Crise agrava queda de sindicatos nos EUA
A maior central sindical dos Estados Unidos, a AFL-CIO, tranquilizou os torcedores às vésperas da finalíssima do campeonato de futebol americano, o Super Bowl, programada para ontem à noite: não iria atrapalhar o maior evento esportivo do país com protestos contra os limites aos direitos sindicais.
Indiana, Estado industrial do Meio-Oeste que neste ano sedia o Super Bowl, aprovou na semana passada uma lei do direito de trabalhar, que entre outras coisas impede os sindicatos de cobrar contribuições obrigatórias de quem se beneficia de seus acordos coletivos. Os ativistas ameaçavam bloquear ruas para atrapalhar a vida dos cerca de 150 mil visitantes presentes em Indianápolis, capital do Estado, para acompanhar o jogo entre os Giants e os Patriots. Com popularidade em queda, os sindicatos acharam prudente não brincar com o esporte nacional.
A lei aprovada em Indiana, um dos bastiões do sindicalismo nos Estados Unidos, foi mais um duro golpe nas organizações trabalhistas americanas, que vivem um lento declínio ao longo dos últimos 50 anos, agravado pela Grande Recessão que atingiu o país.
Ao todo, 23 dos 50 Estados americanos já aprovaram leis do direito de trabalhar, e há projetos para criar uma regra nacional. Eventos muitos raros no passado, os locautes, ou greves de empresas, começaram a ressurgir no último ano, aproveitando a debilidade dos sindicatos. Demissões em massa feitas por Estados e governos locais e limites aos diretos de greve de funcionários públicos começam a minar o que é hoje a base mais forte dos sindicatos americanos.
O sindicalismo vem declinado desde a década de 1950, afirma o cientista político Gordon Lafer, professor derelações trabalhistas na Universidade do Oregon. Mas essa recessão deixou os trabalhadores ainda mais assustados e menos dispostos a reivindicar qualquer coisa.
Hoje, apenas 11,8% dos trabalhadores americanos são sindicalizados, bem abaixo do pico de 28,3% observado em 1954. De 2008 para cá, a crise econômica provocou uma queda de 1,5 milhão no número de trabalhadores sindicalizados. Mudanças demográficas, como o aumento de escolaridade dos trabalhadores, ajudam a explicar o baixo índice de mobilização dos sindicatos, assim como a globalização, a queda da indústria e a expansão dos serviços. Mas essa é apenas parte da história. O Canadá passou por transformações semelhantes, mas seu índice de sindicalização se mantém em 32%.
A oposição dos empregadores aos sindicatos é muito forte nos Estados Unidos, afirma Gary Chaison, professor de relações industriais da Clark University. As leis americanas tornaram a organização sindical muito penosa e difícil. Diante de tantos obstáculos, os sindicatos têm poucos incentivos para investir na ampliação de suas bases. Há, também, características culturais que fazem os Estados Unidos diferentes do Canadá e de países europeus, onde os sindicatos são mais fortes. Em geral, os americanos acreditam mais em valores individualistas e menos na organização coletiva, afirma Chaison.
Do ano passado para cá, ocorreram 17 locautes nos Estados Unidos, episódios em que as empresas fecham as portas até os trabalhadores aceitarem suas propostas salariais, de acordo com dados citados em uma reportagem recente do jornal New York Times. Antes, eram eventos muito raros, geralmente promovidos por ligas esportivas, como do basquete e do futebol americano, contra reivindicações dos jogadores e demais funcionários. Os locautes mostram que as empresas hoje estão fortes em relação aos trabalhadores, explica John Budd, professor de relações trabalhistas na Universidade de Minnesota.
O próximo campo de batalha serão as eleições presidenciais americanas, que acontecem em novembro. O governador de Indiana, Mitch Daniels, é uma figura importante nos quadros do Partido Republicano, e a lei do direito de trabalhar já está se tornando uma bandeira importante na disputa com o presidente Barack Obama, que tenta conseguir um segundo mandato. Fortes lobbies empresariais estão por trás da proposta.
Os sindicatos estão reforçando o caixa e as fileiras dos candidatos democratas, mas estão bastante vulneráveis. Os candidatos republicanos são hábeis em culpar os sindicatos pelas dificuldades econômicas e pelo alto índice de desemprego. Eles precisam de um inimigo, afirma Lafer. Então o problema é o governo, os sindicatos e os imigrantes.
Do Valor Econômico