Com Brasil em destaque, FAO diz que programas ajudaram a reduzir fome no mundo
Divulgação do relatório mostrou que de cada nove pessoas no mundo, uma sofre de extrema desnutrição
Segundo instituição, 805 milhões de pessoas ainda sofrem com insegurança alimentar e desnutrição em todo o planeta, mas programas como o Fome Zero têm ajudado a mudar quadro
O Brasil foi citado como um dos destaques do relatório da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), na última quarta-feira (16), durante a divulgação de dois estudos sobre segurança alimentar e nutricional. Os trabalhos mostram que ainda há muito por fazer, mas grandes avanços foram observados no intuito de acabar com a fome no planeta. E parte das metas obtidas ocorreu por meio de programas que integram ações e promovem inclusão social, como o Fome Zero.
Os dados ainda são assustadores mundialmente: revelam que, de cada nove pessoas no mundo, uma sofre de extrema desnutrição. No total, são 805 milhões de seres humanos que possuem fome crônica, mas esse número representa redução de 100 milhões em relação à última década e de 200 milhões em relação aos últimos 20 anos (de 1990 até hoje).
Conforme os dois trabalhos da FAO, não há como se enganar sobre a gravidade do quadro e a necessidade de erradicar a fome no planeta, apesar dos avanços. Contudo é preciso avaliar que, a partir dos resultados, fica constatado que há possibilidade real de se cumprir o item relativo à fome e desnutrição do Objetivo de Desenvolvimento do Milênio (ODM). Lançado pela ONU no ano 2000, o ODM propõe a redução pela metade da proporção de pessoas subnutridas na Terra até 2015.
No Brasil, entre 2001 e 2012, os índices podem ser citados como exemplo porque a pobreza foi reduzida de 24,3% da população para 8,4% da população (o equivalente a 16 milhões de pessoas). A extrema pobreza, situação atribuída a quem vive com menos de US$ 1 ao dia, foi reduzida, no mesmo período, de 14% para 3,5% da população brasileira. “A meta (de redução da fome no mundo) pode ser alcançada, se apropriados e imediatos esforços forem intensificados”, acentua o estudo.
‘Insegurança alimentar’
Lançado em Roma às 5h (horário de Brasília) e divulgado na capital do país em entrevista coletiva às 9h40, o estudo consiste em dois relatórios complementares, intitulados “O Estado da Insegurança Alimentar no Mundo” (Sofi 2014 – sigla do título em inglês) e “O Estado da Segurança Alimentar e Nutricional no Brasil”. Mostra que 65 países em desenvolvimento em todo o mundo conseguiram alcançar a meta determinada, no caminho para levar à erradicação da fome até 2015 (dentre eles, o Brasil) – e tendem a atingi-la.
A FAO aponta, ainda, como exemplos de regiões do mundo que mostraram significativos avanços nas ações, a América Latina e o Caribe. Ao passo que demonstraram as menores situações de avanço na erradicação da fome e desnutrição no planeta, os países da África Subsaariana e da Ásia Ocidental. Um dos motivos disso é o fato de se tratarem de áreas constantemente atingidas por catástrofes e conflitos, e onde há ausência de políticas firmes voltadas para combate a situações de vulnerabilidade da população. O que, em consequência, reduz as ações integradas voltadas para o combate ao problema.
Na África Subsaariana, que apresenta os piores índices, mais de uma em cada quatro pessoas continua com fome crônica e desnutrição, mas o maior número de pessoas com fome está localizada na Ásia: 526 milhões, no total.
Em relação à América Latina, são citados como bons exemplos Brasil, Bolívia e Equador. Na Bolívia e no Equador, sobretudo, chamaram a atenção, na última década, políticas de apoio às comunidades indígenas e às pessoas que residem em áreas rurais, com inclusão social de diversas formas.
No Brasil
No caso específico do Brasil, a avaliação dos observadores da FAO é mais detalhada e aponta que, no país, o principal vetor para erradicação da fome e desnutrição, o programa Fome Zero, não tem atuado isoladamente, mas consiste num trabalho integrado do governo que envolve 18 ministérios em ações diversas.
Nesse mesmo curso de tempo, mostra o trabalho, a renda dos 20% mais pobres entre a população brasileira cresceu três vezes mais que a dos 20% mais ricos e a proporção de pessoas com desnutrição passou de 10,7%, em 2000, para 5,35%, em 2006. Isso porque os gastos com programas sociais cresceram 128% em 12 anos. Os relatórios associam a esse avanço, também programas de erradicação da extrema pobreza, de agricultura familiar e redes de proteção social implementados.
O ponto destoante na América Latina é o Haiti, onde a situação continua preocupante e mais da metade da população sofre com problemas crônicos de desnutrição, depois do terremoto que assolou o país em 2010.
“Os resultados mostram que podemos ganhar a guerra contra a fome e inspirar os países a seguir adiante, com a ajuda da comunidade internacional, se for necessário”, salientou, no trabalho, o diretor-geral da FAO, o brasileiro José Graziano da Silva.
Tanto Graziano como o presidente do Fundo Internacional para o Desenvolvimento Agrícola (Fida), Kanayo Nwanze, e a diretora executiva do Programa Alimentar Mundial (PMA), ligado à ONU, Ertharin Cousin, endossaram o texto que enfatiza que “substancial e sustentável redução da fome é possível com comprometimento político.”
A FAO cita como exemplo de envolvimento o cumprimento do acordo como o que foi observado em junho passado, durante reunião da cúpula da União Africana, que se propôs a acabar com a fome no continente até 2025. E sugere que passem a ser observadas experiências semelhantes em outras regiões.
Segundo Graziano, o Fome Zero foi importante porque também serviu de modelo para outros países da América Latina e Caribe em iniciativas de combate à fome. Principalmente, por ter levado ao entendimento de que “apenas o aumento da produção de alimentos não é suficiente para acabar com a fome.”
Já a a ministra do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Tereza Campello, ao comentar os números, frisou que “sair do Mapa da Fome é um fato histórico para o Brasil”. Segundo a ministra, foi o sucesso de políticas públicas, como investimentos na agricultura familiar e transferências de renda do Bolsa Família, que “fizeram o Brasil superar a extrema pobreza.”
“Só com o programa de merenda escolar, o pais oferece hoje refeições a 43 milhões de alunos da rede pública. Isso significa alimentar mais do que toda a população da Argentina diariamente nas escolas e creches. Temos muito a comemorar, mas também muito ainda por fazer”, acrescentou ela.
Iniciativas integradas
Nesse quesito, o relatório também chama a atenção para o fato da questão ter que ser resolvida de maneira coordenada, motivo pelos quais os governos devem trabalhar para erradicar a fome por meio de parcerias, também, com o setor privado e a sociedade civil. E cita outros investimentos que precisam ser feitos, tais como no aumento à produtividade agrícola, acesso aterra, a serviços públicos, tecnologias e mercados.
O relatório deste ano tomou como base para a avaliação sete estudos específicos, de situações observadas na Bolívia, Brasil, Haiti, Indonésia, Madagascar, Malaui e Iêmen. A partir de cada um desses locais, foram destacadas as formas utilizadas pelos países para combater a fome e o êxito ou fracasso das experiências aplicadas, bem como as carências encontradas nesses países para o combate ao problema. Também foram observados tanto a eficácia de alguns programas como o impacto com eventos internos e catástrofes, assim como políticas econômicas, diversidades e diferenças culturais.
Nos resultados apresentados, a organização mundial deixa claro: além do combate à fome especificamente, para reduzir os índices negativos, os países precisam apresentar programas de nutrição para corrigir deficiências de micronutrientes de mães e crianças com menos de cinco anos.
Da Rede Brasil Atual