139,8 mil unidades, 31% a mais do que no janeiro-outubro de 2020. A montadora chegou a ser no primeiro semestre a marca com maior ganho de participação de mercado, superando a então líder General Motors.
Com a decisão de funcionar 24 horas por dia, a capacidade produtiva da linha de montagem de Sorocaba vai crescer em 25%, o que deverá aumentar seu volume anual dos atuais 122 mil veículos para 152 mil. Na undiade são produzidos, além do Corolla Cross, os modelos Yaris e Etios, este último ainda em fabricação apenas para atender ao mercado externo.
“Desde quando reunimos as condições para realizar o terceiro turno em Sorocaba, era nossa intenção começar o quanto antes e fico feliz de fazer esse anúncio, ajudando o Brasil a ofertar mais empregos. Estamos todos ansiosos para dar as boas-vindas aos novos colaboradores de Sorocaba que nos ajudarão em nossa missão de produzir carros cada vez melhores”, disse em setembro o presidente Rafael Chang.
Do total de funcionários contratados pela montadora para trabalhar no terceiro turno, 40% é formado por mulheres, que vão ocupar postos na linha de montagem da fabricante.
Valor
Pandemia alterou elações do trabalho e demandas, diz ministra
Ações discutem demissão de trabalhador sem vacina, trabalho presencial e equipamentos de proteção
Quando tomou posse como presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST), em fevereiro do ano passado, a ministra Maria Cristina Peduzzi – assim como todos os brasileiros – ainda não sabia que uma pandemia global estava em vias de ser decretada, o que traria uma série de desafios para a sua gestão, que se encerra no próximo ano.
Com o olhar de quem tem acompanhado de perto os efeitos da crise sanitária para as relações trabalhistas, a ministra disse, em entrevista exclusiva ao Valor, ter observado uma evolução dos casos que foram levados ao TST de março de 2020 para cá. No ano passado, a maioria tratava de contratos de trabalho. Neste ano, as demandas mais recorrentes abordam vacinação, volta ao modelo presencial e uso de equipamentos de proteção individual.
É nesse contexto que se encontra a portaria editada pelo Ministério do Trabalho e Previdência para proibir a demissão de funcionários que decidiram não se imunizar. A norma está atualmente suspensa por liminar do ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF). O caso está sendo julgado pelo Plenário Virtual nesta semana.
De acordo com a presidente do TST, a jurisprudência atual permite que “sanções variáveis, desde a advertência até, em última instância, a dispensa por justa causa” possam ser aplicadas a funcionários que decidirem não se vacinar. Maria Cristina ainda falou sobre os dilemas dos modelos de trabalho inaugurados pela pandemia, como a volta ao trabalho presencial mesmo com a crise sanitária ainda em curso no país.
Segundo ela, essa determinação “está inserida no poder diretivo do empregador”. Em relação à possibilidade de a variante da África do Sul chegar ao Brasil, disse que ainda não é possível prever o impacto de uma eventual nova onda.
A ministra – que em outubro de 2020 contraiu a doença e ficou 21 dias internada – pontuou que a pandemia evidenciou a disparidade de gênero no mercado de trabalho, com mais mulheres do que homens desempregados no país. Também afirmou antever a possibilidade de a vacina contra o coronavírus vir a ser eventualmente adquirida pela iniciativa privada. A seguir, os principais trechos da entrevista:
Valor: A senhora disse recentemente que trabalhadores não vacinados podem ser demitidos por justa causa. Em seguida, o governo editou portaria para evitar que isso aconteça. Qual sua avaliação?
Maria Cristina Peduzzi: A questão é complexa. No Tribunal Regional do Trabalho (TRT) de São Paulo, definiu-se que, caso o empregador comprove a realização de campanha de conscientização sobre a importância da vacinação contra a covid-19, exista vacina gratuita e disponível autorizada pela Anvisa e o empregado não apresente causa justificada para a recusa, é possível aplicar sanções, variáveis, desde a advertência até, em última instância, a dispensa por justa causa. Aplicando a legislação vigente e o entendimento do STF, a Justiça do Trabalho tem confirmado a possibilidade de dispensa por justa causa, caso estejam presentes esses requisitos. O TST ainda não julgou a matéria.
Na perspectiva do Supremo, a exigência de vacinação do empregado se insere no poder diretivo do empregador, para garantir um ambiente de trabalho seguro e saudável. Na decisão do ministro Barroso sobre a portaria, ficou assinalado que a dispensa por justa causa do empregado que se recusa à vacinação deve ser a última e mais drástica medida disciplinar e não será aplicada na hipótese de apresentação de justificativa médica.
Valor: De que modo a pandemia afetou a Justiça do Trabalho? Há uma estimativa do aumento de ações trabalhistas neste período?
Maria Cristina: Houve progressivo aumento no número de processos envolvendo temas pertinentes à pandemia. Em 2020, a primeira instância recebeu 21.798 casos relacionados à covid-19. E foram cerca de 4,3 mil ações originárias na segunda instância. No TST, até o início de março deste ano, foram julgadas 114 liminares envolvendo a temática. O ranking de temas mais recorrentes em 2020, já no contexto da pandemia, trazia questões sobre aviso prévio e multas relacionadas ao FGTS e à rescisão contratual. Já em 2021 as demandas recorrentes são de outra natureza, como a possibilidade ou não de exigência de certificado de vacinação, o retorno total ou parcial ao trabalho presencial e a utilização ou não de equipamentos de proteção.
Valor: A iminência da chegada da variante da África do Sul pode trazer uma terceira mudança no perfil dos casos levados ao TST?
Maria Cristina: Não é a primeira vez que surge uma variante do vírus original, tampouco é a primeira vez que surge uma nova onda. Dessa forma, não é possível fazer previsões.
Valor: Com o avanço da vacinação, trabalhadores podem ser obrigados pelas empresas a voltar para o escritório presencial?
Maria Cristina: A exigência do retorno ao trabalho presencial está inserida no poder diretivo do empregador, devendo ser garantido um prazo de transição de ao menos 15 dias.
Valor: Como o TST tem construído sua jurisprudência sobre o teletrabalho? De que forma regular, à distância, o cumprimento de todas as regras trabalhistas?
Maria Cristina: A disciplina do teletrabalho foi introduzida pela reforma trabalhista de 2017. Está expresso que o empregado em teletrabalho não tem jornada controlada passível de aferição de horas extras. Essa modalidade foca na produtividade, não sendo aplicáveis as normas gerais sobre duração da jornada de trabalho.
Valor: A pandemia deixou mais evidente a desigualdade de gênero no mercado de trabalho, com mais mulheres do que homens perdendo o emprego. Como mudar isso?
Maria Cristina: Vários estudiosos e organizações internacionais reconhecem que as minorias (que não significam grupos com poucas pessoas, mas aqueles formados por indivíduos com menor poder político e social) são fortemente atingidas em momentos de crise econômica, sanitária e social. As mulheres, agora, foram fortemente atingidas, o que foi traduzido em um percentual maior de desemprego. Esses dados demonstram que a desigualdade de gênero no mercado de trabalho ainda é uma realidade.
Valor: Que efeitos a pandemia vai trazer às relações trabalhistas a longo prazo? Quais mudanças vieram para ficar?
Maria Cristina: Um dos maiores aprendizados para a geração atual é a importância do compromisso com o coletivo. É primordial considerar as repercussões das ações de cada um para a família, o trabalho e a sociedade em que está inserido. Outra transformação foi a utilização crescente da tecnologia, como aplicativos de mensagem instantânea, e-mails e videoconferências.
Valor: Um dos temas mais frequentes no TST é a questão do vínculo empregatício em plataformas como o Uber. Como a pandemia alterou essa relação de trabalho?
Maria Cristina: Tanto o TST quanto o Superior Tribunal de Justiça (STJ) têm decisões no sentido de que não há vínculo de emprego entre essas plataformas e os trabalhadores, por não haver um dos elementos essenciais do vínculo de emprego: a subordinação jurídica. Para que o TST venha a julgar a matéria com efeito vinculante é necessário provocação do jurisdicionado. A maior transformação que a pandemia trouxe para o trabalho via plataformas foi destacar sua importância e expansão no mercado de trabalho. Essas atividades ganharam relevância em um contexto de restrição na circulação de pessoas.
Valor: A vacina da covid-19 eventualmente vai se tornar como a da gripe, que pode ser adquirida por empresas privadas para imunizar seus trabalhadores?
Maria Cristina: Essa medida será possível quando a compra e distribuição da vacina forem facultadas às empresas privadas. O cenário atual aponta para uma necessidade de vacinação periódica da população, como ocorre no caso da influenza, o que sinaliza com a possibilidade de poder vir a ser adquirida também pela iniciativa privada.
Valor: Como é ser a primeira mulher a chegar na presidência do TST e ainda com os desafios da pandemia a enfrentar?
Maria Cristina: Há um significado simbólico. A imagem de uma mulher no comando da Justiça do Trabalho é capaz de transmitir a milhões de mulheres a mensagem emancipatória de que elas podem concretizar suas expectativas profissionais. O destino colocou a pandemia como um desafio a ser superado durante a minha presidência. Fugiu de qualquer previsibilidade, mas foi enfrentada com discernimento, coragem, competência e sabedoria por magistrados e servidores.
Folha de SP (Painel S.A)
Advogados projetam aumento de ações trabalhistas em 2022
Horas extras e cobrança de vacina devem impulsionar questionamentos
Depois do aumento no volume de ações trabalhistas por causa da pandemia, advogados que acompanham o assunto projetam uma nova onda de processos envolvendo, principalmente, problemas com horas extras e exigência de vacinação em 2022.
Até agora, as questões relacionadas a demissão por falta de estrutura para a atividade remota, além do direito à desconexão do trabalho, se destacaram no cenário da pandemia, segundo Priscilla Carbone, sócia de direito trabalhista do Madrona Advogados. Também há processos sobre brechas em acordos de redução de jornada e salário, e retorno de gestantes ao trabalho presencial.
Na avaliação de Carbone, o número de novos processos deve voltar a crescer porque muitos funcionários estão aguardando o posicionamento da Justiça para ingressar com suas ações, especialmente nos casos em que ainda não há clareza, como a demissão de funcionários que recusarem a vacina.
Rafael Ferraresi, do Ferraresi Cavalcante Advogados, cita também as discussões trabalhistas sobre o home office, já que muitos profissionais demitidos resolveram entrar com ações relacionadas a horas extras. O movimento de casos do tipo deve aumentar em 2022, impulsionado ainda pela incerteza na economia, diz o advogado.
Estadão
Falta de verba trava perícias do INSS em ações judiciais
O Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) está informando às varas da Justiça Estadual em São Paulo que não há mais dinheiro para pagar perícias médicas de segurados que solicitam benefícios em casos de acidentes, o que tem deixado os beneficiários sem os pagamentos. Desde o início de outubro, procuradores federais que atuam em nome do órgão têm apresentado a mesma explicação em diferentes processos: a verba para o serviço não foi suficiente e “os recursos disponibilizados já foram esgotados”.
A falta de dinheiro do INSS para perícias médicas tem levado a duas situações na prática. Em alguns casos, a Justiça suspendeu processos, o que impede o pagamento dos benefícios às pessoas até a conclusão do caso. Em outros, os peritos têm aceitado trabalhar sem saber quando vão receber.
Nas ações, o INSS tem solicitado que as perícias sejam autorizadas com “pagamento dos honorários para momento posterior”, sem especificar um prazo. Tanto o INSS quanto o Instituto Brasileiro de Perícias Médicas (IBPM) afirmam não ter dados sobre o número de ações paradas por falta de dinheiro. Neste ano, já foram feitas 611 mil perícias na Justiça Federal.
Um açougueiro de 57 anos, que preferiu não se identificar, está com a perícia parada na 5ª Vara Cível de Guarulhos. Em 2014, ele sofreu um acidente enquanto carregava alimentos em um supermercado. Rompeu um tendão no ombro e foi afastado do trabalho. Em 2016, após ter o benefício suspenso, recorreu à Justiça e conseguiu validá-lo novamente. Em agosto deste ano, recorreu ao Judiciário mais uma vez, mas o processo parou após o INSS alegar falta de dinheiro.
Com o procedimento suspenso, o açougueiro não consegue fazer o exame para tentar reaver o auxílio de cerca de R$ 1,7 mil. Se conseguir vencer na Justiça, o INSS terá de pagar os valores atrasados. A advogada Lucimara de Menezes Freitas, que o representa, diz nunca ter visto situação semelhante a essa e conta os prejuízos.
Já a vigilante Suelene Maria da Silva Santos, de 45 anos, conseguiu agendar o exame mesmo depois de o INSS ter dito que não havia verba. Ela sofreu um acidente de moto, no ano passado, no Rodoanel Mário Covas (SP), e quebrou o braço esquerdo. Passou por uma cirurgia e voltou a trabalhar, mas ainda sofre com sequelas. “Meu braço perdeu força. Não consigo segurar uma coisa pesada por muito tempo”, conta ela, que tenta reaver o benefício na Justiça. “Eu sinto dor.”
A perita médica Cláudia Gomes aceitou trabalhar no caso, mesmo sem saber quando haverá pagamento. Ela disse ao Estadão que, assim como outros colegas da área, recebeu pela última vez em setembro. Desde outubro, não houve mais pagamentos.
“O prazo para entrega do serviço executado continua o mesmo. A cobrança para que se entregue o que foi feito não mudou. A gente continua tendo que cumprir nossos prazos, e sem saber como eu vou pagar minhas contas se eu ficar dependendo exclusivamente disso”, afirma.
Segundo a perita, seu único contato são os funcionários das varas de Justiça, que não são os responsáveis pela efetivação do pagamento. “Eles repassam para a gente a informação que eles têm: não tem dinheiro.”
Os honorários dos peritos de diversas especialidades (Medicina, Odontologia, Economia, Contabilidade, Engenharia, Arquitetura, Psicologia e Serviço Social) foram fixados pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em resolução de 2016. Para perícia médica, os valores variam entre R$ 370 e R$ 870.
A presidente do Instituto Brasileiro de Perícias Médicas (IBPM), Ana Carolina Tormes, afirmou ao Estadão que os médicos peritos que trabalham na Justiça Federal também estão com dificuldades para receber os honorários desde que a lei expirou no fim de setembro. Ela avaliou que o problema enfrentado pelos profissionais pode levar a um represamento de processos e a uma fila de exames no Judiciário.
“O principal risco é que a população vulnerável perca o seu acesso à Justiça, uma vez que sem perícia, o juiz enfrentará dificuldades para analisar algo que foge ao seu conhecimento, já que incapacidade e deficiência, demandam análise por profissional capacitado”, disse a presidente.
Em ofícios anexados às ações o INSS diz que o pagamento depende de aprovação do Congresso para a liberação de verbas. “Apenas após a aprovação pelo Congresso Nacional por maioria absoluta e a emissão dos títulos do Tesouro Nacional seria materialmente possível o pagamento decorrente dos ônus processuais e das condenações judiciais impostas ao INSS. A dotação orçamentária em questão foi aprovada para os pagamentos do ano corrente, mas a verba afetada não foi suficiente a toda a despesa”, afirma o órgão.
A dificuldade para o pagamento de perícias enfrenta dois principais obstáculos. O primeiro deles, explícito nos ofícios do INSS à Justiça, é a chamada regra de ouro do Orçamento. Com sucessivos rombos nas contas públicas, o governo tem precisado bancar despesas correntes com recursos obtidos via emissão de dívida, o que normalmente é vedado, mas pode ser feito após autorização especial dada pelo Congresso Nacional.
O crédito para este ano, que servirá como essa autorização especial, ainda não foi aprovado pelos parlamentares. O Ministério da Economia tem negociado a urgência dessa votação com o Congresso, mas já precisou lançar mão de uma portaria emergencial para evitar, por exemplo, a falta de recursos para pagar salários de servidores.
A perícia médica passa por um momento turbulento também em outra frente. Em 23 de setembro, expirou o prazo de dois anos para que o Executivo assumisse o pagamento dos honorários dos peritos judiciais em ações envolvendo o INSS na Justiça Federal.
Até setembro de 2019, essa despesa era de competência do Judiciário, saindo do orçamento dos tribunais, mas uma lei aprovada pelo Congresso e sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro autorizou que o Executivo assumisse a despesa, que crescia de forma significativa na esteira do aumento da judicialização de benefícios do INSS.
Desde o fim de setembro, a responsabilidade pelo pagamento se transformou em alvo de um “jogo de empurra”, enquanto os segurados ficam em um limbo. “Com o fim do prazo previsto na Lei 13.876 de 2019, o pagamento das perícias judiciais passa a ser de competência do Poder Judiciário”, informou o Ministério do Trabalho e Previdência ao Estadão.
Enquanto isso, o Conselho da Justiça Federal (CJF) afirma em comunicado que “para as nomeações de peritos ocorridas após 23/9/2021, os pagamentos respectivos somente poderão ocorrer caso seja aprovada lei autorizando a continuidade do pagamento pelo Executivo”. Ou seja, o órgão ignora a possibilidade de o próprio Judiciário retomar os desembolsos.
Segundo apurou o Estadão com fontes do governo, o impasse se dá porque o Judiciário usou o espaço no Orçamento para realizar outras despesas, que teriam agora que ser cortadas para abrir caminho à retomada dos repasses.
De acordo com um integrante do governo, a despesa “é claramente do Judiciário”, mas não querem pagar para não reduzir seu espaço no teto de gastos, regra fiscal que limita o avanço das despesas à inflação.
De acordo com essa fonte, o Executivo aceita assumir a despesa, mas com condições, e busca apoio ao projeto de lei 3.914, de 2020. Aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ), da Câmara dos Deputados, em agosto, a proposta transfere o pagamento da perícia médica para o autor da ação a partir de 2022. A proposta livra famílias de baixa renda da despesa. Como o parecer da comissão era conclusivo, o texto foi enviado diretamente ao Senado.
Na Casa, o projeto chegou a entrar em pauta, mas foi retirado. O texto foi criticado durante sessão de debate convocada pelos senadores e está sem relator desde que o senador Luis Carlos Heinze (Progressistas-RS) deixou o projeto.
Procurado, o Ministério do Trabalho e Previdência informou que, “com o fim do prazo previsto na Lei 13.876 de 2019, o pagamento das perícias judiciais passa a ser de competência do Poder Judiciário”.
A pasta relatou que “a dotação atual na ação orçamentária de pagamento das perícias judiciais é de R$ 336,4 milhões, tendo sido empenhados (primeira etapa do pagamento, uma espécie de autorização) R$ 191,3 milhões e efetivamente pagos R$ 184,2 milhões”. O Ministério da Economia foi procurado, mas não se manifestou.
Folha de SP
Próximo presidente enfrentará maior risco desde o Plano Real
Embora candidatos defendam arrumar contas públicas, dificuldade pode levar a grave crise
O próximo presidente da República enfrentará o mais complexo desafio econômico desde o Plano Real: reformar o Estado para que ele caiba no Orçamento, abortando a deterioração em curso —com baixo crescimento, alta do dólar, da inflação e da dívida pública.
Segundo a Folha apurou, há consenso nas equipes dos prováveis candidatos à Presidência de que a consolidação fiscal será a prioridade em 2023. Sem ela, o país continuaria em crise permanente ou mais grave que a atual, minando rapidamente o capital político de quem for eleito.
A divergência está em como alcançá-la: mais rápido ou em um período estendido, com regras para que o Brasil volte a gerar superávits primários para estabilizar ou reduzir a dívida pública. Na prática, seria necessário economizar, entre o que o governo arrecada e gasta (sem contar juros), cerca de R$ 300 bilhões (4% do PIB) por alguns anos. Como comparação, a estimativa oficial deste ano é de R$ 96 bilhões de déficit.
Em nenhum outro período desde o Plano Real (1994), o Brasil cresceu por vários anos seguidos e gerou empregos como nos anos em que manteve as contas em ordem e produziu superávits primários.
Com poucas exceções, os melhores anos para a economia se deram entre 1998 e 2013, período em que o Brasil enfrentou crises internacionais e domésticas sem impactos de longo prazo. No auge, em 2010, o país chegou a crescer 7,5%, com a inflação sob controle.
Desde 2014, no entanto, o Brasil acumula déficits primários, o que levou a uma explosão do endividamento público. O resultado tem sido o baixo crescimento e o aumento do desemprego e da pobreza extrema.
Para tentar controlar o gasto, o Brasil tem desde 2016 o chamado teto de gastos, que limita o aumento da despesa à inflação. Mas essa regra está sendo burlada agora com a aprovação da PEC dos Precatórios, que possibilitará gastos “extrateto” superiores a R$ 106 bilhões.
Assim como no Plano Real, que domou a hiperinflação, a consolidação fiscal demandará atacar várias frentes. Repetindo a experiência do plano anti-inflacionário, o destino da reforma fiscal pode determinar o futuro do país nos próximos anos.
Mas, segundo especialistas, ao contrário de mudanças cruciais recentes —como a reforma da Previdência (2019) ou a lei que instituiu o teto (2016)— desta vez não se trata só de aprovar uma ou outra PEC (proposta de emenda à Constituição). Mas de construir acordos políticos e sociais para mexer com grupos de interesse.
Entre eles, sindicatos ligados ao funcionalismo, que resistem à reforma administrativa; empresas e setores que absorvem mais de R$ 300 bilhões ao ano em subsídios; e parlamentares, que se apropriam cada vez mais de recursos do Orçamento com emendas para suas bases.
À frente da equipe econômica de Jair Bolsonaro (sem partido), o ministro Paulo Guedes (Economia), afirmou na semana passada, em audiência no Congresso, que o furo no teto foi consequência de decisão “da classe política”. Mas que seguirá perseguindo a consolidação fiscal.
Guedes promete entregar a despesa primária do governo (sem contar juros) em 18,4% como proporção do PIB no último ano de governo —um pouco abaixo dos 19,5% de 2019.
Recentemente, auxiliares do ministro chegaram a propor ao presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), que encampasse a articulação política em torno de um grande ajuste. Mas a ideia não prosperou diante da decisão de Pacheco de apresentar-se como candidato à Presidência no ano que vem.
O economista Affonso Celso Pastore, articulador do programa de Sergio Moro (Podemos), também sinalizou que a construção de um novo arcabouço fiscal será prioridade. Segundo ele, o programa de Moro deve se dar em torno desse objetivo.
No PT, que deve ter Lula candidato, há reconhecimento de que os melhores anos do partido na Presidência foram aqueles em que o país gerou superávits primários. Segundo o economista Nelson Barbosa, ligado ao partido (mas que diz não falar em nome do PT), a necessidade da consolidação fiscal “vai se impor”.
“Quem vencer no ano que vem terá de reduzir a incerteza. A dúvida é se a consolidação fiscal será pró-povo ou pró-mercado”, afirma Barbosa, que é colunista da Folha. No primeiro caso, diz, poderia haver aumento do gasto em 2023 para reforçar programas sociais, mas que seriam cobertos por economia em outras áreas ou aumento da arrecadação a partir de mudanças na tributação.
Conselheiro de Ciro Gomes (PDT), o economista Mauro Benevides defende alterar o atual teto de gastos, retirando da conta os investimentos públicos, que passariam a variar de acordo com a receita. Mas Benevides defende a consolidação fiscal e já sugeriu corte de 15% em subsídios tributários a empresas e a taxação de dividendos para aumentar a arrecadação.
João Doria, escolhido no sábado (27) candidato pelo PSDB, também já deu declarações garantindo o compromisso com o equilíbrio das contas públicas, algo persegue no governo de São Paulo. O economista Samuel Pessôa, do Instituto Brasileiro de Economia da FGV, é um dos que defendem até algum aumento da carga tributária no caminho da consolidação fiscal.
“Após a eleição, vai ficar mais claro quanto a sociedade vai querer gastar. Pode-se mudar o teto, mas será preciso aprovar reformas que garantam a sustentabilidade das contas públicas”, diz Pessôa, também colunista da Folha. “Parece haver um consenso. A discussão é sobre a composição do ajuste, com mais carga tributária ou a partir de um enxugamento do Estado.”
Para o economista e ex-presidente do Banco Central Arminio Fraga, “na campanha eleitoral, os candidatos vão fazer o de sempre [promessas que demandam gastos]. Mas, no privado, vão ‘beijar a cruz’ [da austeridade fiscal]”, acredita.
“O que não está claro é como fazê-lo. E não podemos nos iludir de que isso se faz da noite para o dia; ou que três pontos [percentuais] a mais de superávit resolvem. Será preciso rever prioridades em um Estado que gasta 79% com folha salarial e Previdência”, diz Fraga, que também assina coluna no jornal.
Sérgio Vale, economista-chefe da MB Associados, afirma que, dada a fragmentação partidária atual, o próximo presidente terá dificuldades políticas enormes para obter consenso em torno de um novo arcabouço fiscal.
“Em 2002, quando tínhamos uma crise de confiança e Lula venceu, ele manteve a austeridade e os superávits com uma base suprapartidária, com PT, PSDB, [e os então] PMDB e PFL. Havia também a pressão externa do FMI [o Brasil era devedor no Fundo] e um clima internacional reformista. Isso não está presente agora”, afirma.
Vale acredita, no entanto, que o tamanho da dívida pública e os oito anos consecutivos de déficits primários (desde 2014) levarão a “alguma acomodação” em 2023. “Nada muito relevante e duradouro, mas é possível que haja um freio de arrumação de curto prazo”, afirma.
Alessandra Ribeiro, economista da Tendências Consultoria, também não aposta em reformas ambiciosas que levem a uma consolidação fiscal mais profunda e permanente. “No geral, a classe política não parece preparada para esse tipo de discussão, de revisar as bases de gastos, como os sociais ou em saúde e educação. O normal tem sido sempre mudar as regras para poderem gastar mais”, afirma.
A Tendências já abandonou a estimativa de que o Brasil deixaria de ter déficits primários a partir de 2025 —sobretudo por causa da expectativa de crescimento menor da economia em 2022 e do furo no teto de gastos com a PEC dos Precatórios.
Para a economista Zeina Latif, da consultoria Gibraltar, um ponto positivo é que tem ficado claro que “a sociedade não tolera mais inflação elevada”. Embora tenha causas ligadas à pandemia e ocorra em vários países, o surto inflacionário brasileiro tem relação direta com a disparada do dólar, que já subiu quase 45% desde que o início do governo Bolsonaro —pressionando commodities como alimentos e petróleo.
A constante instabilidade política provocada pelo presidente e as dúvidas sobre a sustentabilidade das contas públicas têm levado investidores a se proteger no dólar. Agora, com a alta dos juros em curso, a dívida pública subirá mais rápido, podendo deteriorar um quadro já muito desfavorável. “Parece bastante claro que o Brasil terá de recuperar a disciplina fiscal. Apesar dos discursos [que possam ter na campanha], os candidatos sabem que esse é o elemento fundamental”, diz Latif.
A economista lembra, no entanto, que a aplicação do teto não evitou “a má gestão fiscal” recente. E, mesmo que medidas complexas e abrangentes sejam tomadas, o Brasil terá mais dificuldade do que no passado para sustentar um crescimento mais elevado.
“Na comparação com outras crises [como em 2002 e 2015-2016], o Brasil não tem mais o mesmo bônus demográfico [percentual de jovens entrando na força de trabalho], os indicadores de qualidade no ensino médio estão estagnados e a taxa de desemprego estrutural ficará mais alta. Tudo isso reduz o crescimento potencial do país”, diz Latif.
Valor
Aprovação de Bolsonaro cai para 19%, diz pesquisa
Diretor da consultoria Atlas enxerga ‘cansaço estrutural’ do bolsonarismo
Pela primeira vez a taxa de aprovação do governo Jair Bolsonaro caiu abaixo do patamar de 20% na série de pesquisas da consultoria Atlas. Segundo levantamento feito entre 23 e 26 de novembro, 19% dos brasileiros classificam a administração como ótima ou boa.
Há um ano, a aprovação ao desempenho do presidente era de 31%. Em janeiro de 2019, 39%. No polo oposto, a soma dos que o classificam como ruim ou péssimo alcança 60% – segunda maior taxa desse tipo na série, apenas um ponto abaixo da registrada no último levantamento, em setembro. Para outros 20%, a gestão é regular. Para chegar a esses números, a Atlas colheu respostas de 4.921 eleitores, o que resulta numa margem de erro de um ponto.
A pesquisa Atlas é feita pela internet. Via anúncios publicitários, a consultoria dispara milhares de convites aleatoriamente para internautas da área a ser investigada. Ao clicar, o eleitor é direcionado ao questionário do estudo. Dispositivos de segurança impedem que o respondente repasse a pesquisa a outras pessoas ou preencha mais de um questionário. Respostas são coletadas até que haja quantidade suficiente que se enquadre no perfil da amostra desenhada.
Calibragens são feitas para corrigir falta ou excesso de representação e eventual viés de não resposta por certos grupos. Pesquisa assim só pode ser comparada com levantamento que tenha adotado a mesma metodologia. Não pode ser comparada com pesquisa por meio de entrevistas presenciais nem com estudo feito por telefone por meio de operador ou mensagem gravada.
Num segundo critério para avaliar o desempenho de Bolsonaro, respondentes foram provocados a dizer só se o aprovam ou desaprovam, sem a opção intermediária equivalente ao “regular” da questão anterior. O “desaprova” alcançou o pico de 65%. O “aprova” ficou em 29%, a menor taxa nessa série.
O cientista político Andrei Roman, diretor da Atlas, lista outros dados apurados que ajudam a explicar a queda de popularidade. Corrupção e segurança pública foram dois dos temas mais caros na propaganda que levou Bolsonaro à Presidência em 2018. Hoje, o eleitorado tem visão crítica sobre esses dois assuntos. Para 59,2%, a corrupção está aumentando (23,6% acham que está diminuindo; 14,1% não acreditam nem em uma coisa nem em outra). Para 65,2%, a criminalidade está crescendo (13,6% acham o contrário; 16,2% não enxergam nem uma coisa nem outra).
O eleitorado também parece severo na avaliação sobre a economia do país. Para 72,3%, a situação econômica está ruim. Só 9,7% julgam o atual quadro como bom. “Parece que há um cansaço estrutural do bolsonarismo”, afirma Roman.
“Antes, a popularidade de Bolsonaro caía quando ele criava uma crise ou surgia uma notícia ruim, mas sempre se recuperava rapidamente após a fase de maior turbulência. Agora ele parece ter perdido essa capacidade de pronta recuperação. Sugere um desgaste que veio para ficar”, completa.
Folha de SP (Painel)
Resultado das prévias aumenta expectativa de petistas com Alckmin
Integrantes do PT torcem para que tucano decida ir para o PSB construir aliança com Lula
O fim das prévias do PSDB aumentou a expectativa entre integrantes do PT sobre o destino partidário de Geraldo Alckmin (PSDB-SP). Há forte torcida de ala do partido que ele decida ir para o PSB trilhar aliança com o ex-presidente Lula (PT). Quem conversou com o petista recentemente diz que ele está simpático a esta possibilidade.
Folha de SP (Mônica Bérgamo)
Lula reúne Haddad e Marta em jantar em SP
É a primeira vez que os três se encontram depois do rompimento da ex-prefeita com o PT
Lula se reuniu com Marta Suplicy e com Fernando Haddad em um jantar na casa do ex-prefeito e da mulher dele, Ana Estela, neste fim de semana.
É a primeira vez que os dois ex-prefeitos se encontram junto com o ex-presidente. O empresário Márcio Toledo, marido de Marta, e a noiva do petista, Rosangela da Silva, a Janja, também estavam presentes.
A reunião sela a reaproximação de Marta com o PT, com quem rompeu durante o governo de Dilma Rousseff.
O afastamento de Marta da legenda não foi apenas protocolar: ela votou a favor do impeachment de Dilma, chegou a se filiar no MDB de Michel Temer e, em 2020, fez campanha para Bruno Covas contra o candidato do PT, Jilmar Tatto, e Guilherme Boulos, do PSOL.
A ex-prefeita, no entanto, nunca implodiu as pontes com Lula. Sempre evitou criticar diretamente o ex-presidente e foi solidária quando ele estava preso, chegando a escrever uma carta carinhosa ao petista.
Além de Lula, Marta e Haddad, também estavam presentes a mulher do ex-prefeito, Ana Estela, o empresário Márcio Toledo, marido de Marta, a noiva do ex-presidente, Rosangela da Sila, a Janja, o advogado Marco Aurélio de Carvalho, e a sua mulher, Alessandra Gaspar, e os advogados Laio Moraes e Carol Toledo
No jantar, que teve também a presença do advogado Marco Aurélio de Carvalho, da mulher dele, Alessandra Gaspar, e dos advogados Laio Moraes e Carol Toledo, as conversas giraram em torno da viagem de Lula à Europa e das alianças para a campanha presidencial de 2022.
Embora ocupe um cargo na Prefeitura de São Paulo, o de secretária de Relações Internacionais, na gestão do MDB, Marta deve fazer campanha para Lula no próximo ano.
Valor (análise)
A esquerda que enxerga além
Movimentações atuais miram o futuro sem Lula
Por Bruno Carazza
Na recém-lançada biografia Lula: Volume I, o jornalista Fernando Morais conta que, após deixar a cela da PF em Curitiba, o petista se dirigiu aos manifestantes que o acompanharam em vigília nos 581 dias de prisão. Depois do discurso inflamado, “Lula dá um beijo cinematográfico em Janja, desce a escadinha do palanque e, sem precisar anunciar a ninguém, pisa no chão como candidato a presidente do Brasil”.
Morais estava certo. A anulação dos processos contra Lula automaticamente definiu a escolha da esquerda para 2022. Líder com folga nas pesquisas, o recente périplo internacional mostra o apetite do petista por obter um terceiro mandato e, assim, terminar sua carreira política por cima.
O retorno de Lula reenergiza a militância e pode reverter a tendência de queda de votos nesse campo observada desde que ele passou a faixa para Dilma Rousseff, em 2011. Computando os votos para deputado federal, verificamos que o conjunto de partidos inclinados à esquerda (PT, PSB, PDT, Psol, PV, Cidadania, PC do B, Rede, PCB, PSTU e PCO) viu seu eleitorado subir de 17,1 milhões de votos em 1998 para 31,3 milhões com a primeira vitória de Lula, em 2002.
A partir daí, ampliaram seu cacife gradativamente até atingir 38,1 milhões de votos no fim do segundo mandato lulista, em 2010.
Sem Lula no páreo, contudo, os eleitores da esquerda recuaram para 31,2 milhões em 2014 e, no último pleito, 28,3 milhões de votos. Mais do que a redução de sua força eleitoral, há uma dinâmica partidária nessa movimentação. O PT e seu satélite mais fiel, o PC do B, perderam cerca de 6 milhões de votos entre 2002 e 2018. Mas não há vácuo de poder, e esse espaço foi parcialmente ocupado pelo crescimento de PSB, Psol, Rede e – em 2018, com a candidatura de Ciro Gomes – PDT.
Esse fenômeno pode estar associado a diversos fatores, e merece ser estudado mais a fundo. A experiência de quase 13 anos no poder, que exigiu o pragmatismo de alianças ao centro e ao Centrão, pode ter afastado eleitores mais puristas. Escândalos de corrupção também teriam cobrado seu preço. A recessão legada pelo partido, por sua vez, pode ter despertado a vontade de se buscar alternativas econômicas em outras siglas ou candidatos. Uma outra hipótese seria a dificuldade do PT em se modernizar e assumir o protagonismo no debate de novos temas mais progressistas.
Há uma passagem na biografia em que Lula, após ler um livro na prisão, pergunta a um dos seus advogados: “Doutor, me explique uma coisa: o que é essa história de pauta identitária?” O fato de a principal liderança do partido estar tão por fora de um dos principais itens da agenda de seu campo político sugere como o PT pode ter envelhecido.
Em meio a todos esses processos, parcela expressiva dos antigos eleitores do PT buscou refúgio em novas (Rede e Psol) ou renovadas agremiações (PSB e PDT). Outra dinâmica a se observar é a dificuldade que o PT tem de formar e lançar uma nova geração de políticos de relevância nacional.
A entressafra fica clara quando se observa que, apesar de possuir uma bancada de 53 deputados e 6 senadores, eles perderam o comando da mobilização contra Bolsonaro no Congresso. Na Câmara, a liderança da oposição vem sendo exercida por Alessandro Molon, enquanto o líder da minoria é Marcelo Freixo – ambos do PSB.
No Senado, embora a minoria ainda seja capitaneada por um petista (Jean Paul Prates), o líder da oposição é Randolfe Rodrigues (Rede), um dos principais protagonistas da CPI da Covid, maior ação parlamentar contra Bolsonaro.
Na nova geração de quadros petistas, Fernando Haddad desponta como rara exceção – apesar de o livro de Morais deixar claro que a opção preferencial de Lula para substituí-lo na disputa de 2018 era o baiano Jaques Wagner e que, acompanhando as eleições da prisão, o petista demonstrou muita contrariedade com a forma como o ex-prefeito conduziu a campanha.
Embora seja o partido mais popular no eleitorado, com o retorno de Lula às disputas eleitorais os nomes mais promissores que surgiram nos últimos anos no espectro da esquerda estão se acomodando fora do PT, como Guilherme Boulos, no Psol, Manuela D’Ávila, no PC do B, e um extenso grupo que vai dos citados Molon e Freixo a Flávio Dino e Tabata Amaral, no PSB.
A intensa negociação do PSB tentando trazer para o seu lado o tucano Geraldo Alckmin e, assim, ocupar o posto de vice na chapa de Lula é a prova mais evidente de como os demais partidos estão se posicionando visando o futuro pós-Lula.
O retorno de Lula mexe com o jogo eleitoral do ano que vem. Mas, independentemente do resultado em 2022, no campo da esquerda as movimentações já ocorrem mirando o dia em que seu principal jogador pendurar as chuteiras.
Bruno Carazza é mestre em economia e doutor em direito, é autor de “Dinheiro, Eleições e Poder: as engrenagens do sistema político brasileiro” (Companhia das Letras)”. Escreve às segundas-feiras E-mail: bruno.carazza@gmail.com